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AGRUPAMENTO VERTICAL DE ESCOLAS OESTE DA COLINA

ESCOLA EB23 FREI CAETANO BRANDÃO – ANO LECTIVO 2009/2010


EFA ESCOLAR B3 – LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO
A IMPLANTAÇÃO DA REPÚBLICA E AS SUAS PERSONALIDADES

NOME _____________________________________ DATA __/__/__

CESÁRIO VERDE (POETA: 1855 – 1886)

NUM BAIRRO MODERNO

Dez horas da manhã; os transparentes As azeitonas, que nos dão o azeite,


Matizam uma casa apalaçada; Negras e unidas, entre verdes folhos,
Pelos jardins estancam-se as nascentes, São tranças dum cabelo que se ajeite;
E fere a vista, com brancuras quentes, E os nabos - ossos nus, da cor do leite,
A larga macadamizada. E os cachos de uvas - os rosários de olhos.

Rez-de-chaussé repousam sossegados, Há colos, ombros, bocas, um semblante


Abriram-se, nalguns, as persianas, Nas posições de certos frutos. E entre
E dum ou doutro, em quartos estucados, As hortaliças, túmido, fragrante,
Ou entre a rama dos papéis pintados, Como dalguém que tudo aquilo jante,
Reluzem, num almoço as porcelanas. Surge um melão, que me lembrou um ventre.

Como é saudável ter o seu conchego, E, como um feto, enfim, que se dilate,
E a sua vida fácil! Eu descia, Vi nos legumes carnes tentadoras,
Sem muita pressa, para o meu emprego, Sangue na ginja vívida, escarlate,
Aonde agora quase sempre chego Bons corações pulsando no tomate
Com as tonturas duma apoplexia. E dedos hirtos, rubros, nas cenouras.

E rota, pequenina, azafamada, O Sol dourava o céu. E a regateira,


Notei de costas uma rapariga, Como vendera a sua fresca alface
Que no xadrez marmóreo duma escada, E dera o ramo de hortelã que cheira,
Como um retalho de horta aglomerada, Voltando-se, gritou-me prazenteira:
Pousara, ajoelhando, a sua giga. " Não passa mais ninguém! ... Se me
ajudasse?! ..."

Ficha de Trabalho Nº12 – Prof. Teresa Paula Alves


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LC3B – Interpretar textos de carácter informativo-reflexivo, argumentativo e literário.
E eu, apesar do sol, examinei-a;
Pôs-se de pé; ressoam-lhe os tamancos; Eu acerquei-me dela, sem desprezo;
E abre-se-lhe o algodão azul da meia, E, pelas duas asas a quebrar,
Se ela se curva, esguedelhada, feia Nós levantámos todo aquele peso
E pendurando os seus bracinhos brancos. Que ao chão de pedra resistia preso,
Com um enorme esforço muscular.
Do patamar responde-lhe um criado: (...)
"Se te convém, despacha; não converses.
Eu não dou mais." E muito descansado, E pitoresca e audaz, na sua chita,
Atira um cobre ignóbil oxidado, O peito erguido, os pulsos nas ilhargas,
Que vem bater nas faces duns alperces. Duma desgraça alegre que me incita,
Ela apregoa, magra, enfezadita,
Subitamente - que visão de artista! - As suas couves repolhudas, largas.
Se eu transformasse os simples vegetais,
À luz do Sol, o intenso colorista; E, como as grossas pernas dum gigante,
Num ser humano que se mova e exista Sem tronco, mas atléticas, inteiras
Cheio de belas proporções carnais?! Carregam sobre a pobre caminhante,
Sobre a verdura rústica, abundante,
Bóiam aromas, fumos de cozinha; Duas frugais abóboras carneiras.
Com o cabaz às costas, e vergando,
Sobem padeiros, claros de farinha;
E às portas, uma ou outra campainha
Toca, frenética, de vez em quando.

E eu recompunha, por anatomia,


Um novo corpo orgânico, aos bocados.
Achava os tons e as formas. Descobria
Uma cabeça numa melancia,
E nuns repolhos seios injectados.

Ficha de Trabalho Nº12 – Prof. Teresa Paula Alves


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LC3B – Interpretar textos de carácter informativo-reflexivo, argumentativo e literário.

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