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Conceito de texto e

discurso
FLC 0285 Teorias do texto – Enunciação, discurso e
Etimologia dos termos (CUNHA, A.G.
Dicionário etimológico da língua portuguesa. 4.
ed. Rio de Janeiro: Lexicon, 2010.

discur-sar, -ivo –o  DISCORRER


discorrer vb. ‘percorrer, atravessar’ ‘tratar, expor, analisar’
1572. Do lat. Disccurrere, de currere // discursar XVI //
discursivo 1813// discurso XVI. Do lat. Discursos –us, de
discursum, supino de discurrere.
Texto sm. ‘as próprias palavras de um autor, livro ou escrito’/
XIV texto XIV / Do lat. Textum –i ‘entrelaçamento, tecido’
‘contextura (duma obra)’
Contexto sm. ‘conjunto, todo, reunião’ ‘encadeamento das
ideias dum discurso’ 1813. Do fr. Contexte, deriv. do lat.
Contextus – us // contextura XVIII. Do fr. Contexture.
Texto e discurso em diferentes
teorias
• Linguística Textual

• Teoria bakhtiniana
Linguística Textual - LT

• Texto e discurso são sinônimos

• O conceito de texto é seu objeto de estudo

• A LT opera com uma metodologia de investigação


científica que privilegia as relações cotextuais de
composição das sequências linguísticas dotadas de
unidade semântica
Conceito de texto sofre significativas alterações na
história da disciplina (KOCH, I.G.V. Introdução à
linguística textual. São Paulo: Martins Fontes,
2006[2004].

• segunda metade da década de 1960 e a primeira da


década de 1970 –uma unidade linguística superior à
sentença formada por “uma sucessão de unidades
lingüísticas constituída mediante uma concatenação
pronominal ininterrupta.”(Koch, 2006, p. 4), ora
como uma sequência coerente de enunciados
• segunda metade dos anos 1970 - virada pragmática -
unidade básica de comunicação ou interação
humana, compreendendo o contexto enquanto situação
comunicativa.
Virada cognitivista

- década de 1980, a compreensão de que as ações em


geral acompanham-se de processos de ordem cognitiva
motivou uma nova concepção de texto como
“resultado de processos mentais” (Koch, 2006, p.
21), isto é, o texto é resultado da ativação pelos
parceiros da comunicação de saberes acumulados na
memória (linguístico, enciclopédico, cognitivos,
sociointeracional etc.) quanto aos diversos tipos de
atividades da vida social.
-
Perspectiva sociocognitivo-
interacionista
• perspectiva sociocognitiva-interacionista - integração
da virada pragmática com a perspectiva cognitivista - o
texto é o próprio lugar da interação e os
interlocutores, sujeitos ativos que – dialogicamente
– nele se constroem e por ele são construídos.
Exemplo de análise
Conselho Superior
Novo presidente vê mudanças em curso dentro da Fundação
Entre algumas convicções com que assumiu, no dia 15 de agosto
passado, a presidência do Conselho Superior da Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado de São Paulo-FAPESP, o professor Francisco
Romeu Landi, 62 anos, experiente engenheiro, pesquisador e
administrador na área de Ciência e Tecnologia, identifica pelo menos
duas como inabaláveis: a primeira, é que está à frente de uma
instituição reconhecida internacionalmente como uma das melhores
agências de financiamento à pesquisa do mundo; a segunda, é que o
Conselho Superior da Fundação vem atravessando um processo
significativo de modernização em suas idéias e atitudes. (Notícias
Fapesp, n. 2, set. 1995, p. 1)
Análise de Discurso francesa

• Duas concepções de sujeito:

1) Pechêux postula uma teoria não-subjetivista da


subjetividade, uma vez que o indivíduo é interpelado
em sujeito de seu discurso por sua identificação à
formação discursiva que o domina.

2) Charaudeau, por sua vez, opera com um conceito de


sujeito que ao mesmo tempo é coagido pelo contrato de
comunicação e se individualiza por meio de estratégias.
Três momentos dos processos de
produção do discurso:
1) Sua constituição, a partir da memória do dizer, fazendo
intervir o contexto histórico-ideológico mais amplo;

2) Sua formulação, em condições de produção e


circunstâncias de enunciação específicas e

3) Sua circulação que se dá em certa conjuntura e segundo


certa condições. (ORLANDI, 2008, p. 9)
Discurso

O discurso é da ordem da constituição, como dimensão


vertical em que o interdiscurso ou a memória discursiva
determina o intradiscurso. O discurso é “efeito de sentidos
entre locutores” (2008, p. 63) que se realiza na inscrição
da língua na história, regida pelo mecanismo ideológico
de filiação a redes de memória. Segundo Orlandi, o
“discurso é um processo contínuo que não se esgota em
uma situação particular. Outras coisas foram ditas antes e
outras serão ditas depois.” (2008, p. 14).
Texto

O texto é da ordem da formulação em sua materialidade


como historicidade significante e significada, é a
manifestação concreta do discurso e parte de um processo
pelo qual se tem acesso indireto à discursividade. O texto
é o lugar onde aflora a discursividade, lugar de tensão
entre o mesmo e o diferente, ou seja, de variação do/no
dizer.
Sujeito/autor
• O discurso tem sujeito, isto é, as diferentes posições
resultantes da inscrição dos sujeitos em diferentes regiões de
sentido (formações discursivas). Para Orlandi (2008), a
forma-sujeito (posição na relação) da contemporaneidade é
compelida à responsabilidade e liberdade que são tomados
como efeitos de nossa estrutura jurídica de sujeitos com
direitos e deveres.
• O texto tem autor que “se representa em sua origem, com
sua unidade, lhe propiciando coerência, não-contradição,
conferindo-lhe progressão e finalidade”. (ORLANDI, 2008,
p. 112). Esse trabalho do sujeito é, para a AD, uma relação
imaginária com o sentido chamada função-autor.
Divulgação científica (Orlandi)

• a divulgação científica: discurso de textualização jornalística do


discurso científico em um jogo complexo de interpretação.

• O discurso da divulgação científica parte de um texto que é da


ordem do discurso científico e, pela textualização jornalística,
organiza os sentidos de modo a manter um efeito-ciência. Nesse
processo, cria-se o efeito de “exterioridade” da ciência que será
vista como afetando coisas a saber no cotidiano da vida social.

• O jornalista científico ocupa uma posição-sujeito específica da


transferência pelo qual algo que significava de um modo, desliza
para produzir efeitos de sentidos diferentes.
Ciência Hoje 1982
Certamente, houve um crescimento
industrial muito rápido em Cubatão.
Entretanto, durante a fase principal de
implantação de suas indústrias –
realizada em apenas duas décadas –
não houve qualquer previsão dos
impactos sociais relacionados direta
ou indiretamente com a
industrialização. Partiu-se,
aparentemente, do velho pressuposto
de que onde haja mercado de trabalho
industrial, em países
subdesenvolvidos, para lá se deslocam
apreciáveis parcelas de populações
carentes à procura de empregos. Mais
uma vez, cuidou-se da viabilidade
técnica e econômica das empresas de
um modo frio, calculista e incompleto,
nada se fazendo para receber e alojar o
operariado industrial. (Aziz Ab’Saber,
CH, n. 1, 1982, p. 20)
Textualização
• Textualização - material semiótico híbrido: fotografia,
tipografia e linguagem verbal
• Textualização jornalística – fotografia

• Efeito de exterioridade da ciência “Cubatão: o que


dizem os cientistas”
• Função-autor: divulgador e
Discurso

• Formação ideológica político-econômica – processo de


industrialização do Brasil nos anos 1960-1970
• 2 FD em conflito:

1) FD capitalista em países subdesenvolvidos -


responsável pela situação (foto, enunciado do cientista)

2) FD contestadora do modelo econômico – defesa dos


oprimidos – Ciência/SBPC
Teoria bakhtiniana

• “O problema do texto na lingüística, na filologia e em


outras ciências humanas” (Estética da criação verbal,
2003[1959-1961])
• Texto: objeto primeiro de todas as ciências humanas,
diferenciando-as das ciências naturais
• Texto: “conjunto coerente de signos, a ciência das artes
(a musicologia, a teoria e a história das artes plásticas”
opera com textos (obras de arte)” (BAKHTIN,
2003[1959-61], p.305)
• Objeto das ciências humanas: o homem inserido na
sociedade, cujas ações físicas só podem ser interpretadas em
sua expressão semiótica ou em signos

• O texto tem autor: “Encontramos autor (percebemos,


compreendemos, sentimos, temos a sensação dele) em
qualquer obra de arte. Por exemplo, em uma obra de pintura
sempre sentimos o seu autor (o pintor), contudo nunca o
vemos da maneira como vemos as imagens por ele
representadas” (BAKHTIN, 2003 [1959-61], p. 314)
Texto = enunciado

- inclusão “na comunicação discursiva de dado campo”


(idem, p. 309), onde entra em relações dialógicas com
outros textos

- “o enunciado é um todo individual singular e


historicamente único” (idem, p. 334)

- natureza extralinguística, os elementos linguísticos são


um meio para realização do enunciado.
Metalinguística:
relações dialógicas
• “As relações dialógicas entre os enunciados, que atravessam
por dentro também enunciados isolados, pertencem à
metalinguística.” (idem, p. 320)
• as relações dialógicas (concordância, polêmica, contradição,
discussão etc.) são de natureza semântica
• ocorrem entre enunciados integrais
• são sustentadas por sujeitos-autores dos enunciados
• a compreensão do enunciado envolve responsividade e,
consequentemente, juízo de valor (verdadeiro, falso, belo,
justo etc.).
Texto: objeto da linguística

• A linguística opera com texto mas não com obra (...) as


relações puramente linguísticas (isto é, objeto da
lingüística) são relações do signo com o signo e com o
signos no âmbito do sistema da língua ou do texto (isto
é, as relações sistêmicas ou lineares entre os
signos).”(idem, p. 330).
• A linguística conhece apenas o sistema da língua e o
texto. (2003[1970-71], p. 382)
“Gabriela, cravo e canela”
(Jorge Amado, 1958)
• O pássaro se batia contra as grades, há quanto dias estaria preso?
Muitos não eram com certeza, não dera tempo de acostumar-se. Quem
se acostuma com viver preso? Gostava dos bichos, tomava-lhes
amizade. Gatos, cachorros, mesmo galinhas. Tivera um papagaio na
roça, sabia falar. Morrera de fome, antes do tio. Passarinhos preso em
gaiola não quisera jamais. Dava-lhe pena. Só não dissera pra não
ofender seu Nacib. Pensara lhe dar um presente, companhia pra casa,
sofrê cantador. Canto tão triste, seu Nacib tão triste! Não queria
ofendê-lo, tomaria cuidado. Não queria magoá-lo, diria que o pássaro
tinha fugido.
• Foi pro quintal, abriu a gaiola em frente à goiabeira. O gato dormia.
Voou o sofrê, num galho pousou, para ela cantou. Que trinado mais
claro e mais alegre! Gabriela sorriu. O gato acordou. (Jorge Amado.
Gabriela, cravo e canela. p. 227)
Período composto por
subordinação sem conjunção
Muitos não eram com certeza, não dera tempo de acostumar-se.
Muitos não eram com certeza, pois não dera tempo de acostumar-se.
Passarinhos preso em gaiola não quisera jamais. Dava-lhe pena
Passarinhos preso em gaiola não quisera jamais, porque dava-lhe
pena.
Não queria ofendê-lo, tomaria cuidado. Não queria magoá-lo, diria
que o pássaro tinha fugido.
Como não queria ofendê-lo, tomaria cuidado. Porque não queria
magoá-lo, diria que o pássaro tinha fugido.
Referências
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2008[1958].
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criação verbal. Trad. P. Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2003[1959-61].
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