Entrevista realizada pela Assessoria de Comunicação na UESB,em 11/04/2006
RUBENS ALVES NA UESB NO PROJETO DE EXTENSÃO “ARTE NA ESCOLA”
por Raquel Costa Ele diz que “prosear é um jeito de falar”, “palavras fluindo”. E foi um pouco “proseando” que Rubem Alves concedeu uma entrevista à Assessoria de Comunicação da Uesb, no último dia 7. O escritor, um dos mais renomados do Brasil, esteve em Vitória da Conquista para o workshop “Educação, Ciência e Arte na Qualidade de Vida”, que teve a Universidade como uma das realizadoras. O tema da palestra que ministrou foi “A educação transformando vidas”. Aqui, ele fala de educação, escola, crianças e professores. Fala da bondade, do ouvir, da vida e do mundo.
Ascom – Por que a educação transforma vidas?
Rubem Alves – Olha, não é bem assim. Eu estou interessado em transformar as pessoas no sentido da bondade. Geralmente, quando se fala em educação, fala-se em matemática, geografia, física, preparar para o vestibular, essas coisas... isso não transforma vida de ninguém, pode dar conhecimento a essas pessoas; conhecimento é bom, mas nunca fez com que as pessoas ficassem boas. Um exemplo: Buda, Sócrates e Jesus eram extremamente ignorantes de tudo que nós sabemos hoje, sabemos sobre o universo muito mais do que eles; a despeito disso, eles foram imensamente superiores a nós, em bondade e em sensibilidade. Então, a nossa educação está muito centralizada em informações científicas, mas a ciência, por ela mesma, é muito cruel; coisas terríveis que aconteceram no século passado e estão acontecendo neste século têm a ver com a ciência. Ciência não faz ninguém bom. Eu estou interessado numa outra coisa: o que é que faz as pessoas serem sensíveis e boas, porque é com isso que se faz uma boa vida e se faz um bom país.
Ascom – E o que é que torna as pessoas boas?
Rubem Alves – Gandhi relata que ele foi transformado pela leitura de um livro, que aquele livro lhe impressionou tanto que daquele momento em diante ele ficou completamente diferente. Por exemplo, não é possível dar um curso sobre “como ser bom”, isso não existe, isso não se ensina, há coisas que não se ensinam na escola. Mas eu acredito muito na relação que pode ser estabelecida entre o professor e o aluno, nessa relação de respeito do professor, que sabe que a grande tarefa dele não é dar o programa, porque o programa é uma tarefa dos burocratas e vai ser logo esquecido. Quanto é que você se lembra do que aprendeu no curso primário? Você sabe o que é dígrafo? Não. Você sabe fazer cruzamento de coelho branco com coelho preto? Não. Você sabe quais são as causas da Guerra dos Cem Anos? Não. E não faz a menor diferença para você. Mas a primeira coisa é a relação com o professor, o respeito do professor pela criança, ouvir a criança. Quando a gente pensa em escola, educação, a gente pensa sempre nos meninos quietos e um professor ou professora tagarelando coisas diante deles e eles tomando nota. Não é por aí. É a relação de respeito, eu preciso ouvir as crianças, prestar atenção, mostrar o mundo para elas. Esses dias eu tava observando as formigas... Hoje, estávamos no ônibus do aeroporto e tinha, no vidro do ônibus, uma mosca – bicho nojento –, trepidando e, no meio daquela trepidação, se limpando toda, limpando as asas; eu olhei as asas dela e pareciam uma renda finíssima, e comecei a pensar que coisa fantástica que a natureza faz. Então, uma das coisas que são importantes para os professores é fazer as crianças prestar atenção nos assuntos do mundo. Às vezes, as pessoas falam “ah, falta de material didático”... Como falta de material didático? Qualquer coisa é material didático, o mundo inteiro é material didático, e professor tem essa missão de ensinar os alunos a ver, ouvir. E uma coisa importantíssima para o professor: jamais fale alto. Minha filha adotiva de seis anos de idade foi à creche e, quando voltou, a gente perguntou: “E a professora?”. A única observação que ela fez foi: “Ela grita”. Ou seja, aquela professora ensinou para aquela criança que o mundo é feito aos berros, aos gritos. Então, as coisas que transformam as pessoas não são conteúdos específicos, mas atitudes que os