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Fases da história fundiária brasileira (Trecanni):

1. PERÍODO DAS SESMARIAS (1500-1821)

2. PERÍODO DAS POSSES (1821-1850)

3. PERÍODO DA LEI DE TERRAS (1850-1889)

4. PERÍODO REPUBLICANO (1889-atual)


FASE DAS SESMARIAS
A historia territorial do Brasil começa em Portugal.

A partir da conquista portuguesa do Brasil, deixaram de


existir terras sem dono, todas elas incorporaram-se ao
patrimônio da coroa portuguesa.

Antes mesmo de ser ocupado, as terras do Brasil já tinham


sido divididas entre Espanha e Portugal pelo “Tratado de
Tordesilhas” (1494), homologado pelo Papa Julio II por
meio da Bula Pro Bono Pacis de 1504.

Trata-se do direito decorrente da “descoberta”, “conquista” e


posteriormente da “posse” (uti possidetis juris).
Daí se extrai uma premissa fundamental: a
propriedade da terra era originariamente pública. Logo,
toda terra é pública, até que se prove o contrário.

=> O sistema sesmarial:

Com a descoberta, passa a vigorar no Brasil a legislação


de Portugal.

O instituto das sesmarias era o modo vigente de


aquisição de terras, instituído por Dom Fernando I em
26 de junho de 1374, na cidade de Santarém (Portugal).

Estava previsto nas Ordenações Afonsinas (1446),


Manuelinas (1514) e Filipinas (1603).
 Sesmarias no Brasil e em Portugal. Diferenças:

O instituto era o mesmo, mas o contexto muito distinto.

Portugal:

- Visava solucionar a “falta de alimentos”, devido à ociosidade


da terra e o êxodo rural.

- Tomava-se a terra de quem não a lavrasse e dava-se a quem


o fizesse, por certo prazo, mediante o pagamento da “sexta
parte” do que fosse produzido.

- Caso não fossem cumpridas essas condições, a terra era


confiscada pela Coroa. A Lei de Sesmaria foi chamada por
isso de “drástica e violenta”.
Brasil:

- Em 20 de novembro de 1530, Dom João III outorgou a Martim


Affonso de Souza o direito de conceder sesmarias no Brasil. O
sistema foi introduzido oficialmente pela Carta Foral de 06 de
outubro de 1531.

- As terras eram virgens, jamais haviam sido lavradas, a não ser pelos
indígenas. Não haviam os problemas d escassez de alimentos e
tampouco de êxodo rural...

- A letra da lei determinava que as terras fossem lavradas e fossem


dadas “somente na vida daqueles a quem der”. Mas isso não foi
cumprido.

- Natureza jurídica: aproximava-se da “enfiteuse”, pois transferia-se o


domínio útil “ad perpetum”, inclusive com a possibilidade de
transmissão causa mortis.
 Destinatárias das “Cartas de Sesmarias”

- Predominava o favoritismo do Rei.

- Deveriam ser “homens de muitas posses e família, homens


de cabedais” (capazes de construir fortalezas, arregimentar
e transportar para a colônia trabalhadores).

- Cristãos.

- Em relação aos indígenas, um Alvará de 1º de abril de 1680


reconheceu-lhes o direito de serem proprietários. Outro
Alvará ordenava que as terras que lhes tinham sido
usurpadas fossem devolvidas. Porém, não teve nenhuma
eficácia.
* Terras que não poderiam ser das em sesmaria:
“áreas de uso público” (terrenos de marinha,
praias, estradas, acesso às fontes etc.).
 CLÁUSULAS CONTRATUAIS:

1. Aproveitamento

a) Obrigação de construir “torres” ou “fortes” para proteger a


terra dos “gentios brabos”.

b) Prazo de 2 anos para o “aproveitamento”, depois


aumentado para 5 anos.

c) Em caso de descumprimento, a sesmaria caducava (caía em


“comisso”).
2. Medição e demarcação

a) Tamanho compatível com a capacidade de aproveitamento.

=> Porém essa limitação tornou-se ineficaz, pois foram dadas


grandes áreas.

b) A falta de demarcação também gerava o “comisso”.

3. Registro da Carta pelos Provedores locais, sob pena de


não valer.
4. Pagamento de foro – característica da enfiteuse.

5. Confirmação pelo Rei – esse requisito reafirmava o


sistema de privilégios e tornava o procedimento lento e
burocrático, pois o Rei ficava em Portugal e os
pequenos dificilmente teriam acesso ao seu favor.

=> O tramite administrativo, inicialmente simples, passou


a incluir o pedido formal, com especificação de
extensão e limites, vistoria na área, certidão de não ter
recebido outra sesmaria, edital para eventual oposição,
emissão e inscrição da Carta de Sesmaria e confirmação
pelo Rei.

5. Proibição de venda, troca ou doação.


 Conclusões...

1) A sesmaria é a mãe do latifúndio brasileiro.

2) Devido às diferentes peculiaridades do contexto de


Portugal e do Brasil, o sistema sesmarial na Colônia
gerou muitas distorções.

Em Portugal, a terra era “bem de produção” (função


social).

No Brasil, era “bem patrimonial” sob poder absoluto do


sesmeiro.
1) Mas, apesar disso, não se consolidou a
propriedade privada no espaço agrário brasileiro
no sentido moderno de “propriedade absoluta” e,
especialmente, na Amazônia.

 Treccani informa que apenas “cerca de 1,92% do


atual território estadual foi titulado em favor de
particulares durante o período colonial.”

 No município de Santarém, há sesmarias na região


do Lago Grande.
PERÍODO DAS POSSES
Por ocasião da Independência do Brasil, vinham sendo
tecidas muitas críticas ao instituto das sesmarias (José
Bonifácio de Andrada e Silva), que denunciava o tamanho
abissal das sesmarias, a existência de “camponeses vagando
de lugar em lugar”, a agricultura em estado de atraso...

Por isso, em 1822, Dom Pedro I extinguiu o instituto no Brasil


(Res. n. 76, de 17 de julho de 1822).

Apesar de a Constituição do Império de 1824 ter reconhecido


o direito de propriedade, de modo irrestrito e
incondicionado, não haviam normas administrativas para
regulamentá-lo, instaurando assim o “período áureo das
posses”, que durou 28 anos.
Durante esse período, prevaleceu, em grande medida, a
“lei do mais forte” na corrida pela posse de novas terras.

A posse camponesa permaneceu minifundiária e à


margem dos grandes latifúndios, fortalecendo-se em
momentos de enfraquecimento do latifúndio e sempre
fundamentada na ideia do “trabalho” e do “tempo” e na
necessidade de produção de gêneros alimentícios não
produzidos pelo latifúndio monocultor.

Nessa época imperava o caos fundiário total no Brasil.


PERÍODO DA LEI DE TERRAS (601/1850)
Quando da edição da Lei de Terras, estava posto o seguinte
quadro:

a) Sesmarias confirmadas.

b) “Terras devolutas”: A Lei de Terras marca o surgimento


desse importante instituto, definindo as terras devolutas
por exclusão.

“Art. 3º São terras devolutas:


§ 1º As que não se acharem applicadas a algum uso publico
nacional, provincial, ou municipal.

§ 2º As que não se acharem no dominio particular por


qualquer titulo legitimo, nem forem havidas por sesmarias e
outras concessões do Governo Geral ou Provincial, não incursas
em commisso por falta do cumprimento das condições de
medição, confirmação e cultura.

§ 3º As que não se acharem dadas por sesmarias, ou outras


concessões do Governo, que, apezar de incursas em commisso,
forem revalidadas por esta Lei.

§ 4º As que não se acharem occupadas por posses, que, apezar


de não se fundarem em titulo legal, forem legitimadas por esta
Lei.
Messias Junqueira traz um conceito sintético: “aquelas terras
que não verteram para o domínio privado, deste excluído,
evidentemente, o que estiver aplicado a qualquer uso
público.”

A Lei de Terras consagrou a compra e venda como o modo


por excelência de acesso a terra (transmissão onerosa):

“Art. 1º - Ficam prohibidas as acquisições de terras devolutas


por outro titulo que não seja o de compra.”

“Art. 2º Os que se apossarem de terras devolutas ou de alheias,


e nellas derribarem mattos ou lhes puzerem fogo, serão
obrigados a despejo, com perda de bemfeitorias, e de mais
soffrerão a pena de dous a seis mezes do prisão e multa de
100$, além da satisfação do damno causado.”
A terra transforma-se em uma mercadoria. Sua aquisição não
mais se justifica pelo trabalho. Prioriza-se a abstração jurídica
materializada no “título”.

“Art. 11. Os posseiros serão obrigados a tirar títulos dos


terrenos que lhes ficarem pertencendo por effeito desta Lei, e
sem elles não poderão hypothecar os mesmos terrenos, nem
alienal-os por qualquer modo.
Desse modo, o “liberto” e o camponês são excluídos do
acesso a terra e o latifúndio é reafirmado.

A pequena propriedade e o processo de proibição do


trabalho escravo eram vistos como ameaça à oferta de
braços para o sistema de plantation (latifúndio,
monocultura de exportação e trabalho escravo).

A expressão de José de Souza Martins: “Quando o


homem era escravo, a terra era livre. Quando libertou-se
o homem, escravizou-se a terra”.
Por isso, paralelamente, a Lei de Terras incentivou a
imigração de europeus para o Brasil, com dispensa de
serviço militar, facilitação da naturalização etc.

Investiu o dinheiro público e o arrecadado com a venda de


terras na imigração de colonos livres.

O preço alto imposto pelo Estado para a venda de terras


obrigava os trabalhadores (imigrantes, libertos,
camponeses) a trabalhar para os latifundiários.
Quanto aos indígenas...

Art. 12. O Governo reservará das terras devolutas


“as que julgar necessarias”: 1º, para a colonisação
dos indigenas; 2º, para a fundação de povoações,
abertura de estradas, e quaesquer outras servidões, e
assento de estabelecimentos publicos: 3º, para a
construção naval.

Não havia qualquer esboço a um direito originário


indígena sobre suas terras tradicionais.
O art. 4º da Lei de Terras abriu a possibilidade de revalidação
das sesmarias caídas em comisso, desde que houvesse “cultura
efetiva e morada habitual” desde antes da publicação da lei.

Assim, eram consideradas títulos de domínio das sesmarias


“confirmadas” e as “revalidadas” de acordo com a Lei de Terras.

Mais tarde, o Supremo Tribunal Federal reconheceu uma


terceira possibilidade, com a edição da Súmula 340 do ano de
1964: “DESDE A VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL, OS BENS
DOMINICAIS, COMO OS DEMAIS BENS PÚBLICOS, NÃO
PODEM SER ADQUIRIDOS POR USUCAPIÃO.”

Foi reconhecida assim uma prescrição quarentenária


(prescriptio longissimi temporis). Assim, embora não
confirmadas ou revalidadas, as sesmarias mantidas desde 1877
como posse podiam se transformar em propriedade.
 O art. 5º também permitiu a legitimação de
posses “mansas e pacíficas”, “adquiridas por
occupação primaria, ou havidas do primeiro
occupante, que se acharem “cultivadas, ou com
principio de cultura, e morada habitual do
respectivo posseiro, ou de quem o represente,”
obedecidas algumas regras, dentre elas a existência
de um “limite máximo da área legitimável”.
Discriminação de terras devolutas:

Art. 10. O Governo proverá o modo pratico de extremar o


dominio publico do particular, segundo as regras acima
estabelecidas, incumbindo a sua execução ás autoridades que
julgar mais convenientes, ou a commissarios especiaes, os quaes
procederão administrativamente, fazendo decidir por arbitros
as questões e duvidas de facto, e dando de suas proprias decisões
recurso para o Presidente da Provincia, do qual o haverá tambem
para o Governo.
Procedimento ordinário para venda de terras: licitação

“Art. 14. Fica o Governo autorizado a vender as terras


devolutas em hasta publica, “ou fóra della”, como e
quando julgar mais conveniente, fazendo previamente
medir, dividir, demarcar e descrever a porção das mesmas
terras que houver de ser exposta á venda.”

Direito de preferência: “Art. 15. Os possuidores de terra de


cultura e criação, qualquer que seja o titulo de sua
acquisição, terão preferencia na compra das terras
devolutas que lhes forem contiguas, comtanto que mostrem
pelo estado da sua lavoura ou criação, que tem os meios
necessarios para aproveital-as.”
O Registro Paroquial ou Registro do Vigário

Art. 13. O mesmo Governo fará organizar por freguezias o


registro das terras possuidas, sobre as declaracões feitas
pelos respectivos possuidores, impondo multas e penas
áquelles que deixarem de fazer nos prazos marcados as
ditas declarações, ou as fizerem inexactas.

Esse registro foi regulamentado pelo Decreto 1.318/1854

Art. 97. Os Vigários de cada huma das Freguezias do


Imperio são os encarregados de receber as declarações para
o registro de terras, e os incumbidos de proceder a esse
registro dentro de suas Freguezias, fazendo-o por si, ou por
escreventes, que poderão nomear, e ter sob sua
responsabilidade.
O Registro Paroquial não dava direito a domínio, pois
servia como mero cadastro.

Mesmo assim, muitos foram levados indevidamente a


registro.

No Estado do Pará, segundo Palma Muniz, foram


cadastrados, nas diferentes paróquias, 22.069 imóveis
(TRECCANI).
Conclusões...

1. A Lei de Terras mercantilizou a terra, ao consagrar a


compra e venda como principio via de acesso.

2. Os institutos da demarcação (falta de agrimensores),


registro e discriminação de terras devolutas
fracassaram, permanecendo o Brasil sem estrutura
agrária definida.

3. Do ponto de vista técnico, a lei é elogiada pelos


agraristas como introdutora de diversos institutos até
hoje ativos no direito agrário: legitimação de posse, ação
discriminatória, cadastro rural, terras devolutas...
FASE DA REPÚBLICA

A Constituição Republicana de 1891, em seu art. 64


(Emenda de Júlio de Castilhos), entregou aos Estados as
terras devolutas brasileiras, exceto as áreas de fronteiras.

Com base nisso, o Estado do Pará editou o Decreto


Estadual 401/1891 e, após, a Lei Estadual 82/1892 que, no
essencial, repetiam as disposições da Lei de Terras.
os Estados receberam as terras sem qualquer
discriminação, cadastro ou registro preciso.

Em 1891, quando as terras devolutas foram incorporadas ao


patrimonio estadual, a titulação legal abrangia 13% do
Pará.

Isso favoreceu o “coronelismo”, que favorecia as oligarquias


locais com terras.

Surgiram vários movimentos de resistência contra essa


realidade (Canudos/BA, o Cangaço, Contestado (PR/SC).

Tais movimentos forma tratados como “banditos sociais”,


“inimigos internos”.
O Governo Republicano criou o “Registro Torrens”
para “sanear” as numerosas posses existentes fundadas
em títulos de propriedade imperfeitos.

Garantia um título equivalente à propriedade com


presunção absoluta de legitimidade. Contra ele não
poderiam ser opostos outros títulos não registrados.

Mas foi ineficaz. No Pará não existem mais que 50.


Especificidades sobre o processo de
ocupação de Terras no Pará e na Amazônia
- Repassadas terras aos Estados, estes deveriam estruturar um
sistema de definição da propriedade da Terra.

- No Estado do Pará, o Decreto estadual 401 de 1891 e a Lei


Estadual 82 de 1892 “disposições sobre a venda, revalidação,
transferência e legitimação das terras devolutas
exclusivamente pertencentes ao Estado”, com forte e visível
inspiração na Lei de Terras de 1850.

- A primeira legislação estadual irá reabrir os prazos para a


revalidação das cartas de sesmaria e da legitimação
das posses, prazos que, tendo-se esgotados a luz da
legislação imperial, tinham determinado o comisso destes
direitos.
Um dos “considerando” iniciais do decreto 401 apresenta
uma das preocupações do primeiro governo republicano:
“dificultar a constituição das grandes propriedades e facilitar
ao invés a democratização do solo, isto e, o seu retalhamento
em pequenas posses”.

Para por em pratica esta política, foi estabelecido o tamanho


máximo das posses havidas como ocupação primária que
poderiam ser legitimadas. A dimensão foi determinada
levando-se em consideração o tipo de exploração e a
localização: em terra de lavoura, 1.089ha; em campos de
criação, 4.356ha, e em seringais 545 hectares” (art. 8º, § 2º).

O Estado do Pará, desde o começo, preocupou-se em garantir


a terra para a agricultura familiar e evitar a concentração da
propriedade.
No entanto, no Estado do Pará surgiu um instituto peculiar,
que é essencial para compreensão da estrutura agrária regional
atual: o “título de posse”.

Segundo Treccani, “O ‘Titulo de Posse’ é o documento mais


importante da historia fundiária paraense, não só por ter sido
aquele que vigorou por mais tempo (permaneceu em vigor
durante mais de um século, mais precisamente 105 anos), mas
também devido ao fato de ter sido o documento com o maior
número de emissões (teriam sido expedidos mais de cinquenta
mil títulos).”
Segundo Otávio Mendonça, o Pará introduziu na sua
legislação um instituto inédito no direito brasileiro: o
título de posse, combinação originalíssima do fato, que
era a posse, com o documento, que era o título. E como
este se originava daquela, tornava-se evidente que a ela
se subordinava e somente prevaleceria na medida
em que a exercesse.

 Para se transformar em “propriedade” este documento


deveria ser “legitimado”, isto é, seu detentor precisava
provar que tinha dado uma destinação produtiva ao imóvel
e medido e demarcado (art. 7º do Decreto e arts. 48, 120 e
121 de seu Regulamento). Sem a devida demarcação, o
imóvel não poderia ser alienado (art. 21 do Decreto).
O efeito jurídico básico desses “títulos” era o de habilitar
seus detentores a requerer a legitimação de posse. Sua
emissão era mais complexa do que o mero cadastro no
Registro Paroquial.

Procedimento – (1) Iniciava a partir da “declaração do


ocupante”; (2) depois, era expedido um edital para eventuais
oposições e em seguida (3) Administração deveria fazer
vistoria na área para verificar a “posse mansa e pacífica” do
requerente. Com o tempo, a exigência do Edital e da Vistoria
deixaram de ser feitas e era emitido por simples declaração.

Após isso, era emitido o “Título de Posse” e estabelecido um


prazo para cumprir as condições exigidas no documento
(medição, demarcação, pagamento de taxa).
Só depois disso o “Título de Posse” se tornaria “Título de
Propriedade”. Porém, na maioria dos casos (cerca de
90%), isso nunca aconteceu.

Inicialmente, o prazo era 01 para obtenção do “título de


posse” e de mais 05 anos para a medição e demarcação.
Porém, esse prazo veio sendo prorrogada ao longo de mais
de 100 anos, até serem declarados definitivamente caducos
pelo Decreto 1.054/96.
Mas esta circunstância não impediu os detentores dos títulos de
posse de usá-los como se fossem documentos representativos de
domínio. Muito pelo contrario, na maioria das vezes, as terras
contempladas com esses títulos de posse foram objeto de vendas,
doações gratuitas e onerosas, dações em pagamento,
permutas etc., do mesmo modo que foram levados a
inventários, partilhadas ou adjudicadas, servindo inclusive
como instrumento de garantia real a financiamentos,
aproveitando-se os seus detentores, sobretudo da precariedade
descritiva das áreas neles previstas, quase sempre baseadas em
meros acidentes geográficos de difícil ou impossível localização.

Treccani explica que “pessoas inescrupulosas, aproveitando-se do


desconhecimento de parcela da população e de alguns serventuários
de registro publico, realizaram transações imobiliárias transferindo
meras posses como se fossem propriedades favorecendo não só a
especulação, mas a grilagem. “
Organização das classes camponesas ao longo do séc.
XX

- Década de 50 (Ligas Camponesas no Nordeste, União dos


Trabalhadores e Lavradores Agrícolas do Brasil – ULTAB,
Movimento dos Agricultores Sem Terra – MASTER, em
1960 no RS).

- A Reforma Agrária passa a ser uma pauta política


estruturada.

- 1963 é criada a Confederação dos Trabalhadores da


Agricultura (Contag).
João Goulart assume algumas bandeiras da luta dos
trabalhadores rurais (“ameaça comunista”).

Editou o Decreto 4.132/1962 que regulamentou casos de


desapropriação por interesse social, abrindo caminho
para a institucionalização da reforma agrária.

A Lei Delegada 11/62 criou a Superintendência de


Reforma Agrária (SUPRA).

Em 1964, decretou a desapropriação de uma faixa de 10


km ao longo das rodovias federais para fins de reforma
agrária. No mesmo mês Jango foi derrubado pelos
militares.
 Governos Militares:

Compartilhavam da ideia de que a estrutura agrária


semifeudal brasileira obstaculizava o desenvolvimento.

A EC 10/1964 (CF/1946) estabeleceu a competência


exclusiva da União para promover a desapropriação por
interesse social para fins de reforma agrária, mediante
prévia indenização em títulos da dívida agrária, resgatáveis
em até 20 anos, sendo as benfeitorias úteis e necessárias
pagas em dinheiro.

Poucos dias depois foi aprovado o Estatuto da Terra.


 Estatuto da Terra:

 Estabeleceu os institutos agrários em sua formatação atual:


imóvel rural, latifúndio, minifúndio, propriedade familiar,
empresa rural etc.

 Previu a Política Agrícola (eletrificação rural, assistência


técnica, cooperativismo, crédito, ITR progressivo sobre
terras improdutivas etc.).

 Instituiu o Cadastro de Imóveis Rurais (ineficaz).

 Criou o INDA (Instituto Nacional de Desenvolvimento


Agrário) e o IBRA (Instituto Brasileiro de Reforma Agrária).
 Entidades como a CNA e a SRB, além dos militares
“linha dura” manifestaram forte oposição ao Estatuto
da Terra.

 Os ruralistas publicaram um manifesto contra a


proposta reformista militar, dizendo que ela
“representa o ataque frontal ao direito de propriedade e
o perigo de socialização no campo”.

 Contudo, os dados atuais mostram que a reforma


agrária jamais saiu do papel. Ao latifúndio dada a
oportunidade de se “modernizar”, transmudando-se
em “empresa rural”.
A Federalização das Terras Estaduais em 1971
O Governo do General Emílio Garrastazu Médici assumiu o
poder com a bandeira de valorização do homem do campo, da
modernização da agricultura e da “integração nacional”
(“integrar para não entregar”). Por trás desse discurso havia o
forte apelo à segurança nacional. Criou o INCRA e incentivou
a colonização da Amazônia.

A CF/1967, em seu art. 4º, I, tinha incluído entre os bens da


União “as terras devolutas indispensáveis à defesa nacional, ou
essenciais ao seu desenvolvimento econômico”.

Com base nesse permissivo, foi editado o Decreto-Lei


1.164/1971, que incorporou extensas áreas de terras não
aproveitadas na Amazônia Legal ao processo de
“desenvolvimento nacional”.
A CF/88 diz:

Art. 20. São bens da União:

I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a


ser atribuídos;

=> Inclusive as áreas discriminadas sob a égide do Decreto


1.164/1961.

II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das


fortificações e construções militares, das vias federais de
comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei;

=> Já não menciona “terras essenciais ao desenvolvimento


econômico.”
Constituição de 1988
Na abertura democrática, houve um ferrenho debate sobre
a reforma agrária.

Houve um esvaziamento da função social, pois basta o


imóvel ser “produtivo” para impedir sua desapropriação.

Previsão do “usucapião constitucional agrário”.

A reforma agrária (PNRA I e II) não saiu do papel até hoje.


Na nossa região há muitos assentamentos, mas, em geral,
as terras são públicas.

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