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Eliade: O Sagrado, o Profano e os Mitos


O romeno Mircea Eliade não pode ser classificado como um sociólogo da religião. Ele se
colocava como um estudioso da ciência das religiões e um historiador da religião, mas
sempre em seus trabalhos manteve uma grande proximidade com a filosofia.
Mircea Eliade (1907-1986) nasceu em Bucareste, onde realizou seus estudos universitários,
formando-se em Filosofia. Depois disso, partiu para Índia, tendo ali estudado o sânscrito e
as filosofias do sudeste asiático, sob a orientação de Surendranath Dasgupta, professor
emérito da Universidade de Calcutá.
A grande influência exercida por seus escritos, que vão nos ajudar a refletir sobre algumas
temáticas fundamentais para o estudo científico das religiões, que é, afinal, o objetivo desta
área da Sociologia.
O trabalho de Eliade intitulado O Sagrado e o Profano – a essência das religiões, no qual
o autor dedica-se a refletir sobre o significado destes dois conceitos fundamentais para as
ciências da religião.

RELAÇÕES ENTRE O SAGRADO E O PROFANO

A maior influência para este trabalho de Eliade encontra-se no teólogo alemão Rudolf Otto,
autor de um famoso estudo intitulado O Sagrado. Eliade considerava que Otto havia
conseguido esclarecer o significado da chamada "experiência religiosa".
A chave desse entendimento encontrava-se na explicação da ideia de “Deus vivo” para todo
crente:
Não era o Deus dos filósofos, o Deus de Erasmo, por exemplo; não era uma ideia, uma noção
abstrata, uma simples alegoria moral. Era, pelo contrário, um poder terrível, manifestado na
‘cólera’ divina (ELIADE, 1999, p. 15).

Como você pôde notar é simplesmente a constatação que para o fiel a experiência religiosa
vai muito além de uma experiência moral, ou seja, de uma prática de fortalecimento de
certas condutas de vida.
O fiel sente o poder divino em sua vida, teme a sua cólera. É, portanto, uma experiência
que vai além da regulação de padrões de conduta moral. Otto desenvolveu, então, o
conceito de numinoso (que vem do latim “numen”, que significa “deus”), que conforme
Eliade:

O numinoso singulariza-se como qualquer coisa de ganz andere, radical e totalmente


diferente: não se assemelha a nada de humano ou cósmico; em relação ao ganz andere, o
homem tem o sentimento de sua profunda nulidade, o sentimento de "não ser mais do que
uma criatura", ou seja – segundo os termos com que Abraão se dirigiu ao Senhor –, de não
ser "senão cinza e pó" (Gênesis, 18:27). (ELIADE, 1999, p. 16)

O numen é desse modo. Deus é o completamente outro, pois absolutamente diferente de


todos os homens. Este é o caráter daquilo que deve ser chamado então de sagrado, que
se manifesta "[...] sempre como uma realidade inteiramente diferente das realidades
‘naturais’" (Ibid., p. 16). Eliade mostra então que a linguagem humana não é capaz de
expressar o sentido do ganz andere, pois "[...] a linguagem apenas pode sugerir tudo o que
ultrapassa a experiência natural do homem mediante termos tirados dessa mesma
experiência natural" (Ibid., p. 16).
A preocupação de Eliade é tratar o sagrado como uma totalidade, indo, portanto, além de
uma discussão sobre o racional e o irracional. Ele nos mostra o sagrado como sendo o
oposto do profano.

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Para começar seu estudo Eliade propõe o termo hierofania, que simplesmente significa
"algo de sagrado se nos revela" (Ibid., p. 17). Abordando a definição empregada por
Eliade, Gaarder assim sintetiza esses conceitos: "Sagrado indica algo que é separado e
consagrado, profano denota aquilo que está em frente ou do lado de fora do templo."
(GAARDER; HELLERN; NOTAKER, 2000, p. 18).
Veja que como a linguagem não é capaz de nos fornecer uma ideia precisa do numen, do
absolutamente sagrado e é justamente com base na manifestação de algo completamente
diferente do profano que chegamos ao conhecimento sobre o sagrado. O sagrado aponta
o caminho para algo maior do que nós.
Quando alguém presta veneração ou adoração a algum objeto sagrado não o está fazendo
para o objeto diretamente, mas, sim, para o seu aspecto de ser um caminho de algo maior.
Vejamos a importância dessas concepções segundo o próprio Eliade:

O leitor não tardará a dar-se conta de que o sagrado e o profano constituem duas modalidades
de ser no Mundo, duas situações existenciais assumidas pelo homem ao longo da sua história.
Esses modos de ser no Mundo não interessam unicamente à história das religiões ou à
sociologia, não constituem apenas o objeto de estudos históricos, sociológicos, etnológicos.
Em última instância, os modos de ser sagrado e profano dependem das diferentes posições
que o homem conquistou no Cosmos e, consequentemente, interessam não só ao filósofo,
mas também a todo investigador desejoso de conhecer as dimensões possíveis da existência
humana. (ELIADE, op. cit., p. 20).

Assim, é necessário perceber que o numinoso diz respeito a muito mais do que
representações fantasiosas da realidade, do que uma explicação para fenômenos naturais.
Até pelo fato de que o espírito humano reage de maneira diferente aos fenômenos da
natureza:

Ora, os progressos da etnologia cultural e da história das religiões mostraram que [...] as
'reações do homem diante da Natureza' são condicionadas muitas vezes pela cultura –
portanto, em última instância, pela história (Ibid., p. 21).

Chegamos, então, ao ponto em que o estudo do numinoso, das manifestações do sagrado


e do profano, nos ajuda a compreender "as dimensões possíveis da existência humana".
Vejamos agora, com atenção, as seguintes passagens:

Para o homem religioso, o espaço não é homogêneo: o espaço apresenta roturas, quebras;
há porções de espaço qualitativamente diferentes das outras. "Não te aproximes daqui, disse
o senhor à Moisés; tira as sandálias de teus pés, porque o lugar onde te encontras é uma
terra santa." (Êxodo, 3:5) Há, portanto, um espaço sagrado, e por consequência "forte",
significativo, e há outros espaços não-sagrados, e por consequência sem estrutura nem
consistência, em suma, amorfos. Mais ainda: para o homem religioso essa não-
homogeneidade espacial traduz-se pela experiência de uma oposição entre o espaço sagrado
– o único que é real, que existe realmente – e todo o resto, a extensão informe, que o cerca.[...]

Em contrapartida, para a experiência profana, o espaço é homogêneo e neutro: nenhuma


rotura diferencia qualitativamente as diversas partes de sua massa. [...]

É preciso acrescentar que uma tal existência profana jamais se encontra no estado puro. Seja
qual for o grau de dessacralização do mundo a que tenha chegado, o homem que optou por
uma vida profana não consegue abolir completamente o comportamento religioso. [...]

[...] a revelação de um espaço sagrado permite que se obtenha um "ponto fixo", possibilitando,
portanto, a orientação na homogeneidade caótica, a "fundação do mundo", o viver real. A
experiência profana, ao contrário, mantém a homogeneidade e portanto a relatividade do
espaço. Já não é possível nenhuma verdadeira orientação, porque o "ponto fixo" já não goza

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de um estatuto ontológico único; aparece e desaparece segundo as necessidades diárias. A


bem dizer, já não há "Mundo", há apenas fragmentos de um universo fragmentado, massa
amorfa de uma infinidade de "lugares" mais ou menos neutros onde o homem se move,
forçado pelas obrigações de toda existência integrada numa sociedade industrial.

E, contudo, nessa experiência do espaço profano ainda intervêm valores que, de algum modo,
lembram a não-homogeneidade específica da experiência religiosa do espaço. Existem, por
exemplo, locais privilegiados, qualitativamente diferentes dos outros: a paisagem natal ou os
sítios dos primeiros amores, ou certos lugares na primeira cidade estrangeira visitada na
juventude. Todos esses locais guardam, mesmo para o homem mais francamente não-
religioso, uma qualidade excepcional, "única": são os "lugares sagrados" do seu universo
privado, como se neles um ser não-religioso tivesse tido a revelação de uma outra realidade,
diferente daquela de que participa em sua existência cotidiana (Ibid., p. 25-28).

A noção de sagrado e profano divide os espaços do mundo para o homem religioso. Mas
não é uma mera divisão de funções, é uma divisão qualitativa: os espaços sagrados são
muito mais fortes, possuem uma grande significação, diferindo dos espaços profanos, que
não são estruturados.
O profano é o espaço da desordem, da ausência de um sentido maior. É nesse sentido que
o espaço sagrado é o único real, pois é o único que efetivamente importa para o homem
religioso. Por isso, Moisés precisa retirar suas sandálias: não pode trazer o pó dos espaços
profanos em que andou para dentro do espaço sagrado.
Interessante pensar em um paralelo de tal significação com a cultura oriental e seu costume
de retirar os sapatos ao entrar em qualquer prédio ou casa. Os sapatos carregam a sujeira
da rua, por isso, devem ficar na porta de entrada.
O homem não religioso, que optou, portanto, por uma vida profana, não enxerga o mundo
do mesmo modo. Para ele, os espaços do mundo são homogêneos, possuem a mesma
significação. Mesmo assim, Eliade destaca que o comportamento religioso não é
completamente abolido no homem profano, pois existe a configuração do meio social que
o circunda, que ainda é marcado pela noção do numinoso.

Informação Complementar
Lembre novamente do exemplo da cultura oriental. Tirar os sapatos é um gesto repetido por
todos, mesmo pelos que levam uma vida profana, em sentido de respeito ao ambiente no qual
vão entrar.

É importante entender bem o significado da citação em que o autor afirma que o sagrado
fornece um "ponto fixo" para a existência.
O mundo profano é homogêneo, portanto, todo espaço possui o mesmo valor. Isso implica
que todo ambiente está sujeito a ser violado, pois são as necessidades cotidianas que vão
definir a sua utilidade.
Perceba que é importante o paralelo realizado, então, com o mundo industrial, o mundo do
capitalismo. Na sociedade industrial, não existem espaços sagrados, todos os espaços
servem aos propósitos do mercado. Nesse sentido, o indivíduo, mesmo dentro do seu lar,
está sujeito a todos os apelos da sociedade de consumo, que invade sua privacidade por
meio da televisão, expondo sua família a mensagens que propagam valores que, muitas
vezes, são opostos aos que consideram corretos.
A noção de sagrado fornece o “ponto fixo”, o padrão que vai determinar a classificação de
tudo o mais que existir fora dele. Outro exemplo, relacionado ao primeiro sobre a televisão,
pode ser esclarecedor.

Informação
Muitos fiéis das religiões pentecostais e neopentecostais acabam adotando, em seus lares,
uma conduta que, inclusive, regula o conteúdo que deve ser visto na televisão, buscando fugir
de todas as mensagens consideradas profanas.
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A passagem final da citação nos remete, novamente, para a questão de que não há um
espaço puramente profano. Eliade destaca que mesmo o homem profano possui uma
experiência de lugares que se destacam em sua memória dos demais que frequenta.
Podem ser as lembranças da cidade natal, do local em que conhecemos o primeiro amor,
ou qualquer outro espaço em que fatos significativos para a vida individual e privada tenham
ocorrido. Tais espaços tornam-se sagrados mesmo para a memória do homem que decidiu
levar uma vida profana.

A FORÇA DOS MITOS

Passamos, agora, para a última parte do nosso estudo sobre Eliade. Vamos nos concentrar
aqui em outro trabalho importante do romeno, intitulado “Mito e Realidade”. Nessa obra, o
autor vai, novamente, começar pela definição do significado da palavra, partindo da busca
dos seus usos ao longo da história.
E o que o termo mito nos indica hoje? Em nossa sociedade, fortemente influenciada pela
tradição judaico-cristã, ele aparece relacionado com tudo aquilo "que não pode existir
realmente" (ELIADE, 1998, p. 8). Tal significado deriva do sentido atribuído pelos gregos à
palavra “mythos”.
Foram os gregos que começaram a retirar dos mitos o seu significado religioso e metafísico,
presente nas representações das civilizações mais antigas. Em seu sentido original, o mito
indicava uma história que era verdadeira, possuindo forte significação sagrada e exemplar.
Desse modo, foi com o avanço da civilização judaico-cristã que a noção de mito passou a
ser vinculada com uma representação ilusória da realidade, uma vez que somente aquilo
que estava presente nos livros bíblicos era considerado verdadeiro.
Vejamos, a seguir, algumas passagens de Eliade que nos ajudam a entender melhor o
significado do mito:

O mito é uma realidade cultural extremamente complexa, que pode ser abordada e
interpretada através de perspectivas múltiplas e complementares.

[...] Em suma, os mitos descrevem as diversas, e algumas vezes dramáticas, irrupções do


sagrado (ou do "sobrenatural") no Mundo. É essa irrupção do sagrado que realmente
fundamenta o Mundo e o converte no que é hoje. E mais: é em razão das intervenções dos
Entes Sobrenaturais que o homem é o que é hoje, um ser mortal, sexuado e cultural.

[...] é importante frisar, desde já, um fato que nos parece essencial: o mito é considerado uma
história sagrada e, portanto, uma "história verdadeira", porque somente se refere a realidades.
O mito cosmogônico é "verdadeiro" porque a existência do Mundo aí está para prová-lo; o
mito da origem da morte é igualmente "verdadeiro" porque é provado pela mortalidade do
homem, e assim por diante.

[...] a principal função do mito consiste em revelar os modelos exemplares de todos os ritos e
atividades humanas significativas: tanto a alimentação ou o casamento, quanto o trabalho, a
educação, a arte ou a sabedoria (Ibid., p. 11-13).

A primeira ponte feita do mito é justamente com a cultura, em que deriva sua relação com
a realidade.
O mito é real, pois a cultura, em suas diferentes manifestações, é completamente real.
Portanto, antes de prosseguirmos, é preciso ter claro que: dizer que uma coisa é real não
implica em dizer que todos os deuses de fato existem, por exemplo.
Entretanto, a realidade é definida por aquilo em que os homens acreditam e fazem
acontecer em seu cotidiano. É real aquilo que os homens, em sociedade e por meio da sua
cultura, tornam real. Por isso, a passagem seguinte fala da relação do mito com o sagrado,
moldando o mundo do modo como o conhecemos.
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As provas apresentadas para comprovar a realidade dos mitos podem não ser as provas
aceitas pela ciência laboratorial e experimental moderna, mas são as legitimadas por uma
explicação que faz sentido dentro de uma lógica cultural. E a cultura de um povo é a sua
realidade.
Veja que a última passagem do texto anterior nos indica um aspecto que também precisa
ser claramente compreendido. Ao falar que a função principal do mito é nos revelar aqueles
modelos exemplares da conduta humana de certa sociedade, tal afirmação é feita para os
pesquisadores de hoje. Ou seja, o estudo dos mitos é importante hoje por nos ajudar a
compreender os modelos culturais de comportamento humano para as diferentes
sociedades. Para as sociedades em que o mito exerce seu papel, ele continua sendo a
revelação de uma história verdadeira e sagrada:

Acrescentemos que, nas sociedades em que o mito ainda está vivo, os indígenas distinguem
cuidadosamente os mitos – "histórias verdadeiras" – das fábulas ou contos, que chamam de
"histórias falsas".

[...] Em suma, nas histórias "verdadeiras", defrontamo-nos com o sagrado e o sobrenatural;


as "falsas", ao contrário, têm um conteúdo profano [...]

Enquanto as "histórias falsas" podem ser contadas em qualquer parte e a qualquer momento,
os mitos não devem ser recitados senão durante um lapso de tempo sagrado [...] Esse
costume se conservou mesmo nos povos que ultrapassaram o estádio arcaico da cultura (Ibid.,
p. 13-15).

Devem ter ficado claras, na citação anterior, as relações entre os conceitos que compõem
o título desta unidade: o sagrado, o profano e os mitos. A "realidade" do mito vem da sua
relação com o sagrado: o mito revela a história "verdadeira" do sagrado.
Todas as demais histórias são "falsas", justamente por tratarem de tudo aquilo que é o
profano. Lembre-se de que, para o homem religioso, o mundo profano não corresponde à
verdadeira realidade, mas sim a um conjunto de ilusões e distrações.
Os mitos, sendo histórias sagradas, não podem ser contatos em qualquer momento e nem
por qualquer pessoa, pois não podemos, simplesmente, nos aproximar do sagrado.
Lembre-se da mensagem enviada para Moisés, para que retirasse suas sandálias... Só
podemos nos aproximar do sagrado quando abandonamos a contaminação do profano.
Isso ocorre, pois, o sagrado é considerado tão poderoso que o ser profano correria um sério
risco somente por se aproximar dele sem os devidos cuidados. Os riscos envolvidos são
diversos, sendo o mais extremo deles a morte.
Surge daí, então, a necessidade de termos um "um lapso de tempo sagrado”, durante o
qual os mitos podem ser contados. Não é esse, justamente, o significado dos cultos e
celebrações religiosas na nossa sociedade? O cristão de hoje, antes de iniciar a leitura da
Bíblia, também não faz um breve momento de reflexão? Ao realizar o sinal da cruz ele não
está indicando que vai entrar em outro estágio da sua existência, marcado pela presença
do sagrado?
Espero que tenha ficado claro porque Eliade rejeita a definição judaico-cristão para o mito,
ao associá-lo com tudo que é falso e ilusório (Ibid., p. 08). Vejamos mais algumas
passagens do autor para finalizar a nossa reflexão:

A Etnologia não conhece um único povo que não se tenha modificado no curso dos tempos,
que não tenha tido uma "história". À primeira vista, o homem das sociedades arcaicas parece
repetir indefinidamente o mesmo gesto arquetípico. Na realidade, ele conquista
infatigavelmente o mundo, organiza-o, transforma a paisagem natural em meio cultural.
Graças ao modelo exemplar revelado pelo mito cosmogônico, o homem se torna, por sua vez,
criador. Embora pareçam destinados a paralisar a iniciativa humana, por se apresentarem

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como modelos intangíveis, os mitos na realidade incitam o homem a criar, e abrem


continuamente novas perspectivas para o seu espírito inventivo.
O mito garante ao homem que o que ele se prepara para fazer já foi feito, e ajuda-o a eliminar
as dúvidas que poderia conceber quanto ao resultado de seu empreendimento. [...] A
existência de um modelo exemplar não entrava o processo criador.

[...] Direta ou indiretamente, o mito “eleva” o homem (Ibid., p. 124-128).

Portanto, não existe um único exemplo de civilização humana sem uma história, sem a
transmissão de valores de uma geração para a outra, seja pela tradição oral seja pelo
desenvolvimento da escrita.
Os mitos criam modelos ideais de conduta. Eles não dizem ao homem aquilo que ele jamais
vai conseguir atingir. Pelo contrário! Revelam, ao homem, que ele pode superar seus limites,
desde que se prepare para tanto. Os mitos cosmogônicos, aqueles que dizem respeito à
criação do mundo, não existem para que o homem se acomode em sua realidade, mas
servem para indicar que ele também pode ser criador ao buscar se aproximar de um modelo
de conduta.
Se alguém deseja acreditar que os modelos exemplares acabam com as possibilidades de
criação, então, também, deveria acreditar que todas as possibilidades da arte deixaram de
existir depois dos gregos.
Os modelos exemplares não existem para entravar o homem, mas, sim, para estimular sua
imaginação e incentivar a sua ação. Por isso, há a afirmação de que "o mito eleva o homem",
pois esses modelos fazem que ele acredite que pode ser e fazer mais do que aqueles que
vieram antes dele. E, nesse sentido, não temos nada mais real.

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