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Porto Alegre
2016
Tuane Vieira Devit
Porto Alegre
2016
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO _________________________________ 4
5. OBJETIVOS _________________________________ 11
6. ARTIGO _________________________________ 12
APÊNDICE A _________________________________ 38
APÊNDICE B _________________________________ 40
APÊNDICE C _________________________________ 42
APÊNDICE D _________________________________ 43
INTRODUÇÃO
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ficando atrás de internações relacionadas à gravidez, parto e puerpério (3.410),
doenças do aparelho circulatório (2.293) e doenças do aparelho respiratório
(1.958). As internações por neoplasias totalizam 10,5% do total, um índice alto
frente ao extenso número de indivíduos e gama difusa de patologias atendidas
na emergência do HCPA (BRASIL, 2015).
O serviço de urgência e emergência e suas finalidades ainda são tema de
debate em diversos setores. Segundo a resolução 1451/95 do Conselho
Federal de Medicina (CFM), define-se por urgência a “ocorrência imprevista de
agravo à saúde com ou sem risco potencial de vida, cujo portador necessita de
assistência médica imediata” e por emergência “a constatação médica de
condições de agravo à saúde que impliquem em risco iminente de vida ou
sofrimento intenso, exigindo, portanto, tratamento médico imediato”
(CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 1995).
Devido à complexidade dos casos e a grande demanda de atendimentos
tratando-se de pacientes oncológicos, é comum que os mesmos recebam
diagnósticos, iniciem seus tratamentos e até mesmo venham a óbito na
emergência, indo além das urgências e emergências definidas pelo CFM. Eles
acabam permanecendo por um maior período de tempo na unidade, enquanto
recebem os cuidados necessários para estabilizar sua condição de saúde e
iniciarem ou darem continuidade aos seus tratamentos.
Busca-se então com essa pesquisa identificar quem são e de onde vêm estes
pacientes oncológicos que buscam o atendimento emergencial, quais serviços
da rede intersetorial acessam previamente e são encaminhados a partir da
emergência e quais as lacunas e potencialidades presentes neste acesso. A
partir destes dados, será realizada a análise das tais potencialidades e lacunas
presentes no cuidado integral a estas pessoas, e como estes processos
impactam em suas condições de saúde, buscando responder como se
constituem as lacunas e potencialidades da rede de saúde no cuidado integral
ao paciente oncológico a partir da emergência de um hospital de alta
complexidade.
O fruto da pesquisa para o serviço de Emergência do HCPA e para o Serviço
Social da Unidade é justamente analisar a prática já realizada e construir
estratégias de intervenção a partir da especificidade da rede disposta aos
indivíduos, o que se reflete em ganho para os profissionais em seus processos
5
de trabalho, mas principalmente e prioritariamente para os indivíduos
atendidos. Tais estratégias poderão ser criadas tanto em processos com a rede
interna do hospital, bem como com a rede externa, sugerindo uma linha de
cuidados estruturada para os pacientes oncológicos da Unidade.
O desafio deste projeto é analisar a rede de atendimento em saúde e
intersetorial sob a ótica da integralidade e a partir das demandas apresentadas
pelo usuário do serviço de emergência, uma vez que se identifica esse serviço
um locus fundamental na composição para a construção e/ou fortalecimento da
linha de cuidado. O tema se mantém em concordância com as propostas da
RIMS, tendo em vista que é voltada para o cuidado integral no Sistema Único
de Saúde (SUS), visando contribuir para o serviço onde a residente esteve
inserida durante o primeiro ano da residência.
Dá-se então segmento ao atual trabalho de conclusão com uma a revisão do
referencial teórico, a fim de analisar as categorias teóricas e a temática
proposta sob a luz da literatura atual. Após, são apresentados o objetivo geral e
os específicos que nortearam este estudo e por fim, o artigo fruto da pesquisa
realizada durante a residência.
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1. REFERENCIAL TEÓRICO
7
Por conta de uma demanda multifacetada existente nos casos de
neoplasias, o contexto socioeconômico, os determinantes sociais da saúde
(DSS) que incidem sobre modos e condições de vida e trabalho, o acesso à
rede de serviços e os modelos de atenção em saúde impactam diretamente no
processo de promoção e prevenção em saúde. O paciente oncológico acaba
demandando um cuidado integral, que dê conta das suas necessidades em
saúde.
8
atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços
essenciais, entre outros (BRASIL, 1990).
Ainda nesse sentido ampliado da integralidade e do cuidado, Paim e
Silva (2010) ressalvam que a prática da integralidade pode ser verificada por
pelo menos cinco condições: cuidado, prática, programa, política e sistema.
Assim, a integralidade é compreendida pelo conjunto de certas características
do sistema, instituições e práticas.
Para Cecilio e Mehry (2003), a integralidade no cuidado em saúde,
principalmente no âmbito hospitalar, depende inicialmente da forma como os
atores dos serviços de saúde articulam suas práticas, dentro do contexto dos
espaços em que se inserem. Segundo os autores:
O cuidado, nas organizações de saúde em geral, mas no hospital em
particular, é, por sua natureza, necessariamente multidisciplinar, isto
é, depende da conjugação do trabalho de vários profissionais.[...]O
cuidado, de forma idealizada, recebido/vivido pelo paciente é
somatório de um grande número de pequenos cuidados parciais que
vão se complementando, de maneira mais ou menos consciente e
negociada, entre os vários cuidadores que circulam e produzem a
vida do hospital. Assim, uma complexa trama de atos, de
procedimentos, de fluxos, de rotinas, de saberes, num processo
dialético de complementação, mas também de disputa, vão
compondo o que entendemos como cuidado em saúde. A maior ou
menor integralidade da atenção recebida resulta, em boa medida, da
forma como se articulam as práticas dos trabalhadores do hospital.
(CECILIO; MEHRY, 2003, p. 02).
9
território em que o indivíduo se relaciona, a intersetorialidade visa criar uma
nova dinâmica para o aparato governamental, indo para além de apenas
formular projetos amplos para serem realizados setorialmente. Trata-se de
buscar alcançar resultados integrados visando a um efeito sinérgico, ou seja,
um trabalho em conjunto, coeso, complementar e simultâneo (INOJOSA,
2001).
10
sistema pela saúde do usuário, quanto a perspectiva da macropolítica, no apoio
e investimento dos gestores em processos de gestão coletivos e participativos,
atuando nos determinantes sociais, buscando articulações intersetoriais,
mudanças na legislação, atuação na regulação, no financiamento das ações,
na rede de serviços, na organização da vigilância e informação em saúde.
(MALTA; MEHRY, 2010).
Para Franco e Franco (2015), a Linha do Cuidado Integral incorpora a
ideia da integralidade, o que significa unificar ações preventivas, curativas e de
reabilitação, ou seja, na prática da promoção à saúde; proporcionando o
acesso a todos os recursos que o usuário necessita, desde visitas domiciliares
realizadas pela Estratégia Saúde da Família e outros dispositivos como o
Programa de Atenção Domiciliar, até os de alta complexidade hospitalar; ainda
requerendo uma opção de política de saúde e boas práticas dos profissionais.
Nesse sentido, no caso do paciente oncológico, a linha de cuidado visa
abranger os espaços em que o mesmo perpassa, desde a rede básica de
atenção em saúde até serviços de alta complexidade como a emergência, bem
como a articulação e as estratégias firmadas entre os espaços para a melhor
forma de prestar a assistência em saúde necessária no caso do câncer.
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2. OBJETIVOS
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3. ARTIGO
INTRODUÇÃO
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fragilidades e potencialidades da rede de saúde para o cuidado integral 1. O principal
desafio do presente estudo é, portanto, analisar a rede de atendimento em saúde e
intersetorial ao paciente oncológico, sob a ótica da integralidade atentando às demandas
apresentadas pelos usuários.
Devido à sua complexidade e extensão epidemiológica, social e econômica, o câncer é
atualmente um dos principais desafios da saúde pública brasileira. No Brasil, a doença é
a segunda maior causa de óbitos no país, ficando atrás apenas de doenças
cardiovasculares. De acordo com o relatório realizado pelo INCA, a estimativa para os
anos de 2015 e 2016 ressaltou a ocorrência de aproximadamente 600 mil novos casos de
câncer no período, reforçando a importância da doença no país. (INSTITUTO
NACIONAL DO CÂNCER, 2015, p.26). Frente a essa realidade e à grande demanda de
atendimentos nos serviços de saúde, tem se ampliado e tem sido frequente que muitos
pacientes oncológicos recebam diagnósticos e até mesmo venham a óbito em serviços
de emergência hospitalar.
Nesse sentido, o serviço de emergência se constitui num lócus fundamental na
composição para a construção e/ou fortalecimento da linha de cuidados voltada ao
paciente oncológico. Por se tratar de um serviço voltado ao atendimento emergencial e
de caráter urgente, a emergência muitas vezes não possui a visibilidade de sua
magnitude, com relação ao seu lugar e papel na rede de serviços. O presente estudo
busca evidenciar este papel do serviço de emergência, ou seja, uma vez que vai para
além de atendimentos e procedimentos pontuais e sim como esse pode vir a contribuir
para o cuidado integral.
Para o desenvolvimento deste artigo, inicia-se com a discussão sobre os modelos de
atenção em saúde, problematizando a integralidade. Para tal, destaca-se na sequencia a
política de Saúde e os modelos de atenção nos diferentes contextos sócio-históricos.
Num segundo momento apresenta-se o percurso metodológico que embasou o estudo,
bem como a devida caracterização dos pacientes oncológicos atendidos num serviço de
emergência de alta complexidade. Por fim, se sobressalta os resultados que emergem do
estudo em relação às lacunas, fragilidades e potencialidades na atenção integral ao
paciente oncológico.
1
Este estudo é resultante da inserção no Programa de Residência Integrada Multiprofissional em Saúde
de um hospital de alta complexidade, cuja área de concentração foi com ênfase no paciente adulto crítico.
14
Cabe destacar que a análise dos modelos de atenção à saúde aqui feita embasa-se no
contexto e nas práticas do sistema de saúde brasileiro atual.
Por modelo de atenção à saúde entende-se “a convergência de horizontes entre os
diversos discursos acerca de modos de operar e gerir as tecnologias de atenção à saúde
de indivíduos e populações” (AYRES, 2009, p.12), ou seja, os modelos servem como
embasamento para a operacionalização do sistema de saúde e a forma como as
tecnologias são desenvolvidas. Apesar da palavra “modelo” retratar no senso comum
um molde ou padrão estático a ser seguido, no caso da atenção à saúde ela refere-se à
identificação de seus traços principais, fundamentos, lógicas, ou seja, sua essência ou
razão de ser (PAIM, 2008, p. 548) tendo em vista que um sistema de saúde é dinâmico e
se modifica conforme as necessidades em saúde e a realidade do sistema societário em
que se insere. É a partir da década de 80, em âmbito internacional, que se inicia a
contextualização acerca dos modelos de atenção, ou modelos assistenciais, junto ao
debate sobre a reforma sanitária.
As políticas de saúde caracterizam-se como políticas sociais mediadas pelo Estado na
relação com a sociedade, sendo diretamente impactadas pelo contexto sócio-histórico
em que se inserem. Para o objeto do presente estudo, analisar a construção políticade
saúde tem sua importância no reconhecimento da conjuntura em que se introduz o
modelo de atenção vigente ao paciente oncológico, bem como a atenção hospitalar e a
integralidade da atenção à saúde como um todo.
Nos primórdios do contexto brasileiro, a saúde era praticada como filantropia e prática
liberal até o século XIX, onde, em decorrência das transformações econômicas e
políticas, se iniciam campanhas limitadas e a vigilância do exercício profissional. O
modelo de atenção do Sanitarismo Campanhista utilizado na época estava ligado ao
modelo econômico agroexportador, principalmente cafeeiro, que exigia do sistema de
saúde o saneamento dos espaços de circulação das mercadorias e a erradicação de
doenças que pudessem afetá-las (MEHRY, MALTA e SANTOS, 2004, p. 50).
Nesse contexto,as ações se baseavam no controle militarista e autoritário da saúde,
investindo no monitoramento portuário, além de se ter o poder de polícia investido nos
agentes de saúde, que muitas vezes utilizavam a força para intervir no processo de
saúde-doença da população. No final deste século a saúde torna-se pauta das
reivindicações do movimento operário e, nas primeiras décadas do século XX, surgem
algumas iniciativas de organização do setor da saúde, sendo aprofundadas a partir da
década de 30. (BRAVO, 2006, p.89)
As políticas sociais que emergem nesse período são utilizadas como uma estratégia de
amenizar os conflitos entre a classe dominante e o proletariado, principalmente como
uma forma de controle vinculada à força de trabalho. No berço de uma crise política, a
saúde passa a ganhar destaque com ações diretamente vinculadas à ampliação do poder
e ao financiamento da União. As ações em saúde focavam principalmente as questões
de higiene e saúde do trabalhador, em um modelo de assistência médico-curativa
(BRAVO, 2006, p.90). Tal modelo reforça sua base no trabalhador, servindo de
15
fortalecimento do capital e da força de trabalho. Segundo Mehry, Malta e Santos (2004,
p.50) “o importante já não era sanear os espaços, mas cuidar dos corpos dos
trabalhadores, mantendo sua capacidade produtiva”.
O modelo médico-assistencial privatista influenciou diretamente o modelo de
assistência previdenciário, embasado na medicina liberal. Na década de 40, tal modelo
expandiu-se com a compra de serviços privados e nos anos 50 a estrutura de
atendimento hospitalar de natureza privada e sem fins lucrativos já estava consolidado.
A corporação médica organizada já pressionava o financiamento através do Estado, em
uma lógica capitalista e focada na privatização (BRAVO, 2006, p. 92). Segundo Mehry,
Malta e Santos (2004, p. 50), este formato “serviu como um embrião e catalisador do
modelo liberal privatista que se acentuou após 1964 através da rede privada contratada”.
Mudanças mais significativas são inseridas entre os anos de 64 até 85, em que Brasil
sofre então um golpe de Estado e o exército militar sobe ao poder. No contexto da
ditadura militar, o Estado embasava sua intervenção no binômio repressão-assistência.
A política assistencial foi ampliada, burocratizada e modernizada, com a intenção de
aumentar o poder de regulação sobre a sociedade, suavizar as tensões sociais e
conseguir legitimidade para o regime, como também servir de mecanismo de
acumulação do capital. A saúde segue a tendência capitalista e o Estado articula-se
comindústrias farmacêuticas e de equipamento hospitalares. A medicalização da vida
social é imposta, com ênfase na prática médica curativa, individual, assistencialista e
especializada. Nesse sentido, há um enxugamento da saúde pública e a ampliação da
saúde previdenciária. (BRAVO, 200,6 p. 93 e 94).
Em fortalecimento à saúde previdenciária, é criado em 1966 o Instituto Nacional de
Previdência Social – INPS (atualmente Instituto Nacional de Seguridade Social –
INSS), fragmentado em 1978 em três outros institutos. Dentre esses institutos
encontrava-se o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
(INAMPS), responsável pelo sistema de saúde brasileiro.
O INAMPS seguia prestando assistência médica apenas para trabalhadores formais e
seus dependentes segundo a lógica do seguro-saúde. Os indivíduos que não contribuíam
com o INAMPS não possuíam acesso ao sistema, contando então com o apoio de
instituições filantrópicas e da igreja. Havia muita tensão entre a ampliação dos serviços
e a disponibilidade de recursos financeiros, bem como a burocratização dos interesses
público-privados entre setores estatais e médico-empresariais.
Como resultado destas contradições, na década de 70, ocorrem os primeiros
movimentos da Reforma Sanitária e, em 1979, ocorre o 1º Simpósio sobre Política
Nacional de Saúde. Também é nessa década a Previdência passa por uma crise, afetando
o INAMPS. Nesse contexto, o fortalecimento das mobilizações dos profissionais de
saúde, partidos políticos da oposição e os movimentos sociais urbanos voltaram-se para
a concepção da Reforma Sanitária. Para Fleury (1997, p. 33) “o projeto da Reforma
Sanitária portava um modelo de democracia (...), a formulação de uma utopia
igualitária; a garantia da saúde como direito individual e a construção de um poder local
fortalecido pela gestão social democrática”. As principais propostas do projeto se
fundamentaram na universalização do acesso, na concepção de saúde como direito
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social e dever do Estado e na reestruturação do setor através da estratégia do Sistema
Unificado de Saúde.
É na 8º Conferência Nacional de Saúde, em 1986, que a Reforma Sanitária é levada em
pauta e fortalecida, indo para além de um novo sistema de saúde:há uma nova
concepção de saúde e um projeto societário. Como resultado, é implantado o Sistema
Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), um convênio entre o INAMPS e os
governos estaduais, berço do Sistema Único de Saúde (SUS) atual. Em 1988, consolida-
se a nova Constituição Federal, trazendo mudanças no contexto brasileiro das políticas
sociais e solidificando o SUS, propondo uma nova forma de gestão da Saúde.
As esferas de governo do SUS passaram a ser de âmbito Federal, Estadual e Municipal,
de forma descentralizada, o que proporciona um atendimento diferenciado de acordo
com as necessidades de cada região. Seus princípios e diretrizes são voltados para a
universalidade, sendo para toda população; equidade, representando justiça e igualdade
e integralidade, gerando o tratamento integral, com foco na prevenção. Tais elementos
trouxeram uma mudança radical na Política Pública de Saúde.
Apesar do amplo destaque das políticas sociais proporcionado pela Constituição Federal
de 1988, em contrapartida coexiste uma grande crítica ao decorrer dessas quase quatro
décadas, em relação a fraudes, violações e corrupção no repasse de recursos que
impactam diretamente na sociedade brasileira e no acesso a seus direitos. Parte desses
fatores é oriundo da contrarreforma proposta pelo modelo neoliberal, implantado no
Brasil na década de 90 do século XX. As ações do estado, e dentro delas a Saúde,
deveriam responder, portanto, a uma lógica de mercado.
O projeto defendido pela Reforma Sanitária encontra diversos obstáculos, oriundos da
lógica de mercado atribuída à saúde.Dentre eles está a responsabilização da sociedade
civil, gerando a refilantropização de serviços e a privatização. Além disso, observa-se a
fragmentação entre prevenção e atenção curativa, havendo prioridade para a atenção
hospitalocêntrica, em detrimento das ações de promoção e proteção da saúde. Observa-
se, a partir desse contexto, a maior contradição do SUS com impacto inclusive nos dias
atuais: o embate entre o projeto de reforma sanitária, construído na década de 1980 e
inscrito na Constituição Brasileira de 1988, e o projeto de saúde articulada ao mercado
ou privatista, operacionalizado pelo Estado, na década de 90.
O projeto da Reforma Sanitária embasa a concepção de saúde centrada no modelo
ampliado e integral, saindo da dicotomia de saúde e doença e do modelo curativo. A
partir dessa ampliação é identificado que saúde não significa a ausência da doença; na
verdade, significa que a saúde depende diretamente do social, do cotidiano e das
relações sociais que perpassam o indivíduo. É nesse sentido que abordamos a atenção à
saúde ao paciente oncológico, que busca atendimento na emergência de alta
complexidade, considerando a saúde como resultado de uma gama de determinantes
sociais.
Os Determinantes Sociais da Saúde (DSS), segundo definição da Comissão Nacional
sobre os Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS), são fatores sociais, econômicos,
culturais, étnico-raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência
de problemas de saúde e seus fatores de risco na população. Já a comissão homônima da
Organização Mundial da Saúde (OMS) sumariamente define que os DSS são as
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condições sociais em que as pessoas vivem e trabalham. (BUSS; PELEGRINNI FILHO,
2007, p. 78)
Com base nessa definição, idealiza-se então uma concepção ampliada do cuidado,
concebendo o indivíduo numa perspectiva de totalidade. Considera-se não apenas suas
demandas biológicas e fisiológicas, mas também os aspectos que englobam sua vida
social, econômica e política. A lógica biomédica do cuidado, focada na intervenção
curativa e imediatista apenas da doença, é quebrada levando em conta que o contexto
em que os grupos e pessoas estão inseridos atingem diretamente sua saúde.
Nesse sentido, no caso do paciente oncológico, o modelo de atenção integral visa a
abranger os espaços em que o mesmo perpassa - desde a rede básica de atenção em
saúde até serviços de alta complexidade como a emergência, bem como a articulação e
as estratégias firmadas entre os espaços para a melhor forma de prestar a assistência em
saúde necessária no caso do câncer.
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percepção da equipe multidisciplinar da emergência do hospital em questão acerca dos
pacientes oncológicos e da rede de serviços acessada por eles.
A análise documental desta pesquisa foi composta por três etapas, segundo Bardin
(1979): a primeira é a pré-análise, a segunda é a exploração do material e a terceira é o
tratamento dos resultados obtidos e interpretação. Por envolver Seres Humanos, o atual
estudo assegurou-se de todos os aspectos éticos de pesquisa, obedecendo a Resolução
de número 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde. As
entrevistas contaram com a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE) pelos participantes. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
instituição, com o parecer n.º 16-0033.
Faixa etária
4% 4%
33% 12%
18%
29%
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Gráfico 1 - Faixa etária dos pacientes oncológicos analisados na emergência
Fonte: a autora.
As re-internações variaram desde pacientes com nenhuma internação até pacientes com
33 internações prévias, gerando a média de 4 reinternações. A maioria dos indivíduos já
haviam sido diagnosticados com câncer previamente, sendo que apenas 10% tiveram
seus diagnósticos na internação analisada. Observou-se ainda que um grande número
dos sujeitos possuíam vínculo ambulatorial com o hospital do estudo, representando
80% dos pacientes da amostra total.
A partir deste perfil, foram selecionados os participantes da segunda etapa da pesquisa,
em que foram realizadas entrevistas com os familiares dos pacientes, questionando
sobre o percurso na rede de saúde e intersetorial até a chegada ao hospital onde foi
realizado o estudo.
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intersetorial acessada pelos pacientes oncológicos, que refletiu juntamente com a
percepção dos sujeitos, evidenciando assim a atenção à saúde a esse segmento para o
cuidado integral.
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A partir da aproximação com a realidade dos pacientes oncológicos, constatou-se a
presença de inúmeras lacunas e fragilidades na garantia ao acesso dos serviços da rede
de saúde e intersetorial. Processos que atravessam a precarização, organização e
estrutura dos serviços, bem como o atendimento e a continuidade deste. Nesse viés, os
resultados desta categoria foram divididos entre três subcategorias de análise: estrutura
e profissionais da saúde, o diagnóstico tardio e entraves burocráticos na rede de média
complexidade e a (des)continuidade do atendimento.
“(...) a prefeitura já largou o Hospital (1), tá falindo. Então na semana passada ele começou a vomitar
sangue, urinar sangue. A gente foi no Hospital (1) só que lá eles queriam que a gente voltasse pra casa,
porque não tinha médico assistente no momento. Medicaram ele pra pressão alta e mandaram pra casa.
A gente foi no Hospital (2), mas a emergência tava fechada. Porque eles mandaram a gente procurar o
SUS, né, porque o Hospital (1) lá já não tá bom né. Aí viemos pra cá.” (Filha do paciente A.)
"Ele tentou consultar no posto, mas como não tinha médico e o posto é bem precário lá, não conseguiu
os exames. Tanto é que encaminharam pra cá porque eles não tinham como fazer os exames."(Filha
do paciente C.)
"Não, ele nunca teve acompanhamento no CAPS. Ele até precisava, mas nunca teve. Porque antes eles
moravam isolados da gente, não tinha condições. E aí até tinha necessidade de ter algum
acompanhamento. Onde eles moravam é muito difícil, interior." (Irmã do paciente R.)
“(...) parece que quando o paciente tem câncer, pelo lado clínico, não conseguem ver ele como um todo
e resolver um problema, que às vezes eles só precisam de um ajuste de medicação, às vezes tá com uma
infecção respiratória. Não, é tudo pro serviço terceirizado de onde ele veio. Isso é o principal problema, a
pessoa tem muito medo desses pacientes e ficam meio estagnados e não sabem manejar esses pacientes.
E eles tem intercorrências como qualquer outra pessoa. Vão ter uma infecção respiratória, vão ter algum
problema de dor, enfim, que eles vão poder manejar. (...) Uma alternativa seria capacitar esses
trabalhadores, fazer cursos específicos para pacientes oncológicos. O pessoal daqui iria
tranquilamente na rede para capacitar esses profissionais para terem um melhor manejo ao paciente com
câncer.” (Profissional 1, médica)
Outro ponto indicado pelo estudo é o quanto a rede de serviços não comporta as reais
necessidades dos pacientes oncológicos em uma concepção ampliada da saúde. O
paciente consegue acessar o tratamento para a sua doença, porém, por vezes o acesso
acaba inviabilizado por conta de suas vulnerabilidades. Existe uma fragilidade na
intersetorialidade das políticas, onde se garante um tratamento curativo em saúde,
porém sem viabilizar o acesso a tal. Trabalhar em uma concepção de clínica ampliada,
lidando com pessoas em sua dimensão social, e não apenas biológica, é um desafio para
a saúde em geral, principalmente no âmbito hospitalar (CAMPOS e AMARAL, 2007, p.
852).
O enfoque dos Determinantes Sociais da Saúde se mostra necessário, levando em
consideração a capacidade de resposta dos indivíduos, de acordo com os diversos
aspectos presentes em seu cotidiano, para a situação em que se encontram. Com base na
definição dos DSS, idealiza-se, então, uma concepção ampliada do cuidado,
considerando o indivíduo em sua totalidade. Para os pacientes oncológicos, pensar em
DSS é considerar que sua condição social impacta diretamente em sua situação de
saúde, muitas vezes complexa e crítica. Amplia-se o debate para a integralidade e a
necessidade maior de articulação com setores para além da saúde, mas que tem impacto
direto no processo de saúde-doença dos indivíduos, como demonstrado pela profissional
a seguir:
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“O paciente consegue acessar o tratamento, digamos, fazer a rádio ou a quimio, o ambulatório. Aí esbarra
na questão do transporte. O município não disponibiliza o recurso em forma de vale. Ou o paciente não
tem condições físicas de entrar no ônibus, né. Então a gente vê muitos pacientes faltando as sessões de
radio e de quimio, porque não tiveram acesso a um transporte público pra vir. E a maioria dos pacientes
que a gente atende realmente estão em situação de vulnerabilidade, não tem condições de se
organizarem de forma particular para vir. Então, o acesso é limitado. É um acesso relativo.”
(Profissional 2, Assistente Social)
Nesta outra fala abaixo, evidencia-se que apesar de existir uma legislação que garanta o
acesso facilitado aos pacientes oncológicos, devido à complexidade e necessidade de
resposta rápida ao tratamento, a precarização atinge todos os níveis de complexidade e
demandas apresentadas. A garantia de direitos e a integralidade no atendimento acabam
por se tornarem desafios para os espaços e profissionais.
“É, pensando no paciente oncológico a gente tem uma legislação que colabora bastante. O que a gente
vê na vida real, no dia a dia, é justamente o desafio no cumprimento dessa legislação, da garantia de
acesso, dos atendimentos. A legislação é um respaldo, mas o que a gente tem vivenciado hoje é um
país em crise né, e a gente vê isso no impacto que tem causado nos atendimentos mais básicos que a
população necessita, até os mais complexos, que é o caso do paciente oncológico.”(Profissional 3,
Assistente Social)
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diversos momentos, convergindo nas múltiplas histórias dos sujeitos, revelando de
forma paradoxal, sentimentos de culpa dos pacientes, dos profissionais da saúde e da
rede de média complexidade:
“Aí o doutor pediu a biópsia, só que ia levar de dois a três meses, olha só. (...) Quando ele chegou
aqui, passou pela emergência, já atenderam. A doutora olhou os exames e disse pra ele "Bah, seu Onadir
como que o senhor deixou ficar assim?Agora é uma corrida contra o tempo.".” (Esposa do paciente
O.)
"(...) quando uma pessoa chega com muita falta de ar, pedindo muita bombinha, dizendo que não tá
resolvendo a dor nas costas, já deviam ter mandado encaminhamento pra fazer as tomografias e
raio-x bem antes, e não dar só remédio e dizer que é só uma virose. (...) se não fosse culpa dela (da
profissional da saúde) a minha mãe não tava com o tumor tão avançado.” (Filha da paciente N.)
A demora nos atendimentos também foi observada nos serviços da rede intersetorial,
reforçando o déficit estrutural para acompanhar as demandas, em principal as mais
vulneráveis, de uma forma equânime.
“Na verdade ela ficou bastante tempo esperando (pelo Bolsa Família), porque a gente mora num lugar
onde vai enchente, entendeu? Todo ano vai enchente, então a gente mora num lugar bem ruim. Então
demorou as visitas, bastante coisa. Foram ver onde a gente mora." (Filha da paciente N.)
"Ele levou 10 anos esperando a aposentadoria. Ele se enfiou na bebida, mas ainda no cigarro. Aí
demorou." (Filha do paciente C.)
“É, é difícil. Às vezes a pessoa tem que ir muito de madrugada pra conseguir uma ficha, pra poder
entrar com o pedido (de auxílio-doença). E aí chega na hora também, muitas vezes é negado, não
consegue nada. Tem que entrar na justiça. (...) A pessoa trabalha a vida inteira e depois negam."
(Irmã do paciente R.)
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como um dos obstáculos enfrentados, a falta de capacidade dos serviços em
acompanharem os pacientes sistematicamente, como o caso abaixo.
“Acharam que ele tinha uma consulta em 2011 e ele não se apresentou nessa consulta no
ambulatório. Então, foi aonde já podia ter sido tratado. Mas foi negligência tanto dele, quanto nossa
de não ter acompanhado.” (Filha do paciente C.)
“A gente levou ela no Hospital (3) na sexta, porque ela não conseguia respirar, a pressão dela tava muito
baixa. Aí atenderam ela o dia todo e liberaram ela pra ir pra casa. Só que chegando em casa, ela não
conseguia respirar,não aguentava de dor e tava cuspindo sangue, então a gente trouxe ela pra cá.”
(Filha da paciente N.)
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integrado e sistematizado, fragilizando, assim, o vínculo dos pacientes com os
profissionais e serviços de saúde. Percebeu-se com esse estudo que não há de fato uma
linha de cuidado específica ao paciente oncológico, sistematizada e integrada para o seu
atendimento e para a continuidade do mesmo.
Em relação a isto, a concepção de uma linha de cuidado à pacientes crônicos de doenças
não transmissíveis abrange tanto a perspectiva da micropolítica, buscando potencializar
o trabalho cuidador na responsabilização do profissional e do sistema pela saúde do
usuário, quanto a perspectiva da macropolítica, no apoio e investimento dos gestores em
processos de gestão coletivos e participativos, atuando nos determinantes sociais,
buscando articulações intersetoriais, mudanças na legislação, atuação na regulação, no
financiamento das ações, na rede de serviços, na organização da vigilância e informação
em saúde. (MALTA; MEHRY, 2010, p. 596-200)
Para Franco e Franco (2015, p. 1), a Linha do Cuidado Integral incorpora a ideia da
integralidade, o que significa unificar ações preventivas, curativas e de reabilitação, ou
seja, na prática da promoção à saúde; proporcionando o acesso a todos os recursos que o
usuário necessita, desde visitas domiciliares e outros dispositivos como o Programa de
Atenção Domiciliar, até os de alta complexidade hospitalar; requerendo uma opção de
política de saúde e boas práticas dos profissionais.
Nesse sentido, no caso do paciente oncológico, a linha de cuidado contribuiria na
abrangência dos espaços em que o mesmo perpassa, desde a rede básica de atenção em
saúde até serviços de alta complexidade como a emergência, bem como a articulação e
as estratégias firmadas entre os serviços para a melhor forma de prestar a assistência em
saúde necessária no caso do câncer, otimizando os fluxos da rede de saúde.
2 Em junho de 2016, foi apresentada por Henrique Meirelles, ministro da Fazenda do governo de Michel Temer, a Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) 241/55, que tem como objetivo limitar os gastos públicos pelos próximos 20 anos. A PEC institui o
Novo Regime Fiscal, que prevê que tais gastos não poderão crescer acima da inflação acumulada no ano anterior, e com isso os
investimentos públicos essenciais e estratégicos, como em saúde, educação e assistência social, sofrerão um grande impacto.
Atualmente essas áreas já precisam de mais investimento, porém o novo regime afetará de forma desigual as populações mais
vulneráveis.
27
3.2.1 Vínculo entre os serviços, trabalhadores e usuários como potencializador do cuidado
Segundo Campos (1997), o vínculo entre os usuários do serviço de saúde e
trabalhadores amplia a eficácia das ações de saúde, favorecendo a participação do
usuário durante a prestação do serviço. Nessa perspectiva, identificou-se na fala dos
indivíduos a contribuição e o reconhecimento do vínculo como potencializador do
acesso à rede e no acompanhamento de suas situações de saúde e de seus familiares,
conforme ilustrado nas fala abaixo.
"Quem atende a gente é muito legal. A maioria que atende já é da comunidade, a gente conhece todo
mundo, temos vínculo. Eles faziam visita domiciliar, quando meu marido saiu do Hospital, eles iam
quase todo dia. Trocavam a sonda dele, iam fazer curativo. Olha, eles foram maravilhosos. O agente
(comunitário de saúde) vai de vez em quando, pergunta, questiona. Eles acompanham bem." (Esposa do
paciente O.)
"Ela acessa o CRAS, pra fazer o grupo de mães, toda semana. Há uns quatro anos mais ou menos. Já
conhecem ela, o atendimento é bom. Ela se sente bem." (Esposo da paciente V.)
"Olha, quando o posto tá aberto e tem médico, ele já chega e é preferencial. É, eu não posso me queixar.
A gente é sempre bem atendido. Tanto as enfermeiras quanto as atendentes do balcão, atendem bem,
mas falta muita coisa lá. Tá longe de tá bom. O que tem eles oferecem de boa vontade.” (Cunhada do
paciente A.)
“Se o paciente já tem vínculo com a rede, esse contato é muito mais fácil, com certeza.” (Profissional
3, Assistente Social)
Outro ponto importante a ser destacado são os profissionais de referência nos espaços
de atendimento em saúde. Majoritariamente, os indivíduos reconhecem médicos e
enfermeiros como profissionais de referência, mas sem um real acompanhamento da
família, e acessam a rede básica apenas para consultas pontuais ou para receber
medicamentos.
Nos contextos onde os indivíduos que já possuíam vínculo com os serviços acessados
antes do diagnóstico de câncer, com um maior suporte e acompanhamento sistemático
da rede, percebeu-se uma diferenciação nos cenários e na gestão do cuidado. Os sujeitos
se mostravam mais implicados e cientes acerca dos processos e situação de saúde de
seus familiares, bem como das suas estratégias de enfrentamento e de serviços presentes
na rede com que poderiam contar. Portanto, considera-se o vínculo como
potencializador no cuidado ao paciente oncológico por contribuir para um suporte mais
28
estruturado e para a equidade nos atendimentos, tendo em vista que há a busca pelo
reconhecimento prévio da situação e necessidades de saúde e do contexto social do
paciente.
"Ah, lá o atendimento é bom. São sempre atenciosos, fazem o que podem, né? Falta bastante coisa,
medicamento. Mas eles fazem o que conseguem, apesar disso." (Esposo da paciente V.)
“(...) eles tentam fazer o melhor que eles podem com o que eles tem. A gente sabe que não é culpa de
quem tá trabalhando lá assim, né. É porque é coisa do governo, eu acho.” (Neta da paciente L.)
"Tudo muito rápido no INSS, sabe? Muito agilizado. Os profissionais foram muito receptivos. A gente
sente até mais confortável né? É difícil, a situação que a gente se encontra, então. A gente se sente
mais confortável." (Cunhada do paciente A.)
"Uma vez ela acessou o hospital de lá (da cidade de origem). Mas ficaram tudo conversando em
volta dela e ninguém dava atenção. Nunca mais levo lá naquele lugar. Falta de respeito com o
paciente." (Mãe da paciente J.)
"No CRAS ela chega e é atendida. É perto de casa, são muito queridos. Agora ainda disseram que vai
abrir um mais perto, olha que maravilha.” (Mãe da paciente J.)
“A gente tem tanto direito que a gente não sabe. Me falaram sobre o CRAS, que é bem pertinho da minha
casa. Mas eu nunca imaginei que tinha direito. Aí um dia conversando com outra pessoa ela disse "Não,
vai lá no CRAS que acho que tu consegue", e não é que eu fui e consegui mesmo. Fui bem atendida."
(Esposa do paciente O.)
A territorialização também permite que os usuários compartilhem as informações sobre
os serviços entre si, conforme visto na última fala, garantindo a participação dos
indivíduos como atores importantes na rede e nos processos de trabalho dos locais de
atendimento, ampliando o acesso entre os usuários do território.
O território é também um espaço, porém singularizado, pois tem limites, podendo ser
político-administrativos ou de ação de um determinado grupo de atores sociais, sendo
que, internamente, possui uma identidade que vai depender da história de sua
construção. Importante ressaltar que também é portador de poder, pois nele se exercitam
e se constroem os poderes de atuação tanto do Estado, das agências e de seus cidadãos.
É uma importante estratégia para as políticas sociais públicas na consolidação de ações
para o enfrentamento de problemas e necessidades da população que o habita e o produz
socialmente. (Gondin et al., 2008, p. 238)
30
A territorialização também foi apontada pelas profissionais entrevistadas como
elemento facilitador nos atendimentos e encaminhamentos realizados a partir da
emergência em questão, conforme ilustrado pela fala a seguir:
“Quando os pacientes são da capital é menos difícil, não sei se é porque a rede está mais estruturada, mas
quando tu faz um contato os profissionais já estão acostumados com aquilo, por mais que seja difícil e
não seja imediato a disponibilização dos recursos, os profissionais já estão por dentro daquele fluxo. A
maioria sabe como deve funcionar, claro, a receptividade é diferente entre as unidades de saúde, nesse
entendimento de compartilhar o cuidado. Em geral na rede da capital há um entendimento maior do
compartilhamento do cuidado, que é necessário. Que não é só a alta complexidade que vai dar conta. (,..)
Eu acredito que o trabalho em rede é a grande possibilidade para que esse paciente e essa família
consigam ter acesso ao seus direitos e acesso à saúde.”(Profissional 2, Assistente Social)
31
Em relação às potencialidades, o vínculo entre os trabalhadores, usuários e serviços
surgiu como potencializador no cuidado ao paciente oncológico por contribuir para um
cuidado estruturado e para a equidade nos atendimentos, devido à relação de
proximidade entre as equipes e os usuários.
Outra potencialidade sinalizada na pesquisa foi a proposta de uma abordagem
acolhedora dos serviços e das equipes de saúde, tornando possível o estabelecimento de
um vínculo de respeito mútuo e responsabilidade para com o usuário e suas demandas.
O acolhimento contribui para o cuidado integral e para a equidade, no momento em que
esta responsabilização acarreta em um real acompanhamento e sensibilização para as
demandas trazidas durante os atendimentos.
A territorialização da saúde também foi evidenciada como potencialidade, por
contribuir para o trabalho integrado em rede, gerando proximidade entre as equipes de
saúde e os usuários, facilitando o acesso e fortalecendo o vínculo. Tal organização pode
trazer benefícios para a atenção à saúde e para o acesso aos espaços de atendimento de
forma mais efetiva.
Nessa perspectiva, se reforça a necessidade do debate, para melhoria dos serviços a
partir do sinalizado neste estudo. Sugere-se o cuidado integral e a atenção intersetorial
como estratégia para a atenção à saúde do paciente oncológico, frente às suas demandas
complexas e multifacetadas, que impactam sua vida e seu cotidiano, bem como de seus
familiares e da sociedade, tendo em vista a indissociabilidade da saúde e dos
determinantes sociais.
32
REFERÊNCIAS
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33
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34
CONSIDERAÇÕES FINAIS
35
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GIL, A. C., Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas,
2002
36
HOSPITAL DE CLÍNICAS DE PORTO ALEGRE. Dados Emergência. Porto
Alegre, RS, 2015.
37
APÊNDICES
APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
PARTICIPANTES PACIENTES OU FAMILIARES
Nº do projeto GPPG ou CAAE 160033
38
Caso ocorra alguma intercorrência ou dano, resultante de sua
participação na pesquisa, você receberá todo o atendimento necessário,
sem nenhum custo pessoal.
Os dados coletados durante a pesquisa serão sempre tratados
confidencialmente. Os resultados serão apresentados de forma conjunta,
sem a identificação dos participantes, ou seja, o seu nome não aparecerá
na publicação dos resultados. Caso você tenha dúvidas, poderá entrar em
contato com a pesquisadora responsável, Profª. Drª. Dolores Sanches
Wünsch, pelo telefone (51) 3308-5700, com
Rubrica do participante ______ Rubrica do pesquisador ________
____________________________________
Nome do paciente
____________________________________
Nome do participante da pesquisa
____________________________________
Assinatura do participante
____________________________________
Nome do pesquisador que aplicou o Termo
____________________________________
Assinatura
Local e Data: _________________________
39
APÊNDICE B
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
PARTICIPANTES PROFISSIONAIS
40
Os dados coletados durante a pesquisa serão sempre tratados
confidencialmente. Os resultados serão apresentados de forma conjunta,
sem a identificação dos participantes, ou seja, o seu nome não aparecerá
na publicação dos resultados.
Caso você tenha dúvidas, poderá entrar em contato com a
pesquisadora responsável, Profª. Drª. Dolores Sanches Wünsch, pelo
telefone (51) 3308-5700, com a pesquisadora Tuane Vieira Devit, pelo
telefone (51) 3359-8305 ou com o Comitê de
Rubrica do participante ______ Rubrica do pesquisador ________
____________________________________
Nome do participante da pesquisa
____________________________________
Assinatura
____________________________________
Nome do pesquisador que aplicou o Termo
____________________________________
Assinatura
41
Local e Data: _________________________
APÊNDICE C
42
APÊNDICE D
ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM OS PACIENTES E FAMILIARES
1. Dados do paciente
CID: Sexo: Idade:
Profissão: Escolaridade:
Procedência (cidade e bairro):
Com quem reside: Renda familiar:
43
Desde quando você acessa este(s) local (is)?
44