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ies Eo joa ‘s3 SOIVSNA oti, maa «Fis: - ‘cSt te, Sa [osu : 1 En ele Tse Sent 2 SUMARIO. Introdugdo: Eliot ensasta, 9 ‘Tradigao ¢ talento individual, 37 ‘A fungi da rkica, 49 Dante, 63 0s poetas metafisices, 113 ‘Andrew Marvell, 127 John Dryden, 145 William Blake, 161 Swinburne como poeta, 168 In memoriam, 175 ‘As Ponsées de Pascal, 189 Batidelaire, 207 ‘Arnold e Pater, 222 Notas, 238 Indice, 250 INTRODUGKO (22), Te cts and heman oer), Reunion by desiracton (94), What acai? (94), On oct G94, biton (94), Noes towards thedefiniion nfo te Poy and rane OB), Teron ‘etre (1986), Essays on poets and poets (S81), George Herter (962), Knowledge and eperence 'he phocehe °F FH. Brey (1968 To eric the rte 98, Rio, agosto de 1989 TRADIGAO E TALENTO INDIVIDUAL’ ‘0s textos ingless € aro falarmos de tradicdo, embo- ocasionalmenteuilizemos essa palavra para lamen- tar a sua ausincia. Ndo sabemos aos refeci A “tradiglo”” ov a “uma tradigio"; quando muito, empregamos oadje- tivo para dizer que a poesia de fulano & “tradicional” ou mesmo “muito tradicional". A palaveas6ocorretalverra- ramente,exceto numa frase de censur. Ao contrrio, ela ‘ vagamente aprobat6ria se envolver, como no caso de ut trabalho reconhecido, alguma deletota reconstrugdo ar- ‘queol6gca.E dif tomarmos a palavraagraddvel os ou- vidos ingleses sem essa cOmoda referencia & ranquilizado- ra citncia da arqueologia, ‘Com toda ceteza, a palavra nko costuma aparece em nosasapreciagdes de escritoresvivos ou mortes. Cada fo, cada raga, tem ndo apenas sua tendtociacradora, mas {também sua tendéncia critica de pensar; e etd também mals elas falha eimitagdes de seus habitosefticas do que {as de seu géniocriador. Conhecemos, ou supomes cone: cer, a partir da volumosa massa de textos critcos que su em lingua francesa, © método ou hébito critic dos rancess;concluimos apenas (Somos, portanto, pessoas n- conscintes) que 0§ francess slo ‘mais eiticos™ do que 16s; e As vezes até nos envaidecemos desse fato, como se ” TRADICAO E (0s franceses fossem menos esponneos.Talvezo seam; mas abe lembrar que a critea€ to inevitével quanto 0 ato de respirar, quendoestariamos em piores condigbes pelo fa- ‘ode ricularmos o que Se engendra em nossas mentes quan do Temos um livro ¢ ele nos emociona, por erticarmos as nossas proprias mentes em sua taefa de critcar. Um dos fatos capazes de vr & luz nesse processo é nossa tendéncia ‘em insite, quando elogiemos um poeta, sobre os aspectos de sua obra nos qua ele menos se assemela a qualquer ‘outro. Em tais aspects ou trechos de sua obra pretende- ‘mos encontrar 0 que ¢ individual, 0 que é a esséncla pecu- liar do homem. Salientamos com satisasko a difereaga que ‘0 separa poeticamente de seus antecessores, em especial 05 ‘mais préximos; empeahamo-nos em descobir lgo que pos- sa ser isolado pare assim nos deleitar. Ao contraro, se nos aproximarmos de um poeta sem esse preconceito, podere ‘mos amide descobri que ndo apenas o melhor mas tam- ‘bém as passagens mais individuals de sua obra podem ser aquelas em que os postas mortos, seus ancesras,revelam ‘mais vgorosamente sua imortaidade. Endo me reir &épo- ca influencavel da adolescéncia, mas ao periodo de lena smaturidade. ‘Todavia, s¢ ania forma de tradigdo, de legado a ge ago segunte,consisteem seguir os caminhos da gerapdo imediatamente anterior & nossa gragas a uma timida ecega aderéncia a seus ios, a tradi" deve ser positivamente ‘desetimulada, 14 vimes malas correntes semelbantes se per deem nas areas; e @ novidade é melhor do que a repeti- Ho. A tradicdo implica um significado muito mais ampo. Ela nfo pode ser herdada, e se alguém a desea, deve conquistéla através de um grande esforco. Ela envolv, em primeiro lugar, o sentido histrico, que podemos conside- rar quaseindispensével a alguém que pretenda continuar Fy poeta depois dos vintee cinco anos: o sentido hist implica a percepso, no apenas da caducidade do passa- do, mas de sua presenca; 0 sentido histrico leva um ho- mem a escever no somente com a propria geracdo a que pertence em seus 0360s, mas com um sentimento de que to: da. itertura européia desde Homero nea incida, to da a literatura de seu proprio pais tem uma existéncia si- ‘ulténea econsttuem uma ordem simultnea, Esse seni do histérico, que 9 sentido tanto do atemporal quanto do temporal edo atemporal edo temporal reunidos, €quetomna lum esrtor tradicional. E €isso que, a0 mesmo tempo, faz com quem escrito se torne mais agudamente consciente de seu lugar no tempo, de sua propria contemporaneidade, ‘Nenhum poeta, nenhum artista, tem sua significapdo completa sozinho. Seu significado ea apreciagdo que dele fazemos constituem a apreciago de sua telagao com os poe- {ase os artistas mortos. Nao se pode estimd-toem si €pre- tito stud, para contraste e comparasdo, entre of mor- tos, Entendo isso como um principio de esttica, nfo ape- nas histrica, mas no sentido criti. E necessrio que ele Sejaharménico,coeso, endo unilateral; © que ocorre quando ‘uma nova obra de arte aparece 6, as vezes, 0 que ocorre simultaneamente com rlagao a todas as obras de arte que ‘precedem. Os monumentosexstentes formam uma ordem ideal entte si, e esta 6 se modifica pelo aparecimento de lum nova (ealmente nova) obra entre eles, A ordem ens: {enteé completa antes que a nova obra apareca: para que a cordem perssta apés aintrodusio da novidade, a tovalida de da ordem existente deve se, se jamais 0 foi sequer eve ‘mente, alterada: ¢desse modo a elas, proporgdes, va ‘de cada obra de arte rumo ¢0 todos reajustados: ese a harmonia entre 0 antigo eo novo. Quem quer ‘due hajaaceto essa ideia de ordem, da forma da literatura » TRADIGAO E «uropéia ou ingles, no julgardabsurdo que oparsado deva ser modificado pelo presente tanto quanto o presente este. ia orientado pelo passado. Eo poeta que disso esta ciente ‘era consetacia de grandes dificuldadese responsabilida. aes [Num sentido peculiar, ter ele também a consciéncia de que deve inevtavelmente ser julgado pelos padres do passado. Eu disse julgado, no amputado, por eles jules. do nao para ser tio bom quanto, ou pior ou melhor do que (© morto; ¢ decerto ndo julgado pelos eanones de eriicos ‘mortos. Tratase de um julgamento, uma comparagdo, na ‘qual duas cosas sio medidas por cada uma delas, Estar ape- ‘as em harmonia poderiasigniticar que a nova obra nao estivesse de modo algum realmente em harmonise no seria nova e, por isso, ndo seria uma obra de arte, Endo ‘quetemos em absolute dizer que o novo é mais valioso por ‘que se ajusta a essa harmonia; mas esse ajuste € um teste de seu valor — um teste, éverdade, que s6 pode ser lenta ‘ceautelosamenteaplicado, pois enhum de és ¢ ju inta- lel em matéria do que esté ou no em conformidade. Di- ‘ems: isso parece estar de acordo, ¢&talver individual, (u parece individual, e pode estar de acordo; mas prov. velmente nos ser dificil se se trata de uma coisa, eno de Procedamos a una exposigdo mals intligivel sobre @ felagdo entre o poeta eo passado: ele no deve tomar 0 pas- sado por uma massa, um mingau indscriminado, nem con ‘ebG-o inteiramente a partir de uma ou duas admiragoes partculaes, nem organié-o totalmente com base num pe ‘iodo de sua preferEncia. O primeiro camino ¢ inadmissi vel; 0 segundo, uma importante experiéncia da juventude; 0 tercero, uma prazerosae altamente desejtvel comple: mentagdo. O poeta deve estar extremamente cénscio da principal correne, que de modo algum fui invariavelmen- te através das mais alta reputagdes. Deve estar absoluta- ‘mente atento para o dbviofato de que em arte nunca se per- {eigoa, mas de que o material da arte jamais ¢inteiramente ‘© mesmo. Deve estar cOnscio de que a mentalidade euro- péia — a mentaidade de nosso pais —, uma mentalidade ‘que ele aprende com o tempo ser muito mals importante do que sua propria mente particular, ¢ uma mentalidade que muda, ¢ de que essa mudanya ¢ um desenvolvimento que nada abandona en route, que ndo aposenta nem Shakes peare nem Homero, nem os desenhos rupestes do artista ‘magdaleniano. E que esse desenvolvimento — talvez um re- finamento, decerio uma complexidade — no constitu, do ponto de vista do artista, nenhum aperfeipoamento, Tal: vez nem mesmo um aperfeigoamento do ingulo do psicé- logo ou no émbito que imaginamos; talvez apenas numa fase tarda, devido a complicapdes em economia e maqui- nirio. Mas a diferenga entre o presente eo passado € que 0 presente consent constitu de certo modo uma conscién cla do passado, num sentido e numa extensao que a cons- cléncia que o passado tem de si mesmo nao pode revel. ‘Alguém dss: “Os escrtores mortos estdodistantes de 1s porque conhecemos muito mais do que eles conhece- ram". Exatament, ¢ slo els aquilo que conhecemo. Estou cbnscio de uma objecdo habitual aquilo que ci. amente faz parte de meu programa para o métier da poe- fia. A objegdo € que a doutrinarequer uma ridicua soma de erudigdo (pedanteria),alegasdo que pode ser rejetada se recorrermos as vidas de poetas em qualquer pantedo. Is- soequivalera a afirmar que uma grande cultura debilita ou pervert a sensibildade podtica. Enquanto, porém, persis: {irmos em acrditar que um poeta deve saber tanto quanto © enijam os limites de sua neceséria reeetividade ou ne- a TRADICAO E cxssria indoléncia,ndo sed desejdvelrestringr 0 conbert- ‘mento a tudo quanto posta ser posto sob forma provitosa de pesquisa, recepedes, ou Sob o8 ainda mais pretensiosos ‘modelos publicitérios. Shakespeare adquiiy mals nogdesbé- sleas de histria nos textos de Plutarco do que a maioria dos homens poderia ter adquirido em todo o Museu Brité- nico. O fundamental consist em insistir que o poeta deva desenvolver ou buscar a conscizncia do passadoe que pos scontinuar a desenvolv@a a longo de toda a sua carrira. ‘© que ocorre éuma continua entrega de si mesmo, t ‘como se € num dado momento, a algo que se revela mais valioso, A evolupio de um artista € um continuo auto- sacrifcio, uma continua extinglo da personalidade, Resta aqui dfinr esse processo de despersonalizasio «sua relagdo com o sentido da tadicao. E nessa despero- nalizago que @ arte pode se vista como préxima ds cond ‘ho de citacia. Convido-o, portanto, a considera, através de uma sugestiva analogia, a reagdo que se desencadea quan- do uma partcula de patna finamenteincorporada €intro-

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