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Queda

Gustavo Martins
Lá estava ele.
O responsável por tudo que me ocorreu. Aquele que chamam de “imortal” e “invencível”. O
homem chamado Roth Rovena.
Por quanto tempo esperei que se distraísse por um instante, que baixasse a guarda tida como
impenetrável.
A hora finalmente chegara.
A espada banhada pelo sangue de mais de mil homens repousava sobre uma pedra. O escudo
que nenhuma lâmina jamais perfurara não estava em suas mãos. Não vestia a armadura escarlate
que o tornou intocável.
Despido de seus equipamentos lendários ele era como qualquer homem. Sua altivez
incomparável e a aura tão densa quanto as muralhas de um castelo não o acompanhavam. Tudo
que havia frente a mim era um homem a banhar-se.
Um homem culpado pela morte de todos que eu amei. Um homem que por vingança pela perda
de quem amava trouxe o mesmo sofrimento a centenas de outros. Ele deveria pagar.
 E foi para isso que eu me preparei por tanto tempo. Eu faria aquilo que nenhum homem antes
conseguira. Eu seria a justiça divina a cair sobre um demônio.
Retesei meu arco e peguei a flecha banhada no veneno do basilisco.
Ele estava em campo aberto e eu contava com a proteção das árvores. Não havia vento ou
qualquer outra coisa que pudesse desviar o curso da seta.
Iria acertá-lo nas costas e deixaria seu corpo ser consumido pela peçonha.
A flecha entre os meus dedos implorava para ser disparada. Tremia, puxava, assoviava, ansiava
pela vida daquele homem.
Mas ainda não era hora.
Ele ainda estava dentro da água. Não podia disparar agora, pois mesmo que acertasse o veneno
seria lavado.
Os segundos pareciam mais longos do que jamais foram. Meus músculos começavam a sentir a
pressão de flexionar o arco. A dor aguda começava a me desconcentrar.
Deveria manter o foco. Aquilo não era nada comparado ao que muitos outros sofreram.
Finalmente ele se levantou.
Não havia mais nenhum impedimento. Era minha chance.
Soltei a flecha que cruzou os ares sibilando até encontrar seu alvo. 
Foi perfeito.
A ponta da seta atravessou a carne do homem e um jorro de sangue tingiu a água de vermelho.
Um grito de dor ecoou por toda a floresta até que ele afundou na água.
Meu trabalho estava feito.
Permaneci sentada de costas para o lago por longos minutos. A justiça fora feita, mas mesmo
assim algo me incomodava. Mesmo que meu marido e filho finalmente pudessem descansar em
paz, ainda sentia que algo não estava no lugar. Talvez devesse checar o corpo.
Subitamente senti algo me agarrar por trás.
Fui jogada no chão violentamente. Minha boca avermelhou-se com o sangue que saia do meus
pulmões feridos. Abri os olhos e vi...
Ele ainda vivia.
Seus olhos cheios de fúria pareciam os de uma fera humilhada prestes a se vingar.
Debati-me enquanto ele arrancava minhas roupas. Gritei ao ser tocada por aquelas mãos
imundas. Chorei ao ser invadida várias e várias vezes até não ter mais energias para resistir.
Ao final, derrotada e humilhada, jazia sem vida na terra.

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