Boletim n. 86 da Biblioteca da Escola Secundária/3 José Cardoso Pires, em Santo António dos Cavaleiros, dedicado aos 200 anos do nascimento de Alexandre Herculano.
Boletim n. 86 da Biblioteca da Escola Secundária/3 José Cardoso Pires, em Santo António dos Cavaleiros, dedicado aos 200 anos do nascimento de Alexandre Herculano.
Direitos autorais:
Attribution Non-Commercial (BY-NC)
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia online no Scribd
Boletim n. 86 da Biblioteca da Escola Secundária/3 José Cardoso Pires, em Santo António dos Cavaleiros, dedicado aos 200 anos do nascimento de Alexandre Herculano.
Direitos autorais:
Attribution Non-Commercial (BY-NC)
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia online no Scribd
Este boletim da Biblioteca/Centro de Recursos da Escola Secundária/3
José Cardoso Pires tem o número 86,sendo datado de Abril de 2010.
Foi realizado pelo professor João Carlos Costa, tendo sido efectuadas 60 cópias. Professor Bibliotecário: João Carlos Costa Equipa da biblioteca 2009/2010: professoras Ana Paulina Pascoal, Ana Ribeiro, Maria do Carmo Costa
Tema: 200 anos do nascimento de Alexandre Herculano
P á g i n a I n t e r n e t d a B E / C R E e m : http://bibesjcp.no.sapo.pt B l o g u e d a B E / C R E e m : http://becre-esjcp.blogspot.com Base de dados: http://esjcp.bibliopolis.info/opac/
ALGUMAS FONTES UTILIZADAS:
ALEXANDRE Biblioteca on-line do conto. In Ficções, 2003-2005. [Consult. 2010.04.27]. Disponível na www: <URL: http://www.ficcoes.org/bibliote- ca_conto/index.html> HERCULANO Célia Vieira e Isabel Rio Novo, Literatura Portuguesa no Mundo, Boletim nº 86 da Biblioteca e Centro de Recursos Educativos Dicionário Ilustrado. Porto: Porto Editora, 2005. Escola Secundária/3 José Cardoso Pires 8 1 vos custará nem mealha? tangiam tão lindamente que era um céu- - Dize, dize lá, Brearte. - Porque não ides à serra procurar vossa mãe? Segundo ouço contar aos velhos, ela aberto. Ele pôs-se a ouvi-los e sentiu uma saudade que o fez chorar. "- Irei ter com o abade - disse ele lá consi- A L E X A N D R E é grande fada. - Que dizes tu, Brearte? Sabes quem é go. - Quero confessar-me. Quem sabe se esta tristura ainda é tentação de Satanás? H E R C U L A N O minha mãe e que casta é de fada? "O abade era um velhinho, santo, santo, - Grandes histórias tenho ouvido do que se que não o havia mais. Nos 200 anos do seu nascimento passou certa noite neste castelo: éreis vós "Foi a ele que se confessou meu pai.
A lexandre Herculano de cidade do ataque das tropas miguelistas,
pequenino, e eu ainda não era nado. Os Depois de dizer mea culpa, contou-lhe ponto estando Alexandre Herculano integrado no porquês destas histórias, isso Deus é que os por ponto a história do seu noivado. Carvalho e Araújo contingente liberal. Na cidade do Porto é sabe. "- Ui! filho - bradou o frade -, fizeste mari- foi um dos grandes nomes do encarregado de organizar os arquivos da - Pois dir-tos-ei eu agora. Chega-te para dança com uma alma penada! biblioteca e escreve diversos artigos sobre cá, Brearte. "- Alma penada, não sei - tornou D. Diogo O pajem olhou de roda de si, quase sem o -; mas era cousa do diabo. romantismo português, teoria literária. Já em Lisboa, dirige a mais importante querer, e chegou-se para seu amo: era a "- Era alma em pena: digo-to eu, filho - tendo nascido em 1810, revista literária do romantismo português, obediência e, ainda mais, certo arrepio de replicou o abade. - Sei a história dessa mu- medo que o faziam chegar. lher das serras. Está escrita há mais de cem e falecido em 1877. intitulada O Panorama, e em 1839 é convi- dado pelo rei D. Fernando II para dirigir as - Vês tu, Brearte, aquela fresta entaipada? anos na última folha de um santoral godo do Foi poeta, romancista, historiador e ensaís- bibliotecas reais da Ajuda e das Foi por ali que minha mãe fugiu. Como e nosso mosteiro. Desmaios que te vêm ao ta, deixando-nos uma obra extensa, entre a Necessidades, os palácios reais lisboetas da porquê, aposto que já to hão contado? coração pouco me espantam. Mais que qual figura uma História de Portugal, altura, continuando a realizar investigação - Senhor, sim! Levou vossa irmã consigo... ânsias e desmaios costumam roer lá por romances como O Bobo e O Monge de histórica, o que resultará na História de - Responder só ao que pergunto! Sei isso. dentro os pobres excomungados. Cister, Eurico o Presbítero, para além da Portugal, em 4 volumes, que irão ser publi- Agora cala-te. "- Então, estou eu excomungado? colectânea de contos Lendas e Narrativas. cados ao longo dos anos seguintes. O pajem pôs os olhos no chão, de ver- "- Dos pés até à cabeça; por dentro e por Por dificuldades financeiras, não conseguiu É eleito deputado pelo Partido Carlista em gonha; que era humildoso e de boa raça. fora; que não há que dizer mais nada. frequentar a Universidade, já que era oriun- 1840, mas demite-se pouco depois, desiludi- "E meu pai, a primeira vez lia sua vida, do de uma família modesta, e frequentou um do com a actividade parlamentar. 6 chorava pelas barbas abaixo. curso prático de Comércio, esudando ta m- Na década seguinte regressa à política e E o cavaleiro começou o seu narrar: "O bom do abade amimou-o, como a uma bém na Torre do Tombo, o arquivo de docu- funda vários jornais, entre os quais O País e, - Desde aquele dia maldito, meu pai pôs- criança; consolou-o, como a um mal-aventu- mentos históricos portugueses, aprendendo mais tarde, O Português. se a cismar: e cismava e amesquinhava- - rado. Depois pôs-se a contar a história da o francês e o alemão, e lendo romances No ano de 1855 é nomeado vice-presidente se, perguntando a todos os monteiros velhos dama das penhas, que é minha mãe... Deus estrangeiros. da Academia Real das Ciências, tendo rea- se, porventura, tinham lembrança de me salve! Em 1831 envolve-se numa conspiração con- lizado diversas recolhas de textos históricos, haverem no seu tempo encontrado nas "E deu-lhe por penitência ir guerrear os tra o regime que vigorava então em que publicará sob a designação Portugaliae brenhas alguns medos ou feiticeiras. Aqui foi perros sarracenos por tantos anos quantos Portugal, liderado pelo rei D. Miguel I, e é Monumenta Historica. um não acabar de histórias de bruxas e de vivera em pecado, matando tantos deles obrigado a exilar-se em Inglaterra, seguindo Envolve-se em diversas polémicas, almas penadas. quantos dias nesses anos tinham corrido. depois para França. nomeadamente com o clero, e em 1867 reti- "Havia muitos anos que meu senhor pai se Na conta não entravam as sextas-feiras, dia Neste países continua a cultivar-se, estu- ra-se para uma quinta que possuía em Vale não confessava; alguns havia, também, que da Paixão de Cristo, em que seria irreverên- dando História e diversos historiadores de Lobos, desgostoso com a morte prematu- estava viúvo sem ter enviuvado. cia trosquiar a vil ralé de agarenos, cousa estrangeiros, e contactando com as obras de ra do rei D. Pedro V e desiludido com a vida "Certo domingo pela manhã, nasceu ale- neste mundo mui indecente e escusada. grandes escritores da época. pública. gre o dia, como se fora de Páscoa; e meu Um ano depois, em 1832, as tropas liberais, No seu retiro dedica-se à agricultura, e casa senhor D. Diogo acordou carrancudo e triste, In partidárias de D. Pedro IV, desembarcam na com D. Maria Hermínia Meira, que havia como costumava. Lendas e narrativas praia do Mindelo, no norte de Portugal, sido sua namorada de juventude, continuan- "Os sinos do mosteiro, lá em baixo no vale, tomam a cidade do Porto e defendem a do a trabalhar na sua obra Portugaliae 2 7 Monumenta Historica, intervindo por diver- Trata-se de uma obra puramente romântica, - Silvano, toma lá tu, que és fragueiro: leve por uma grande fresta, levando a filhinha sas vezes em defesa do que considerava quer pelo seu género, um romance histórico, o diabo a podenga, que não sabe senão cor- que muito chorava. serem algumas injustiças, nomeadamente quer pelas reacções e conflitos interiores rer e retouçar. Desde esse dia não houve saber mais nem contra o encerramento forçado das dos personagens principais e do destino que O canzarrão abriu os olhos, rosnou, pôs a da mãe nem da filha. A podenga negra, essa Conferências do Casino, em que par- lhes é traçado. pata sobre o osso e, abrindo a boca, sumiu-se por tal arte, que ninguém no caste- ticipou Eça de Queirós. mostrou os dentes anavalhados. Era como lo lhe tornou a pôr a vista em cima. Aos 67 anos morreu de pneumonia, uma O romance O Monge de Cister um rir deslavado. D. Diogo Lopes viveu muito tempo triste e doença que era uma das principais causas Nesta obra, Alexandre Herculano volta a Mas logo soltou um uivo e caiu, pernean- aborrido, porque já não se atrevia a montear. de morte em Portugal no século XIX e que abordar o conclito entre ética e religião. A do meio morto: a podenga, de um pulo, lhe Lembrou-se, porém, um dia de espairecer vitimou nomes como Cesário Verde. acção deste romance histórico decorre na saltara à garganta, e o alão agonizava. sua tristura, e, em vez de ir à caça dos cer- O seu túmulo está no Mosteiro dos época de D. João I, uma altura em que exis- - Pelas barbas de D. From, meu bisavô! - dos, ursos e zevras, sair, à caça de mouros. Jerónimos, em Lisboa. tiram graves convulsões políticas, tendo exclamou D. Diogo, pondo-se em pé, trému- Mandou, pois, alevantar o pendão, desen- como principal personagem Frei Vasco, um lo de cólera e de vinho. - A perra maldita ferrujar e polir a caldeira, e provar seus arne- O romance O Bobo cavaleiro que se fez monge, mas que ainda matou-me o melhor alão da matilha; mas ses. Entregou a Inigo Guerra, que já era Este romance histórico tem a sua acção situ- se encontra repleto de sentimentos de vin- juro que hei-de escorchá-la. mancebo e cavaleiro, o governo de seus ada nos tempos do início da nacionalidade gança e ódio, pretendendo castigar o seu E, virando com o pé o cão moribundo, castelos, e partiu com lustrosa mesnada de portuguesa, no Condado Portucalense, rival, Lopo Mendes, que casara com a sua mirava as largas feridas do nobre animal, homens de armas para a hoste de el-rei tendo como figura central do enredo D. amada, Leonor, quando se encontrava que expirava. Ramiro, que ia em fossado contra a mouris- Bibas, um bobo de corte que se envolve ausente, vingando também a honra da sua -A la fé que nunca tal vi! Virgem bendita. ma de Espanha. como espectador duma série de intrigas e irmã Beatriz e do seu pai, já que esta havia Aqui anda cousa de Belzebu. - E dizendo e Por muito tempo não houve dele, em paixões, acabando por resolver alguns con- sido ultrajada por um cavaleiro que se havia fazendo, benzia-se e persignava-se. Biscaia, nem novas nem mensageiros. flitos em favor do jovem D. Afonso apresentado com uma identidade falsa. - Ui! - gritou sua mulher, como se a houver- Henriques, futuro primeiro rei de Portugal. am queimado. O barão olhou para ela: viu-a 5 As Lendas e Narrativas com os olhos brilhantes, as faces negras, a Era um dia ao anoitecer: D. Inigo estava à O romance Eurico, o Presbítero Trata-se de uma recolha de contos publica- boca torcida e os cabelos eriçados. mesa, mas não podia cear, que grandes Neste romance histórico, Herculano aborda dos em revistas da época, em grande parte E ia-se alevantando, alevantando ao ar, desmaios lhe vinham ao coração. Um pajem a época do final do domínio visigótico na inspirados no autor romântico inglês Walter com a pobre Dona Sol sobraçada debaixo muito mimoso e privado, que, em pé diante Península Ibérica, antes da expansão Scott. do braço esquerdo; o direito estendia-o por dele, esperava seu mandar, disse então muçulmana no território, abordando uma Herculano adaptou algumas lendas da cima da mesa para seu filho, D. Inigo de para D. Inigo: questão ainda hoje tão complexa como o tradição popular oral, entre as quais «A Biscaia. - Senhor, porque não comeis? celibato dos religiosos. Eurico, um cavaleiro Dama Pé-de-Cabra» ou «O Bispo Negro», E aquele braço crescia, alongando-se para - Que hei-de eu comer, Brearte, se meu que é o principal personagem, torna-se pres- ou ainda narrativas de cariz histórico, como o mesquinho, que, de medo, não ousava senhor D. Diogo está cativo de mouros, bítero (religioso) por causa do seu amor «O Alcaide de Santarém» ou «A Morte do bulir nem falar. segundo rezam as cartas que ora dele são impossível por Hermengarda, a irmã nobre Lidador», a história do lendário guerreiro E a mão da dama era preta e luzidia, como vindas? de Pelágio, mas, quando o território é Gonçalo Mendes da Maia. «A Abóbada» é o pêlo da podenga, e as unhas tinham-se- - Mas seu resgate não é a vossa mofina: ameaçado pelos mouros, enverga nova- uma história que nos conta a construção do lhe estendido bem meio palmo e recurvado dez mil peões e mil cavaleiros tendes na mente as suas armas e transforma-se no Mosteiro da Batalha e do seu arquitecto, em garras. mesnada de Biscaia: vamos correr terras de Cavaleiro Negro, que combate heroica- havendo ainda alguns contos cuja acção - Jesus, santo nome de Deus! - bradou D. mouros: serão os cativos resgate de vosso mente os invasores árabes. decorre na época actual do autor, desde «O Diogo, a quem o terror dissipara as fumaças pai. Depois de encontrar novamente Hermen- pároco da aldeia», a história de um bondoso do vinho. E, travando de seu filho com a - O perro de el-rei de Leão fez sua paz com garda e tomando consciência de que o seu padre de aldeia, como o título expressa, ou esquerda, fez no ar com a direita, uma e os cães de Toledo e são eles que têm prea- amor é impossível e um sacrilégio devido à uma narrativa de viagem, «De Jersey a outra vez, o sinal da Cruz. do meu pai. Os condes e potestades do rei sua condição de religioso, procura a morte Granville», baseada nas experiências do E a sua mulher deu um grande gemido e tredo e vil não deixariam passar a boa hoste na batalha, enquanto a sua amada autor. largou o braço de Inigo Guerra, que já tinha de Biscaia. enlouquece. seguro, e, continuando a subir ao alto, saiu - Quereis vós, senhor, um conselho, e não 6 3 - De quê, de quê, donzela? - acudiu o ca- a excelente preia que havia preado. A D A M A PÉ-DE-CABRA sois, que valeiro com os olhos chamejantes. - De Seu filho assentou-se ao pé dele: ao pé da logo me nunca dar tréguas à mourisma, nem perdoar mãe Dona Sol; e começaram alegremente 1 cativastes? aos cães de Mafamede? Sou bom cristão. seu jantar. Vós os que não credes em bruxas, nem em - Sou de Guai de ti e de mim, se és dessa raça dana- - Boa montaria, D. Diogo - dizia sua mu- almas penadas, nem nas tropelias de tão alta li- da! lher. - Foi uma boa e limpa caçada. Satanás, assentai-vos aqui ao lar, bem jun- nhagem - Não é isso, dom cavaleiro - interrompeu - Pelas tripas de Judas! - respondeu o tos ao pé de mim, e contar-vos-ei a história como tu; a donzela a rir. - O de que eu quero que te barão. - Que há bem cinco anos não colho de D. Diogo Lopes, senhor de Biscaia. porque esqueças é do sinal da Cruz: o que eu quero urso ou porco-montês que este valha! E não me digam no fim: "Não pode ser. " venho do que me prometas é que nunca mais hás-de Depois, enchendo de vinho o seu pichel de Pois eu sei cá inventar cousas destas? Se a semel de persignar-te. prata mui rico e lavrado, virou-o de golpe à conto, é porque a li num livro muito velho, reis, como - Isso agora é outra cousa - replicou D. saúde de todos os ricos-homens fragueiros quase tão velho como o nosso Portugal. E o tu, senhor Diogo, que nos folgares e devassidões e monteadores. autor do livro velho leu-a algures ou ouviu-a de Biscaia. perdera o caminho do Céu. E pôs-se um E a comer e a beber durou até a noite o contar, que é o mesmo, a algum jogral em - Se já pouco a cismar. jantar. seus cantares. sabeis E, cismando, dizia consigo: "De que É uma tradição veneranda; e quem descrê quem eu servem benzeduras? Matarei mais duzentos 4 das tradições lá irá para onde o pague. seja, ofereço-vos a minha mão, e com ela as mouros e darei uma herdade a Sant'Iago. Ora deveis de saber que o senhor de Juro-vos que, se me negais esta certíssi- minhas terras e vassalos. Ela por ela. Um presente ao apóstolo e Biscaia tinha um alão a quem muito queria, ma história, sois dez vezes mais descridos - Guarda as tuas terras, D. Diogo Lopes, duzentas cabeças de cães de Mafamede raivoso no travar das feras, manso com seu do que S. Tomé antes de ser grande santo. que poucas são para seguires tuas mon- valem bem um grosso pecado." dono e, até, com os servos da casa. E não sei se eu estarei de ânimo de perdoar- tarias; para o desporto e folgança de bom E, erguendo os olhos para a dama, que A nobre mulher de D. Diogo tinha uma -vos, como Cristo lhe perdoou. cavaleiro que és. Guarda os teus vassalos, sorria com ternura, exclamou: podenga preta como azeviche, esperta e Silêncio profundíssimo; porque vou princi- senhor de Biscaia, que poucos são eles para - Seja assim: está dito. Vá, com seiscentos ligeira que mais não havia dizer, e dela não piar. te baterem a caça. diabos. menos prezada. - Que dote, pois, gentil dama, vos posso eu E, levando a bela dama nos braços, caval- O alão estava gravemente assentado no 2 oferecer digno de vós e de mim; que se a gou na mula em que viera montado. chão defronte de D. Diogo Lopes, com as D. Diogo Lopes era um infatigável mon- vossa beleza é divina, eu sou em toda a Só quando, à noite, no seu castelo, pôde largas orelhas pendentes e os olhos semi- teiro: neves da serra no Inverno, sóis dos Espanha o rico-homem mais abastado? considerar miudamente as formas nuas da cerrados, como quem dormitava. estevais no Verão, noites e madrugadas, - Rico-homem, rico-homem, o que eu te airosa dama, notou que tinha os pés forca- A podenga negra, essa corria pelo aposen- disso se ria ele. aceitara em arras cousa é de pouca valia; dos como os de cabra. to viva e inquieta, pulando como um dia- Pela manhã cedo de um dia sereno, esta- mas, apesar disso, não creio que mo con- brete: o pêlo liso e macio reluzia-lhe com um va D. Diogo em sua armada, em monte cedas; porque é um legado de tua mãe, a 3 reflexo avermelhado. selvoso e agreste, esperando um porco- rica-dona de Biscaia. Dirá agora alguém: "Era, por certo, o O barão, depois da saúde urbi et orbi feita montês, que, batido pelos caçadores, devia - E se eu te amasse mais que a minha demónio que entrou em casa de D. Diogo aos monteiros, esgotava um quírie comprido sair naquela assomada. mãe, porque não te cederia qualquer dos Lopes: O que lá não iria!" Pois sabei que não de saúdes particulares, e a cada nome uma Eis senão quando começa a ouvir cantar seus muitos legados? ia nada. taça. ao longe: era um lindo, lindo cantar. - Então, se queres ver-me sempre ao pé de Por anos, a dama e o cavaleiro viveram em Estava como cumpria a um rico-homem Alevantou os olhos para uma penha que ti, não jures que farás o que dizes, mas dá- boa paz e união. Dois argumentos vivos ilustre, que nada mais tinha que fazer neste lhe ficava fronteira: sobre ela estava assen- me disso a tua palavra. havia disso: Inigo Guerra e Dona Sol, enlevo mundo, senão dormir, beber, comer e caçar. tada uma formosa dama: era a dama quem -A la fé de cavaleiro, não darei uma; darei ambos de seu pai. E o alão cabeceava, como um abade velho cantava. milhentas palavras. Um dia de tarde, D. Diogo voltou de mon- em seu coro, e a podenga saltava. O porco fica desta vez livre e quite, porque - Pois sabe que para eu ser tua é preciso tear: trazia um javali grande, muito grande. A O senhor de Biscaia pegou então de um D. Diogo Lopes não corre, voa para o pe- esqueceres-te de uma cousa que a boa rica- mesa estava posta. Mandou conduzi-lo ao pedaço de osso com sua carne e medula e, nhasco. dona te ensinava em pequenino e que, aposento onde comia, para se regalar de ver atirando-o ao alão, gritou-lhe: - Quem sois vós, senhora tão gentil; quem estando para morrer, ainda te recordava. 4 5