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186 – JUSTIÇA – “Trabalha e Confia”!

Para quem não sabe, este é o “slogan”


da bandeira do Estado do Espírito Santo. O pequeno notável Estado do
Espírito Santo começa ao Sul da Bahia, limita-se em todo o Oeste com Minas
Gerais e se finda no Norte fluminense. À Leste, o esplendor do Oceano
Atlântico com cerca de 350 km de belíssimas praias; seu povo, uma mistura
de europeu com latino que originou em um dos mais agradáveis e amáveis
povos do Brasil, mas a justiça do Estado...

O termo “complicado” poderia ser definido como lema recente do Espírito


Santo, mas o mais correto seria “envergonhado”. Nos últimos anos o que
não faltou para o povo capixaba foram motivos para se sentirem
envergonhados; parece que os Três Poderes estaduais resolveram se unir
para fornecerem matérias jornalísticas de conotação nacional e
envergonharem completamente aquele povo ordeiro e trabalhador.

Primeiro foram os escândalos do Legislativo; a Polícia Federal cumpriu


mandados de prisão expedidos pelo TRF que chegou a prender o ex-
presidente do Legislativo capixaba; depois vieram os escândalos com juízes
e desembargadores do próprio TRF; segundo procuradores federais, havia
uma quadrilha de magistrados no Espírito Santo que facilitava a vida de
amigos em processos; depois vieram os escândalos envolvendo policiais
civis e servidores do alto escalão federal que “davam uma mãozinha” aos
bandidos das importações ilegais. Nesta ultima operação, um filho de
Governador chegou a ser preso por cumplicidade com a quadrilha.

Neste ponto da história, o Espírito Santo já estaria mergulhado em uma


crise interna maior do que a sua própria extensão territorial; chegou a se
comentar nos bastidores do Congresso de haver intervenção federal para
que o tema não expandisse ainda mais. Outras crises chegaram a abalar as
estruturas políticas e sociais daquele Estado, mas um mar de calmaria se
estenderia até a semana passada.

No início de dezembro três Desembargadores, inclusive o Presidente do TJ


estadual e um juiz, receberam notícia de prisão decretada pelo Superior
Tribunal de Justiça; estes magistrados foram acusados, investigados e
presos após denuncias de crimes de favorecimento, peculato e
prevaricação; dava início a mais recente crise envolvendo os baluartes
capixabas, gente acima de tudo e de toda e qualquer suspeita, pelo menos
para nós que estamos de fora e não vemos, sabemos ou ouvimos nada que
diga a este respeito.
Os supostos crimes eram simples (para os acusados); segundo investigação
do Ministério Público e Polícia Federal, os amigos dos desembargadores
acionavam empresas e o Governo na justiça, procedendo com os mais
absurdos pedidos ilícitos; o Desembargador Frederico Pimentel, Presidente
do Tribunal e também pai do juiz preso, Frederico Pimentel Filho, davam
ordens a uma funcionária que tratava de “sortear” o destino “certo” de cada
processo. Na vara de um amigo ou na turma de seus amigos, todos os
processos eram julgados favoráveis aos interessados acusados e ao final, a
quadrilha recebia uma “ajudinha de custo” como carros importados,
dinheiro e outros mimos.

Os presos especiais foram transferidos para Brasília e confiados a


carceragem da Polícia Federal, por se tratar deles possuírem foro
privilegiado e lá permaneceram durante quatro dias dos cinco em que suas
prisões temporárias lhes permitiam; entrou em cena então a preclara
Ministra Laurita Vaz, relatora do processo, que decretou a revogação do
xilindró dos juízes. Caberá ainda a Laurita Vaz decidir se os acusados
poderão ou não retornar as funções de magistratura, uma vez que o Egrégio
Colegiado capixaba em seção plenária decidiu pela consulta a relatora.

Antes mesmo de adentrar na questão das prisões de magistrados do alto


escalão da justiça brasileira, vale também lembrar que nesta mesma
semana foi condenado a nove anos de prisão o Juiz Federal Salem Jorge
Cury da 3º Região (São Paulo – Mato Grosso do Sul); segundo acusações
também do Ministério Público, Salem Jorge permitia que um funcionário do
TRF assinasse documentos em seu nome e durante o período inquisitório e
investigatório, ele coagiu diversas pessoas envolvidas no escândalo; perdeu
o cargo e será “preso” para cumprir a pena determinada pelo próprio TRF 3
juntamente com seu “amigo” e servidor Vander Ricardo de Oliveira.

O judiciário, antes respeitado e glorioso, está se tornando o principal alvo da


corrupção ativa brasileira; os novos e velhos magistrados, sem generalizar,
não estão suportando as pressões políticas e as pressões das vaidades
pessoais. Nunca antes os carros, mansões, viagens glamorosas, jóias de
valor inestimáveis, fazendas e barcos fizeram parte da vida de parte da elite
do judiciário do Brasil, como se viver sem isso perdesse a preeminência
fantasiosa de ser poderoso.

Eu não saberia mensurar se há culpabilidade desta ou daquela figura; eu


não saberia afirmar se a própria sociedade que ajudou a criar estes mitos
também não se porta com mea-culpa deste fenômeno, mas certeza mesmo
é que para ser deputado, senador, governador, juiz, promotor ou delegado
de polícia e não ter um bom carro, uma boa casa e freqüentar os lugares
mais caros da sociedade significam “desconfiança” por parte de muitos e se
aplica claramente na maioria dos cargos que exerçam “poder”,
principalmente os que possuem “poder de polícia”.

Se olharmos para o passado, veremos que os juízes, desembargadores e


ministros superiores, desta vez generalizando, eram figuras que já haviam
nascido abastadas e oriundas de uma linhagem nobilíssima, primeiro que
estudar direito antes de 1980 era praticamente impraticável para os
comuns e desafortunados; depois que para poder se dizer “preparado” para
uma carreira jurídica na magistratura era tão comum para os ricos da
mesma forma que passar fome para os pobres, então, raramente víamos
um magistrado de linhagem desafortunada.

Os magistrados de modo geral eram homens e raras mulheres que


possuíam belas mansões, os mais caros veículos dotados de motoristas
uniformizados; não posso dizer que seus proventos sustentassem estes
luxos decadentes, mas com certeza, salário não era a perseguição da
maioria deles; fala-se no meio jurídico que milhares de juízes foram
indicados por seus padrinhos e que jamais passariam com louvor num
concurso público. Este conjunto em extinção era visto como algo
surpreendente e os “homens da capa preta” eram verdadeiros deuses do
Olimpo, daí a frase célebre: metade pensa que é Deus e a outra metade têm
certeza.

Com o passar dos anos e a evolução da comunicação e da própria justiça,


estes canais de mitos começaram a cair, da mesma forma que seus próprios
poderes semi-absolutistas e a figura do juiz, prefeito, padre e delegado já
não mais ostentavam tanto glamour quanto antes. Os proventos desta
gente começaram recentemente a ganhar proporções menos volumosos,
mas a vaidade, pelo menos para alguns, jamais deixou de existir.

No Século XXI, a popularização dos cargos tornou de certa forma fácil uma
pessoa comum, dotada apenas de inteligência conseguisse chegar à
carreira da magistratura e com este fenômeno nunca antes visto vieram
também à vulnerabilidade dos “intocáveis”. Toda esta gente que possui
PODER através de seus ofícios começaram a perceber que eles eram mais
parecidos com o povo e que a questão do “efêmero” já havia batido a sua
porta. Era preciso fazer compreender que esta concentração de “poder”
teria dia e hora certos para se encerrar e que todas estas pessoas voltariam
a serem pessoas comuns.
Como já disse Jose Marti, líder da libertação cubana: “o que brilha com luz
própria nada pode apagar”; o brilho de muitos magistrados não advém de
seus próprios conhecimentos e de suas aplicações nas ciências jurídicas,
eles brilham para a sociedade que os bajulam e através de prêmios sem
nenhuma importância, brindes e mimos; são pessoas vaidosas que cultivam
a parte mais medíocre do passado enganador.

Mas como eu costumo dizer da Polícia Rodoviária Federal que tinha a fama
de ser a mais corrupta polícia brasileira e que depois dos últimos concursos,
mais sérios e cheios desta gente jovem cheia de boas idéias e ações
práticas anticorrupção já dá exemplo de ser uma das mais atuantes e
notáveis; da mesma forma é que afirmo com toda autoridade: os jovens
juízes, aliados aos bons do passado ainda farão da justiça brasileira um
orgulho nacional, é uma questão de tempo.

Se estes magistrados acusados de formação de quadrilha, roubo e


favorecimento próprio forem julgados “culpados”, que eles sejam banidos
do quadro tão nobre de JUÍZES e que recebam além da pena prevista em
Lei, uma chance de utilizarem suas cabeças para promoverem a justiça e
não a baderna. O povo do Brasil não pode confundir os que delinqüem com
suas instituições, afinal de contas, marginais existem em todas as classes.

Da mesma forma que confundir uma decisão séria e embasada na Lei com a
promoção de favorecimento; a Ministra Laurita Vaz do STJ, muito embora
tenha permitido a soltura dos acusados do Espírito Santo, agiu em
formalidade legal; da mesma forma que, pela primeira vez em muitos anos,
um espetáculo pirotécnico não foi deflagrado, com a prisão de gente tão
ilustre e respeitado; mostra maior disso foi à operação da PF que sequer foi
comentada, apesar de seu nome: NAUFRÁGIO.

O povo brasileiro, em especial do Espírito Santo, não merecia um presente


destes de Natal! Agora é trabalhar e confiar que a Justiça capixaba restaure
sua dignidade para poder voltar a atuar conforme suas incumbências
naturais sem o menor nível de questionamento.

Eu não lembro de ter conhecido magistrados corruptos mas conheço


centenas deles que são de caráter probo e de retidão dos princípios e este é
meu maior orgulho!
Carlos Henrique Mascarenhas Pires

www.irregular.com.br

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