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Caius Brandão
caiusbrandão@globo.com
Introdução
Desde o início de 2011, o mundo vem sendo sacudido por um movimento social
que impressiona por sua força avassaladora, com conseqüências drásticas e, até certo
ponto, imprevisíveis. O poder de tal movimento se compara aos dos abalos sísmicos de
grande magnitude que, também no início do ano, devastaram a costa leste do Japão. O
que aqui nos parece ser semelhante à intensidade desse fenômeno natural é o poder das
idéias. Indiscutivelmente, a força propulsora no epicentro dos movimentos sociais que
hoje se alastram pelo mundo árabe é idéia de liberdade.
O ato de auto-imolação e a morte de um jovem vendedor na Tunísia, que teve
suas mercadorias confiscadas pela polícia local, desencadearam uma série de protestos
que culminou no fim do governo de 23 anos do ditador Zine El Abidine Ben Ali. O fim
do regime militar na Tunísia, por meio de uma revolta popular, gerou um efeito-dominó
de proporções inimagináveis por todo o mundo árabe. Em seguida ao levante na
Tunísia, foram necessários apenas 18 dias para que jovens egípcios conseguissem reunir
dezenas de milhares de pessoas em protestos pacíficos na Praça Tahrir, no Cairo, e
derrubar o governo ditatorial de Hosni Mubarak. Depois de mais de 30 anos no poder,
hoje ele se encontra preso e responde na justiça por crimes de corrupção e assassinato
de manifestantes. Além da onda de protestos pacíficos em diversos países do chamado
Mundo Árabe, tais como na Jordânia e Arábia Saudita, atualmente, insurgentes da Líbia,
Palestina, Iêmen, Síria e Bahrein enfrentam batalhas sangrentas por mudanças políticas,
sociais e econômicas em seus respectivos países. O cenário que impressiona o mundo
ocidental é de um povo de aproximadamente 180 milhões de pessoas de diferentes
nações, há décadas subjugadas por seus atuais governantes, mas que agora gritam
unissonamente por democracia – no mesmo idioma e a partir da mesma consciência de
liberdade. Saber-se livre é, no entanto, apenas o primeiro passo para a realização
concreta e objetiva da liberdade de um povo que deseja ser livre e soberano.
De acordo com o filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770 –
1831), ao construir uma representação de si, o espírito de um povo busca conhecer a sua
própria essência, que é a liberdade.
“O direito do ético nos povos é a consciência que o espírito de si mesmo
possui. Portanto, o que se realiza na história é a representação do espírito. A
consciência do povo depende do que o espírito de si mesmo sabe; e a última
consciência, a que tudo se reduz, é que o homem é livre.” (HEGEL, 1995, p.
56).
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A partir de agora, nos referimos a esta obra como o Segundo Discurso.
sociedade, ao mesmo tempo em que obedecem apenas a si mesmos. Em suas próprias
palavras:
Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens
de cada associado com toda a força comum, e pela qual cada um, unindo-se
a todos, só obedece contudo a si mesmo, permanecendo assim tão livre
quanto antes. (ROUSSEAU, 1979, p. 32)
Conclui-se daí que o governo legítimo não passa de um funcionário que executa
a vontade geral do corpo soberano. Para o genebrino, “a primeira e mais importante
máxima do governo legítimo ou popular, ou seja, daquele que tem por objeto o bem do
povo, é, pois, como já o disse, seguir em tudo a vontade geral.” (ROUSSEAU, 2006, p.
91)
Apesar da brevidade dos argumentos até aqui encadeados, acreditamos já
possuirmos elementos suficientes para analisarmos, à luz do pensamento de Rousseau, a
questão da ilegitimidade dos governos despóticos.
Antes mais nada, vejamos como o filósofo distingue o governo popular do
governo tirânico:
Seria então conveniente dividir ainda a economia pública em popular e
tirânica. A primeira é a de todo Estado no qual, entre o povo e os chefes,
reina uma unidade de interesses e de vontade; a outra existirá
necessariamente em qualquer lugar onde o governo e o povo tiverem
interesses diferentes e, consequentemente, vontades opostas. As máximas da
economia tirânica estão inscritas ao longo dos arquivos da história e nas
sátiras de Maquiavel. As outras só se encontram nos escritos dos filósofos
que ousam reclamar os direitos da humanidade. (ROUSSEAU, 2006, p. 91).
Para Rousseau, nenhum homem possui autoridade natural sobre outros homens.
Para ser legítimo, o direito de mando deve ser estabelecido exclusivamente por
convenção, e nunca pela força da violência. Com este argumento, Rousseau refuta o
“direito do mais forte” e conclui que “só se é obrigado a obedecer aos poderes
legítimos”. (ROUSSEAU, 1979, p. 26)
Visto que homem algum tem autoridade natural sobre seus semelhantes e que
a força não produz qualquer direito, só restam as convenções como base de
toda a autoridade legítima existente entre os homens. (ROUSSEAU, 1979, p.
26)
Conclusão
Referências bibliográficas: