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Folha do Sul Gaúcho: a sua opinião sob um novo ponto de vista

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Alto Camaquã: a famosa preciosidade da região
04/11/2010
Fernanda Couto Rostan
Não é rua, mas é nosso. Não se mandou ladrilhar com pedrinhas de brilhante, porém,
através de um trabalho que valoriza os próprios potenciais, adentrou de forma triunfante
o rol das Montanhas Famosas. É o Alto Camaquã, território que vai de Lavras do Sul a
Piratini e tem este nome em referência à localidade a qual compreende: as margens do
rio Camaquã. Em outubro, um importante passo foi dado do outro lado do mundo: na
China. Lá, o território foi elevado ao grupo das Montanhas Famosas do Mundo, título
exclusivo no RS e que apenas mais quatro locais no Brasil receberam.

O início foi em 2005, quando os pesquisadores da Embrapa Pecuária Sul Marcos Borba
e José Pedro Trindade se dedicaram a estudar a região e buscar formas de unir
desenvolvimento e preservação, numa forma que envolvesse os moradores. Borba
explica como foi esta fase:
- A idéia fundamental do Alto Camaquã reside na valorização de ativos próprios de
regiões que se mantiveram à margem dos processos de desenvolvimento levados a cabo
ao longo dos últimos 70 anos. Isso, pois alguns lugares, em função de uma serie de
condições ambientais (relevo dobrado, solos rasos, afloramento de rochas, vegetação
com forte componente arbóreo), culturais (associada a criação de gado) e econômicas
(baixo nível de capitalização), não reuniram as condições necessárias para a aplicação
da modernização agrária.

Esta falta de condições transformou-se na relíquia da região: por não ter se


modernizado, há uma série de características que proporciona a construção de bases de
um desenvolvimento diferenciado, unido à conservação dos recursos naturais.

Em 2007, os pesquisadores finalizaram o projeto "Ecologização da pecuária familiar


como estratégia de desenvolvimento territorial do Alto Camaquã". A partir daí, buscou-
se contato com os moradores da região, além dos poderes executivos, legislativos e
conselhos municipais, representações de classe, associações e empreendedores. Foi
criado o Fórum do Alto Camaquã, que teve sua primeira edição em 2008, no qual foram
decididos quais os temas a serem trabalhados: a pecuária familiar, o turismo, a marca
territorial, a educação, novas estratégias produtivas e o fortalecimento das organizações.

Hoje, cerca de 60 famílias, nos municípios de Lavras do Sul, Bagé, Caçapava do Sul,
Santana da Boa Vista, Candiota, Pinheiro Machado e Piratini participam do projeto Alto
Camaquã. A cada 28 dias acontecem reuniões nas Unidades de Pesquisa Participativa,
com trocas de experiências entre pesquisadores, famílias e demais integrantes da
Associação para o Desenvolvimento Sustentável do Alto Camaquã (ADAC). Neste ano
ainda aconteceu a primeira exposição dos produtos oriundos do território, como
artesanato em lã, mel, móveis coloniais, entre outros.
- Os resultados podem ser computados como modificações dos sistema de produção
onde os pecuaristas começam a usar de forma consciente os recursos forrageiros
naturais, modificando a capacidade de carga dos campos e melhorando a eficiência
produtiva dos rebanhos. Também deve-se considerar o avanço em termos de
organização, tanto social (fortalecimento da ação coletiva) quanto produtiva, seja da
identificação dos animais, do registro de dados, do ajuste de épocas de reprodução até
das estratégias de comercialização, uso da marca, novos mercados, entre outros, conta o
pesquisador.

O caminho para a fama

A Associação Mundial de Montanhas Famosas (WFMA) foi criada em 2009 e tem


como sede dos encontros anuais a cidade de Jiujiang, na China. Para pertencer à tal
associação, o quesito principal é ser um lugar montanhoso e ter a preservação ambiental
como princípio básico. Os montes Lushan,na China; Kilimanjaro, na Tanzânia, as
colinas Chocolate, nas Filipinas, assim como parques naturais da Alemanha, Áustria e
Romênia fazem parte do grupo.
A professora Mônica Amorim, da Universidade Federal do Ceará, que também é
consultora do Banco Mundial, conheceu o território do Alto Camaquã e convidou para
candidatar-se a membro da WFMA. Hoje, outros quatro locais brasileiros fazem parte,
todos no Ceará: os monólitos do Quixadá, o Parque Nacional do Ubajara e a região
serrana de Guaramiranga e o Geoparque Araripe, o primeiro a entrar.

O evento chinês foi muito formal, conforme Borba.


- Um evento de grande formalidade, cercado de um grande aparato de segurança. Na
verdade as novas candidaturas brasileiras já haviam sido bem negociadas pela secretaria
geral da WFMA para a América do Sul, Monica Amorim. Mesmo assim as perguntas
giraram em torno das estratégias de conservação ambiental, como é feita, quais são as
bases científicas, quem está envolvido e a estrutura turística do território.

O diploma adquirido para o Alto Camaquã tem validade até 2011, quando acontece um
novo encontro da WFMA, desta vez nos Estados Unidos. Para ser renovado, algumas
mudanças são necessárias.
- São mudanças de postura. E podem ser divididas em mudanças dos municípios
membros e da Associação para o Desenvolvimento Sustentável do Alto Camaquã –
ADAC. Os municípios precisam definir-se como membro do Alto Camaquã; precisam
ter posicionamentos claros sobre a conservação ambiental e o desenvolvimento
territorial endógeno; necessitam valorizar as práticas produtiva conservacionistas e
processos de transformação industrial dos produtos diferenciados (como política pública
local); precisam fortalecer a organização social; organizar o turismo inclusive com a
busca de recursos para investimento, enumera Borba.

Além disso, também é necessário participar ativamente da promoção da WFMA. Já a


ADAC tem que promover a organização da rede produtores e empreendedores do
território; viabilizar programas de capacitação de atores sociais para o desenvolvimento
endógeno; promover a marca Alto Camaquã; fortalecer a articulação intrarregional e
com entidades externas; viabilizar o planejamento estratégico do turismo no âmbito
regional, o empreendedorismo e a qualificação dos produtos e serviços; organizar
eventos regionais e ampliar a captação de recursos.

A notoriedade da região é motivo de orgulho para os pesquisadores que se dedicaram ao


projeto.
- O Alto Camaquã passará a ser divulgada associada a lugares já famosos, como o Mote
Fuji, o Monte Kilimanjaro ou as Florestas e Parques Nacionais dos EUA. Saímos do
anonimato para a visibilidade mundial, sem escalas. A região passa a ter uma
oportunidade exclusiva para, aproveitando a distinção internacional, optar
definitivamente por uma estratégia de desenvolvimento alternativa que promova a
diferenciação de produtos, processos e serviços. Os potenciais existem, transformá-los
em valores depende exclusivamente da região, argumenta o Borba.

Vidas que mudaram


Fazer o turismo funcionar numa pequena cidade, como Lavras do Sul. Este é o desafio
de Fernanda Teixeira, turismóloga. O Alto Camaquã entrou na sua vida como uma
ferramenta de trabalho.
- Consigo trabalhar dentro e fora do município com profissionais que entendem a
linguagem do projeto e outros que dêem suporte ao que faço. O turismo se desenvolve
em região, a perspectiva muda, assim como o horizonte da cidade. Os participantes
entendem a importância da temática, salienta.
O apicultor Lisandro Silveira tem uma propriedade, na qual 7,5 quilômetros são
ocupadas pelo rio Camaquã. O projeto já rende resultados para ele.
- Procurava algo no sentido de buscar meios para atender uma demanda de público
diferenciado. Já fui a Brasília vender mel e depois mandei mais produtos pra lá, afirma.

O trabalho realizado junto às famílias


- Identificar potencialidades, deficiências, oportunidades e ameaças do local;
- Construir coletivamente novos conhecimentos apropriados ao local;
- Elaborar estratégias de uso sustentável dos recursos naturais locais;
- Exercitar o conceito de "sistemas intensivos em conhecimento";
- Monitorar indicadores ambientais (solo, fauna, vegetação,), social (sucessão familiar,
situação da terra, uso de mão de obra), e econômicos (contabilidade, custos de
produção);
- Fortalecer a identidade e a imagem da região/território;
- Construir indicadores e avaliar a sustentabilidade;
- Planejamento estratégico (estabelecer situação futura desejada);
- Promover a ação coletiva (cooperação em prol de objetivos comuns).

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