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Lógica proposicional

clássica
Em discussão
Lógica proposicional

Permite determinar a validade de alguns argumentos


(dedutivos), mediante o uso de uma linguagem formal.

Como podemos pensar e expressar o nosso


pensamento de modo válido?
1
Proposições e operadores
proposicionais
Proposições

Simples Complexas

São proposições em que não São proposições em que está


estão presentes quaisquer presente um operador
operadores proposicionais, não se proposicional ou mais do que um,
podendo decompor noutras podendo decompor-se noutras
proposições. proposições.

João joga futebol. Exemplos João joga futebol e Maria lê o jornal.


Maria lê o jornal.
Se o Universo é finito, então Deus
não é omnipotente.
O Universo é finito.
João pensa que Maria lê o jornal.
Deus é omnipotente.
Operadores proposicionais

Palavras ou expressões que, sendo ligadas


a determinadas proposições, permitem
formar novas proposições.

Verofuncionais Não-verofuncionais

Permitem determinar, Não permitem


apenas com base nos determinar o valor de
valores de verdade das verdade da proposição
proposições simples, o complexa unicamente
valor de verdade da com base nos valores
proposição complexa de verdade das
resultante. proposições simples.
Operadores verofuncionais
(operadores lógicos, conectores ou
conectivas proposicionais)

A proposição complexa é uma função de verdade


das proposições simples ou elementares.

O valor de verdade das proposições simples depende do facto de


elas estarem ou não de acordo com a realidade; o valor de verdade
das proposições complexas depende exclusivamente do valor de
verdade das proposições simples e dos operadores utilizados.
Variáveis proposicionais: P, Q, R, etc.

Dicionário (interpretação)

P: Paulo é livre.
Q: Paulo é feliz.

Argumento Forma lógica do argumento

Se Paulo é livre, então Paulo é feliz. Se P, então Q.


Paulo não é feliz. Não-Q.
Logo, Paulo não é livre. Logo, não-P.

Argumento válido: é impossível que


as premissas sejam verdadeiras e a
conclusão seja falsa.
2
Operadores proposicionais
verofuncionais
Operadores verofuncionais

Designação Símbolo Leitura Forma lógica Exemplo

Não-P
Negação  “não”
P
Júlia não é pintora.

PeQ Júlia é pintora e Ana é


Conjunção  “e”
PQ escritora.

Inclusiva P ou Q Júlia é pintora ou Ana é


 “ou”
PQ escritora.
Disjunção
Ou Júlia é pintora ou Ana
Ou P ou Q
Exclusiva  “ou… ou”
PQ
é escritora (mas não
ambas as coisas).

Se P, então Q Se Júlia é pintora, então


Condicional ⟶ “se... então”
P⟶Q Ana é escritora.

P se, e só se, Q Júlia é pintora se, e só


Bicondicional ⟷ “se, e só se”
P⟷Q se, Ana é escritora.
Negação Tabela de verdade
da negação

P Alberta é pintora. P P

P Alberta não é pintora. V F


Ou:
F V
Não é verdadeiro que Alberta seja pintora.

Outras expressões

É falso que Alberta seja pintora.


É errado afirmar que Alberta é pintora.
Não se dá o caso de Alberta ser pintora.

A negação de uma proposição P é uma proposição com a forma “Não-P”,


formalizando-se por P. Se P é verdadeira, P é falsa; se P é falsa, P é
verdadeira. A negação de uma negação equivale a uma afirmação.
O operador “não” é o único operador unário (os restantes são binários).
Conjunção

Tabela de verdade
P Joaquina trabalha.
da conjunção
Q Paula descansa.
P Q PQ
PQ Joaquina trabalha e Paula descansa.
V V V
V F F
F V F
Outras expressões F F F
Joaquina trabalha, mas Paula descansa.
Não só Joaquina trabalha, como Paula descansa.
Joaquina trabalha, apesar de Paula descansar.

A conjunção – “P e Q” (P  Q) – é verdadeira se, e só se, ambas as


proposições conectadas – proposições conjuntas – forem verdadeiras
(é falsa se pelo menos uma dessas proposições for falsa).
Disjunção inclusiva
Tabela de verdade
da disjunção
inclusiva
P Ricardo é futebolista.

Q António é aluno. P Q PQ


V V V
PQ Ricardo é futebolista ou António é aluno. V F V
F V V
F F F

A disjunção inclusiva – “P ou Q” (P  Q) – é sempre


verdadeira, exceto quando P e Q são ambas falsas.
Disjunção exclusiva

Tabela de verdade
P Manuel nasceu em Lisboa. da disjunção
exclusiva
Q Manuel nasceu no Porto.

Ou Manuel nasceu em Lisboa ou Manuel P Q PQ


PQ
nasceu no Porto.
V V F
V F V
F V V
F F F

A disjunção exclusiva – “Ou P ou Q”,


mas não ambas (P  Q) – é verdadeira
quando P e Q possuem valores de
verdade distintos e falsa quando P e Q
possuem o mesmo valor de verdade.
Condicional

P O Universo é finito. Tabela de verdade


da condicional
Q Deus existe.
P Q P⟶Q
P⟶Q Se o Universo é finito, então Deus existe.
V V V
O antecedente (P) é uma condição suficiente para o V F F
consequente. O consequente (Q) é uma condição F V V
necessária para o antecedente.
F F V
Outras expressões
Caso o Universo seja finito, Deus existe.
Deus existir é condição necessária para o Universo ser finito.
O Universo ser finito é condição suficiente para Deus existir.
O Universo é finito apenas se Deus existir.

A condicional – “Se P, então Q” (P ⟶ Q) – só é falsa se P (o antecedente)


for verdadeira e Q (o consequente) for falsa. Nas restantes situações, a
condicional é verdadeira.
Bicondicional

P Albano é católico. Tabela de verdade


da bicondicional
Q Albano vai à missa.
P Q P⟷Q
Albano é católico se, e só se, Albano vai à
P⟷Q
missa. V V V
V F F
F V F
F F V
Outras expressões

Albano é católico se, e apenas se, Albano vai à missa.


Albano ser católico é uma condição suficiente e necessária para Albano ir à missa.
Se Albano é católico, então vai à missa, e vice-versa.

A bicondicional – “P se, e só se, Q” (P ⟷ Q) – é verdadeira se as


proposições conectadas tiverem o mesmo valor de verdade e falsa se essas
proposições tiverem valores de verdade distintos.
Negação de condicionais Negação de bicondicionais

Ter-se-á de mostrar que as


Ter-se-á de mostrar que o
duas proposições em causa
antecedente não é uma
não constituem condições
condição suficiente para o
necessárias e suficientes
consequente.
uma para a outra.

Exemplo Exemplo

Se pensas, então és livre. Pensas se, e só se, és livre.

Negação: Negação:

Pensas, mas não és livre. Pensas e não és livre, ou és


livre e não pensas.
3
Âmbito dos operadores e
formalização das proposições
Âmbito de um operador

Proposição ou proposições que


esse operador afeta.

Dicionário:

P: Deus existe.
Q: O mal existe.

Operador principal:
Se Deus existe, então o mal não existe. P ⟶ Q
condicional

Não é verdadeiro que se Deus existe Operador principal:


(P ⟶ Q)
então o mal não existe. negação

O operador principal é o de maior âmbito. É aquele que se aplica a toda a fórmula


proposicional.
Formalização de proposições

Colocar as proposições na sua expressão canónica.

Isolar as proposições simples que as constituem e atribuir variáveis


proposicionais a cada uma (dicionário).

Simbolizar ou formalizar, com linguagem lógica, a proposição complexa.


Exemplo

Felismino não tem razão, se a dor é um mal ou o


desejo não é um bem.

Expressão Se a dor é um mal ou o desejo não é um bem, então


canónica Felismino não tem razão.

P: A dor é um mal.
Dicionário Q: O desejo é um bem.
R: Felismino tem razão.

Formalização (P  Q) ⟶ R
4
Tabelas de verdade: avaliação
de formas proposicionais
O método das tabelas de verdade

Expressão canónica Dicionário Formalização

Não é verdadeiro que P: Paulo escreve


se Paulo escreve então (P ⟶ R)
Q: Júlia é feliz.
Júlia é feliz.

1.º P Q (P ⟶ Q) 2.º P Q (P ⟶ Q)


Desenhar a Colocar na
tabela, tabela os valores V V
colocando aí as
letras
de verdade das
proposições
V F
proposicionais e simples, F V
a proposição esgotando as
complexa. possibilidades. F F

3.º P Q (P ⟶ Q) 4.º P Q (P ⟶ Q)


Calcular os
valores de V V V Calcular os V V F V
verdade das
proposições,
V F F valores de
verdade do
V F V F
excetuando os F V V operador F V F V
do operador principal.
principal. F F V F F F V
4.º 2.º 3.º 2.º 1.º Ordem do cálculo

P Q R [(P  Q)  (R ⟷ P)]
V V V F V V V F F
V V F F V V F V F Devemos começar pelos
V F V V F F V F F operadores de menor âmbito e
ir avançando para os de âmbito
V F F F F V F V F
maior. Os valores de verdade
F V V F F V V V V do operador principal são, por
F V F V F F F F V isso, determinados em último
F F V F F V V V V lugar.
F F F V F F F F V

Para duas Podemos


variáveis, são transcrever os
necessárias 4 valores de
linhas; para três, verdade de R
8; para quatro, para facilitar a
16, etc. visualização.
Tautologias

As tautologias, ou verdades lógicas, designam as proposições complexas


que são sempre verdadeiras (são verdadeiras em todas as possíveis
combinações de valores de verdade).

Proposição Dicionário Formalização

Se o sol brilha e Pedro


P: O sol brilha.
corre, então Pedro (P  Q) ⟶ (Q  P)
Q: Pedro corre.
corre ou o sol brilha.

P Q (P  Q) ⟶ (Q  P)
V V V V V
V F F V V
F V F V V
F F F V F
Contradições

As contradições, ou falsidades lógicas, são as proposições complexas que


são sempre falsas (são falsas em todas as circunstâncias possíveis).

Proposição Dicionário Formalização


Lídia sorri e Fialho escreve
P: Lídia sorri.
se, e só se, Fialho não (P  Q) ⟷ (Q  P)
Q: Fialho escreve.
escreve ou Lídia não sorri.

P Q (P  Q) ⟷ (Q  P)
V V V F F F F
V F F F V V F
F V F F F V V
F F F F V V V
Contingências

As contingências, ou proposições indeterminadas, são proposições


complexas que tanto podem ser verdadeiras como falsas.

Proposição Dicionário Formalização

Se há nuvens e chuva, então P: Há nuvens.


(P  Q) ⟶ (Q  P)
não há chuva e há nuvens. Q: Há chuva.

P Q (P  Q) ⟶ (Q  P)
V V V F F FV
V F F V V VV
F V F V F F F
F F F V V F F
5
Inspetores de circunstâncias:
avaliação de formas
argumentativas
Inspetores de circunstâncias

Sequências de tabelas de verdade usadas


para a(s) premissa(s) e para a conclusão.

Num inspetor de circunstâncias, um


argumento válido é aquele em que cada
linha que torne todas as premissas
verdadeiras é uma linha em que a
conclusão é verdadeira; não existe
nenhuma linha que torne as premissas
verdadeiras e a conclusão falsa. Se
existir uma linha assim, o argumento é
formalmente inválido.
Avaliação de formas argumentativas – Exemplo 1

Argumento Dicionário

Se há átomos, então não existe uma matéria subtil. P: Há átomos.


Existe uma matéria subtil. Q: Existe uma matéria
Logo, não há átomos. subtil.

Formalização

P ⟶ Q P ⟶ Q
Q P ⟶ Q, Q ∴
ou Q ou
P
∴ P ⊨ P

Premissa 1 Premissa 2 Conclusão


A terceira linha exprime a
única circunstância em que
P Q P ⟶ Q, Q ∴ P ambas as premissas são
V V verdadeiras. Ora, dado que
V F F V F
tal circunstância também
V V V F F torna a conclusão verdadeira,
V F
F V F V V o argumento é considerado
F V
F V V F V válido.
F F
Avaliação de formas argumentativas – Exemplo 2

Argumento Dicionário

Platão é racionalista, ou Kant é empirista e utilitarista. P: Platão é racionalista.


Não é verdadeiro que Kant seja empirista e utilitarista. Q: Kant é empirista.
Logo, Platão é racionalista. R: Kant é utilitarista.

Formalização P Q R P  (Q  R), (Q  R) ∴ P


P  (Q  R) V V V VV V F V V
(Q  R) V V F VV F V F V
∴P V F V VV F V F V
V F F VV F V F V
Estamos perante um argumento
válido, pois, nas circunstâncias em
F V V FV V F V F
que as premissas são F V F FF F V F F
verdadeiras, a conclusão também F F V FF F V F F
o é. F F F FF F V F F
Avaliação de formas argumentativas – Exemplo 3

Argumento Dicionário

Se há segurança e não há liberdade, então o mundo é cruel. P: Há segurança.


O mundo é cruel. Q: Há liberdade.
Logo, há segurança e não há liberdade. R: O mundo é cruel.

Formalização P Q R (P  Q) ⟶ R, R ∴ P  Q
(P  Q) ⟶ R V V V VF F V V V V F F
R V V F VF F V F F V F F
∴ P  Q V F V VV V V V V V V V
V F F VV V F F F V V V
Há três circunstâncias (1.ª, 5.ª e
7.ª) em que ambas as premissas F V V FF F V V V F F F
são verdadeiras e a conclusão é F V F FF F V F F F F F
falsa. Logo, o argumento é F F V FF V V V V F F V
formalmente inválido. F F F FF V V F F F F V
Variáveis de fórmula

As letras iniciais do alfabeto – A, B, C, etc. – são usadas para


as variáveis de fórmula. Estas especificam a forma lógica de
qualquer tipo de proposição (seja simples ou complexa).

Formalização
(com variáveis proposicionais)
(P  Q) ⟶ (R  S)
(R  S) ⟶ (T  U)
∴ (P  Q) ⟶ (T  U)

Formalização
(com variáveis de fórmula)
A⟶B
B⟶C
∴A⟶C
Formas de inferência válida

Modus ponens Modus tollens

Exemplo Exemplo

Se há destino, então Deus existe. Se há destino, então Deus existe.


Há destino. Deus não existe.
Logo, Deus existe. Logo, não há destino.

Dicionário

P: Há destino.
Q: Deus existe.

Formalização Formalização
P⟶Q P⟶Q
P Q
∴Q ∴ P
Contraposição

Exemplo Formalização

Se há conhecimento, então há verdade. P⟶Q


Logo, se não há verdade, então não há conhecimento. ∴ Q ⟶ P

Se não há verdade, então não há conhecimento. Q ⟶ P


Logo, se há conhecimento, então há verdade. ∴P⟶Q

Dicionário

P: Há conhecimento.
Q: Há verdade.
Silogismo disjuntivo

Exemplo Formalização

Pedro caminha ou fala da sua vida. PQ


Pedro não caminha. P
Logo, fala da sua vida. ∴Q

Pedro caminha ou fala da sua vida. PQ


Pedro não fala da sua vida. Q
Logo, caminha. ∴P

Dicionário

P: Pedro caminha.
Q: Pedro fala da sua vida.
Silogismo hipotético

Exemplo Formalização

Se Carlos corre, então Joana escreve. P⟶Q


Se Joana escreve, então Filipe lê. Q⟶R
Logo, se Carlos corre, então Filipe lê. ∴P⟶R
.

Dicionário

P: Carlos corre.
Q: Joana escreve.
R: Filipe lê.
Lei de De Morgan: negação da conjunção

Exemplo Formalização

Não é verdadeiro que Marte é uma estrela e um cometa. (P  Q)


Logo, Marte não é uma estrela ou não é um cometa. ∴ P  Q

Marte não é uma estrela ou não é um cometa. P  Q


Logo, não é verdadeiro que Marte é uma estrela e um cometa. ∴ (P  Q)

Dicionário

P: Marte é uma estrela.


Q: Marte é um cometa.
Lei de De Morgan: negação da disjunção

Exemplo Formalização

Não é verdadeiro que Júlio é poeta ou arquiteto. (P  Q)


Logo, Júlio não é poeta e não é arquiteto. ∴ P  Q

Júlio não é poeta e não é arquiteto. P  Q


Logo, não é verdadeiro que Júlio é poeta ou arquiteto. ∴ (P  Q)

Dicionário

P: Júlio é poeta.
Q: Júlio é arquiteto.
Negação dupla

Exemplo Formalização

Não é verdadeiro que Joana não é trabalhadora. P


Logo, Joana é trabalhadora. ∴P

Joana é trabalhadora. P
Logo, não é verdadeiro que Joana não é trabalhadora. ∴ P

Dicionário

P: Joana é trabalhadora.
A configuração geral das formas de inferência válida pode ser
apresentada com recurso às variáveis de fórmula

Exemplo Formalização

Se António tem uma biblioteca e uma família estruturada,


então António é feliz e não vive aflito. (P  Q) ⟶ (R  S)
Não é verdadeiro que António é feliz e não vive aflito. (R  S)
Logo, não é verdadeiro que António tem uma biblioteca e ∴ (P  Q)
uma família estruturada.

Dicionário
A⟶B
P: António tem uma biblioteca. B
Q: António tem uma família estruturada. ∴ A
R: António é feliz.
S: António vive aflito. Modus tollens
Formas de inferência válida

Modus ponens Modus tollens Silogismo disjuntivo

A⟶B A⟶B AB AB


A B A B
∴B ∴ A ∴B ∴A

Silogismo hipotético Contraposição Negação dupla


A⟶B B ⟶ A A A
A⟶B
B⟶C ∴ B ⟶ A ∴A⟶B ∴A ∴ A
∴A⟶C A ⟶ B  B ⟶ A A  A

Leis de De Morgan

(A  B) A  B (A  B) A  B
∴ A  B ∴ (A  B) ∴ A  B ∴ (A  B)

(A  B)  A  B (A  B)  A  B
Principais falácias formais

Falácia da afirmação do
consequente

Exemplo

Se há destino, então Deus existe.


Deus existe.
Logo, há destino.

Dicionário Formalização

P⟶Q
P: Há destino. Q
Q: Deus existe.
∴P
Falácia da negação do
antecedente

Exemplo

Se há destino, então Deus existe.


Não há destino.
Logo, Deus não existe.

Dicionário Formalização

P⟶Q
P: Há destino. P
Q: Deus existe.
∴ Q

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