punição do pecado com pecado Aluno: Neemias Barbosa da Silva Orientador: Prof.º Rev. Ronaldo Bandeira Henriques
Defesa de monografia apresentada em cumprimento parcial das exigências da matéria
Monografia II, para obtenção de título de Bacharel em Teologia A relação entre a soberania de Deus e o pecado humano sempre foi campo de acirrado debate. Calvino recusava a visão daqueles que faziam de Deus um mero espectador do pecado humano. Para ele, Deus mantém uma relação de eficiência com as ações dos ímpios, permitindo e ordenando-as para o cumprimento de seu decreto eterno. Turretini tem afirmações ainda mais severas sobre a relação entre soberania de Deus e o pecado humano. Para ele, Deus, muitas vezes, pune o pecado com pecado. Este é um assunto difícil, mas impossível de ser evitado por alguém que queira estudar toda a Bíblia. O assunto surge quando se lê textos como os de Êxodo 4 e 7-14, e Romanos 1.18-32. A Confissão de Fé de Westminster não o evitou, pelo contrário, interpretou esses textos, na seção VI do capítulo V, da seguinte maneira: Quanto àqueles homens malvados e ímpios que Deus, como justo juiz, cega e endurece em razão de pecados anteriores, ele não só lhes recusa a graça pela qual poderiam ser iluminados no entendimento e movidos no coração, mas às vezes tira os dons que já possuíam, e os expõe a objetos que, por sua corrupção, tornam ocasião de pecado; além disso os entrega às suas próprias paixões, às tentações do mundo e ao poder de Satanás; assim, acontece que eles se endurecem sob as influências dos meios que Deus emprega para o abrandamento dos outros.¹ ¹ ASSEMBLEIA DE WESTMINSTER. Confissão de Fé de Westminster. 17ª ed., São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 54-55. O assunto da relação entre a soberania de Deus e o pecado humano não é um assunto fácil ou popular. O assunto se torna mais complicado ainda quando se parte para a questão da punição do pecado com pecado. Há pouco material falando sobre o assunto. Contudo, é uma doutrina bíblica, e foi afirmada por diversos teólogos de renome na história da igreja. Se é uma doutrina bíblica, merece ser estuda de forma mais aprofundada. Esta monografia tem o propósito de explicar e explorar as partes desse parágrafo da Confissão, mostrando como a justiça de Deus se manifesta na punição do pecado com pecado. Adicionalmente, este trabalho busca fornecer informações bibliográficas que ajudarão a esclarecer o leitor sobre este assunto. Este trabalho consiste em uma pesquisa exploratória. O método utilizado nesta monografia é a pesquisa bibliográfica. Até onde é possível, esta pesquisa se detém em autores reconhecidamente de tradição reformada. Teólogos de outras tradições também são citados em determinados momentos, mas apenas quando estão de acordo com os símbolos de fé de Westminster. Esta pesquisa não apresenta um caráter polêmico. Por causa do escopo do trabalho, e por causa da limitação de tempo e recursos, optou-se nesta monografia por uma pesquisa que mostra o que a teologia reformada tem a dizer sobre o tema proposto. Para esclarecer como a justiça de Deus é demonstrada na punição do pecado com pecado, este trabalho está dividido em três partes: Capítulo 1: A justiça de Deus Capítulo 2: O pecado Capítulo 3: A punição do pecado com pecado Neste capítulo a justiça divina é definida como aquela perfeição de Deus por meio da qual ele “é em si santo e justo, e tem a constante vontade de dar a cada um o que lhe é devido.”² Nessa definição a justiça divina tem um aspecto absoluto, como uma perfeição do ser divino, e um aspecto relativo, como uma perfeição das obras de Deus no trato com suas criaturas. Intimamente ligada à justiça de Deus, está a sua santidade. A justiça é santa, pois Deus julga de acordo com seu ser santo. ² TURRETINI, F. Compêndio de teologia apologética. v. 1, p. 315. Essa santidade divina é manifestada na sua lei. Como uma expressão do seu ser, a lei é tanto um padrão para a vida de suas criaturas, quanto o padrão mediante o qual ele as julga. Ao julgar suas criaturas Deus exerce sua justiça distributiva. Ao obediente, como fruto da graça, remunera com recompensas. Aos desobedientes, como produto da ira, retribui com punições. A manifestação da ira de Deus e do seu ódio pelo pecado é a sua justiça retributiva. Ele é o justo juiz que já está punindo pecadores de diversas formas, inclusive entregando-os ao pecado. Ele é o justo juiz que está aguardando pacientemente o dia do juízo, quando retribuirá a cada um segundo seus feitos. Visto que a ira e o ódio de Deus são temas intimamente relacionados à sua justiça retributiva, reservou-se um subtópico deste capítulo para tratar sobre eles. Para entender como o pecado pode ser punido com pecado é necessário primeiro entender do que se está falando quando se usa esse termo. Por conta disso, o segundo capítulo apresenta o conceito reformado de pecado, que inclui ilegalidade, privação corruptora e insensatez. Além disso, há uma breve descrição da entrada do pecado na Criação de Deus, começando pelo mundo angélico e se estendendo ao mundo humano. As consequências desse desastre foram grandiosas. São essas consequências, chamadas de pecado original, que fazem com que o pecado seja punido com pecado. O último capítulo reúne os temas abordados nos dois primeiros capítulos e mostra como Deus pune pecadores entregando-os ao pecado. Para tanto, há nele uma breve análise de como Deus restringe o pecado mediante sua graça comum. Ao contrastar a restrição do pecado com o abando judicial, o leitor obtém uma noção melhor de como Deus pune pecados anteriores entregando pecadores à corrupção do pecado, para que eles cometam pecados posteriores e se afundem ainda mais em sua depravação. Nesse capítulo, são analisadas duas passagens bíblicas que falam claramente sobre pecadores sendo punidos com pecado (Ex 4, 7-14; Rm 1.18-32). No final do capítulo há uma comparação entre a reação de Moisés e Paulo ao juízo divino, o que dá ao leitor um paradigma de como agir quando percebe que Deus está punindo com pecado a sua nação, geração, cultura ou indivíduos. A doutrina da punição do pecado com pecado, apresentada na seção VI do capítulo V da CFW, é bíblica e faz parte da teologia reformada. Tais fatos já seriam suficientes para motivar qualquer cristão a estudar esse tema. Entretanto, essas não são as únicas razões. A realidade do mundo atual parece demonstrar que a ira de Deus está se manifestando do céu contra toda impiedade e perversão dos homens que suprimem a verdade pela injustiça; tais homens parecem estar sendo entregues por Deus à imundícia, a paixões infames, e a uma disposição mental reprovável (Rm 1.18-32). Diante disso, essa pesquisa teve como objetivo apresentar e esclarecer os dados bíblicos e teológicos que fundamentam a doutrina da punição do pecado com pecado. Desenvolvimentos posteriores: A principal desenvolvimento posterior a que esse trabalho pode ser submetido é a análise de linhas teológicas divergentes da apresentada nesta pesquisa. Este trabalho buscou ser uma exposição do que a teologia reformada fala sobre o tema em estudo. Contudo, será muito válido analisar e criticar, posteriormente, à luz da Bíblia e da teologia reformada a oposição dos socinianos à doutrina reformada da justiça de Deus, a objeção dos remonstrantes e arminianos modernos à doutrina reformada do pecado original, e a resistência do teólogos pós-modernos ao conceito de ira divina e justiça retributiva.