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tt Arte Cinética Cyril Barret movimento (a palavra deriva do Mas nem toda arte que envolye movimento é *cinética”, no sentido preciso em que o termo é usado quando falamos de Arte Cinética, Desde os tempos mais antigos, os artistas interessae ram-se em descrever @ movimento —o movimento de homens € animais valos galopand, atletas correndo, ledes saltando sobre suas presas e passaros em vo. Por outras palavras, eles se interessaram pela representacio do movi- para ser mais exato, de objetos que se movem, Mas o artista cinéti co nio se preocupa em representaro movimento: est’ interessado no proprio ‘movimento como parte integrante da obra. Essa distingao entre movimento representada ¢ movimento real ndo € arte que envoly deradas ‘cinéticas’, nem todas as obras “cinéticas” se movimentam, No senti- do preciso em que o termo é usado, uma obra de Arte Cinética deve possuir outras qualidades especificas além de mover-se: 0 movimento deve produzi uma determinada espécie de efeito, de que trataremos logo. Por outro lado, lem ser produzidos pelo espectador, movimentando-se diante da obra ou pelo espectador que pega € manuseia a obra. Pode ser até 0 caso, como na Arte Op, de que nem a obra nem o espectadar se movam e, no en- tanto, o efeito ainda seja cinético, Mas isso é polémico, e examinarei a ques to em seu lugar adequado, Basta dizer aqui que uma obra de Arte Op, quer seja considerada um ramo da Arte Cinética, quer nao, nao representa movi- mento: di uma impressao de que realmente se movimenta. Assim, na Arte Cinética, acorre algum movimento real; na Arte Op, a pripria obra parece mo- ver-se; em representagdes de objetos moventes, somente o objeto representado parece mover-se. Essas distingdes podem ser expostas com maior clareza se considerar- mos a genese da Arte Cinética. Os manifestos futuristas continham o germe da ideia de Arte Cinética: Movimento ¢ luz destroem a materialidade dos corpos. 10! Manifesto fururista, Mas embora eles celebrassem a beleza do movimento em palavras, em_ sua arte 05 Futuristas pouco mais fizeram do que representi-lo pictoricamen- te. A tinica diferenga entre uma estampa esportiva e Cao na coleira, de B ou Dinamismo de um cidlista, de Boccioni, por exemple, é que a estampa cap- ta uma fase momentinea no movimento de um cavalo, ao passo que Balla e Boccioni apresentam-nos tum certo niimero de fases tal como poderiam apa~ recer, se sobrepostas em uma tinica chapa fotografica.” Al las futuristas, entretanto, representaram © movimento de ‘uma outra maneira mais indireta, Em vez de representar um objeto em mo- vimento, eles representaram um objeto tal como seria visto por um observa- dor em movimento: uma rua vista de um avio voando baixo ou de um carro em grande velocidade. Nisso, os futuristas estavam meramente desenvolven- do uma ideia que estava latente na obra de Cézanne e explicita no cubismo, a saber, a de representar um objeto tal como se apresenta quando observado dos pontos de vista de um observador que caminha a sua volta, e nao do pon- to de vista de um observador fixo. Mas isso € apenas uma representacdo de movimento. O proprio movimento nao entra diretamente na composicéo da obra. Nao é Arte Cinética no sentido técnico. nos anos que se seguiram imediatamente ao fim da Pri- se concretizou pela pri- |, Rodchenko, Gabo e Pevsner —estivesse trabalhando clara e convincente encontra-se no Manife Pevsner em agosto de 1920. No decorrer do m: criticaram o futu- eresse nu Russia) pelas de Cinética | tite 15, Conceitos da Arte Moderna | movimento." De} vi numa linguagem nao muito diferente da dos m: 2s tos futuristas, eles denunciaram a arte do passaco e proclamaram uma arte dindmica, a arte dos “ritmos cinéticos”, "Renunciamos ao erro egipcio multimilenar em arte, que considerou os ritmos estiticos os tinicos elemen- tos da arte pictorica, Afirmamos um novo elemento na arte pict6rica, os rit. mos cinéticos, como as formas bisicas do nosso sentimento de tempo re Gabo ampliaria essa declaragao trinta anos depois, quando escreveu: “A ese cultura construtiva é nio sé tridimensional; ela é tetradimensional, na medi- da em que estamos tentando inserir nela o elemento de tempo. Por tempo entendo movimento, ritmo: tanto 6 movimento real quanto 0 ilusdrio, que é percebido através do fluxo de linhas e formas na escultura ou na pintura. Em no em uma obra de arte é tao importante quanto o espa- 0, @ estrutura e a imagem.” O que Gabo ¢ Pevsner contemplavam era uma forma de escultura em que o movimento teria um lugar igual ao da estrutura, do espago e da ima- gem, mas nao seria lugar predominante. Nao pretendiam substituir a escul- tura tradicional por alguma espécie de balé mee: caracteristica essencial e distis Foi a massa que eles renunciaram. A engenhai monstrado que a forga dos corpos nao depende da massa munha disso, Mas 03 escultores ainda nio se tinham apercebido ou tirado gem disso. “Voces, escultores de todos os matizes ¢ tendéncias, ainda aderem ao velho preconceito de que o volume no pode ser separado da ‘massa. Mas podemos omar por exemple, quatro supers planate, partir ico. Nao renunciavam ws ou de uma grade de arames, como O resultado, porém, &estitico, embo- uma sugestdo de movimento possa ser transmitida opticamente pela torga0 das superficies e pela tensio dos arames. George Rickey descreveu adequa- ddamente esses tipos de construcio como “celebracses estiticas de eventos ci- néticos”. Um outro modo de produzir o mesmo efeito é pelo movimento. o éassim, basta pegar um pedaco de barbanté com wm peso atado a uma extremidade e fazé-lo girar rapidamente. Logo que ganha velocidade, comeca a parecer sélido, como se fosse um cone. O barbante em movimento delineia uma certa érea de espaco, cria uma forma ou imagem no assim as caracteristicas essenciais da escultura. Iss0 é, por as- sim dizer, um paradigma, um arquétipo da Arte Cinética, Uma obra de Arte Cinética mével cria uma forma no espaco pelo movimento, Nao & essencial que a forma pareca sélida; ¢ suficiente que o objeto em movimento delimite efi um cert Sreade xpageequeaguma forma cu imagem srjacano [A mais antiga obra a preencher esses requisitos foi a Construgio Cinéti- cade Gaho, de 1920 Consiste numa vara metilica vibratil,acionada por um ‘motor. Quando a vara vibra forma-se uma simples onda. E esguia e transhici- da como um vaso etéreo e frigil. Gabo esperava avangar desse humilde co- mego para formas cinéticas mais complexas, mas estava descontente com o obsticulo representado pelo motor como gerador de energia. Em 1922 fez um desenho, Projeto para uma construgdo cinética, que nunca che- goua ser concretizado. E, dai em diante, por falta de recursos técnicos para a execugao de seus projetos, passou a se dedicar as construgdes estiticas. $6 quase uma década depois é que foi produzida uma obra de Arte Ci- nética quase tao importante quanto a de Gabo. Foi a Maquina de luz ou Mo- dulador luz-espago de Lasel6 Moholy-Nagy. Embora Gabo nao parega ter-se apercebido do fato, a luz, desempenhou um papel importante na producio do efeito escultural em sua Construgio Cinética. Era o reflexo de luz prove- niente da superficie metilica que criava a impressio de Moholy- Nagy tinha plena consciéncia da importaneia da luz na c A luz nao age apenas sobre as partes metilicas de sua maquina; também the adiciona um novo elemento “escultural”, Assim como as pegas méveis deli- mitam e definem certas ireas de espaco, também a luz inunda e envolve todo ‘oespago que rodeia a miq ideia do uso “escultural” da luz ¢ todo o campo da Arte Cinética, ¢ € a que esta sendo mais vigorosamente ex- plorada hoje em dia No aspecto tedrico, Moholy-Nagy também deu uma importante contri- buigdo, Num manifesto publicado conjuntamente com Alfred Kemeny em 1922, ele analisa o efeito da Arte Cinética sobre o espectador. Diante de uma obra de Arte Cinética, 0 espectador deixa de ser um observacor passive ou receptivo: toma-se um parceiro ativo “com forgas que se desenvolvem por iniciativa propria’. Na Arte Cinética, a composigao nao se mostra toda de imediato, © espectador, por assim dizer, tem que recompor e construir a obra Nagy considerava suas obras como artefatos me- ramente experimentais ¢ demonstratives. Pre' im tempo em que © espec- tador participaria na formagio da prépria obra. Também nisso Moholy-Nagy prenunciou alguns dos desenvolvimentos mais recentes — a participagao do espectador, 6°) ‘© movimento da Arte Cinética, conforme é hoje conhecido, pode ser Jderado como datando nao de Gabo ou de Moholy-Nagy, mas de Ale- Calder. Este tiltimo resolveu o problema da forga motriz de um modo que cra simultaneamente simples, elegante ¢ bvio: Ider usou o movimen- todo ar. Assim, ler sua fonte de e' por si mesmo, Mas Mohol Te ma plenamente desenvolvida, consistiam em chapas de metal, Preto ¢ branco ou nas cores primérias- vermelho, amarclo e azul. As chapas eram suspensas de varetas ¢ articuladas de tal maneira que podiam movi ‘mentar-se livremente em qualquer diregio. Quando postos em movimento Por uma corrente de ar, os mébiles giram suavemente, em velocidades varia, veis, e estabelecem uma especie de contraponto de movimento, Mas, ember. ra 0 mobiles de Calder estejam de acordo com a concepgio de Gabo de escultura cinética, as ideias deste ultimo Parecem ter tido uma influéncia di- reta sobre cle. Calder chegow & Arte Cinética por meio da fabricagéo de brin. uedos, Seu uso de cores primirias pode ter sido inspirado em Mondrian e, em Mir6, as formas das chapas de metal ~e, na verdade, 0 pedprio esp tidico dos mébiles, Durante largo tempo, Calder foi o balhou com escultura cinetica, Ele foi olhado como alguém um tanto excens trico. A escultura cinética, afinal de contas, nao & pintura nem escultura como tradicionalmente entendidas. Parece faltur-the seriedade; o seu lugar apropriado,diriam algumas pessoas, ¢a loja de brinquedos. Mas depois da Sex gunda Guerra Mundial e, sobretudo, desde as anos 1950, a Arte Cinética pas- Sout atrair cada vez mais a atengio de artistas sérios. Seria fil, no entanto, fentar resumir tudo 0 que tem sido feito nos iltimos vinte anos. Portanto, Considerarei apenas as principais direcoes em que os artistas trabalharam e, Por comodiddade, agruparei suas obras em quatro titulos: |. Obras que envol, vem movimento real; 2. Obras estéticas que produzem scu efeito “cinético”™ elo movimento do espectador; 3. Obras envolvendo a projegio de lay, 4 Obras que requerem a participagio do espectador Conceitos da Arte Moderna ico artista de importancia que tra- 1. Obras que se movimentam ~ podem ser distinguidas entre 1920, a tecnalos uso de uma grande As obras que realmente se movimentam si pela forca motriz empregada. Desde os anos avangou suficientemente para possibilitar aos artistas 0 variedadle de maquinas acionadas pela energia elétrica Mas alguns ainda se apdiam em fontes naturais de energia, Kenneth Martin ¢ George Rickey, tal como Calder, usam o movimento do ar: Martin, para ob- ter um continuo movimento espiral ascendente de tiras metilicas eurviline. as; Rickey, a fim de produzir movimentos ritmicos contrastados com laminas altas &esguias que se movimentam para um ¢ outro lado, como se fossem grt, ma alta ondeada por uma brisa. Outros artistas empregam forgas naturais conjuntamente com energia clétrica. Takis usa o magnetisma. Seu Balé mag- nnética consiste numa grande bola branca de metal que, alternadamente ate da.e repelida por uma bobina magnética, é compelida a executar uma danea erratica em torno dela. Da es que usam um motor elétrice, alguns, como Pol Bi dlem a fonte energética. Outros, como Schéfler, Kriimer ¢ yam o como parte da br, Esta segunda slo ¢ esteticamente mal sotsfatéra, a medida em que o elemento de mistficacdo & rernovido, Mas até agora essas “miquinas” nfo tem sido totalmente satsfatbrias como obras de Arte Cinética, isto €, o movimento é feito para servira algum propio e no se apreseta como algo de interes inst eu como um “elemento scl enti aia explcao, As olras de Krier i, na rai use masa wag dads, rombando " struiu, ndo.com éxito total, al era da miquina e da propria ARTE ~ ele construiu, ndo com &x oe ne destrutived”~ e, ebora teen realizado un corto ei satisfatorias, elas se movimentam niimero de composiges méveis muito s , tras umn plano nice de que no expago (eomo se ura tela de Arp fose pos- ts em movimento). O principal ineeresse de uma obra de Bury & misteriosa vida com que ele dotou os movimentos imprevisiveis de um feixe de pregos, frames ou pequenos pinos de madei 2. Obras envolvendo movimento por parte do expectador - fm 1820, Maree! Duchamp demonstrou, por mio de sew Rott plage ve ques um disco plano pintado com cicuos concinticos¢ grado apart ad sire aparéncia de um objeto sélido, Por outras pulavras, um objeto movente pode passar por uma transformacao éptica tao radical que parece ser alp Tout diferente. Em certas condigdes, o mesmo el ito pode ser i "9 lo espectador movimentando-se cant de um abjeto As posibilidades artist cas desse fendmeno dptico tém sido exploradas por numerosos a 7 Jor exemplo, assim fez. em suas “estruturas vibratérias’ © “metamorfose: Dizzele."O que sempre me interessou foi 0 transformagio de elementos, 2 desatralzag de substincia sla. Em certamedids, iso nteresou ser aon artistas, ma ev quer incoxpono proesn de ransfomagdo ma pro fra obra, Assim, enquanto a observamos, a linha exp tema por jas tics em vibrato puso material emer Sot eliza es bt to colocande alum objeto ~ uma estrtara de areme, pr exemp= dante de um fundo achamalotado. Quando 0 espectador se Let ie a ae : obra, 0 fundo achamalotad fragments a Tinhs da erutura de was de modo que se apresenta como uma série de pequenos pontos flutuan ae JJementos so is impressionante na obra de Soto é que os seus é misterioso e complexo, “Separadamente”, como diz Soto, “essas co 8 muito estranho acontece... todo um mundo de novos lo pela com de elementos s Tal como Tunner e os impressi ‘bones dé rirte Moderna consiste em dissolver a forma em cor ¢ luz, em realizar, declarou ele, “um mundo abstrato de relagSes puras,o qual tem uma existéncia diferente do mun- do das coisus... Meu objetivo ¢ libertar o material até que se torne tio quanto a miisica - embora eu fale de miisica nao no sentido de m no sentido de relagdes puras’."" Uma peca de muisica nao € uma “coisa” ou mesmo uma combinagao de coisas: ¢ o relacianamento entre sons, Do mes- mo modo, uma obra de Soto no é uma coisa, um objeto, mas uma relacio de elementos épticos que resulta do movimento: "é puramente éptica, sem substncia Fisica”. Tal como a miisica, ela canta Embora os efeitos visados por Soto tenham tanto em comum com os de tum pintor ou com os de um escultor, suas obras so tridimensionais. As obras de outros artistas, como Vasarely, Ag: mais pictéri- cas, Em cada caso, as formas se alteram quando o espectador passa defronte delas, como se assistisse a um filme abstrato. Por vezes, como no caso das fisi= cromias de Cruz-Diez, tanto as cores como as formas muclam; podem ir de de perspex ou de tede outras, Asis, gum outro material semelhante, ¢ calocando umas i fren- ado, obtém seus efeitos—usualmente uma espécie ichamalotada ~ por ilusio éptica, colocando uma folha perfurada diante de um fundo de pontos correspondentes no ta is perfuragdes. Embora essas obras ganhem em interesse por seus padroes de molde de se mutantes, elas nfio dependem do movimento da mesma forma como as de como se estivéssemos diante de um relevo pintado, Entretanto, subsiste 0 fato de que, quando nos movimentamos, a composi¢io se altera, de fato, de um modo inteiramente distinto de um relevo “estitico” Nesse ponto cumpre dizer uma palavra sobre a Arte Op, qu foi assinalado, & classificada as vezes como Arte Cinética, Ela € ass cada porque di uma forte impressie de movimento, A obra parece expan- diese ¢ contrairse, avanar e recuar; ha partes que parecem gira, dar saltos na tela, aparecer e desaparecer etc. Entretanto, nenkum movimento real esti wolvido, quer por parte da obra, quer por parte de espectador. Por conse- ite, esti Faltando uma caracteristica essencial da Arte Cinética, tal como -oncebida por Gabo e Pevsner: a construgio de alguma forma ou imagem ago pelo movimento. O espaco onde as formas parecem mover-se é to- mente ilusério, ao contrério do espago onde funcionam as obras de Soto como ja jue & em parte ilusério e em parte real. Por conseguinte, hi ponders gu estio fazendo € 0 que os artistas op fazem, que os dois campos se confun- dem, Mas isso nao € verdade, Embora todos possam produzir seus efeitos por io, 0s artistas op geram a impressio de movimento por meio de iu- \éticos fazem exatamente o oposto: eles pro- duzem a ilusdo por meio de movimento, Os artistas op confiam inteiramente em meios pict6ricos: 0 jogo entre cores ¢ linhas. Os artistas cinéticos, por ou- tro lado, apéiam-se no movimento como elemento de transformagio, Dife- rem, pois, no método € na intencio. Chamé-los a todos artistas cinéticos obscureceria importantes diferengas existentes entre eles. meio d sfio, a0 paso que os artistas 3. Obras envolvendo luz O uso da luz pode ser dividido, de um modo geral no piatirio no que chamarei o escultural, ou seja, luz projetada no espaco. le em que ela é usada para de- Areas de espao. Tres coisas estio geralmente envolvidas aqui: fontelu- minosa, of cestiver focalizada ~e supe! r partes da obra ou, se se tratar de tum espago fechado, as paredes circundantes, Esse uso da luz tem efeito de atrairo espectador para érbita da prépria obra. Cria um ambiente artisti- co. Mas 0 foco da atengao pode variar. Na obra de Nicholas Schiffer, por ‘exemplo, a atengio mais dirigida para as superficies iluminadas das partes de metal polido da obra do que para o movimento da huz pelas paredes. Em certos trabalhos de Von Graevnitz, Piene ¢ Le Parc, o movimento da luz & {que constitui o principal foco de interesse. A ambigdo de Piene & produzir monumentais projegdes luminosas ao ar livre. “O meu maior sonho”, diz ele, *e projetar hz no vasto céu notumno, sondar 0 universo quando a luz vai ao meu encontro."" © uso do néon, por outro lado, tal como & empregado por Morellet, por exemplo, habilita o artista a mapear areas do espago por meio da prépria fonte luminosa, isto é, sem projegio. De certo modo, a luz é o meio mais efetivo de apresentagao visual de ritmos e padrBes de movimento. 0 mais “desmaterializado” de todos 05 ele- mentos.a disposigio do artista, O néon é particularmente adequado para esse fim. Como as obras de Ga Rossi ¢ Don Mason demonstram, € possivel produzir as mudangas de ritmo e tom mais sutis, mediante a iluminagao alea- toria de tubos de néon, Ondas de luz fluem e refluem no proprio nicleo de cada tubo, como se, momentaneamente, ganhasse vida ¢ logo morresse tran- a ente, Mas a luz, no ¢ apenas “desmaterializada” em si mesma; ela também tem um efeito "desmaterializador’ sobre os objetos com que entra em conta- to, Quando o espectador se movimenta diante de um Relevo fuminoso de refletida pelas tiras de metal polido comega tremulando e vi- Airte Cinética Canceitos da Arte Moderna Tg }o de que se esta olhando para um turbilhao de galixias ou um rede- moinho de poeira de prata. Em Reflexos liguidas, de Liliane Lijn, a luz é cap- tada por gotas de agua que funcionam como lentes, ampliando, refletindo projetando a propria luz. Os elementos mais simples podem set transforma: dos, de maneira incrivel, por meio da luz em movimento. Todas essas obras envolvem 0 movimento da guinte, incluem-se no conceito de Arte Cinética ja tras obras, como as de Malina ¢ Healey, que sio mais dificeis de classificar desse modo. A luz se move mas ela no se move no espago. E projetada numa la por tras. E isso o que entendo por uso pictérico da luz: pintar com luz," Em principio, esse uso da luz nao é diferente do seu emprego no cinema, Mas, se quisermos ampliar o termo Arte Cinética para incluir filmes — pelo menos, filmes abstratos como os feitos por Eggling nos anos 1920 -, correre- Mos o risco de confundir dois conceitos distintos. Pode-se argumentar, Porém, que, ao contririo do filme e da televisio, é possivel discernir pelo me. znos tenuemente as partes em movimento que produzem as imagens na tela de uma obra de Malina ou Healey. Logo, elas envolvem movimento real no espago e esto, por conseguinte, de acordo com a definicao, Do mesmo modo, podem ser também considerados objetos cinéticos as Videos-rotores de Peter Sedgley, nos quais a luz. ultravioleta é projetada em discos giratérios com cir. los concéntricos de tinta fluorescente de cores variadas. iz nO espago e, por conse- ito. Mas existem on- 4. Obras envolvendo a participagao do espectador ~ Num manifesto pu- blicado em 1963, o Groupe de Recherche d'Art Visuel, ao qual pertencem Le Parc, Morellet e Garcia-Rossi, lé-se: “Desejamos colocar o espectador numa si em que ele se inicia € transforma. Desejamos desenvolver nele uma capacidade crescente de percepgio e de agio.”" E, falando acerca de Labyrinthe, eles afirmaram: "A obra esta deliberadamente orientada para a ico da distincia entre o espectador e a obra de arte. Quando essa dis- tancia desaparece, torna-se maior o interesse na prépria obra e menor a im- portincia da personalidade do autor.” " Tradicionalmente, o espectador tem desempenhado um papel mais ou menos (embora nao totalmente) passivo. Ele tem admirado obras de arte como produto da imaginagio de outrem, como algo com que se defronta e que é distinto dele proprio, Sugere-se agora que ele pode entrar num relacionamento mais intimo com a obra, tornan- do-se um parceiro em sua produgio, A participacio do espectador pode ir desde a ativi tada de por uma obra em movimento e de fazé-la parar Nesse aspecto, Lygia Clark oferece-nos um exemplo particularmente bom com os Bichos Essas obras sio feitas de Folhas articulaclas de metal que podem ser ma- ipuladas de modo a assuimir varias formas. Cada parte da obra esta Funcio- nalmente relacionada com todas as outras, como num organismo, e 0s movimentos das partes obedecem a uma sequéncia definida, A Fe Ln vida propria: nao se fixaré em qualquer das posigdes que o manipul — set, Asi, 20 manipula a obra, ele ests consciente de que exit uma intencionalidade dentro dela, Como disse Lygia Clark, estabelece-se um novo relacionamento entre © espectador e a obra. Esse novo sleioemers € posit pelo movimento independente da obra er exports ato do nando. fs também altera o papel do acta, Ete ona fees obra icabada para apresentar um conjunt ssibilidades, vanproetura uma dios pert daqual obra pode dexvaleras © 130 ds hu feree ainda mstores possibilidads i participago doe pestador,Conforme je diss, 0 espectador ingress na propria aba eta Cercao, Sua atengio cath totalmente coneentrad na ecurdio cicundants 6 alu asthe os sentidos. Uma pessoa adquire essa concentraio da ldadesno cinema e no teatro. Mas num ambiente de objets del cin tea, como 0 Labyrinthedo Groupe de Recherche, as percepes do expect dor sio ainda mais agugadas pelo fato de que ele pode no s6 ativar as obras, mas também andar dentro delas. elemento de acaso. A repetigdo exata de movimento, por muito complex ue seja, torna-se mondtona. Mas © movimento completamente aleatério também tem que ser evitado, pois seria sem propésito nem forma: seria si Plesmente atc, Deve ser exereidoalgum controle Io &geralmenteo do pela descoberta de algum relacionamento entre os elementos na obra que s mantém constants no decurso de tod e qualquer variagio ce movimen- to. A quantidade de maneiras como esse relacionamento & percebido pode ser infinita, Pode ser uma questao de acaso a espécie de percepgio que ocorre num dado momento. Mas como existem relagées subjacentes constantes, 0 moe Tented neste capitulo formecer uma defini do temo “Ate Cindi A semelhanga do que ocorre com tantos termos artisticos, como is- tho, expressionismo, arte abstratae Arte Pop, nenhuma defn frm pode ser dada. E ineviivel que ela seja asada de mancirs as mais diversas pode ser desconcestante para os nio iniciados, mas ndo tem por que resultar ca ailse dos Bich, ce Lygin Clark, no sj inconeta, mite proble= a lSsruna baa om unm apecag da Are Cine, Para io rusio, bata obser mam coms propastas da Arte Cine mo, movimento especifica~ tema, veja-se Ronaldo Brito, Neooomeretismo, v brasiteira, Rio, "Temas e Debates n° 4, FUNAR' Conceitos da Arte Moderna ‘em grande confusdo, dlesde que certas distingdes sejam feitas. Procurei indi- car em que consistem essas distingdes. Ha obras que envalvem movimento no espago, quer por parte da prépria obra, quer por parte do espectador, quer este manipule a obra ou nio, ¢ isso deve envolver id transformagao dptica dos elementos de que a obra consiste, que eu chamo o sentido estrito, ou seja, 0 sentido em que era entendido pe~ los primeiros te6ricos. Depois, temos as obras que dio uma impressio de jento sem que esteja envolvido qualquer movimento real (Arte Op); © envolyem movimento real, embora bidimensional = relevos mé- es ~ com ou sem uma ilusio de movimento no espago; ¢, finalmen- te, representagSes estiticas de movimento, como nas pinturas futuristas. Se alguém quiser chamar a qualquer ou a todas essas modalidades Arte Cinéti- cca, tudo bem, mas pelo menos as distingdes devem ser preservadas. " que ganhou destaque no fi da de 1950 e comeco da de 1960, ¢ atingiu o seu climax na posicio Lumiére et Mouvement em Paris, 1967, teve seu declinio como movimento de interesse central }, mais ou me da exposicdo na Tate Gallery; ¢, embora continue como m arte ambiental ¢ outras manifestagdes de varios tipos, 1970 Notas 1. Joshua C. Taylor, 134. 2. Ck Muybridge, 880. 3. O Mobile de Duchamp de 1913 — us invertida colocada sobre um banco ~ nao era cinético na acepgio técnica, embora pudesse ser movimen- tado, Nao pretendia sequer ser olhado como obra de arte ¢ certamente, na época, nao tinha a intengio de apresentar 0 movimento como objeto de con- futuristas, Balla e Depero, fizeram em 1915 objetos spectivamen- vendo 0 segundo © que talvez. tenha sido o primeiro uso de um motor -, que so, pelo menos, precursores da Arte Cini Cinéticos na acepgo mais precisa. Mas hi tanta pesquisa a dda que é impossivel formular enunciados categoricos a resp 6. “Russia and Constructivism’, em Gabo, p.160. 7. The Realistic Man sto, pact x0 obra de Arte Cinética 0 modelo de Tatlin para o Mon 9-20, Embora as suas pecas 31 mentem, 0 movimento delas -ernivel, porquanto requerem un wu um dia para completar suas revolugdes 10 de novembro-dezembro de 1965, p.13. LL. Zero One. 12. O uso pictérico da luz tem uma longa historia, No século Xvi, Castel truiu um “cravo ocular” que pretendia fornecer o equivalente visual da: ca, Muitos experimentos nessa mesma linha foe fede desde. ‘criabin compés uma pega de musica para acompanhamento com co: ian de core mats bem sucedido foi constulde por Thomas Wil 9. 19, Ciao em Image, inverno de 1966, p21, em tradugio de Reg Gad Stephen Bann 14, Ibid, 15. Desde que este artigo 10, em 1967, modifiquei meus pontos de Para uma anilise mais detalhada desse ponto, ver 0 meu Op Art, Lo 1970, p.123-24 e 145.

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