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OS BANCOS E O JUDICIÁRIO

NUM TRISTE FIM DE SEMANA PARA A SOCIEDADE.

Em recente evento intitulado "O Papel do Sistema Financeiro no Desenvolvimento


Nacional", realizado pela FEBRABAN, da data de 31/03 (5.f.) a 02/04 (Sábado),
no sofisticado Hotel Transamérica da Ilha de Comandatuba, reuniu-se a alta
direção das Instituições Financeiras no país (Bradesco, Itaú, Unibanco, Nossa
Caixa, Caixa Econômica Federal, BankBonton, Santander, Pactual, Safra, HSBC
Bank, ABN Amro Real, Banco do Brasil, Citibank, JP Morgan) com integrantes da
cúpula de nosso Poder Judiciário (Magistrados do Supremo Tribunal Federal,
Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais), dentre estes, os
Presidentes do STF e do STJ.
Segundo a FEBRABAN o objetivo do encontro foi o de apresentar aos nobres
representantes do Poder Judiciário os pontos mais relevantes da discussão do
sistema financeiro nacional, como a necessidade de um marco jurídico apropriado
para o setor, o acesso ao crédito e a expansão da rede bancária.
Tais informações são oriundas da própria FEBRABAN, no “saite” que hospeda na
Internet. Algumas outras notícias foram publicadas apenas em jornais de cunho
econômico de grande circulação.
Embora não conste na Internet e não tenha sido divulgado pela mídia, estava
sendo verbalmente informado pela FEBRABAN, ao ser consultada sobre
inscrições para o evento, que o Seminário seria “fechado” e que seu custo seria da
ordem de R$55.000,00 por pessoa, daí que somente banqueiros estariam
presentes. E era omitida a presença de membros do Poder Judiciário.
Pois bem. Estes são os fatos. Dado o caráter especialíssimo do evento, boas
perguntas são melhores que quaisquer respostas, diante das respectivas
competências envolvidas e do atual momento nacional.
Portanto, pergunta-se:
1) O que estariam fazendo os nobres representantes da cúpula de nosso
Poder Judiciário em tal evento, em dias úteis e até a véspera de um domingo?
Aliás, quais seriam tais representantes?
2) A qual título estariam Ministros e desembargadores, em tal evento? Como
magistrados, como administradores do Poder Judiciário, como professores
palestrantes, como seres políticos, como ouvintes convidados ou como simples
turistas?
3) Com custeio de quem ?
4) Com quais interesses?
5) Estariam presentes a tal evento, quaisquer representantes da Sociedade
Civil, tais como as Associações Civis de Defesa ou dos Ministérios Públicos? Em
caso negativo, por que não?
6) Quem poderá fornecer a agenda do evento, a sua lista de presença, as
notas taquigráficas e a contabilidade dos gastos e pagamentos?
7) Por que haveria a necessidade de banqueiros discutir marcos regulatórios
do SFN com Magistrados, que possuem competência exclusiva para julgar, jamais
para legislar?
8) Em razão da patente proximidade dos Magistrados com os Bancos,
poderiam os primeiros, caso presentes ao evento, julgar casos em que os últimos
são partes?
9) E como se faria no caso de ADIns, como a da CONSIF contra a
constitucionalidade do CDC? Teríamos algum Ministro impedido?
10) Seriam estes os exemplos sociais e administrativos a serem seguidos
pelos Magistrados de 1.ª Instância?
Ainda que não tenha havido qualquer “maldade” no Seminário realizado, fica difícil
acreditar no mérito das lides que hoje tramitam em nossos Tribunais.
Até porque, todos os dias, retratam os Jornais os resultados pífios que vêm sendo
colhidos por nossa sociedade, quando tem que enfrentar no Poder Judiciário as
poderosas corporações brasileiras, exatamente o caso dos bancos (spreads
extorsivos e contratos abusivos), das empresas de telefonia (assinatura básica),
das concessionárias de serviços públicos em geral e até das companhias de
cigarro, que até hoje, pasmem, ainda não perderam um só processo judicial de
indenização no Brasil. Até parece que fumar faz bem!
O encontro de Magistrados e Banqueiros, num evento “fechado” de nítido
interesse destes últimos, macula a imagem de nossos Tribunais, ofende a
independência e a imparcialidade da Justiça e coloca em risco nossa segurança
jurídica.
Sejamos sinceros, não há como se admitir jantares entre Juízes e as partes
contrárias. Sem contar que encontros velados para antagônicos são plúmbeos,
situam-se em zonas cinzentas da lei e do comportamento humano.
Assim sendo, independentemente da cobertura prestada pela mídia ou da
apuração da existência de eventuais ilícitos pelas autoridades, o Seminário
banqueiro foi um episódio lamentável, triste para a Sociedade brasileira, sendo
irrelevantes o seu mérito ou intenções, ainda que nobres.
Mas, num Brasil calado, tanto por ignorância, quanto por conveniência, será que
alguém mais pensa de tal maneira?

Antonio Luís Guimarães de Álvares Otero


OAB/SP 166.740
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Artigo concluído em 06/04/2005.

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