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DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA

Juarez Cleto Côrtes Júnior1 (CEUNSP)

RESUMO
O artigo analisa o instituto de Direito Penal que suspende a execução da pena
privativa da liberdade, mediante o preenchimento de alguns requisitos e a imposição de
algumas medidas a serem observadas pelo beneficiado.

Palavras-Chave: Direito Penal - sursis - suspensão condicional da pena.

Introdução

A suspensão condicional da pena está prevista no Código Penal vigente a partir do artigo
77, trata-se de um instituto de política criminal que busca suspender a execução da pena privativa
de liberdade, desde que preenchidos alguns requisitos legais. Não existe consenso doutrinário
quanto à natureza jurídica do instituto, alguns autores entendem se tratar de uma medida de
política criminal que evita a aplicação da pena privativa de liberdade, esta é a posição de que
somos signatários. Nesse mesmo sentido: Ministro Marco Aurélio: “O instituto do sursis
consubstancia execução mitigada da pena” – HC 77.724-3-SP, 05.08.1998, DJU 12.08.1998, p. 3.
Outros estudiosos do Direito o vêem como uma pena propriamente dita, não consentimos com tal
posição, pois as penas estão claramente enumeradas no artigo 32, do Código Penal e a suspensão
se destina justamente a evitar a aplicação de uma das penas, a privativa de liberdade. Há outra
corrente de pensadores que entendem ser um benefício penal concedido ao réu, no entanto, não
podemos nos olvidar que o sursis traz sempre consigo condições obrigatórias a serem cumpridas
pelo seu destinatário, não havendo, portanto, que se falar em benefício.

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O autor escreveu este artigo quando era discente do 10º semestre do Curso de Direito da Faculdade de
Direito de Salto do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio, em 2006.
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Sursis – Conceito, aspectos históricos e modalidades

Como dissemos, o sursis é um instrumento de política criminal que viabiliza a


possibilidade de suspender a execução da pena privativa de liberdade mediante o preenchimento
de requisitos legais e a imposição de condições.
O sursis surgiu no Brasil através do Decreto 4.577, de 5 de setembro de 1922 e hoje
encontra-se positivado no próprio Código Penal.
Atualmente existem duas modalidade de sursis: o simples, que impõe ao beneficiado a
obrigação de prestar serviços à comunidade ou limitações de fim de semana; e o especial, através
do qual o beneficiado fica obrigado à se abster de freqüentar determinados lugares, fica proibido
de sair da comarca onde reside, sem prévia autorização do juiz ou deve comparecer mensalmente
ao juízo para informá-lo acerca das atividades que está desempenhando. O primeiro é o mais
rigoroso, devendo ser aplicado quando as condições pessoais do réu e/ou as circunstâncias do
crime exigirem maior severidade na aplicação da medida. Nesse sentido: “Aplicação na
modalidade especial – Não cabimento – Receptação – Crime de notória gravidade – Decisão
reformada para aplicação na modalidade simples – Imposição tão somente de prestação de
serviços à comunidade” (TACRIM/SP, RT 719/460). Há entendimento majoritário de que as
condições a serem impostas previstas para o sursis simples e especial não devem ser aplicadas de
forma cumulativa e sim de forma isolada, isto é, ou se aplica restrições do sursis simples ou do
sursis especial. Estas vêm previstas no artigo 78, § 2º. Nesse diapasão: TACRIM/SP, RT
671/341; TJSP, Ap. 145.287-3, São Paulo, 4ª C., rel. Bittencourt Rodrigues, 19.06.1995, v.u.
Tanto no sursis simples quanto no especial a pena ficará suspensa de 2 a 4 anos. A doutrina faz
menção ao sursis etário e ao humanitário, o primeiro é destinado aos maiores de 70 anos
condenados à pena privativa de liberdade não superior a 4 anos; o segundo, também denominado
profiláctico é reservado à pessoa enferma, desde que devidamente justificado, podendo a pena ser
de até quatro anos, nesses casos a suspensão dá pena vai de 4 a 6 anos. A fundamentação do
sursis humanitário é o bom senso em se admitir que a pessoa gravemente enferma precisa de uma
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forma mais adequada para se tratar. A lei 9.605/98 (Lei Ambiental) admite sursis para penas de
até 3 anos para qualquer condenado.

Requisitos

O primeiro requisito a ser preenchido é de cunho objetivo que exige seja o réu condenado
à pena privativa de liberdade não superior a dois anos. Os demais requisitos são de caráter
subjetivo e são os seguintes:
a-) não ser o réu reincidente em crime doloso;
b-) culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos e
circunstâncias do crime recomendando a concessão do sursis.

Direito do réu ou Faculdade do Juiz

Não existe um consenso quanto à aplicação da suspensão condicional da pena no que


tange a ser um direito do réu e, portanto, o juiz estaria obrigado a aplicá-la sempre ou ser uma
faculdade do juiz, aplicando quando entender conveniente. Posicionamo-nos no sentido de que
cabe ao juiz de acordo com seu convencimento diante da instrução criminal verificar a
possibilidade de aplicação da medida, no entanto, sempre que presentes todos os requisitos para
sua concessão trata-se de um direito do réu.
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Sursis e Concurso de Crimes

O sursis pode ser aplicado mesmo nos casos de concurso de crimes, desde que a pena
aplicada não seja superior a dois anos. Imaginemos um indivíduo que é condenado pela prática de
quatro crimes, a cada crime foi imposta pena de cinco meses, totalizando 20 meses de detenção,
nesse caso pode ser aplicado o sursis.

Circunstâncias especiais que não impedem a concessão do sursis

Há circunstâncias especiais que não impedem seja concedido o sursis, vejamos quais são:
A condenação anterior à pena de multa, conforme dispõe o artigo 77, § 1º, do CP, assim
também é o entendimento do Supremo Tribunal Federal através da edição da súmula 499; ser o
réu reincidente em crime culposo, bastando que seja culposo apenas um dos delitos, ou o anterior
ou o posterior; prescrição da pretensão punitiva do crime anterior; condenação anterior pela
prática de contravenção, tendo em vista que não gera nem reincidência; perdão judicial
anteriormente concedido, pois também não gera reincidência; réu foragido ou revel, desde que o
réu compareça na audiência admonitória.

Circunstâncias especiais que impedem a concessão do sursis

Em primeiro lugar a falta do preenchimento dos requisitos do artigo 77, do CP, já implica
a não concessão da medida, mas além desse caso, existem outras situações que impedem o
deferimento do sursis. Vejamos:
A prescrição da pretensão executória da condenação anterior; condenação anterior
irrecorrível, no exterior, eis que gera reincidência; aplicação de medida de segurança.
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Sursis e indulto

Não existe consenso na doutrina, tal falta se reflete em nossa jurisprudência. Uma parte
entende que não há compatibilidade, eis que o indulto se destina a condenados que cumprem
pena em regime carcerário, tanto assim que os decretos de indulto fazem menção ao bom
comportamento carcerário, portanto, quem está em liberdade concedida mediante sursis não
necessita do indulto. Outra parte dos estudiosos entende que existe compatibilidade, sob a
justificativa de que o indulto se aplica a condenados em cumprimento de pena e o sursis é uma
forma alternativa de se aplicar a pena. A melhor posição, a qual somos signatários é a segunda,
inclusive grande parte dos decretos de indulto atualmente têm trazido a previsão expressa da
compatibilidade com o sursis. Nesse sentido: JTJ 192/320; TACRIM/SP, RT 694/328; TJSP, Ag.
215.317-3, Presidente Venceslau, 2ª C., rel. Silva Pinto, 25.11.1996, v.u.

Reincidência, multa e sursis

De acordo com a Súmula 499 do STF a condenação à pena de multa não impede a
concessão do sursis. Vejamos seu conteúdo: “Não obsta à concessão do sursis condenação
anterior à pena de multa”. Portanto, mesmo quando houve condenação à pena de multa, pode ser
concedido o sursis, ainda que reincidente, aliás, se assim não fosse, não teria sentido a edição
dessa súmula, pois quando não é reincidente a aplicação do sursis é plena, desde que preenchidos
seus requisitos é claro.

Possibilidade de impor outras condições além das prevista na lei

Pode o juiz submeter o beneficiado a outras restrições não previstas pelo legislador.
Imaginemos um condenado por ter feito vítima em acidente de trânsito, nesse caso o juiz poderia
obrigá-lo a freqüentar um curso de educação de trânsito, enfim algo que faça com que venha a
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ajudá-lo (o beneficiado) a evitar a prática dessa conduta novamente. Nesse sentido é o artigo 79,
do CP, que confere essa permissão ao julgador.

Revogação do Sursis

O legislador tratou da revogação em único artigo do Código Penal, distinguindo casos em


que obrigatoriamente o sursis tem que ser revogado e casos em que a medida pode ser revogada.
São situações de revogação obrigatória se no curso do prazo o beneficiado:
a-) é condenado em sentença irrecorrível pela prática de crime doloso. A lei fala apenas em
condenação por crime doloso, tal condenação pode ser também à pena de multa;
b-) tendo condições, não efetua o adimplemento da pena de multa ou não repara o dano, sem
motivo justificado; Alguns defendem a impossibilidade de revogação do sursis pelo não
pagamento da multa, porque passou a ser considerada uma dívida de valor devendo se sujeitar à
aplicação da Lei 6.830/80. No entanto, a concessão do sursis não é uma sanção pecuniária, sendo
assim, caso o condenado seja solvente e tenha frustrado o pagamento da multa, tem sim contra si
motivos para ver cassado o benefício. Nesse sentido é também o entendimento do eminente
Guilherme de Souza Nucci;
c-) descumpre as condições do sursis simples, previstas no artigo 78, §º1, do CP
Se acontecer do sentenciado não comparecer a audiência admonitória o sursis ficará sem
efeito por disposição do artigo 160, da LEP.
A revogação ficará a critério do juiz quando o condenado deixar de cumprir qualquer
outra condição imposta, ou seja, qualquer das condições do sursis especial, ou for condenado
irrecorrivelmente por contravenção ou crime culposo a pena restritiva de direitos ou privativa de
liberdade.
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Prorrogação do período de prova

Sempre que o beneficiado estiver sendo processado por um outro crime ou contravenção
prorrogar-se-á o prazo da suspensão até o julgamento definitivo. Trata-se de prorrogação
automática, uma vez que o beneficiado sofra contra si novo processo, portanto, exigindo-se pelo
menos haja sido recebida a denúncia.

Cumprimento das Condições e extinção da pena

Quando expirar o prazo da suspensão condicional sem que tenha ocorrido a sua
revogação, dar-se-á a extinção da pena privativa de liberdade.
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Conclusão

Diante do exposto, concluímos que a suspensão condicional da pena é um instituto de


política criminal que atua de forma eficiente na ressocialização de indivíduos, evitando que
muitas pessoas agentes de crimes culposos, cidadãos de boa índole que não são marginais tenham
sua liberdade restringida entrando em contato direto com criminosos nos presídios, ocasião em
que terão influência para enveredar-se para o mundo do crime. Além disso, o sursis também
auxilia o Estado no que diz respeito à atual falta de espaço físico para alocar com dignidade os
apenados a penas privativas de liberdade, contribui para evitar prisões que ao longo dos anos têm
mostrado que produzem efeitos írritos, não contribuindo para a ressocialização.

REFERÊNCIAS

DELMANTO, Celso et al. Código Penal Comentado. 5 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
JESUS, Damásio Evangelista de. Código Penal Anotado. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 5 ed. Rev., atual e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2005.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal: - Parte Geral. 11 ed. São Paulo: Atlas,
1996, v. 1.

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