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A TRÁGEDIA DOS COMMONS E OS DIREITOS DE PROPRIEDADE:

Com Hardin, Além de Hardin 1.

Víctor Hugo Martínez Ballesteros2

victorhugo.martinez@rai.usc.es

Ihering Guedes Alcoforado3.


ihering@ufba.br

Resumo:

O propósito deste artigo é mostrar a relevância dos diferentes regimes de propriedade


no modo de gerir os recursos naturais renováveis, e nesse sentido entrar no debate
sobre os regimes de propriedade que influenciam a exploração de ditos recursos. O
ponto de partida é a caraterização do frame que Hardin propôs em Tragedy of the
Commons (1968), a partir do qual se apresentam tanto a sua visão sobre a
problemática ambiental, como as críticas surdidas em relação ao seu artigo, para
concluir estabelecendo a necessidade de um marco institucional, o qual defina os
direitos de propriedade e as medidas de controle precisas para alcançar uma
administração eficiente dos recursos naturais.

Palavras Chave: Hardin, tragédia dos comuns, regime de propriedade.

JEL- K11,Q01,Q28,Q56.

1
Articulo Presentado en el VIII Encuentro de la Sociedad Brasileña de Economía Ecológica
(ECOECO), Agosto 2009, Cuiabá, Mato Grosso.

2
Bolsista MAE-AECID, pesquisador na Universidade Federal da Bahia (UFBA) e doutorando em
Economia Aplicada na Universidade de Santiago de Compostela (USC).

3
Professor do Departamento de Economia Aplicada da Universidade Federal de Bahía (UFBA)
Introdução:

A crescente pressão sobre os recursos naturais renováveis tem ameaçado sua


exploração sustentável, estimulando uma ampla reflexão sobre o controle do acesso
aos referidos recursos. O objetivo deste trabalho é introduzir a partir do artigo de
Garrett Hardin, The Tragedy of Commons (1968) a problemática da mediação dos
diferentes regimes de propriedade na institucionalização do acesso aos referidos
recursos.

Com este propósito o presente trabalho se divide em três partes e uma conclusão. Na
primeira parte, apresenta-se de forma sucinta as causas sugeridas por Hardin no
processo de degradação dos recursos naturais, avaliando-se a pertinência da metáfora
da Tragédia dos Comuns. Na segunda, apresentamos as idéias forças que estruturam o
argumento The Tragedy of Commons (1968), chamando a atenção sobre a relevância
dos regimes de propriedade em relação a administração de recursos naturais. Na
terceira parte apresenta-se as críticas ao frame de Hardin, focando a referida crítica
sobre os pontos mais fracos do argumento do autor norte-americano, em particular
sobre os direitos de propriedade, para passar em seguida as conclusões.

1. O Cenário de Hardin.

The Tragedy of the Commons (1968) constitui uma exame crítico da relação
do ser humano com a natureza. Hardin assume a existência de uns padrões
demográficos que elevam a pressão sobre os recursos naturais, sendo essa enorme
pressão exercida por uma população crescente, da que se derivam atividades de
produção e consumo perversas que corrompem a ordem natural. Deste jeito, se
produzem fortes desequilíbrios na relação entre homens e natureza , já que as
atividades necessárias para o suporte da população provocam um deterioração
progressiva dos recursos naturais, a partir do nível de exploração que ultrapassa a
capacidade de carga do meio ambiente. O panorama exposto por Hardin é
desalentador e suas conclusões apocalíticas. O Autor norte-americano é alinhado com

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o pensamento neo-malthusiano que, de um lado, advoga um controle demográfico
para evitar a catástrofe malthusiana, e do outro lado, propõe ações de controle sobre
os recursos naturais para evitar a degradação dos recursos, sendo o segundo vetor o
que foca a atenção de este artigo.

A idéia central exposta em The Tragedy of the Commons (1968) é que quando um
recurso natural renovável é utilizado por um coletivo, sem restrições na entrada, sem
restrições no uso, e sem custos para os usuários, então dito recurso será sobre-
explorado, levando a dita Tragédia dos Comuns. Esta colocação de Hardin se apoiá
em dois pontos: i) o crescimento da população mundial aumenta a pressão sobre os
aludidos recursos ii) o regime de propriedade comum, favorece a sobreexploração dos
recursos naturais. De forma que, nesta situação, os agentes envoltos na exploração
dos recursos comuns procuram maximizar a sua utilidade individual
independentemente, de tal jeito que a soma de todas as utilidades maximizadas
individualmente resultam em uma pressão excessiva sobre o recurso natural, levando
a degradação ou desaparição do mesmo ,i.e., A Tragédia dos Comuns4.

Admite-se a importância do artigo de Hardin, já que faz uma importante chamada de


atenção sobre as conseqüências de ultrapassar a capacidade de carga (Carrying
Capacity), pondo em tela de juízo não só a explosão demográfica mais também o
padrão de consumo decorrente da mesma, e como conseqüência desta ,a problemática
ambiental (Hardin, 2005: 233-236) Assim, identificando o problema populacional e
assumindo um suposto regime de propriedade comum, Hardin analisa diferentes

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The Tragedy of Commons (1968), foi escrita como uma critica ao pensamento clássico,
particularmente ao pensamento de Adam Smith e a sua concepção da Mão Invisível. Hardin negava a
possibilidade de mercados auto-regulados onde a procura do beneficio individual derivasse em um
beneficio coletivo. A maximização das utilidades individuais na exploração dos recursos naturais é a
pedra angular da crítica de Hardin ao pensamento de Smith, já que é essa procura de bem-estar
individual a que dirige a sociedade a uma tragédia coletiva.

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medidas para frear a degradação progressiva dos recursos naturais, sugerindo que se
use a propriedade privada e/ou estatal e, é dela que passamos a tratar.

2. AS IDEIAS FORÇAS DA TRAGÉDIA DOS COMUNS

2.1 A Contribuição de Hardin.

Sob o ponto de vista institucional, a principal contribuição de The Tragedy of the


Commons (1968), é sua discussão seminal sobre os regimes de propriedade que
devem fundamentar a gestão e o acesso dos recursos naturais renováveis. Nesse
sentido, a essência da tragédia de Hardin está ligada a concretização de um suposto
regime de propriedade comum, que segundo o autor norte-americano está definido
por duas caraterísticas: i) não existem restrições no uso, ii) não existem restrições no
acesso ao recurso natural. Esta nomeação é errônea, já que as duas condições acima
expostas são as caraterísticas definitórias do regime de Acesso Livre, e , é nela que
vai se assentar a maior parte da crítica ao pensamento de Hardin, já que interdita a
discussão sobre as possibilidade da propriedade comum como um mecanismo
institucional de mediação aos recursos naturais renováveis.

Assim , sob as condições que concretizam a problemática da sobre-exploração dos


recursos naturais exposta no ponto anterior, identificando o (suposto) regime de
propriedade comum como o regime em tela, e assumindo a racionalidade dos
membros da comunidade implicada na exploração do recurso natural conclui que a
liberdade na administração dos recursos é intolerável por incentivar a degradação dos
recursos naturais. Daí propor duas linhas de atuação para frear a tragédia comunal : i)
a transferência dos direitos propriedade “comunal” para os regimes de propriedade
Privada e Estatal, os quais supõe administram os recursos eficientemente, e ii)
medidas coercitivas para regular o uso, acesso e exploração dos recursos naturais com
a finalidade alcançar moderação e maior eficiência na sua exploração. Em função
disto, Hardin defende um deslocamento dos direitos de propriedade para outros
regimes onde os recursos naturais podem ser geridos eficientemente, entendendo que

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estes regimes coincidem com a propriedade privada e com o Estado. Em outras
palavras, para Hardin o ponto chave no caso dos regimes de propriedade, é a
definição dos direitos e obrigações dos participantes, deste modo se obtém uma
regulação que poderia ser providenciada por sistemas de propriedade estatais ou
privados, os quais forneceriam de moderação e ordem a exploração dos recursos
naturais, frente a anarquia do regime de propriedade comum aceitado (erradamente)
por Hardin.

Ante esta asseveração e acudindo a literatura especializada5, observamos que a


propriedade privada pode revelar-se como um sistema ótimo para a exploração dos
recursos naturais com grandes possibilidades de sucesso econômico e ambiental, já
que o estabelecimento e a aplicação de direitos de propriedade privada subministram
com freqüência os arranjos institucionais para uma exitosa exclusão (FEENY et al
[1990] 1995: 56). Além disso, o regímen de propriedade privada , em teoria, vai fazer
um uso mais eficiente dos recursos (em base a fins egoístas), ainda que sob condições
de administração e exploração insustentáveis pode dirigir a gerencia dos recursos
naturais a uma situação de sobre-exploração dos recursos. No caso da gestão dos
recursos naturais pelo Estado também foram documentadas diferentes experiências
onde o resultado da exploração dos recursos são eficientes, tanto na delimitação dos
direitos e obrigações de exploração, como em termos de eficiência econômica e de
sustentabilidade. Embora, existem casos onde a gestão é eficiente sob regulação
estatal, também existem outros nos que dita gestão é economicamente ineficiente
(FEENY et al, [1990] 1995:58). Por conseguinte, tanto a propriedade privada como a
Estatal podem derivar em experiencias bem sucedidas ou em outras nas que os
recursos naturais sejam administrados ineficientemente.

Neste ponto e avançando para a segunda parte do seu argumento, Hardin entende que
é necessária a intervenção institucional para restringir o uso dos recursos naturais,
instaurando o conceito de Coerção Mútua, único tipo de coerção que Hardin
5
Em The Tragedy of Commons: Twenty-Two Years Later, os autores Feeny, Berkes, McCay e
Acheson documentam diferentes experiencias (bem e mal sucedidas) sobre recursos naturais geridos
sob diferentes formas de propriedade.

5
recomenda (Hardin, 1968: 1247). Assim o autor norte-americano se apóia na idéia da
coerção mutuamente acordada, assumindo que a liberdade de gestão dos recursos
naturais é inadmissível, e portanto é necessário admitir certo controle institucional
para preservar os recursos naturais e fazer um uso mais eficiente dos mesmos. No
cenário de Hardin os mecanismos de ação institucional são as medidas coercitivas, as
quais procuram uma moderação no uso e exploração dos recursos e permitem evitar,
no possível, a proibição, induzindo a moderação e influindo na atitude dos agentes
econômicos de tal jeito que se modificam comportamentos ambientais daninhos, i.e.,
explorações insustentáveis.

Resumindo: Hardin ao focar a atenção nos direitos de propriedade, assim como nas
suas implicações ambientais e sócio-econômicas, desvela sua importância e em
decorrência seu papel central na gestão, exploração e conservação dos recursos
naturais

3. A QUESTÃO DA PROPRIEDADE.

Nesta seção apresentamos as críticas a proposta defendida por Hardin em The


Tragedy of Commons (1968) ,em relação aos direitos de propriedade como um ponto
de partida para a definição dos possíveis regimes de propriedade aplicáveis a
exploração dos recursos naturais, tendo como pano de fundo a contribuição da teoria
econômica, em especial a da Nova Economia Institucional (NEI) a qual está
principalmente fundamentada no pensamento de Ronald Coase.

3.1 Alguns passos além de Hardin

A partir das condições de possibilidades postas por Hardin, avançou-se além de


Hardin no entendimento da conexão entre os regimes de propriedade e o modo em
que são geridos os recursos em varias direções. Numa direção avançou-se tendo tendo
como ponto de partida a noção de bens públicos, e nesse sentido os regimes de
propriedade passam a ser definidos por duas caraterísticas comuns, i ) exclusividade

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ii) rivalidade (Feeny et al, [1990] 1995: 54),de tal jeito que dependendo do regime de
propriedade em tela, estas caraterísticas serão mais ou menos agudas, já que tal como
evidenciou Ronald Coase em The Lighthouse of Economics (1974) não existe um
bem que seja em sua essência público. Numa outra direção avançou-se no
estabelecimento das evidências pelas quais a própria natureza dos regimes de
propriedade determinam as obrigações e direitos dos agentes econômicos implicados
no uso de recursos ambientais, os quais a depender do modo que são definidos
estabelecem mecanismos que levam ou não a exploração sustentável. Ou seja, os
direitos de propriedade bem definidos estabelecem em que condições e por quem (e
por quem não) podem ser utilizados os recursos e em que intensidade.

3.1.1 Os Regimes de Propriedade

Devido a importância de definir apropriadamente os regime de propriedade, o que


infelizmente não acontece no texto de Hardin, resulta interessante revisar os
diferentes regimes aplicáveis a exploração dos recursos naturais e as suas
caraterísticas em função do controle legal sobre o recurso.

i) Livre acesso

O regime de livre acesso é aquele no que não existem direitos de propriedade. Este
regime de (não)propriedade provoca o livre acesso ao recurso, e portanto,
impossibilita a existência de uma regulação na exploração dos recursos naturais. É
assim que entendemos a cita […]...everybody's property is nobody's property."
(Bromley & Cernea, 1989: 19). É exatamente nestas circunstâncias de acesso, uso e
exploração não regulados, onde as “trágicas” hipóteses de Hardin tomam mais força e
não sob as condições de propriedade comum aceitas pelo autor norte-americano , ou
dito com outras palavras, o grande erro de Hardin é identificar uma situação
desregulada de livre acesso, com um regime de propriedade comum, o qual, sim,
responde a uma regulação concreta que define o acesso uso e exploração dos recursos
naturais comunais.

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ii) Propriedade Comum

Os direitos sobre os recursos naturais pertencem a um coletivo que regula o uso dos
mesmos, e que excluí a outras pessoas de fora da comunidade. Nesse sentido a
propriedade comum reserva o direito de explotação do recurso para uns poucos e
admite o direito de poder excluir a outros do uso dos recursos. No interior da própria
comunidade os direitos sobre os recursos não são nem exclusivos nem transferíveis,
são frequentemente direitos de acesso e uso iguais para os membros da comunidade
(Feent et al, [1990] 1995: 55). Sob estas caraterísticas a propriedade comum é em
essência, a propriedade privada de um grupo, e nesse sentido são as decisões do
grupo as que determinam quem deve ser excluso (Bromley & Cernea, 1989: 15).
Portanto o regime da propriedade comum, em base a sua definição, esta caraterizado
pela capacidade de exclusão de um grupo sobre outros, e ademais este garante a
exploração exclusiva do recurso por parte de um grupo reduzido. Nesse sentido a
afirmação de Bromley e Cernea de que a propriedade comum é uma variação do
regime de propriedade privada, onde os decisores na gestão e exploração do recurso
são os membros do grupo, toma sentido.

iii) Propriedade Privada

A essência do regime de propriedade privada reside em que a capacidade legal para


explorar um determinado recurso natural pertence exclusivamente, a aquele que
possua em propriedade o direito de exploração de dito recurso, ou em outras palavras,
a propriedade privada é a capacidade legal e social para poder excluir a outros
(Bromley & Cernea, 1989:12).

Está idéia de propriedade privada, sendo um pouco radical deve ser matizada, já que
os regimes de propriedade respondem ante uma amalgama de normas, leis, tradições
que dependendo dos contextos sócio-econômicos e institucionais definem as
obrigações e responsabilidades dos agentes participantes, matizando a capacidade de
exclusão e de exclusividade aceita pela definição anterior .

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iv) Propriedade Estatal

Os recursos naturais também podem não só ser regulados pelo Estado através dos
direitos de propriedade, mas o próprio direito de propriedade pode passar a ser
exercido pelo Estado. De tal jeito que o Governo não só estabelece quem e de que
modo deve explorar os recursos naturais, definindo os direitos de exploração e de
exclusão relativos o recurso, mas o próprio governo se converte no agente que o
exerce.

Uma vez expostos os diferentes tipos de regimes de propriedade, e recuperando as


bases da contribuição de Hardin exposta no primeiro ponto deste trabalho, é
interessante valorar que: o regime de propriedade comum como modelo para
administrar recursos naturais é frequentemente mal interpretado, sendo muito normal
que em uma situação na que não exista um regímen de propriedade definido, se pense
que o regime de propriedade em tela é o de propriedade comum (Bromley & Cernea,
1989: 1).

3.2 Critica as idéias forças de Hardin

Na equalização da alegoria The Tragedy of the Commons (1968), do ponto de vista da


propriedade se pode identificar varias falhas na argumentação do autor i) Hardin
identifica a falta de direitos de propriedade com um regime de propriedade comum,
ii) Assumido o regime de propriedade comum, limita a racionalidade dos membros da
comunidade, iii) Sob o ponto de vistas institucional, não considera os diferentes
arranjos que se derivam da interatuação dos agentes, limitando as soluções a uma
transferência dos direitos propriedade e a medidas coercitivas para restringir o uso e a
entrada aos recursos naturais.

O autor concretiza o seu frame sob um suposto regime de propriedade comum, e sob
este cenário assevera que a exploração abusiva dos recursos naturais renováveis
dirigiram a sociedade a uma tragédia ambiental e econômica. Repassando os

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diferentes tipos de regime de propriedade expostos acima, as caraterísticas que coloca
Hardin coincidem com as do regime de livre acesso e não com as de propriedade
comum.

Não é necessário afundar mais no erro terminológico, mas é interessante chamar


atenção sobre mais uma circunstância que Hardin não considera, e que é essencial
para entender o regime de propriedade comum: a racionalidade dos agentes, tendo em
conta o resultado coletivo. Ou seja, na sua alegoria da tragédia dos comuns o autor
reconhece a racionalidade dos agentes econômicos que procuravam maximizar cada
utilidade individual sem considerar os resultados coletivos e, assim, desconsidera que
ante a degradação dos recursos naturais, em principio meio de subsistência de uma
coletividade , os proprietários tendem a estabelecer uma serie de novos ordenamentos
sócio-econômicos que melhorem a produção em termos ambientais e econômicos,
tendo como referência sua própria identidade coletiva (Pipes, 2001: 117) Como foi
exposto anteriormente o regime de propriedade comum pode ser considerada como a
propriedade privada de um grupo, de tal jeito que entre eles se estabelecem uma serie
de ordenamentos econômicos e sociais, ao tempo que são reconhecidos direitos e
obrigações (Bromley & Cernea, 1989: 15), que se encontram, por exemplo, nos
fundamentos do direito consuetudinário de origem anglo-saxão.

Nesse sentido um grupo que assuma o regime de propriedade comum é definido


como um conjunto fechado de indivíduos com o direito de exploração de um recurso
e com a capacidade para excluir a outros do uso do recurso natural. Evidentemente,
para que isto se produza, são precisas uma serie de interatuações complexas entre os
membros da comunidade que regulem o funcionamento interno do recurso em
propriedade comum. Na literatura econômica podemos encontrar diferentes casos nos
que se documenta a eficiência e sustentabilidade de regimes de propriedade comum
que exploram recursos naturais, nesses casos a existência, respeito e aceitação de uma
serie de regras internas na comunidade de proprietários é determinante (Feeny et al,
[1990] 1995: 57). Estas relações complexas não são consideradas por Hardin, quem

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nega a natureza organizativa de um grupo de propriedade comum, limitando a sua
capacidade para administrar o uso dos recursos.

Atente-se que é baseado na idéia de que a liberdade de exploração dos recursos


naturais em regime de propriedade comum é intolerável que, Hardin aposta por uma
intervenção institucional para mudar o regime de propriedade, já que este é, para ele,
a base dos problemas de preservação dos recursos naturais, i.e., sob a condições de
propriedade comum a destruição do recursos é inevitável. Portanto uma das soluções
propostas por Hardin é uma transferência dos direitos de propriedade, existindo duas
possibilidades i) os direitos são transferidos ao Estado ii) ou são transferidos para um
regímen de propriedade privada. Estas soluções alternativas identificam parte do
mesmo problema, i.e., um regime de propriedade daninho que derivará em
conseqüências funestas para a humanidade, e planteia uma solução o problema que se
traduz na eliminação do causante do mal, mas por meio de soluções institucionais e,
em decorrência mecanismos de incentivos distintos.

Em resumo, Hardin marginaliza as possíveis interatuações eficientes não só entre os


agentes econômicos, mas também entre as características dos recursos,
desconsiderando os mecanismos interativos que produzem os arranjos institucionais
nos diferentes níveis para solucionar os problemas de uma exploração inadequada dos
recursos naturais, ou seja, Hardin desconsidera a dinâmica da esfera institucional que
define os direitos de propriedade e outros acordos institucionais, e também âmbito
sócio-econômico, os quais em conjunto contribuem a definir o sucesso no uso
apropriado dos recursos independentemente do regímen de propriedade em tela
(Feeny et al, [1990] 1995: 60).

4. CONCLUSÕES:

Com The tragedy of Commons (1968) Hardin faz uma primeira chamada de atenção
ao tópico ecologista, de tal jeito que as suas aportações derivaram em duas direções:
Em primeiro lugar, Hardin atraí o interesse sobre o regimes de propriedade e a sua

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importância no modo em que são geridos os recursos naturais. Como já foi explicado
acima, a caraterização da visão de Hardin em relação os regimes de propriedade,
estava fundamentada em supostos inadequados, o que supõe um profundo erro de
base e depreciam as conclusões do autor, mas serve como um marco válido para o
começo da discussão sobre que regime de propriedade deve ser adotado para gerar,
do modo mais eficiente possível, a exploração dos recursos naturais. Portanto a
marginalização do regime de propriedade comum proposta por Hardin era
inadequada. Além dos reconhecidos erros de Hardin , a contribuição essencial no
caso dos regimes de propriedade, é a necessidade de estabelecer de um modo claro os
direitos e obrigações dos participantes nas exploração dos recursos, para obter uma
regulação que forneça moderação e ordem a exploração dos recursos naturais.

Em segundo lugar, Hardin estabelece a necessidade da intervenção institucional para


fornecer de moderação a exploração dos recursos naturais. Hardin propôs i) a
transferência dos direitos de propriedade de regimes de propriedade perversos (o que
ele identificava como regime de propriedade comum) para outro tipo de regimes de
propriedade (Estatal ou privada) como medida para paliar a exploração indevida dos
recursos naturais. ii) propôs um conjunto de medidas coercitivas que regulassem a
utilização e usufruto da exploração dos recursos naturais. É assim que Hardin revela a
necessidade da intervenção da esfera institucional como mecanismo regulador, de tal
jeito que a atuação das instituições se concretizam na definição dos direitos de
propriedade e em medidas coercitivas que marcam as regras do jogo econômico,
estabelecendo as normas para gerar do modo mais eficiente possível os recursos
naturais. Nesse sentido as aportações de Hardin além de como chamada de atenção
ecologistas serviram como base seminal para começar o debate sobre a importância
das instituições e da discussão sobre a delimitação dos direitos de propriedade em
relação a gestão eficiente dos recursos renováveis.

É assim que The Tragedy of the Commons (1968) se consolidou como um artigo que
deve ser revisado a hora do desenvolvimento da discussão sobre a gestão dos recursos

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naturais e sobre os direitos de propriedade , uso e exploração relacionados com os
referidos recursos.

Agradecimentos:

O trabalho de Víctor Hugo Martínez Ballesteros foi financiado por uma bolsa do
Ministério de Assuntos Exteriores e Cooperação Internacional Espanhol, Agencia
Espanhola de Cooperação Internacional. Bolsas MAE-AECID.

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