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ESTÁGIO CLÍNICO

12/04/2021

Profª Esp. Verediana Moreira Dias


Modelação, modelagem e regras
 O ensino de um repertório comportamental pode acontecer por modelação, por
modelagem ou por regras.

 Cada uma dessas formas de ensinar é usada dependendo das necessidades. Já


tivemos oportunidade de falar sobre a modelagem.

 A modelação é usada quando a modelagem é muito custosa ou inviável.

 Ela consiste na imitação de um modelo. Então, repetindo o exemplo citado por


Skinner, é bem mais fácil alguém ensinar o origami deixando que o aprendiz observe
e repita os gestos do mestre do que esperar até que uma resposta próxima da
esperada ocorra.
 Esse e muitos outros tipos de aprendizagem são difíceis de acontecer sem
imitação.

 Alguns repertórios mais complexos vão sendo aprendidos primeiramente com


modelação, passando depois a uma modelagem.

 Segundo Skinner, “mostrar e dizer são maneiras de ‘incitar comportamentos,


de levar pessoas a se comportarem de uma dada maneira pela primeira vez,
de modo que se possa reforçar seu comportamento”.
 A modelagem ocorre naturalmente nas nossas vidas, mas pode ser planejada
por outra pessoa, para selecionar algum repertório esperado.

 Ainda que todas essas pessoas não chamem com esse nome o que estão
fazendo, é o que, muitas vezes, fazem os pedagogos, os professores, os
treinadores de um esporte ou os pais, quando vão diferenciando o responder
passo a passo até chegarem ao resultado final esperado.

 Isto é, no processo de modelagem, uma consequência ocorre de modo a induzir


alguma dimensão do responder (como, por exemplo, a direção, a força ou a
velocidade de um movimento), até que um novo comportamento seja
instalado.
 Por exemplo, no primeiro dia de aula, as crianças, muitas vezes, se sentam em
qualquer carteira, em posições variadas, viradas para trás, de joelhos ou
conversando com o colega.

 A professora vai então apresentando consequências para o comportamento


desejado - sentar-se em silêncio, de frente para o quadro e olhando para ela.

 As consequências podem ser a apresentação de algum atrativo no quadro ou de


um fantoche falando cada vez mais baixinho e logo o comportamento desejado
torna-se instalado - mantido por suas consequências naturais ver e ouvir o que
está acontecendo na frente da sala de aula.

 Enfim, se olhamos para nossa própria história de vida, podemos identificar


processos de modelagem que estão atrás das atitudes mais simples até
daquelas que mais caracterizam nosso jeito de ser.
 As regras podem ter função de “pontapé inicial” para um comportamento e
podem também ser muito úteis quando não há tempo de aprender via
modelação e tampouco via modelagem.

 Aprendemos desde cedo a respeitar os avisos do tipo “Cuidado! Alta tensão”.

 As regras são valiosas para instalar um responder rápido e eficaz em situações


nas quais bastaria uma única exposição para um efeito letal, ou para que a
pessoa se ressentisse de um dano irreversível.

 No cotidiano, a modelação, a modelagem e as regras se combinam,


resultando no que chamamos de aprendizagem.
A tríplice contingência

 O trabalho do analista do comportamento apoia-se na análise de


contingências. Segundo Skinner,

uma formulação das interações entre um organismo e o seu meio


ambiente, para ser adequada, deve sempre especificar três coisas: (1) a
ocasião na qual ocorreu a resposta, (2) a própria resposta e (3) as
consequências reforçadoras.
As relações entre elas constituem as “contingências de reforço”.
 Skinner apresentou essa formulação explicando que, nela, o estímulo já não
mais se parece com um gatilho que "dispara” a resposta, como no
comportamento respondente. Ele destacou a interrelação entre a ocasião em
que uma resposta ocorre e as suas consequências.
 A tríplice contingência, portanto, descreve combinações de eventos.

 Isto quer dizer que o analista do comportamento não decompõe o mundo em


partes para entendê-lo, ele simplesmente procura relações: como um
universo indiferenciado foi se combinando com o responder de uma pessoa,
tornando-se então, para ela, ambiente?

 O analista do comportamento atua com base na chave interpretativa da


seleção por consequências, considerando como eventos consequentes e
antecedentes foram sendo combinados entre si e com o responder.
Contextos de atuação do Analista do Comportamento

 A tríplice contingência oferece um modelo de análise livre de conteúdo,


sendo, portanto, aplicável aos mais diversos contextos.

 Por exemplo: é possível fazer uso da tríplice contingência para planejar


intervenções para o comportamento de uma criança em sua sala de aula, de
uma pessoa em sua família, de um funcionário em um escritório, de atletas
que desejam melhorar seus desempenhos.
 Diferentes áreas de atuação do psicólogo podem ser atendidas com a
aplicação desse modelo, como a Psicologia do Esporte e a Psicologia Jurídica,
entre várias outras, além daquelas já bastante difundidas: Clínica,
Organizacional e Escolar.

 Poucas orientações em Psicologia têm influência aplicada tão penetrante


no campo da Educação, sobretudo da Educação Especial, do tratamento de
transtornos alimentares, do tratamento do tabagismo, dos transtornos de
ansiedade e humor e da orientação de pais, como a Análise
Comportamental Aplicada.
 Alguns assuntos aplicados originários de outras tradições em Psicologia
gradativamente passaram a ter o enfoque comportamental - como, por
exemplo, a orientação profissional.

 A tríplice contingência baliza ações do analista do comportamento, que


podem ser interpretativas, estratégicas, táticas, técnicas e o que podemos
chamar de reflexivas.

 Na prática, todas as ações acontecem de modo integrado.


A interpretação

 Ao interpretar, o analista do comportamento faz uso do modelo de seleção


por consequências para explicar o comportamento.

 Assim, o analista do comportamento leva em conta as consequências que


deram origem ao nosso organismo, ao nosso repertório comportamental
individual e às práticas culturais, a fim de oferecer a explicação do
comportamento humano.
 Para interpretar, não é preciso verificação ou evidência, é necessário que
haja uma relação razoável, segundo a teoria, de eventos que serão tomados
como “explicação”.

 Segue um exemplo de interpretação no contexto clínico.


 Quando um cliente relata para seu terapeuta que está muito deprimido e uma
avaliação médica já descartou problemas fisiológicos, o profissional interpreta,
supondo que há, provavelmente:

 1) perda de eventos reforçadores;

 2) baixa densidade de reforços;

 3) alta densidade de eventos aversivos não contingentes ao responder do cliente;

 4) reforço de comportamentos ligados à depressão;

 5) ou que dois ou mais desses eventos estejam acontecendo em conjunto.


 É muito comum o cliente contar em seguida que começou a se sentir triste
desde que alguém de sua família veio a falecer, ou de que terminou um
namoro, ou de que foi demitido de um emprego, ou de que sofreu outras
perdas importantes.

 E então, o analista do comportamento no contexto clínico segue compondo


sua interpretação do problema do cliente.

 Como se pode notar, a interpretação é o apelo à teoria — ela requer amplo


conhecimento de dados advindos de pesquisas feitas com animais e com seres
humanos, além do domínio de conceitos.
 A interpretação requer intimidade com um sistema de pensamento
consistente, que inclui evidências empíricas relacionadas a uma visão única
da relação entre seres humanos e seu mundo — a visão behaviorista radical.

 Interpretar é a ação central do analista do comportamento, e consiste em


explicar uma situação em termos de relações comportamentais, para só então
pensar em estratégias, adotar táticas e aplicar técnicas.
As estratégias

 A interpretação dá origem a um plano para alcançar os resultados desejados,


isto é, dá origem a uma estratégia.

 Imaginemos uma comunidade pobre, na qual muitos adolescentes moram


com pais e parentes que são traficantes ou têm problemas com a polícia e
com outros traficantes.

 Os comportamentos ligados à delinquência e prostituição infantil são


altamente prováveis nesse contexto.
 São aprendidos por modelação, por modelagem ou instrução e muitas vezes
mantidos por esquemas de reforço negativo (quando o responder elimina ou
adia um evento aversivo).

 Por exemplo, Carlinhos foi instruído pelo tio a mentir para a polícia,
afirmando que o tio não estava no barraco e que não sabia se havia droga ali.

 Ver o tio morto por um traficante rival ou capturado pela polícia, ou até
mesmo morto em troca de tiros com a polícia, seria um evento aversivo para
Carlinhos e que, entretanto, poderia ser evitado com uma mentira para a
polícia.

 Mentir para a polícia e ficar ansioso em relação a ela são respostas mantidas
por um esquema de reforço negativo.
 O contexto mais amplo da vida de Carlinhos não parece oferecer esquemas
concorrentes com esse.

 A rede social de Carlinhos é precária, e ele conta com a amizade de outros


meninos e meninas que vivem uma realidade parecida.

 Juntos, realizam trabalhos eventuais, vigiando carros em feiras ou vendendo


bugigangas no trânsito.

 Confrontar ou driblar a polícia tem valor de sobrevivência, e pequenos


furtos e roubos são aprovados socialmente, além de render coisas pelas
quais seria difícil pagar: tênis de marca, smartphones, etc.
 Assumindo que essa seja uma interpretação aceitável para os
comportamentos transgressores de Carlinhos e de seu grupo de amigos, todos
em situação de risco de delinquir, o analista do comportamento passa da
interpretação para a estratégia, isto é, a um plano geral para alcançar um
resultado esperado.

 O resultado desejado é que Carlinhos e seus amigos respondam em esquemas


concorrentes com esses esquemas em vigor.
 Para isso, uma estratégia poderia contemplar o fomento dos comportamentos
de:

 1) adequação a contextos sociais diversos (relacionados com habilitações


para o mercado de trabalho, habilidades sociais, aproximação habilidosa de
pares afetivos, etc.);

 2) autoproteção (alternativos a ficar contra a polícia e contra a lei);

 3) autoconhecimento (descrevendo as variáveis controladoras das respostas


envolvidas em expor-se ao risco de morte e descrevendo o que está fazendo
pelo seu futuro); e ainda,

 4) autocontrole = LIDAR.
 Na inspiradora tese de doutoramento de Conte, o leitor pode conhecer um
projeto universitário da Universidade Estadual de Londrina, no Paraná, que
reuniu esforços de empresas, as quais ofereciam estágios para meninos como
Carlinhos, de analistas do comportamento, envolvidos em ações estratégicas
como a descrita aqui, e da associação de bairro, que proporcionou
infraestrutura para reuniões e realização de oficinas.

 Nessa intervenção, meninos com características semelhantes às de Carlinhos


constataram sua situação e o risco de morrer cedo, e lutaram para evitar esse
destino, muitos deles com sucesso.
As táticas

 Consideramos táticas as ações que aproveitam os recursos, sejam eles


infraestruturais ou sociais, disponíveis no contexto para cumprir a
estratégia.

 Permanecendo no exemplo de Carlinhos, o analista do comportamento


poderia treinar multiplicadores para, na Sede da Comunidade do Bairro,
monitorar a realização das tareias escolares e reforçar comportamentos
considerados virtuosos (solidariedade, fidelidade, respeito, amor, disciplina,
etc.).
 Os analistas do comportamento poderiam, por exemplo, conduzir
atendimentos grupais e/ou individuais na sede comunitária para tratar de
comportamentos de autocontrole para cada adolescente em seu contexto de
vida; monitorar a inscrição e o comparecimento às oficinas que capacitam
para o mercado de trabalho; e reforçar relações interpessoais cordiais no
estágio oferecido por empresas.
 Na literatura, há relatos interessantes do aproveitamento das condições
infraestruturais para prevenir a ocorrência de comportamentos indesejáveis.

 Por exemplo, em um projeto estadunidense, as futuras mães, ao ingressarem


no sistema de saúde para atendimento obstetrício, receberam também
orientações para evitar comportamentos opositores em seus filhos, os
quais são comuns aos dois anos de idade, o que resultou na prevenção
desses comportamentos.
As técnicas
 Uma vez que o analista do comportamento disponha de uma boa
interpretação, aliada às estratégias e táticas, as técnicas, então, têm o seu
lugar.

 Há um amplo conjunto de técnicas fundamentadas em princípios de


aprendizagem respondente e operante que podem ser aplicadas — a
dessensibilização sistemática, a aproximação sucessiva, o fading out, o time
out, o reforço diferencial de outros comportamentos, a inundação, a
modelagem, etc.

 Mas, tratando-se de aplicação de técnicas, o ecletismo é permitido.


 Quando pensamos nas técnicas, fica muito claro que o único ecletismo que não
é tolerado é o teórico-filosófico.

 Havendo consistência nesse ponto, o analista do comportamento sente-se à


vontade para tomar emprestadas técnicas de outras tradições em Psicologia,
desde que sejam compreendidas e validadas de um ponto de vista
comportamental.

 Por exemplo: podemos usar as técnicas de role-playing, associação livre ou


outras advindas de práticas distintas em Psicologia, desde que sejam
convenientes a uma intervenção fundamentada em interpretações
estritamente comportamentais.
 Há um ditado que diz: “Se seu único instrumento é um martelo, tudo para
você é prego” .

 Ele alerta para o apego indesejável às técnicas, e o quanto isso pode


obscurecer a realidade que o profissional tem à sua frente.

 Assim, o analista do comportamento busca ser criativo, curioso, explorador


e eclético quando o assunto são as técnicas.
A reflexão

 A própria posição epistemológica (pragmatista) do analista do comportamento o obriga a


admitir que sua prática seleciona e é selecionada por eventos de seu contexto de atuação.

 Refletir sobre isso é a única possibilidade de romper com tendências inconsistentes com os
valores de um analista do comportamento.

 O principal valor do analista do comportamento é a sobrevivência das culturas. Para todas


as ações desse profissional, é possível o questionamento: “De que modo isso contribui para
a sobrevivência da cultura?”.

 A atuação do analista do comportamento inclui a constante atenção ao efeito de suas


práticas para a coletividade.
Referências

 https://comportese.com/2012/03/08/esvanecimento-definicao-e-aplicacao

 Leia o capitulo 4, pag. 97, do livro 

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