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Abraham A. Akrong
Primeiros encontros
O primeiro contato entre o cristianismo e as culturas
e religiões tradicionais da África Ocidental começou com a
chegada de comerciantes europeus no litoral da Guiné desde
aproximadamente o século XV. Infelizmente, esta parte da história
cultural do cristianismo em Gana não tem recebido a atenção que
ela merece e este desprezo aparente nos privou de conhecermos
o relacionamento singular que existia entre a religião tradicional
e o cristianismo antes do século XIX (R. G. Jenkins, 1985, p. 19).
A atenção ao relacionamento entre o cristianismo e a religião
tradicional no litoral de Gana antes do século XIX nos dá o alcance
completo dos relacionamentos que podem existir entre a religião
tradicional e o cristianismo à medida que exploramos a natureza
do diálogo contínuo e do encontro entre a religião tradicional e o
cristianismo (Hernas, 1995, p. 3).
A teoria de M. Priestly de “avaliação de vantagem” (Priestly,
1969, p. 7) e a ideia de Per Hernas de “interdependência e
reciprocidade”1 captam de maneira adequada o tipo de interação
cultural e o meio ideológico em que os comerciantes e os ganenses
se relacionavam uns com os outros no litoral no período pré-
-colonial. Ao escrever sobre o relacionamento entre africanos e
europeus no litoral ocidental, Per Hernas o descreveu como um
relacionamento de interdependência e reciprocidade, um sistema
aberto com atores dos dois lados participando de jogos estratégicos
baseados na “avaliação mútua de vantagens” e no qual nenhum dos
dois lados era capaz de impor as regras do jogo (Hernas, 1995).
1 N.E.: Per Hernas compartilha suas reflexões sobre este tema dos relacionamentos historicamente
multidimensionais entre europeus e africanos que são ofuscadas pela dicotomia excessivamente
simplificada entre “tradição e modernidade” no capítulo 39.
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2 Em uma conversa, o Prof. Hernas falou sobre a evidência em alguns dos registros dinamarqueses que
relatavam como os europeus usavam a medicina tradicional para se protegerem de inimigos ou para
lhes dar vantagens numa competição. Houve um caso em que se relatou que um homem branco
tinha vários objetos espirituais tradicionais embaixo da sua cama que foram descobertos após a sua
morte.
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3 N.E.: As variações sobre o tema do Destino Manifesto que se desenvolveram ao longo do tempo
com os motivos econômicos em transformação dos colonizadores europeus por trás da apropriação
de recursos africanos são cuidadosamente traçadas na Seção 3, especialmente no capítulo 22, de
Frederick Cooper e as ideologias capitalistas que determinaram a transformação desta exploração e
suas razões em transformação são discutidas por Claude Ake no capítulo 1. Sobre o eurocentrismo
racista sustentado na mídia satélite atual, veja o capítulo 50 de Chinua Achebe
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4 Citado por Tsenay Serequeberhan (1991, p. 4). Para um tratamento excelente das bases filosóficas e
intelectuais de ideologias eurocêntricas que apoiavam as políticas orientadoras da superioridade e do
racismo europeu colonial, veja Cornel West (2002 [1982]).
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5 N.E.: De acordo com Louis Nnamdi Oraka (1983, p. 28), “Rev. Thomas J. Dennis (1900-1929) foi o
melhor e mais prolífico estudante de Igbo e escritor da sua época. Ele usou um Comitê de Tradução
do Idioma Igbo, incluindo nativos Igbo, para traduzir Pilgrim”s Progress e alguns catecismos. Ele
também traduziu o Union Reader e o Union Hymnal. Morreu num naufrágio, em 1917”.
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6 N.E.: A filosofia evolucionista do Iluminismo e da ciência racista vitoriana, que ela inspirou depois,
sustenta a abordagem de missão civilizadora ortodoxa dominante atual para combater HIV/AIDS
na África por meio de programas de modificação de comportamento. Veja o capítulo 56, de Eileen
Stillwaggon.
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Imperialismo cultural
O imperialismo cultural foi o efeito agregado da ideologia do
Destino Manifesto e da filosofia do progresso do Iluminismo. Ele
produziu na Europa uma suposição de superioridade cultural que
afetou todas as transações entre os africanos e os europeus. Esta
foi a principal razão pela qual a maioria dos missionários pode
7 N.E.: James Ferguson, no capítulo 30 desta coletânea, detalha o papel da antropologia como a
disciplina acadêmica que serviu para promulgar estes estereótipos racistas evolucionários com a
profundidade e a persistência mais abrangentes.
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A reação africana
A reação africana à denegrição e a denominação de cultural
e religião tradicionais veio de várias maneiras, mas a unidade
fundamental foi a resistência da cultura e da espiritualidade
africanas, na busca por manifestação e realização própria dentro das
estruturas do cristianismo missionário domesticado. A dinâmica
da espiritualidade africana estava presente no protesto silencioso
das pessoas nos bancos de igrejas missionárias e nos movimentos
externos de protesto que levaram ao surgimento de diversas formas
de cristianismo local (Akrong, 1998). Os movimentos espirituais
8 N.E.: Estas crenças são mantidas nas filosofias que sustentam o conselho econômico e políticas
educacionais embutido em programas de ajuste estrutural iniciados pelas Instituições de Bretton
Woods (veja Akilagpa Sawyerr, no capítulo 4; e Samir Amin, no capítulo 20 e Kwame Ninsin, no
capítulo 63).
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9 N.E.: Max Assimeng explica a crítica sociológica inerente nestes movimentos messiânicos, veja seu
capítulo 7.
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11 N.E.: Damian U. Opata nesta seção explica o fenômeno do “culto implacável ao diabo” e da violência
nas ruas contra a infraestrutura religiosa tradicional africana e seu pessoal causada por pentecostalistas
na Nigéria contemporânea.
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A perspectiva fenomenológica
Do ponto de vista autorizado pela fenomenologia da religião15,
a religião tradicional africana é comparável ao cristianismo, com a
qual ela mantém várias crenças e práticas em comum. Este fato é
o que tornou possível, inicialmente, à religião tradicional fornecer
a ecologia espiritual permitiu a implantação e o crescimento
do cristianismo através do processo de evangelização na África
Ocidental colonial. A menos que suponhamos uma ideologia
do imperialismo cultural, é difícil ver como se pode definir a
priori a religião tradicional como sendo basicamente demoníaca
e, portanto, incompatível com o cristianismo (Kirwen, 1993;
Sarpong, 1995).
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A perspectiva teológica
Até agora nesta análise não se prestou muita atenção no
que a teologia ocidental ortodoxa de religiões tem a dizer sobre a
religião e a cultura tradicional africanas (Martey, 1993). Falando
de maneira adequada o relacionamento entre religião tradicional
e cristianismo é tratado sob as rubricas da teologia de religiões ou
como um subtópico do Evangelho e da cultura. Isto implica que,
formalmente, as religiões africanas devam ser tratadas a partir da
perspectiva das normas do discurso teológico cristão.
As questões fundamentais que surgem quando a teologia cristã
aborda outras religiões podem ser divididas em três: filosóficas,
teológicas e práticas (John Hick, 1991). A categoria filosófica
lida principalmente com o relacionamento entre reivindicações
absolutas do cristianismo, ou em princípio os preceitos de qualquer
outra religião em relação a outras tradições religiosas. Este é o
tipo de enigma filosófico que estimulou o filósofo britânico David
Hume a formular a problemática das reivindicações absolutas de
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