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Goiânia, 24 de agosto de 2009 De: 31 de dezembro de 2006 a 6 de janeiro de 2007

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  .:: Editorial
ANÁLISE

  .:: Conexão
Ano Novo significa vida nova?
  .:: Ponto de Partida Desejar feliz Ano Novo é algo vazio se não tivermos feito nada para que o futuro seja melhor.
  .:: Poderes A melhor forma de desejar um feliz Ano Novo é fazer algo no presente para que isto se
  .:: Bastidores concretize no futuro
  .:: Reportagens
NILDO VIANA

  .:: Entrevistas Final de ano. No meio das festas de Natal e Ano


Novo surge a expectativa do recomeço e da
mudança. Cartomantes, astrólogos, entre outros,
  .:: Direto do Oriente Médio são consultados pelos meios de comunicação e
  .:: Ideias pela população para saber como será o ano que
  .:: Economia está chegando. As pessoas desejam feliz Ano
  .:: Dissonância Novo umas para as outras. Todo final de ano é
  .:: Cartas
marcado por essa expectativa de que o ano que
se iniciará será melhor. Mas de onde vem essa
  .:: Imprensa
expectativa e essas previsões? Qual é a base real
  .:: A Semana dessa expectativa? O que significa a passagem
  .:: Mundo de um ano para outro? Tais questões são
  .:: Opinião Jovem raramente colocadas, pois as pessoas dificilmente questionam o ar que respiram, e isto vale
para o “ar cultural”, isto é, o mundo das tradições e concepções que permeiam a vida
cotidiana.
  .:: Opção Cultural
As expectativas são produto do desejo de uma vida melhor, de um futuro mais feliz. A origem
dessas expectativas está em dois elementos: descontentamento e desejo. O
  .:: Otávio Lage
(+) listar mais
descontentamento com a vida atual (em sua totalidade ou em vários de seus aspectos, que,
caso da sociedade moderna, remetem à vida profissional, afetiva, financeira, política) traz o
desejo da mudança, a esperança de que dias melhores chegarão, sonhos serão realizados.
  .:: Edições Anteriores O descontentamento e o desejo criam a expectativa e a crença na mudança, bem como uma
  .:: Contato pseudestesia (falsa sensação) coletiva de renovação. As previsões das pessoas não
  .:: Expediente possuem, na maioria dos casos, uma base concreta. Isso faz das previsões místicas um forte
atrativo, pois reforçam a esperança e crença na mudança.

A maioria percebe esse processo como sendo individual: descontentamento, objeto do


desejo, expectativa, crença em mudanças para o indivíduo. Embora possam ocorrer
mudanças individuais, elas são limitadas caso não ocorram mudanças sociais. Daí o eterno
descontentamento e desejo de mudança, pois, mesmo aqueles que sobem um degrau na
ascensão social, enriquecem e realizam desejos que, no fundo, não significam realização
pessoal, já que eles continuam presos em uma sociedade mercantil, burocrática e
competitiva, continuam sentindo o descontentamento e a necessidade de nova mudança. A
mudança no sentido coletivo era mais comum em sociedades “primitivas”, não marcadas
pelo individualismo e pela competição, embora não tenha sido abolida, mas apenas
marginalizada, na sociedade moderna.
Ensino religioso em
escolas públicas pode Porém, a passagem para o Ano Novo não significa nenhuma mudança em si. O ano é um
gerar discriminação, período de tempo construído por meio de um processo classificatório, utilizando como critério
avalia professor o tempo que o planeta Terra gasta para dar a volta em torno do Sol. No mundo
contemporâneo, é o que se chama “ano solar”, cuja origem é egípcia. O que ocorre é um
movimento físico de um planeta em torno de uma estrela, marcando determinado período de
tempo. Esse período de tempo também expressa mudanças biológicas nos seres vivos, entre
outros, mas não apresentando nenhum salto ou mudança radical.

Relações sociais — A expectativa de mudança que ocorre neste período do ano é


direcionada para a esfera das relações sociais, que não sofrem nenhuma grande influência
deste movimento físico que serve de critério classificatório para a duração do ano. Além
disso, a demarcação de quando é o fim do ano e início do seguinte é arbitrária, um produto

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social. Poderia ser, ao invés do dia 1º de janeiro, em agosto, desde que o calendário tivesse
sido produzido sob outra forma, com outra marcação das datas. E era assim, por exemplo,
no antigo Egito, onde o ano iniciava em 19 de julho. Em outros casos, o início do ano ocorre
em outras datas, tal como março, setembro, dezembro. Isto sem falar dos calendários nos
quais o ano tem mais de 12 meses.

Algumas mudanças superficiais reforçam essa pseudestesia coletiva de renovação. Como


várias relações sociais se organizam a partir da demarcação temporal do calendário anual,
isto reforça a percepção de uma mudança. O calendário escolar, por exemplo, se organiza
principalmente de forma anual, o que significa que o indivíduo fica na expectativa de
encontrar novas pessoas, viver novas relações. Mesmo sendo um calendário semestral, a
sensação de renovação ocorre, reforçada pelo clima geral anunciado pelo Ano Novo e
bastante amplificada pelos meios de comunicação, pelo misticismo e pelas religiões. No Ano
Novo também há o recomeço do campeonato de futebol e outras competições esportivas, as
promessas de novos programas na TV e mais algumas mudanças que, no fundo, nada
mudam ou mudam superficialmente, ou localizadamente, atingindo apenas alguns indivíduos
ou grupos sociais, o que é pouco mais do que a mudança individual acima aludida.
Porquanto, não há mudança na totalidade das relações sociais. Em alguns casos individuais,
as mudanças são um pouco mais profundas, tal como para quem passou no vestibular ou
acertou um novo contrato de trabalho.

No que se refere às relações sociais, as mudanças não caem do céu, nem ocorre nenhum
acontecimento mágico no 1º de janeiro que provoque qualquer alteração que não seja um
processo de continuidade em relação ao(s) ano(s) anterior(es). A Segunda Guerra Mundial,
deflagrada em 1939, não nasceu neste ano, pois foi produto de um longo processo histórico
que gerou sua razão de ser e existência. Assim, se alguém quer acontecimentos novos no
ano seguinte, tem que perceber que existe um processo que traz um conjunto de tendências
e que a pura vontade, a fé ou o misticismo nada poderão fazer nesse sentido, já que são as
ações anteriores que irão promover as possíveis mudanças. Embora a vontade e a fé sejam
elementos que podem influenciar os acontecimentos, a preparação e a ação presente são
mais importantes para se alterar o futuro. Isto nada tem a ver com a passagem para o Ano
Novo. Um dia mágico no qual as coisas mudam sem nenhuma ação nesse sentido é
impossível. A ruptura entre o presente e o futuro não ocorre, pois o futuro é construído no
presente — carregando as influências do passado —, inclusive a ruptura. Nada acontecerá
no ano que vem que já não esteja preparado, ou em forma embrionária, neste ano e nos
anos anteriores. Por conseguinte, desejar feliz Ano Novo é algo vazio se não tivermos feito
nada para que o futuro seja melhor. A melhor forma de desejar um feliz Ano Novo é fazer
algo no presente para que isto se concretize no futuro.

NILDO VIANA é escritor e sociólogo.


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