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FOTOGRAFIA E PINTURA

JOSÉ ROSÁRIO - Pequeno congado

Óleo sobre tela - 35 x 22 - 2009

Ao lado, fotografia utilizada como referência.

Desde que a fotografia foi aperfeiçoada, em 1841, e nos apresentada na forma como a
conhecemos hoje, muita coisa mudou no mundo das artes. É bem provável que o advento da
fotografia decretasse o final da arte acadêmica propriamente dita, uma vez que para retratar
algo tal qual é, muitos instrumentos desenvolvidos ao longo de todos esses anos, prestassem
para isso com mais precisão. A arte acadêmica não morreu, a fotografia ganhou movimento e
o nascer do cinema trouxe ainda infinitas possibilidades para fazer e expressar arte. Com esses
dois fortes aliados, a liberdade teve que ampliar seu significado.

Fotografia de referência
CLÁUDIO VINÍCIUS - Volta de estrada

Óleo sobre tela - 70 x 100 - Coleção particular

Os conceitos mudaram bastante, e isso não há como negar. A representação de algo extraído
do natural (paisagens, retratos, arranjos e construções) passou a adotar a expressão e as
sensações como requisitos muito mais importantes do que a representação fiel daquilo que se
vê. Interpretando aquilo que está diante de si, dentro da sua maneira de ver, o artista
reproduz sensações exclusivamente suas, e por isso mesmo incomparáveis por qualquer efeito
fotográfico.

Fotografia do fuzilamento de Maximiliano, Imperador do México.


EDOUARD MANET - A Guerra Civil

Aguada e aquarela - 46 x 32,5 - 1871

Museu de Belas Artes, Budapeste

EDOUARD MANET - Execução do Imperador Maximiliano

Óleo sobre tela - 252 x 305 - 1867

Mannheim, Stadtische Kunsthalle


Na obra acima, executada por Edouard Manet, nota-se

claramente a influência da fotografia feita durante o

fuzilamento do Imperador Maximiliano.

Uma referência fotográfica não precisa ser

necessariamente a reprodução fiel da mesma.

Um estudo em aguada mostra também

o quanto o artista explora o mesmo tema,

em ocasiões diferentes.

Embora seja um tema em vários pontos polêmico, a fotografia como referência para a
produção artística tem seus defensores, mas também seus fortes adversários. Esses últimos
alegam que a cópia fiel de uma foto, nada mais é que uma transposição de imagens, ação
isenta da menor criação artística. Seus defensores, em contrapartida, dizem que a fotografia é
apenas um grande aliado tecnológico, que veio incrementar recursos no processo produtivo de
uma obra. Alegam ainda que grandes nomes como Picasso, Dégas, Manet, Courbet, Dali,
Delacroix e muitos outros, incorporaram tais “auxílios” em suas obras, e que elas não
diminuíram em nada, o respeito e o valor que são dados aos seus trabalhos.

Beira do Piracicaba - fotografia.


JOSÉ RICARDO - Beira do Piracicaba

Óleo sobre tela - 70 x 110

Acervo José Rosário

Somente os artistas conscientes sabem usar das vantagens desse recurso, seja para a
complementação de esboços ou no arquivamento de várias informações que venham a
enriquecer o processo criativo na produção de uma obra. Eles também são sabedores que a
comodidade de uma informação fotográfica tende sempre a gerar inseguranças no ato do
desenho, e que muitos venham a criar laços de dependência muito grandes com essas
referências. A pintura em plein air, ou mesmo a prática de esboços feitos do natural, são bons
desafios para saber em que grau de dependência o artista está, com relação ao uso de fotos
em seu trabalho. Nesse momento não há recurso intermediário entre o artista e o ambiente
que lhe serve de referência.

Lavadeira - fotografia
EDGAR WALTER - Lavadeira

Óleo sobre tela

Observe como a fotografia de referência foi

alterada em função da composição.

Elementos foram subtraídos e outros

adicionados para que a obra ganhasse o

ponto de interesse na figura da lavadeira.

A fotografia capta momentos de raras luzes, que se perdem rapidamente numa abordagem ao
ar livre. Também é muito útil para congelar movimentos, impossíveis de se fixar num outro
método. Mas a maior vantagem na referência com fotos, é que se torna possível reunir várias
delas para formar uma única cena, atividade aliás, das mais usadas pela maioria dos artistas, e
que obriga o processo criativo em um grau diferenciado dele.
À esquerda: Estrada do velho jacarandá, Dionísio - fotografia de referência

À direita: VINÍCIUS SILVA - Estrada do velho jacarandá (estudo)

Óleo sobre tela, 18 x 24 - 2011

VINÍCIUS SILVA - Estrada do velho jacarandá

Óleo sobre tela - 50 x 70 - 2011

Acervo de José Rosário

A tecnologia tem sido muito generosa para a captação cada vez mais fiel da cena retratada,
deixando as câmeras cada vez mais eficientes e muito mais fáceis de serem utilizadas. Mas,
essa é uma tentação que deve ser vista com reservas. Não se esqueça que uma câmera, por
mais evoluída que seja, é apenas uma máquina. É você, como artista, que decide qual efeito
realçar em sua cena, que imagem acrescentar ou excluir para que a obra caminhe o máximo
possível dentro da sua intenção. Câmeras, por mais reguladas que estejam, ainda tendem a
simplificar as tonalidades, muitas vezes deixando as áreas de sombras muito escuras, ou
também realçam mais algumas cores que outras. Quando você comparar a foto com a cena ao
vivo, verá quantas sutis e preciosas diferenças se encontram nas duas.
Fotografia de referência

THEODORE ROBINSON - Duas em um barco

Óleo sobre cartão - 23,5 x 34,8

The Phillips Collection, Washington

Mesmo artistas tão experientes, aplicam recursos para

melhor utilizar sua referência fotográfica. Caso de

Theodore Robinson, quadriculando imagem de

referência, logo acima.


Há também muitos outros recursos que facilitam a vida do artista, no que diz respeito a
ampliação da fotografia usada como referência para pintura. Alguns fazem uso de
quadriculados, outros usam antigos instrumentos como o pantógrafo e ainda há pessoas que
projetam tais fotos nas telas, por meio de projetores, para copiarem seus contornos. São
processos que agilizam o fazer, mas que distanciam bastante da real intenção de produzir arte,
ou seja, representar aquilo que é a sua visão única e intransponível de um tema.

SCOTT PRIOR - Fotografia de referência

SCOTT PRIOR - Estudo à lápis - 1991


SCOTT PRIOR - Toalhas e luz do sol

Óleo sobre tela - 61 x 61

De posse da escolha de uma fotografia para servir como referência para seu trabalho, é
preciso que você faça uma análise criteriosa para decidir sobre o que deve ser acrescentado,
excluído ou modificado, para que esta referência produza bons resultados. Por isso, reproduzir
uma foto que você mesmo tenha feito, seja bem mais fácil para compor seu trabalho, do que
se orientar por uma foto realizada por outra pessoa. Quando você mesmo fotografa, aquele
tema já havia lhe despertado algum interesse, tal cena já formava em sua mente, um esboço
de uma obra.

Fotografia de referência
TÚLIO DIAS - Estrada do interior

Óleo sobre tela - 100 x 150

Toda composição passa por criteriosos processos para se transformar numa obra
tecnicamente correta e artisticamente agradável de se ver. Os conceitos iniciais para qualquer
composição, também devem ser levados em consideração na hora de utilizar a foto como
referência. Profundidade, proporção, localização do ponto de interesse principal, distribuição
de cores, correta representação de fontes de luz e volumes. Todos esses itens podem não
estar em conformidade na foto que você dispõe a desenhar ou pintar, portanto não hesite
nenhum momento em fazer as correções que sejam necessárias.

As duas referências acima serviram para a

conclusão da obra abaixo.

A paisagem foi idealizada em função da composição.


JOSÉ ROSÁRIO - Matando a sede

Óleo sobre tela - 60 x 100 - 2011

Combinar fotos para compor uma cena possui alguns segredos que não podem ser
desprezados. Verifique se as fotos que irá combinar tenham a mesma fonte de luz, proporções
adequadas e se também apresentam riquezas de detalhes compatíveis entre si. No item
perspectiva, fique atento se o ângulo de visão nas duas referências é o mesmo, do contrário,
poderá gerar grotescos erros de profundidade. A proporção é outro item de extrema
importância, e quando incluem figuras humanas o cuidado deve ser ainda maior. Compare a
proporção das figuras humanas com construções à sua volta, bem como a arbustos e animais,
caso existam.

PAULO DE CARVALHO - Foto-montagem


O artista carioca Paulo de Carvalho lançou

mão de vários recursos até concluir sua obra.

Na foto superior, foto-montagem feita por

ele mesmo no local escolhido. Nas duas imagens

acima, um quadro de Antonin Fanart (esquerda)

serviu como referência para as figuras que ele

também representou. De Thomas Hill (direita),

o efeito dramático causado pelas gradações de

luz e sombra também foram sua influência.

O resultado é uma tela panorâmica que

ambienta bem uma cena do século XIX.

PAULO DE CARVALHO - Vista do alto da serra, Petrópolis

Óleo sobre tela - 10 x 40

Coleção particular

Grandes visões panorâmicas, que não são conseguidas, mesmo pelas máquinas mais
avançadas, podem ser compostas pela união de duas ou mais fotos. Mais uma vez, deve-se
ficar atento à diferenças exageradas com relação à mudança de luz e perspectiva. Quando já
tiver em mente fotografar para unir cenas numa mesma panorâmica, coloque a máquina num
ponto fixo, de preferência um tripé, para que não ocorram eventuais problemas na montagem.
Não custa relembrar que selecionar apenas os elementos mais atraentes de suas “fotos-
esboços” ainda é uma das regras mais sensatas a seguir.

Fotografia de referência

FERDINAND PETRIE - Pôr de sol

Aquarela

De posse de todas essas informações, use a fotografia como uma referência a seu favor.
Mesmo diante de tantos recursos, a emoção que você consegue imprimir em seu trabalho é
muito mais importante que uma eficiente reprodução que nada transmita.

PETER HENRY EMERSON - Preparando a armadilha

Fotografia

THOMAS FREDERICK GOODALL - A armadilha

Óleo sobre tela - 83,8 X 127

Walker Art Gallery, Liverpool

http://joserosarioart.blogspot.com/2011/06/fotografia-e-pintura.html

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