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INTERPRETAÇÃO DA

GASIMETRIA ARTERIAL
Versão Original: Versão Portuguesal:
Marc D. Berg, MD Manuel Primo, MD
DeVos Children’s Hospital Unidade de Cuidados Intensivos
Neonatais e Pediátricos
Rita R. Ongjoco, DO
Hospital Garcia Orta, Portugal
Sinai Hospital of Baltimore

12/30/02 ABG Interpretation 1


Interpretação da gasimetria arterial

• Primeiro - o doente tem acidose ou alcalose ?


• Segundo - qual é o problema primário –
metabólico ou respiratório.
• Terceiro - o doente estará a compensar?
– a compensação respiratória é imediata,
enquanto a compensação renal demora
algum tempo.
12/30/02 ABG Interpretation 2
Interpretação da gasimetria arterial

• É raro haver hipercorrecção quer pelo


sistema respiratório quer pelo renal
• O pH indica o problema primário
• Depois de estabelecer o equilíbrio
ácido/base primário e o grau de
compensação, avaliar a oxigenação

12/30/02 ABG Interpretation 3


Valor Normal
• pH 7,35 a 7,45
• paCO2 36 a 44 mm Hg
• HCO3 22 a 26 mEq/L

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Valores anormais
pH < 7,35 paCO2 < 36 mm Hg
• Acidose • Alcalose respiratória
(metabólica e/ou respiratória) (hiperventilação alveolar)

HCO3 < 22 mEq/L


pH > 7,45
• Alcalose • Acidose metabólica
(metabólica e/ou respiratória)
HCO3 > 26 mEq/L
paCO2 > 44 mm Hg • Alcalose metabólica
• Acidose respiratória
(hipoventilação alveolar)
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Em resumo - Respiratório
Assim:

paCO2 > 44 com o pH < 7,35


representa acidose respiratória
paCO2 < 36 com o pH > 7,45
representa alcalose respiratória

Numa situação primária respiratória o pH e o paCO2


movimentam-se em direcções opostas.
– Para cada desvio em 10 mm Hg no paCO2, o pH
modifica-se em direcção oposta em 0,08 unidades.
12/30/02 ABG Interpretation 6
Em resumo - Metabólico
e:
HCO3 < 22 com o pH < 7,35
representa acidose metabólica
HCO3 > 26 com o pH > 7,45
representa a alcalose metabólica
Numa situação primária metabólica, o pH e o HCO3
modificam-se na mesma direcção (assim como o
paCO2)
12/30/02 ABG Interpretation 7
Compensação
• O organismo tende a voltar ao estado ácido/base
normal (i.e. pH próximo de 7,4)

Situação Primária Compensação


acidose respiratória alcalose metabólica
alcalose respiratória acidose metabólica
acidose metabólica alcalose respiratória
alcalose metabólica acidose respiratória
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Compensação previsível
Acidose Respiratória
• ..Aguda – o pH diminui 0,08 unidades por cada
aumento de 10 mm Hg na paCO2; HCO3 ↑0,1-1
mEq/L por ↑10 mm Hg paCO2

• ..Crónica – o pH diminui 0,03 unidades por cada


aumento de 10 mm Hg na paCO2; HCO3 ↑1,1-3,5
mEq/L por ↑10 mm Hg paCO2
12/30/02 ABG Interpretation 9
Compensação previsível
Alcalose Respiratória
• ..Aguda – o pH aumenta 0,08 unidades por cada
diminuição de 10 mm Hg na paCO2; HCO3 ↓0-2
mEq/L por ↓10 mm Hg paCO2

• ..Crónica - o pH aumenta 0,17 unidades por cada


diminuição de 10 mm Hg na paCO2; HCO3 ↓2,1-5
mEq/L por ↓10 mm Hg paCO2
12/30/02 ABG Interpretation 10
Compensação previsível
Acidose Metabólica
• paCO2 = 1,5(HCO3) + 8 (±2)
• paCO2 ↓1-1,5 por ↓1 mEq/L HCO3

Alcalose Metabólica
• paCO2 = 0,7(HCO3) + 20 (±1,5)
• paCO2 ↑0,5-1,0 por ↑1 mEq/L HCO3
12/30/02 ABG Interpretation 11
Classificação do desequilíbrio primário
ácido-base e sua compensação
• Situações do estado ácido-base respiratório e/ou
metabólico identificáveis:
– Acidose Respiratória (hipoventilação alveolar) -
aguda, crónica
– Alcalose Respiratória (hiperventilação alveolar) -
aguda, crónica
– Acidose Metabólica – não compensada,
compensada
– Alcalose Metabólica – não compensada,
parcialmente compensada

12/30/02 ABG Interpretation 12


Acidose Respiratória Aguda
• paCO2 está elevada e o pH é acidótico
• A diminuição no pH deve-se
exclusivamente ao aumento da paCO2
• O Bicarbonato sérico e o excesso de base
estão com valores normais porque o rim
ainda não teve tempo para desencadear o
mecanismo de compensação
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Acidose Respiratória Aguda
• Causas
– Fisiopatologia Respiratória – obstrução das vias
aéreas, pneumonia grave, trauma torácico /
pneumotórax
– Intoxicação medicamentosa aguda (narcóticos,
sedativos)
– Bloqueio neuromuscular residual
– Lesão do SNC (traumatismo craniano)

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Acidose Respiratória Crónica
• paCO2 está aumentado com o pH dentro de
valores normais
• O mecanismo de compensação renal
aumenta a excreção de H+ em menos de 24
horas e pode corrigir a acidose resultante da
retenção crónica de CO2 dentro de
determinados limites

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Acidose Respiratória Crónica
• Causas
– Doença pulmonar crónica
• (ex. Displasia broncopulmonar, Doença Pulmonar
Obstrutiva Crónica)
– Doença Neuromuscular
– Obesidade Extrema
– Deformidade da parede torácica

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Alcalose Respiratória Aguda
• A paCO2 é baixa e o pH é alcalótico
• O aumento do pH deve-se exclusivamente à
diminuição da paCO2
• O Bicarbonato e o excesso de base estão
dentro de valores normais porque o rim
ainda não teve tempo para desencadear o
mecanismo de compensação
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Alcalose Respiratória
• Causas
– Dor – Drogas
– Ansiedade – Sépsis
– Hipoxemia – Febre
– Doença pulmonar – Tirotoxicose
restritiva – Gravidez
– Insuficiência cardíaca – Ventilação mecânica
congestiva grave excessiva
– Embolia Pulmonar – Falência Hepática

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Acidose Metabólica não compensada
• paCO2 normal, HCO3 baixo e o pH inferior
a 7,30
• Resulta duma produção aumentada de
valências ácidas e/ou falência na sua
eliminação
• O sistema respiratório não está a compensar
aumentando a ventilação alveolar
(hiperventilação)
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Acidose Metabólica Compensada
• paCO2 inferior a 30, HCO3 baixo e pH de
7,3-7,4
• Os doentes com acidose metabólica crónica
não conseguem hiperventilar o suficiente
para diminuir a paCO2 até à compensação
completa (pH de 7,4)

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Acidose Metabólica
(com Anion Gap aumentado)
• Causas
– Cetoacidose
• diabética, alcoólica, jejum prolongado
– Acidose láctica
• hipóxia, choque, sepsis, convulsões
– Intoxicação medicamentosa
• salicilatos, metanol, etileno-glicol, etanol, álcool
isopropílico, paraldeído, tolueno
– Insuficiência Renal
• urémia
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Acidose Metabólica
(com Anion Gap Normal)
• Causas
– Acidose tubular renal – Diarreia
– Pós alcalose – Inibidores da anidrase
respiratória carbónica
– Hipoaldosteronismo – Administração de
ácidos (HCl, NH4Cl,
– Diuréticos poupadores
de potássio arginina HCl)
– Perdas pancreáticas de – Sulfamylon®
bicarbonato – Colestiramina
– Diversão Ureteral

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Eficiência da Oxigenação
• Avaliação complementar da gasimetria arterial
implica a análise do estado da oxigenação
sanguínea
• Hipoxemia – diminuição do oxigénio sanguíneo -
paO2 inferior a 60 mm Hg e saturação inferior a
90%
• Hipóxia – oxigénio disponível insuficiente para as
necessidades metabólicas dos tecidos

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Mecanismos da Hipoxemia
• Pressão parcial do oxigénio inspirado
insuficiente
• Hipoventilação
• Shunt Direito - Esquerdo
• Desequilíbrio Ventilação-perfusão
• Equilíbrio de difusão (alvéolo-capilar)
incompleto
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Avaliação das trocas gasosas
• Diferença da tensão Alveolar-arterial de O2
– Gradiente A-a
– PAO2-PaO2
– PAO2 = FIO2(PA% - PH2O§) - PaCO2/RQ*
• Quociente artério-Alveolar de O2
– PaO2/PAO2
• Razão arterial-O2 inspirado
– PaO2/FIO2
– P/F ratio
% Pressão atmosférica em mm Hg ± 760 § Pressão parcial do vapor de água ± 47 mm Hg
* RQ= quociente respiratório = 0,8
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Avaliação das trocas gasosas
Gasim. Arterial Gradiente A-a
PaO2 PaCO2 21% 100%
FIO2 baixo ↓ ↓ N* N
Hipoventilação alveolar ↓ ↑ N N

Perturbação das trocas gasosas


Desequilíbrio Regional da V/Q ↓ ↑/N/↓ ↑ N/↑
Shunt Intrapulmonar Dto - Esq ↓ N/↓ ↑ ↑
Perturbação da difusão ↓ N/↓ ↑ N

Shunt anatómico Dto - Esq


(intrapulmonar or intracardíaco) ↓ N/↓ ↑ ↑
* N = normal

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Sumário
• 1 - O doente apresenta acidose ou alcalose?
– Avaliar o pH

• 2 - Qual é a alteração primária (metabólica ou


respiratória)
– Avaliar a pCO2
– Se a pCO2 está desviada em sentido oposto ao da
alteração do pH, então o problema base é do foro
respiratório…
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Sumário
• 3 – Existe algum grau de compensação por
parte do doente – verifique?
– Num problema com origem respiratória,
confirme que a alteração do pH é totalmente
devida à variação do pCO2
• Se sim, não há compensação metabólica
• Se não, então haverá compensação parcial ou uma
outra alteração metabólica concomitante

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Sumário
– Num problema metabólico, calcular o pCO2
previsível

• Se pCO2 medido está próximo do calculado então


há adequada compensação respiratória
• Se superior à calculada existe uma acidose
respiratória concomitante
• Se inferior à estimada estamos em presença de uma
alcalose respiratória concomitante

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Sumário
• Não esquecer de avaliar a qualidade da
oxigenação (…e de observar o doente…)
– a “normalidade” da gasimetria pode estar
dependente de um grande aumento do trabalho
respiratório
– Acidose metabólica em simultâneo com acidose
respiratória é um dado preocupante

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Caso 1
O Billy tomou alguns comprimidos com
barbitúricos apresentando depressão do estado de
consciência e da respiração. Observa-o no SU 3
horas após a ingestão com uma FR de 4 c/mn.
É efectuada uma gasimetria arterial (…após
avaliação e estabilização clínica..) que revela um
pH = 7,16, pCO2 = 70 e HCO3 = 22

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Caso 1

Qual a alteração do equilíbrio ácido/base


encontrada?
2. Acidose metabólica não compensada
3. Acidose respiratória compensada
4. Acidose respiratória não compensada
5. Alcalose metabólica compensada

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Caso 1
Acidose respiratória não compensada

• Não decorreu tempo suficiente para haver


compensação metabólica.
• Na sequência da ingestão dos barbitúricos
esta criança diminuiu a frequência
respiratória com hipoventilação e subida do
pCO2 sanguíneo que conduziu à acidose.

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Caso 2
A Suzie apresenta vómitos e diarreia há 3 dias.
Segundo a sua mãe “..não tolera nada e a diarreia não
dá sinais de acalmar..”. Aparentemente apenas teve
uma fralda com urina nas últimas 24 horas. Está
letárgica, com a pele fria e um tempo de
repreenchimento capilar muito aumentado.
A sua gasimetria arterial tem os seguintes valores:
pH=7,34, pCO2=26, HCO3=12

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Caso 2
Qual a alteração do equilíbrio ácido/base
encontrada?
2. Acidose metabólica não compensada
3. Alcalose respiratória compensada
4. Acidose respiratória não compensada
5. Acidose metabólica compensada

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Caso 2
Acidose metabólica compensada

•A prolongada perda de líquidos associada à diarreia


causou uma acidose metabólica, provavelmente por
dois mecanismos.
– Primeiro pela produção de ácido láctico associada
à hipovolemia e hipoperfusão.
– Segundo, provavelmente houve perda importante
de bicarbonato com as fezes. O organismo
compensou isto eliminando aceleradamente o
CO2, aumentando a ventilação.
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Caso 3
Está a avaliar uma jovem com 15 anos no SU
trazida da escola ao SU por queixas de dores
abdominais e vómitos.
A história fornecida revela uma perda de peso de 5
kg nos últimos 2 meses e poliúria com 15 dias de
evolução: É negada qualquer outra queixa bem
como actividade sexual ou consumo de drogas
ilícitas.
Ao exame objectivo está alerta, orientada e
apirética. FC 115, FR 26 regular, TA 114/75,
saturação 95% em ar ambiente.

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Caso 3
Observação sem dados relevantes excepto ligeira
dor à palpação abdominal a nível epigástrico e
tempo de repreenchimento capilar superior a 3
segundos.
A avaliação laboratorial pedida incluiu gasimetria
com o seguinte resultado. pH = 7,21 pCO2= 24 pO2
= 45 HCO3 = 10 BE = -10 Saturação de 72%

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Case 3
Qual a interpretação da gasimetria?
2. Acidose respiratória não compensada com
hipoxemia grave
3. Alcalose metabólica não compensada
4. Acidose metabólica associada a acidose
respiratória com hipoxemia grave
5. Acidose metabólica com compensação
respiratória

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Caso 3
Acidose metabólica com compensação respiratória
– Esta doente apresentava um quadro de diabetes
mellitus com cetoacidose inaugural.
– A oximetria de pulso bem como o exame objectivo
não revelavam nenhum problema respiratório para
além da taquipneia que traduzia o mecanismo
compensador da acidose metabólica.
– A gasimetria fora obtida a partir da punção venosa
para a avaliação laboratorial solicitada no SU.
12/30/02 ABG Interpretation 40
References
• The ICU Book – Paul L. Marino, 1991,
Algorithms for acid-base interpretations, p415-426
• Textbook of Pediatric Intensive Care 3rd Edition –
edited by Mark C. Rogers, 1996, Respiratory
Monitoring: Interpretation of clinical blood gas
values, p355-361
• Pediatric Critical Care – Bradley Fuhrman and
Jerry Zimmerman, 1992, Acid-Base Balance and
Disorders, p689-696
• Critical Care Physiology – Robert Bartlett, 1996,
Acid-Base physiology p165-173.
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