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10/09/2015 Ágora eletrônica: algumas reflexões teórico­metodológicas | Ferreira | Estudos de Sociologia

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Procurar Est. Soc. [online]. 2013, vol. 2, n. 19
Por Edição
Por Autor ÁGORA ELETRÔNICA: algumas reflexões teórico­metodológicas1
Por título
ELECTRONIC AGORA: SOME THEORETICAL AND METHODOLOGICAL CONSIDERATIONS

F E RRAM E N TAS  DE Jonatas Ferreira* 


ARTIGOS
Breno Fontes**
 Resumo

 Imprimir artigo ______________________________________________________
Resumo
 Exibir metadados O ensaio que se segue busca propor uma reflexão dos aspectos teóricos e metodológicos que
deveriam orientar futuras investigações acerca das manifestações políticas de 2013 no Brasil e
 Como citar este tudo que delas decorre. Partindo de uma crítica ao economicismo subjacente a muitas das análises
documento propostas para explicar tais eventos e passando em revisão também a teoria das redes sociais, e
suas metodológicas, o artigo propõe a análise do discurso, tal como proposto por Laclau e Mouffe,
 Política de
como um espaço mais profícuo de investigação.
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e­mail  (Restrito a usuários Manifestações de junho de 2013; Política; Redes Sociais; Democracia Radical
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(Restrito a usuários Absctract
cadastrados)
The following essay asks for an analysis of the theoretical and methodological aspects that should
guide future investigations on the 2013 political protests in Brazil and its consequences. Starting
IN F ORM AÇÕE S with a critical approach to the economicism that underlies a great number of the analysis of such
Para leitores events and reviewing critically the theory of social networks, as well as their methodological
Para Autores implications, the text offers the discourse analysis, as proffered by Laclau and Mouffe, as a more
Para Bibliotecários advantageous space for investigation.

OPEN JOURNAL SYSTEMS Keywords
June’s 2013 protests; Politics; Social Networks; Radical democracy
______________________________________________________

No dia 20 de junho, estávamos lá, no centro do Rio de Janeiro, Esplanada dos Ministérios, na Conde
da Boa Vista, Avenida Paulista, e num grande número de artérias vitais dos grandes centros
urbanos do Brasil, confrontando o que surgia nas ruas com o que noticiavam as grandes emissoras
de TV. Para quem não estava de alguma forma conectado ou conectada às mídias sociais que
povoam a Internet, as manifestações pareceram como um raio em céu azul. Em alguma medida,
todos compartilhamos certa perplexidade, todavia. Os governos federal, estadual e municipal, 60%
dos domicílios que não têm acesso à Internet, ou os 45% dos indivíduos que nunca acessaram a
Internet em suas vidas (ver http://www.cetic.br/usuarios/tic/2012/), e mesmo aqueles que foram
às ruas, sensíveis portanto a esse tipo de mídia, não tinham uma ideia muito exata do impacto que
a mobilização, até então predominantemente virtual, poderia ter na vida social e política de
diversas cidades do país nas semanas que se seguiram. André Singer compara esses acontecimento
a um abalo sísmico. “Porque em certo momento os protestos adquiriram tal dimensão e energia
que ficou claro estar ocorrendo algo nas entranhas da sociedade, algo que podia sair do controle.
Mas nunca restou nítido o que estava acontecendo” (Singer, 2013, p. 24). Atônitos também
estavam e estão as grandes emissoras de TV brasileiras: um famoso âncora de telejornalismo
chegou a condenar o que se convencionou chamar de 'vandalismo', mais especificamente, a
depredação e queima de um carro da TV Record: era preciso que os manifestantes soubessem que
as emissoras de TV têm um papel fundamental na divulgação desses protestos, ponderou o
jornalista. Havia naquele comentário muita verdade e uma discussão premente a ser levada
adiante. De um modo bastante contundente, era mesmo o lugar político que os meios de
comunicação de massa ocupam nas sociedades contemporâneas que estava em questão naqueles
protestos – e que ali, em meio a uma pluralidade de demandas, se traduzia na reivindicação de
formas alternativas de encontrar e produzir informação, de tornar visíveis pautas políticas, de
mobilizar.

Nesse contexto, o que se convencionou chamar 'vandalismo', por mais que o temamos, ainda
merece uma explicação. O que significa? Como o tornou possível? Alfredo Sirkis, ecoando de algum
modo a visão predominante na grande mídia, que procura separar os “bons” dos “maus
manifestantes”, afirmava em artigo do dia 21 de junho de 2013 na Folha de São Paulo: “A
violência associada ao processo do vandalismo e da truculência policial é uma espécie de efeito
colateral, a não ser que fuja ao controle completamente ­ o que, em geral, não ocorre com
mobilizações majoritariamente de classe média”. Se é verdade que os grandes veículos de
comunicação operam tradicionalmente a partir de um diapasão moralizador e ordenador ­ e seus
interesses, via de regra, se confundem com aqueles que caracterizam os poderes instituídos ­,
mesmo essa tarefa não pode ser realizada de modo satisfatório sem uma compreensão razoável da
realidade. Tratava­se para os manifestantes de encontrar espaços de articulação política fora do
âmbito tutelado pelas grandes empresas de comunicação, ou pelo estado, espaços novos que
pudessem eventualmente influenciar as agendas editoriais dos grandes media. Isso não é uma

http://www.revista.ufpe.br/revsocio/index.php/revista/article/view/405/331 1/11
10/09/2015 Ágora eletrônica: algumas reflexões teórico­metodológicas | Ferreira | Estudos de Sociologia
novidade em termos de ciberativismo. Consideremos como ilustração um contexto político bastante
distinto, como é o caso tunisiano de expressão política pela Internet num contexto fortemente
autoritário. Em ensaio publicado em 2013, Lacomte propõe precisamente discutir o lugar dos meios
de comunicação nos processos políticos contemporâneos, sua condição, acrescentaríamos, de
indicador do grau nível de realização democrática num dado contexto social:

“no contexto autoritário tunisiano, onde as medias tradicionais, do
mesmo modo que os espaços públicos mediatizados, estavam largamente
sobre a dominação do poder e onde a oposição tunisiana instituída estava
desprovida de base social e abandonada pela juventude, a internet
permitia a emergência de um espaço público constituído por novas vozes
alternativas – tanto no nível de sua forma quanto dos atores que a
emitiam – capazes de influenciar a configuração do regime político
posto?" (Lacomte, 2013, p. 53)

Em aproximadamente 350 cidades do Brasil (Singer, 2013, p. 24), os cartazes produzidos pelos
manifestantes, em sua pluralidade, no seu caráter francamente artesanal, deram o tom desses
eventos que um militante carrancudo avaliou como sendo carnavalesco. Para além de qualquer
simplificação, teríamos de fato de concluir que o depoimento coletivo que vimos deve ser
relacionado intimamente a esse tipo de alegria e à busca de uma forma de manifestação e de
práticas políticas mais horizontais, menos centralizadas. Mas há no depoimento daquele militante
uma crítica mais específica: recifense de coração, propunha que a tradicional e hoje questionável
horizontalidade do carnaval pernambucano estaria muito mais próxima da falta de centro das
manifestações de junho do que o estaria, digamos, a mobilização pelas eleições diretas para
presidente da República: com seus convidados ilustres, objetivo claramente circunscrito, comícios e
palanques devidamente protegidos, hora de começar e terminar. Implicitamente, sua opção de
prática política alinhava­se mais a esta segunda possibilidade e, assim, criticava o fato de essas
manifestações não terem um centro, ou um roteiro claramente definidos, sua pluralidade e
ausência de um programa de lutas de longo prazo.

No artigo “Respeitável público: performance e organização dos movimentos sociais antes dos
protestos de 2013”, Dowbor e Szwaro, propõem, à luz do interacionismo simbólico, analisar o
aspecto teatral que manifestações como as promovidas pelo Movimento Passe Livre ­ que
culminaram nos protestos de junho de 2013 – apresentam. Afirmam ainda os autores que esse
caráter dramatúrgico não destitui o seu sentido estratégico, político. “Nessa competição pela
interpretação da plateia e por uma reação positiva do público, a performance dos movimentos visa
transformar aquilo que é uma plateia desde sempre virtual (seja ela as autoridades estatais, a
opinião pública ou quaisquer outras personagens da sociedade civil) em um público espectador
cativo, um aliado” (Dowbor e Szwaro, 2013, p. 44­45). Para milhares de pessoas que filmaram
suas próprias participações naqueles protestos, não bastava participar, era preciso preparar o
testemunho da própria participação e, assim, estar em dois lugares e dois tempos: na
manifestação, exposto às lentes de uma infinidade de pessoas, e antevendo o momento em que
essas imagens se tornarão evidência de participação e fermento de mobilização nas redes sociais.
Acerca do que, seguindo Laurence Allard e Frédéric Vandenberghe (2003), poderíamos chamar de
necessidades expressivas da individualidade contemporânea, é preciso desde logo assinalar isto que
desaparece das análises que enfatizam a importância das “redes sociais” ou dos “enxames
cognitivos” produzidos nas redes sociais: a expressão como elemento central desta dinâmica. A
dimensão estrutural desse tipo de abordagem, no que pese seu compromisso com uma síntese
teórica entre estrutura e ação, são um fator que certamente age no sentido de tal omissão.
Embora não privilegiemos uma análise da expressão como elemento central das manifestações de
junho, nosso artigo se esboça a partir da necessidade de entender a articulação de elementos
simbólicos, discursivos como peças fundamentais para compreender a configuração do político
neste contexto.

Nosso amigo e também docente, Alexandro de Jesus, registrou a própria participação na passeata
do dia 20, no Recife, como vimos muita gente fazer – gente que deseja ser escutada e vista e que
parece ter encontrado uma forma de conseguir as duas coisas. No vídeo que ele nos cedeu
podemos ler alguns desses cartazes que transcrevemos: “Verás que um filho teu não foge à luta”,
“Desculpe o transtorno, estamos mudando o Brasil!”, “Foda­se a Copa!”, “Saúde, Educação e
Respeito”, “Winter is coming”, “Japão, trocamos nossa seleção por sua educação”, “Amor não tem
cura”, “Não à PEC­37”, “Saúde padrão FIFA”, “Vem, vamos embora que esperar não é saber”, “E
hoje mainha me bota pra dormir de couro quente”, “Dilma, me chama de copa e investe em mim”,
“Tem tanta coisa errada no Brasil, que não cabe em um cartaz”, “Armaria! PEC 37, nann”,
“Impunidade? Diga não”, “Dez centavos não compra nem um “Dudu””, “Ei, Dudu, pega os dez
centavos e enfia lá no SUS”, “#vemprarua”, “São demônios os que destroem o poder bravio da
humanidade”, “Um passo à frente e você já não está no mesmo lugar”, “A gente quer ter voz
ativa, no nosso destino mandar”, “Governador, quer ser presidente? Cuida primeiro da gente”,
“Quantas escolas cabem em um estádio?”, “De burro, eu só tenho a chibata”, “Abaixo o ato
médico”, “Brasil, 500 anos de desigualdade!”, “Homofobia tem cura”, “O gigante acordou”, “Renan
Calheiros, não esquecemos de você”.

Se pudéssemos, em algum momento, num fração de segundos, fotografar o tráfico de mensagens
nas redes sociais durante esses dias, é provável que tivéssemos algo que se assemelharia a esse
mosaico discursivo. Num plano importante, mas que pode facilmente levar a equívocos, aquele
aparente caos é o que foi simbolicamente produzido no Facebook, por exemplo, a cada segundo
durante esses dias de junho. Neste sentido, todas essas mensagens apenas transportavam para as
ruas, sob a forma de instantâneo, o dinamismo intenso e a pluralidade discursiva das redes sociais.
Essa atualização do que se mantinha num plano virtual foi, por si só, um fenômeno de uma
importância política que não pode ser negligenciada. O que aconteceu é um fenômeno
relativamente novo, inédito no Brasil. Novo, primeiro, com respeito à sua forma de mobilização: o
ativismo das ruas sendo convocado pelas mídias sociais (Facebook, Twitter, entre outras). Esse tipo
de evento político, todavia, e os fatos que dele decorrem, vêm se repetindo mundo afora ­ a
exemplo das manifestações da primavera árabe, nos países do Noroeste da África; dos protestos em
Portugal (“movimento geração à rasca”); na Espanha (“indignados”); nos Estados Unidos (“ocupe a
Wall Street”). Em todos esses contextos foi possível perceber a perplexidade dos analistas. A dita
sociedade da informação estaria produzindo um tipo novo de ativismo, buscando estabelecer uma
relação politicamente virtuosa entre virtual e atual? O que esperar dessas grandes mobilizações
populares? É possível que este fenômeno se transforme em uma agenda política que possamos
traduzir em categorias a partir das quais o político tem sido tradiconalmernte concebido? Pensar em
uma ágora eletrônica implica ressignificar o conteúdo das nossas instituições, em especial aquelas
que operam o modelo de democracia representativa? Como transformar a articulação de demandas
tão plurais em uma agenda política também articulada e factível? Mais uma vez, o texto de
Lacomte (2013, p. 61), ao analisar um contexto político cujo autoritarismo seria bem maior do que
o nosso, oferece­nos subsídios para pensar o fenômeno que tratamos neste ensaio.

“Eles [os ciberativistas] fizeram emergir um espaço público alternativo
cujo estilo e normas de discurso público se distanciam fortemente
daqueles esperados de uma “esfera pública” no sentido habermasiano,
onde supostamente predominam o estilo deliberativo, a procura racional
do consenso pela força do “melhor argumento” e ultrapassagem
[dépassement] das subjetividades. Veremo ao contrário que humor,
ironia, informalidade e subjetividade caracterizaram largamente a tomada

http://www.revista.ufpe.br/revsocio/index.php/revista/article/view/405/331 2/11
10/09/2015 Ágora eletrônica: algumas reflexões teórico­metodológicas | Ferreira | Estudos de Sociologia
de palavra e ações de protesto destes internautas cidadãos. Ao denunciar
direta ou indiretamente a situação política tunisiana, estes além do mais
não pararam de tornar evidente seu desafio à oposição tunisiana
instituída, não hesitando em colocá­la em questão ou ironizá­la, em
denunciar suas querelas ideológicas e liderança, a ineficiência de seus
modos de ação, o caráter exageradamente formalizado e vertical de seus
modos de organização e comunicação”

A novidade dos eventos de junho, o fato de não se enquadrarem a um modelo de participação
cívica convencional, e de questionarem os valores esperados na esfera pública ­ e a obra de
Habermas parece para Lacomte um exemplo destas expectativas ­ fez com que essas
manifestações fossem compreendidas pejorativamente como “revolta coxinha”, ou, para os mais
paternalistas, como manifestação política juvenil e inexperiente. Com efeito, até esses eventos, a
esmagadora maioria dos que pensam a política não haviam visualizado a possibilidade de práticas
de participação e constituição de agenda política não canalizadas pelo que se entende
tradicionalmente por esfera pública: partidos, sindicatos, veículos de informação de massa (rádio,
televisão, mídia impressa)2. Habermas, mesmo refletindo acerca daquilo que ele designa formas
autônomas da esfera pública, as coloca de certa forma subordinada ao campo normativo. Este é o
caso das “Associações Livres”, que constroem pontos de conexão com a esfera pública, indo de
encontro às redes de comunicação tradicional, mas mantendo vínculo com os campos institucionais
da política3. E, ainda segundo Habermas – e este é o ponto que demonstra otimismo, em relação,
por exemplo, à visão bastante sombria da possibilidade de processos comunicativos mais amplos e
libertadores, expressada por Horkheimer e Adorno4, em sua crítica à indústria cultural – a partir daí
surge a possibilidade de uma “descolonização” da racionalidade instrumental a partir do mundo da
vida.

Mesmo o bom artigo que nos oferece André Singer a respeito desses acontecimentos parece não se
desembaraçar de uma avaliação que, afinal, tem como pano de fundo a pergunta: podemos
apreciá­los à luz das categorias marxistas que refletem a mudança social? São “jornadas”
comparáveis ao 18 de Brumário? Posicionados nestas trincheiras, parece que nos desobrigamos de
procurar compreender mais profundamente o que de fato aconteceu e continua a ocorrer em
alguma medida no Brasil. Como foram possíveis esses eventos? E o que eles significam na dinâmica
política brasileira? Um exemplo claro de redução analítica desses eventos são suas interpretações
economicistas – no que pese os importantes subsídios que algumas delas podem oferecer, como o
já mencionado artigo de André Singer. Haveria ou não haveria uma crise econômica por trás de
todo aquele descontentamento, cenário que aparentemente o Governo Lula desconheceu e, em
decorrência todos os Governos estaduais e municipais envolvidos na crise política? O evento político
parece só poder ser analisado em bloco, como produto subjacente a uma causa fundamental. O
presidente do PSDB, Alberto Goldman, em artigo à Folha de São Paulo, do dia 02 de julho de 2013,
afirmou, após uma pergunta retórica, não ter sido a corrução, ou o preço das passagens, as
deficiências do poder público nas áreas de segurança e educação a deflagrar isoladamente as
manifestações: “Enfim, por que essa indignação não explodiu antes? A meu ver, porque Lula e
Dilma foram protegidos por bons resultados econômicos: inflação contida, diminuição do
desemprego, crédito abundante e barato como incentivo ao consumo e aumentos salariais
satisfatórios” 5. E continua argumentando acerca da raiz econômica de uma sucessão de
acontecimentos políticos: “A inflação, em especial o custo dos alimentos, deu um salto
astronômico. O emprego parou de crescer, o crédito diminuiu, os juros aumentaram e os aumentos
de salários apenas recuperam a inflação, quando muito”. É necessário afirmar que esse tipo de
redução, o político como epifenômeno do econômico, é tecnocrática por princípio, traduzindo uma
recusa fundamental em se dar ao trabalho da análise generosa dos fatos. Tal qual o militante de
que falamos nas linhas iniciais deste ensaio, aqui já se tem as respostas. Remetendo a categorias
analíticas tradicionais, mas posicionado em um campo político bem distinto daquele em que situa
Goldman, Singer afirma que junho de 2013 significa principalmente o fato de, mesmo tendo sido
aceso o estopim pela classe média, “o novo proletariado, forjado na década do lulismo, entrou nas
avenidas, dando um colorido inédito às marchas reivindicatórias. Uma placa tectônica do país se
mexeu, surpreendendo a todos os atores tradicionais” 6. André de Lara Resende7, oferecendo uma
análise alternativa à de Goldman e à de Singer, preferindo falar de uma crise de representação que
em última instância estaria associada à falência de uma reedição do projeto desenvolvimentista.
Embora não precise operar a partir da pressuposição de uma crise da economia, e seja bem mais
sofisticado do que a explicação proposta por Goldman, a economia é ainda o núcleo da explicação de
Resende para os eventos de junho.

Explicações por atacado parecem não combinar muito nem com a extrema diversidade dos atores;
muito menos com os desdobramentos que puderam ser observados nos meses seguintes.O caso da
recuperação de popularidade de Dilma é ilustrativo. A malaise, por certo, existe, mas ligá­la
diretamente a uma causa principal seria ingenuidade ou precipitação analítica. Neste ponto, parece
até mais simpática a perplexidade de Antonio Prata, manifestada em um artigo na Folha de São
Paulo, no auge dos acontecimentos:

“Sejamos francos: ninguém tá entendendo nada. Nem a imprensa nem
os políticos nem os manifestantes. Tinha Punk de Moicano e playboy de
mocassim. Patricinha de olho azul e rasta de olho vermelho. Tinha uns
barbudos do PCO exigindo que se reestatize o que foi privatizado e
engomados a La Tea Party sonhando com a privatização de todo o resto.
Tinha quem realmente se estrepa com esses 20 centavos e neguinho que
não rela a barriga numa catraca de ônibus desde os tempos da CMTC [...]
tinha a esperança de que este seja um momento importante na história
do país e a suspeita de que talvez o gás da indignação, nas próximas
semanas, vá para o vinagre” 8

Acreditamos na necessidade de avaliar esses acontecimentos a partir de uma perspectiva
sociológica mais ampla, o que pressupõe uma colaboração tal qual propõe este dossiê da revista
Estudos de Sociologia. Neste sentido, propomos expor nas páginas que se seguem alguns
apontamentos de uma reflexão teórico metodológica que possa orientar futuros trabalhos neste
campo. Embora modesto diante das demandas da realidade, tal reflexão é certamente útil. Sua
realização todavia, no contexto do presente ensaio, requer ainda um outro passo. Assim, da
perspectiva que aqui adotamos, faz­se necessário compreender aqueles eventos em sua dimensão
técnica e política. Às análises econômicas propomos o contraste com esta perspectiva de onde a
sociologia poderia obter novas informações sobre as manifestações de junho.

Redes sociais: uma visão preliminar

Comecemos, pois, por afirmar um lugar comum neste tipo de análise: as novas tecnologias de
informação e comunicação constituem­se tecnicamente a partir de uma potência de
horizontalidade na interação entre os indivíduos até então desconhecida. A Internet está para as
organizações sociais em rede, assim como a televisão e o rádio corresponderam tecnicamente ao
modelo político do fordismo, no qual predominava recepção em massa e emissão centralizada. Se,
no contexto das novas tecnologias de informação e comunicação, afirmamos que a relação entre
emissão e recepção é bem mais simétrica do que o foram as medias típicas do fordismo, de modo
algum afirmamos que essa simetria seja efetivamente realizada, e que portanto a topografia que
caracteriza o ciberespaço seja de algum modo plana. As novas tecnologias de informação podem
também ser o lugar onde políticas autoritárias, antidemocráticas encontrem espaço, basta que nos

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10/09/2015 Ágora eletrônica: algumas reflexões teórico­metodológicas | Ferreira | Estudos de Sociologia
reportemos aos eventos que associam o Governo Barak Obama com a espionagem digital.

A teoria das redes aqui nos auxilia a entender que a mobilização das manifestações que começaram
em junho de 2013 não ocorrem num vazio territorial. Este é um fato relativamente conhecido,
registrado em outras ocasiões pelos teóricos das redes. A march of Dimes9, uma grande mobilização
popular que aconteceu nos Estados Unidos na década de 1950, é um exemplo conveniente. O
objetivo era arrecadar dinheiro para financiar a pesquisa de uma vacina contra a poliomielite. E o
momento de ápice aconteceu quando uma multidão de pessoas, vindas de todas as partes da
América do Norte, reuniu­se em Washington. Parte importante da campanha foi veiculada por
rádio, veículo de comunicação de massas de importância indiscutível na época10. Mas as pessoas se
organizavam a partir de suas redes ancoradas territorialmente: amigos do bairro, membros de
congregação religiosa, entre outros ingredientes de sua trama reticular. Era, então, possível,
vislumbrar naquela multidão de pessoas, pequenos aglomerados de conhecidos, compartilhando
aquele momento de suas biografias. Da mesma forma, os que foram à Avenida Paulista, Avenida
Getúlio Vargas ou Avenida Conde da Boa Vista, em sua maior parte, não estavam sozinhos, mas
sim em grupos, que fazem parte da trama reticular cotidiana.

Nos dois casos, ficamos com a pergunta: “como a ação coletiva seria coordenada” (Marwell,1993)?
Haveria alguma forma de explicar a complexa natureza do fenômeno da mobilização coletiva, o fato
de um número expressivo de pessoas decidirem, por exemplo, ir às ruas manifestar sua
insatisfação contra o aumento das passagens? Esta pergunta é trabalhada por Marwell, quando ele
constrói sua teoria da massa crítica que fundamentalmente indica as formas pelas quais a
estrutura das redes sociais promove ou inibe as chances de mobilização coletiva de um grupo.
Massa crítica remete à possibilidade de, em um campo reticular qualquer, independente de ser
resultante de interações face a face ou mediadas por qualquer veículo comunicativo, mobilizar um
número relativamente importante de pessoas que provoque visibilidade e que, desta forma, motive
outras pessoas a aderirem ao movimento e também repercuta ou provoque efeitos na esfera
pública. Marwell parte do principio que “participantes em organização de movimentos sociais são
usualmente recrutados a partir de laços sociais preexistentes” (p.102) – e aqui acrescentaria que
este fato independe da forma de ativar as interações, face a face ou mediada pela internet, por
exemplo. No caso que estudamos, evidentemente, temos um complicador, embora o “Passe Livre”
possa ser entendido como movimento social com objetivo definido e uma estrutura de mobilização
claramente delimitada, as manifestações que dela decorreram estão longe de se encaixar neste
modelo. Cabe­nos aqui, entretanto, em lugar de cegar diante dessa diversidade, procurar entender
como, partindo de lugares, motivações tão distintas, essas demandas puderam se articular
momentaneamente.

A arquitetura da rede11 contrariamente ao que inicialmente se pensava não se estrutura a partir da
possibilidade de acesso aleatório aos nós. Os nós e laços descritos por Euler, todavia, transmitem
fluxos comunicativos entre os atores, e estes se comunicam de forma aleatória, o que significa que
todos têm a mesma chance de entrar em contato com outro membro da rede em questão. A
construção da teoria dos grafos tem por princípio a existência de um número isolado de nós, que
entram em contato com outros aleatoriamente. A partir de um determinado momento, estrutura­
se uma rede, com uma topologia particular, com a maior parte dos nós estruturada em um grande
aglomerado: cria­se uma comunidade, na linguagem dos sociólogos, ou, para os físicos perlocação12.
Considerando como verdadeira esta teoria, admite­se que todos os membros da comunidade têm a
mesma chance de entrar em contato com outros; e mais, que a comunidade interconectando com
o ambiente mais amplo implica igual possibilidade de acesso a qualquer parte deste ambiente. Essa
concepção de comunidade nos é bem familiar: ela tem os mesmos princípios que orientam a
percepção liberal de sociedade, ou seja, aleatoriedade, atores em igualdade de condições, um grau
zero a partir do qual a comunidade, a rede, a sociedade se articula. Esta teoria se populariza a partir
de um experimento conhecido por seis graus de separação13, a partir do qual se procurava testar a
hipótese que a média de contatos para qualquer pessoa intermediar um encontro com outra
desconhecida é de seis, fenômeno conhecido por small world14.

Posteriormente verifica­se que o fenômeno das redes era bem mais complexo, que o modelo
aleatório das conexões não é recorrente em muitos casos, onde prevalece a lei da potência (Power
Law), ou seja, a evidência de que há uma “distribuição” 15 desigual de poder que articula a rede.
Nestes casos, a posição estrutural de um ator determina a chance de ter mais ou menos acesso a
recursos proporcionados pela rede, de ter também maior controle sobre os fluxos de informação. A
topologia de uma rede sugere maior assimetria entre atores, com clusters e indicadores de
centralidade claramente indicando posições desiguais entre os atores16. Este é o caso para a maioria
das estruturas reticulares complexas, com um grande volume de nodos.

A topologia de uma rede nos revela aquele momento imediato de sua captura, tal qual em uma
fotografia. A dinâmica reticular não deve apresentar a rigidez estrutural que por vezes os
sociogramas nos induzem a acreditar. O que acontece, de fato, é um constante movimento – é
certo acomodado às dificuldades das posições estruturais dos atores; e este movimento, para o
caso das redes sociais, implica também, muito além do determinismo estrutural, a consideração de
que os atores constroem estratégias, buscam posições centrais em suas redes para assim ter
acesso a recursos.

Todavia, a dinâmica reticular é ainda uma seara pouco explorada. A maioria dos estudos sobre
redes sociais ainda remete a campos empíricos microssociológicos, e na maioria dos casos
procedendo à recolha dos dados de uma vez, desconsiderando portanto os complexos processos de
mudança na estrutura. Sociogramas retratam aquele momento quando foi capturado, nos informa
sobre a topologia daquela rede fotografada e, como em toda fotografia, apenas nos dá a imagem de
uma paisagem. Mas a estrutura reticular, mesmo guardando algumas características relativamente
constantes, é, por sua natureza, instável. E a sua complexidade aumenta enormemente quando
consideramos a possibilidade de análise dinâmica. Típico de sistemas complexos, o grau de
indeterminação aumenta com o incremento do número de possibilidades de variação, o que torna,
a partir de certo momento, quase impossível a captura de sua dinâmica. O que resulta no fato que
a relação entre a estrutura da rede e sua função é uma fronteira a ser explorada17. Porque a
dinâmica estrutural depende de como se comportam os atores, e este comportamento é
determinado por sua função. Um sistema dinâmico “é qualquer sistema cujo estado, enquanto
representado por um conjunto de variáveis quantitativas, muda no decorrer do tempo de acordo
com regras definidas ou equações” (Newman, 2010, p. 676). Sistemas dinâmicos não reticulares já
são objeto de estudo das matemáticas; aqueles envolvendo estruturas reticulares são bem
recentes, e são estratégicos para a compreensão de fenômenos envolvendo processos com um
número relativamente importante de atores em interação. Para o nosso caso, perguntamo­nos
como observar as interações mediadas pela internet e avaliarmos as estruturas das redes
resultantes e suas determinações sobre processos de ação coletiva, de mobilização, por exemplo,
semelhante àquela acontecida em Junho de 2013 no Brasil.

E aqui podemos perceber o limite da imagem que propomos no início deste ensaio, qual seja,
conceber um corte temporal em que o tráfego discursivo que há nas redes sociais pudesse ser
convertido numa fotografia. Essa visão estática é o que nos faz ver caos onde há um rico
dinamismo político a ser investigado. Todos não são iguais no contexto do enorme dinamismo das
mídias sociais. O dito “os ricos ficam sempre mais ricos” reflete o fato de que, neste labirinto de
conexões, é possível encontrar hubs, atores centrais, que controlam e organizam o fluxo de
informações. Isso ocorre, não de uma forma tão centralizada quanto outrora, mas de forma
alguma reproduzindo a utopia de perfeita simetria ou horizontalidade entre os participantes. Além

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deste fato merece destaque neste contexto o fenômeno da dita “exclusão digital” – ou do
autoritarismo digital, como preferem Ferreira, Pinto e Motta (2012). A internet também não
espalha seus benefícios entre todos e o fato que se reduza o problema político dos grupos
subalternos como um problema de exclusão – que poderia ser resolvido mediante algo como o
acesso universal – é não entender esta como uma questão política num sentido mais profundo
(Young, 2002). Os diversos níveis de posionamento social que caracterizam determinados grupos,
tais como renda, acesso à educação formal etc., estratégias culturais de vida, são elementos que
carregamos para o dito mundo virtual. Isso significa que também temos que ser cautelosos em
relação à potência reformadora de uma ágora virtual: democracia não é uma mera conquista
técnica, mas um chamado político – e por isso assustam­nos aqueles que procuram cancelá­la
numa distopia, numa utopia técnica ou econômica, ou ainda numa resposta pronta. Uma boa
educação pode significar um trânsito mais virtuoso nas infovias, o que implica que programas
governamentais de acesso a computadores e à Internet só podem ser considerado 'inclusivos' se
forem concebidos a partir de uma visão ampla de cultura e de democracia. Qualquer tipo de
inovação técnica e politica, sejamos claros, não ocorre num vazio político e a síntese que podemos
obter entre forças de conservação e forças de transformação é sempre imprevisível. Por isso a
compreensão do que foi e o que ainda são as manifestações de junho são objeto de uma
negociação discursiva que comporta e comportou interpretações que vão da estrema esquerda à
extrema direita.

Em suma, parece­nos equivocado pensar as dinâmicas sociais associadas às novas tecnologias de
informação e comunicação como ocorrendo de forma completamente desterritorializadas – Nicholas
Negroponte ajudou a disseminar este mito em seu hoje quase esquecido Being Digital. As mídias
sociais ancoradas na Internet, embora apresentem elementos desterritorializadores, alimentam­se
de redes territorializadas. É curioso perceber o quanto as redes sociais baseadas na Internet se
reforçam a partir de laços afetivos: sempre implicados nos atos de “curtir” ou “comentar” alguma
contribuição de um dado indivíduo. Há pessoas, entidades capazes de obter mais aprovação pública
que outras e isso, por si só, torna esse espaço muito mais organizado e dotado de hierarquias do
que pode imaginar quem tem do Facebook apenas uma foto, um instantâneo, e indireta, como é o
caso das diversas reportagens veiculadas pelos grande mídia acerca das manifestações de junho.
Esse é o momento de elaborarmos um pouco mais claramente o que os teóricos da sociedade da
informação entendem como redes sociais e enxames (swarms).

Redes sociais e enxames: uma revisão crítica

Mas o que pode de fato nos ensinar a ARS? Em princípio podemos dizer que ela procura responder a
questões de otimização de comunicação entre elementos humanos e não humanos. Sua base
teórica remonta às formulações matemáticas propostas por Euler, no século dezoito, em 1736,
mais precisamente. Essas formulações resultam de um problema matemático simples, mas de
consequências evidentes para uma sociedade que se urbanizava e complexificava. Leonhard Euler
formulou esse problema da seguinte forma: dada uma ilha conectada ao continente por cinco
pontes, qual seria a maneira ótima de cruzar cada uma destas uma única vez sem jamais
retroceder sobre os próprios passos? Foi deste modo que Euler apresentou a estrutura básica da
teoria das redes, que diz respeito a verificação da relação entre pontos a partir de rotas. “Os
primeiros ensaios de Euler sobre teoria dos grafos tentavam conceituar redes transformando­as por
abstração em coisas (pontos, ou “nós”) e ações (linhas, “margens” [edges], e desenvolvendo
formulas para analisar quantitativamente o modo mediante o qual nós interagem entre si via
margens” (Thacker, 2004a). A teoria dos grafos18 é, pois, a base da ARS, que hoje apresenta
aplicações tão diversas quanto analisar a comunicação de grupos humanos, a disseminação de um
vírus em uma dada população, genética molecular, planejamento urbano, entre muitas outras. No
campo da sociologia, a ARS vem oferecer uma análise de pressupostos, ao mesmo tempo,
estruturais e indutivas e que tem na relação entre os indivíduos seu principal foco (Degenne e
Forsé, 1999, cap. 1). Como funcionaria esse estruturalismo que tem sempre um olho na ação
individual? Degenne e Forsé (1999, p. 9 e 10) exemplificam essa possibilidade mediante uma
análise na tendência estrutural ao casamento homofílico. Não há aqui uma determinação externa
que se impõe ao indivíduo, mas oportunidades 'econômicas' que se colocam para quem deseja se
casar: é mais provável que se encontre um parceiro ou parceira em seu ciclo de relações pessoais
do que fora dele; é provável que esse ciclo reflita sua condição de classe, ou faixa etária etc. Aqui,
claramente, há uma resposta ao dilema ator­estrutura, quando se apresenta a ideia de
fundamentar a análise dos fenômenos sociais a partir do campo relacional.

Há uma tendência entre alguns teóricos das redes de universalizar ou essencializar o fenômeno,
com a proposta de construção de uma teoria universal, que entendesse o fenômeno reticular e
suas características estruturais como modus operandi de uma gama infinita de manifestações do
real, desde as estruturas de processos reticulares derivados das interações sociais entre humanos,
até algoritmos que propõem explicar dinâmicas de articulação de fluxos de indivíduos de espécies
diferentes (como enxames de abelhas, cardumes de peixes, revoada de pássaros), redes neurais,
fluxos comunicativos na web, redes metabólicas, entre outros. Newman (2010) afirma
explicitamente que há uma ciência das redes, que tem por objetivo “compreender e modelar o
comportamento dos sistemas de redes que acontecem no mundo real” (p.17). Este “mundo real”
compreende uma série diversa de fenômenos, e se admite que possuam características estruturais
que são o objeto de uma mesma ciência

De acordo com Thacker (b), há na teoria das redes pressupostos que devem ser devidamente
apreciados:
“Ela começa por entender redes como uma distribuição espacial de nós
(coisas) e margens (ações). Isso em si requer a separação entre entidades
individuais e as ações locais causadas por eles: um ator e um ato, nó e
margem. Dessa premissa conceitual e ontológica, conceitos da teoria dos
grafos pretendem descrever propriedades gerais de diferentes tipos de
redes”.

Para Thacker, um primeiro problema neste tipo de abordagem é confundir a existência de conexão
em uma dada área com a existência de uma coletividade. Embora não exista coletividade sem a
ocorrência de conexões entre os indivíduos, o inverso não é necessário: uma série de conexões não
leva necessariamente ao estabelecimento de uma coletividade19. Para isso, a representação
simbólica de uma totalidade entre os indivíduos é imprescindível. A não observância desta
diferenciação elementar tem consequências políticas: “O perigo dessa visão é que a superposição
entre conectividade e coletividade leva a uma espécie de política na qual o fato de simplesmente
estar online se torna sinônimo de ativismo político” (Ibid.). A observação de Thacker é significativa
se levarmos em conta precisamente isso que viemos insistindo, ou seja, na necessidade da analisar
as redes sociais a partir de sua dinâmica territorializadora, a partir de sua dinâmica política e social
mais elementar. Neste ponto, o liberalismo de princípio pressuposto na teoria das redes – “pontos”,
indivíduos, agindo de modo a estabelecer padrões – parece­nos outra armadilha que não nos
permitiria ver o fenômeno político que temos sob escrutínio em sua complexidade e historicidade –
ou territorialidade, como queiram. Nas manifestações a que assistimos, fica claro que estávamos
não apenas diante de um espaço, onde se aglomerava uma multidão, mas diante de um lugar de
lugares onde diversas reivindicações políticas e grupais se articulavam. Como é possível que se
articulem em sua diversidade? E isso nos leva ao segundo elemento das ponderações de Thacker.

A ideia de rede social espacializa e paralisa sob a forma de ligações entre indivíduos, ou entre
pontos e ações, uma dinâmica que só pode ser compreendida com fenômeno temporal. Não se

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trata pois de acrescentar um vetor temporal a uma concepção fundamentalmente estática de
sociedade, mas de perceber desde o princípio essa temporalidade fundamental. A matematização e
espacialização das relações entre os indivíduos amesquinha este segundo e importante aspecto dos
processos sociais. É isso, nós diríamos, que permite tratar como fenômenos equivalentes do ponto
de vista analítico um evento biológico e outro social, tornando irrelevante, por exemplo, o elemento
expressivo, discursivo, que caracteriza este segundo. Em contraposição a essa perspectiva,
entendemos que a mudança, o tempo, não podem ser entendidos como produto secundário das
redes sociais, mas sua essência. Por isso mesmo, Thacker reafirma:

“Uma topologia ou mapa de uma rede não é uma representação em
tempo real. Ela achatou o tempo transformando­o em espaço,
mostrando­nos todos os possíveis nós e margens. Entretanto, mesmo no
nível de nossa experiência cotidiana […] redes criam impactos que são
inegavelmente baseados no tempo, dinâmicos e temporais. Redes são
sempre redes vivas: redes que estão funcionando e redes que estão em
processo” (ibid.)

Aqui, no que pese a compartilha de várias das observações acima, separamo­nos de Thacker.
Tentar solucionar as dificuldades identificadas na matematização das relações sociais recorrendo a
conceitos emprestados do vitalismo é cair num problema similar ao que se busca resolver, visto que
o vitalismo é uma expressão da dificuldade de pensar o político a partir de uma ontologia que lhe
seja própria (ver Ferreira, 2011). Vitalismo é uma dimensão do biopolítico. Bergson, por mais que
reconheçamos o potencial crítico de sua obra, não responde aos desafios da espacialização dos
fenômenos temporais que ele próprio identificou, e a tudo o que tal espacialização implica ao pensar
o político a partir de uma categoria que lhe é imprópria, nomeadamente, instrumentalização do
social. A vida biológica não consegue propor uma ontologia em que o sentido, o discursivo, sejam
elementos centrais da experiência humana. Por esse motivo, o conceito mais dinâmico de enxame
(swarm) também se revela equívoco para tratar de fenômenos como o que estamos considerando
neste ensaio.

Modelizações matemáticas que enfrentam o complexo fenômeno dos enxames (swarms),
movimentos orquestrados de indivíduos apenas aparentemente movidos por um telos que escapa
às decisões individuais, são interessantes exercícios que nos indicam possibilidades de padrões de
topologias reticulares. E também são importantes insights para os que trabalham com
comportamento animal, na tentativa de compreender os intricados fenômenos de ações coletivas
aparentemente cheias de sentido e imprescindíveis para a reprodução das espécies. Deste modo,
cardumes de peixes sugerem estratégias de combate a predadores; o fenômeno conhecido por
inteligência de enxame (swarm Intelligence) assinala uma articulação de um conjunto de
indivíduos que interagem em um ambiente provocando padrões de comportamento adequados ao
enfrentamento de uma situação de stress. Não existe um telos que se possa vislumbrar estratégias
previamente aprendidas para cada caso, mas uma marca evolutiva daquela espécie em particular
que reproduz dinâmicas quase que intituitivamente. O interessante destas dinâmicas é a existência
de um padrão descentralizado na produção dos processos reticulares, sugerindo uma topologia
adequada às movimentações observadas20. Trata­se de um complexo processo que articula ao
mesmo tempo informações entre os indivíduos membros daquela estrutura reticular – sugerindo
alguma forma de comunicação e por isso mesmo uma topologia reticular adequada a este processo
– e informação derivada da própria movimentação da rede, stigmergy, o que sugere uma auto­
organização reticular.

Proveniente da etologia, ciência do comportamento animal situada entre a zoologia, a anatomia
comparada e o estudo de ecossistemas (Thacker b), o conceito de enxame revela que a vida animal
é sempre relacional e que o elemento vivo só pode ser compreendido em interação dinâmica com o
sistema vivo. E se em seus primeiros estudos, a etologia pressupunha que tal sistema assumia a
forma de um controle necessariamente centralizado, como é o caso do estudo de Edward Wilson
sobre formigas, estudos mais recentes tenderam a focar o modo como “processos coletivos”
menores constituíam grupos maiores (ibid). Assim, o voo de um bando de andorinhas, ou de aves
migratórias, é o resultado de um conjunto de regras simples executada pelos indivíduos em relação
uns aos outros (como o ajuste de velocidade e distância em relação aos vizinhos). Deste ajuste
surge um padrão ­ e não da obediência às determinações de uma liderança, por exemplo. “De fato,
cientistas que estudam o comportamento de insetos sociais concluíram que a coperação no nível da
colônia é largamente auto­organizada: em numerosas situações a coordenação surge das
interações entre os indivíduos” (Bonabeau e Théraulaz, 2000, p. 73 ­74). Interações simples e não
conscientes podem, por agregação, resultar em padrões de comportamento altamente complexos
que no limite poderiam até ser chamados de “inteligência de enxame”. Neste ponto não há como
não lembrar as polêmicas em torno da ideia de inteligência artificial na década de 1960 e que opôs
Joseph Weizembaun e Hubert Dreyfus a cientistas que acreditavam que computadores inteligentes
poderiam ser construídos. O cerne da posição de Dreyfus é bem conhecida. Partindo da
fenomenologia husserliana, ele argumentava que se um computador não tem intencionalidade,
não é consciente. Desta forma, não podemos atribuir­lhe pensamento ou inteligência. A
emergência de um padrão de comportamento num formigueiro, embora possa resultar eficiente
com respeito à sobrevivência do grupo, é desprovido de intencionalidade e portanto de significado
social – o que não implica dizer “desprovido de importância social”. Qual o sentido, portanto, do
tropo mediante o qual cientistas podem associar o padrão de comportamento de um enxame e o
atributo 'inteligência”? As distinções que aqui podem ser facilmente elencadas a partir dos
ensinamentos de Dreyfus não impedem que engenheiros de tráfico usem o que aprendem com os
padrões de eficiência dos insetos à locomoção humana, ou seja, não os impede de usar
formigueiros como parâmetro para planejar o tráfico em grandes cidades.

O fato de a dinâmica das estruturas reticulares dos swarms precindir de uma ideia de ação
intencional, por conseguinte, amesquinha a explicação da maioria dos processos vividos em
sociedades humanas. Que a ação humana seja definida nestes termos, ou seja, como algo provido
de significado e de intencionalidade, é largamente aceito nas ciências sociais. Talvez uma exceção
notável seja encontrada no conceito de imitação em Tarde: comportamentos coletivos poderiam
ser resultado direto do contágio21. Para além, portanto dos átomos constituintes do comportamento
de massa, os indivíduos, estaria a totalidade que de uma maneira ou de outra, conduziriam seus
membros. Esta ideia, a de comportamento de massas, foi bastante discutida no final do século XIX:
além do próprio Tarde, Le Bom, McDougall, Trotter, entre outros22. Seguindo esta linha
interpretativa, alguns autores sugerem que padrões de comportamento difundidos a partir das
mídias sociais podem espelhar as Leis da Imitação de Tarde, dando, desta forma uma indiscutível
semelhança com os movimentos dos swarms observados entre algumas espécies animais. Ramos,
por exemplo, sugere que muitos pássaros, como por exemplo as gaivotas, constroem seus ninhos
em colônias: “A nidificação grupal evidentemente oferece aos indivíduos alguns benefícios, tais
como a detecção de predadores ou maior facilidade de encontrar comida. O mecanismo neste caso
é a imitação: pássaros preparando o ninho são atraídos pelos lugares onde outros pássaros já estão
se aninhando, porquanto a regra comportamental pode ser sintetizada da seguinte forma: eu faço
meu ninho próximo ao seu ninho”. Os autores remetem, em nota de pé de página, ao “trabalho
seminal” de Tarde Les Lois de l’imitation 23.

Poderia a etologia oferecer uma resposta teórica para entender como os vínculos sociais e as ações
surgem no âmbito das novas mídias? Embora alguns vejam aqui uma resposta ao tipo de
articulação política que tem surgido na internet nossa resposta a essa questão seria negativa. Um
dos principais problemas identificados no conceito de redes sociais também é reproduzido nos

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raciocínios que decorrem do conceito de enxame. Thacker percebe isso com clareza ao observar
que, assim como é inadequado confundir coletividade e conectividade, é espúrio tomar como
semelhantes padrão e propósito nos sistemas vivos.

Enquanto em biologia pode ser adequado deixar o estudo de enxames no
nível da organização e padrão, no domínio político isso é apenas o começo.
A simples identificação de padrões não implica uma política, nem mostra
como contingência e potencialidade são afetadas em tal contexto.
Identificar uma multidão numa estação do metrô como sendo organizada
de um determinado modo nada diz acerca da significância de tal padrão,
neste contexto, neste momento social e cultural (Ibid. b).

Esse erro advém de tentar tratar um fenômeno social a partir de um modelo biológico,
reivindicação que gerou intensos debates no campo sociológico desde a sua emergência. O que
escapa a tais modelos é precisamente o fato de a realidade social, humana, ser constituída a partir
de significados compartilhados e disputados, um jogo discursivo que é sempre diferencial no sentido
que Derrida atribui a este termo. E evidentemente, como viemos sugerindo ao longo deste tópico,
a obra de Foucault poderia aqui também nos ser de grande valia. Ora a redução do social e do
político a padrões biológicos é plenamente compreensível numa sociedade em que a política se
converteu na administração biológica da existência. Sobre isso, todavia, não poderemos discorrer
mais amplamente, dados os limites e escopo deste ensaio.

Algumas consequências dessas ponderações

O fato de insistirmos na ideia de território ao falar dos eventos de junho de 2013, é uma tentativa
de ajustar nossa interpretação a essas conclusões teóricas. Do ponto de vista metodológico, isso
revela a importância dos significados constituídos e disputados no bojo dos eventos políticos que
temos em foco. O que essas preocupações podem significar concretamente? Vejamos. Mesmo para
quem participou de mobilizações como as “Diretas Já”, “Fora Collor”, entre tantas outras,
impressiona a quantidade de jovens que levou adiante essas marchas de agenda tão ampla.
Coligindo resultados apresentados pelo Datafoha, Plus Marketing e Ibope, Singer (2013, p. 28)
apresenta os seguintes resultados: os mais jovens (entre 12 e 25 anos) representaram 53% dos
manifestantes no dia 17/06, em São Paulo, 41% dos manifestantes no dia 20/06 no Rio de Janeiro
e 55% dos manifestantes no dia 22/06 em Belo Horizonte. Se somarmos a estes números pessoas
com até 35 anos, estes percentuais tornam­se bem mais expressivos. É de se supor que essa
maioria seja também preponderante nas mídias sociais com base na Internet a partir das quais
foram articuladas essa infinidade de manifestações enfeixadas nos espaços metropolitanos de todo
o país. Nas ruas impressiona, portanto, a pluralidade de bandeiras que se articulavam num
sentimento difuso de insatisfação. Embora possa haver uma articulação discursiva dessa
diversidade, parece claro que tal articulação é, em sua precariedade, o produto de inúmeras lutas
por hegemonia – como o atestam, por exemplo, a recusa de alguns manifestantes em aceitar a
presença de bandeiras de partidos políticos durante essas manifestações.

No segundo semestre de 2013, falou­se muito acerca de estarmos diante de uma reivindicação por
uma forma política descentrada, horizontal de ação. As perguntas a que essa constatação deram
ensejo não tardaram: como responder a essas inquietações, supondo que haja vontade ou
competência institucional estabelecida para fazê­lo? A quem responder? Com quem negociar e
exatamente o quê? Por mais que se negue esse fato, aprendemos a pensar política ainda a partir
de um modelo em que a questão da soberania é central. Ora, ninguém propôs de forma mais
acabada o político nesses termos que Carl Schmitt. Em O Conceito do Político, ele afirma que, se a
moralidade diz respeito a uma distinção entre bem e mal, o estético entre beleza e feiura, a política
pode ser definida nos seguintes termos: “A distinção política específica à qual ações e motivos
podem ser reduzidas é aquela entre amigo e inimigo”. E como o político na obra de Schmitt leva
sempre à questão da decisão soberana, na primeira página da Teologia Política lemos esta outra
definição que complementa a primeira: “Soberano é aquele que decide acerca da exceção” (1984,
p. 5). Ou seja, soberano ou soberana é aquele, ou aquela instituição, ou conjunto de interesses,
capaz, ou capazes, de estabelecer um espaço de pertencimento, de identidade, contrapondo­o aos
interesses daqueles que são considerados estranhos, impróprios. Identidade e capacidade de
decidir, esses seriam os atributos essenciais do exercício político soberano. A pergunta que
propomos neste momento é aquela que mobiliza Laclau e Mouffe a escrever Hegemonia e
Estratégia Socialista: seria possível pensar estratégias políticas libertárias sem o recurso às ideias de
identidade e essência que têm alicerçado a luta política no espaço democrático, levando em conta o
dinamismo e a contingência que marcam as sociedades capitalistas avançadas? O espaço discursivo
­ e de reflexão sobre a discursividade ­ que se abre com essa pergunta interessa como resposta aos
becos­sem­saída a que a teoria das redes e da inteligência de enxame nos levaram.

Ora, que o pensar político que fundamenta a teoria da soberania, e tudo que dela decorre, é
conservador, todos sabemos. Menos clara é a forma como esses conceitos, que de resto decorrem
do pensamento hegeliano, apresentam uma enorme afinidade com outros bem menos suspeitos
como “classe social”, “revolução proletária”, “identidade de classe”. Apesar de tudo o que Foucault
falou acerca da caducidade desse modo de conceber o político ­ alicerçado que está na teoria do
direito do século XVIII ­ diante da evidência de que a administração biológica da vida seria o novo
paradigma da produção e reprodução do poder nas sociedades industriais, parece claro que aquela
influência está longe de ser superada. E isso não apenas em decorrência, por exemplo, da força que
as análises de orientação marxistas ainda apresentam na contemporaneidade. Deleuze, levando
adiante a crítica de Foucault à ideia de soberania, sugere neste autor a construção de uma
topologia moderna, que não opera mais a partir da pressuposição de um lugar, de uma fonte
privilegiada de poder. “perceberemos que “local” tem dois sentidos diferentes: o poder é local
porque ele não é jamais global, mas ele não é local ou localizável porque ele é difuso” 24”

Em livros com Homo Sacer ou Estado de Exceção, Agamben, por outro lado, sugere estarmos
distantes de superar a ideia do político que encontra sua forma mais acabada na obra de Schmitt.
Parece ainda inevitável traçar entre esse tipo de formulação política e a estruturação de agendas
político­partidárias que almejam o controle do aparato de Estado. Neste contexto, em consonância
não apenas com uma política da soberania, mas da identidade, decide­se entre questões ditas
fundamentais e questões ditas secundárias, entre alianças que garantem essa identidade e outras
que a põe a perder. No âmbito das esquerdas marxistas a ideia de um partido proletário talvez
tenha encapsulado, em seu messianismo e essencialismo, esse pressuposto à perfeição. Em sua
versão mais crua, cínica, esse tipo de compreensão converte­se facilmente em uma pragmática de
como se manter no poder. Esse 'pragmatismo' se torna um elemento político ainda mais
preocupante quando constatamos o afastamento histórico de nossas instituições políticas do
cidadão comum25. Sintomático desse afastamento talvez seja o tom desesperado mediante o qual
um Senador da República, Cristovam Buarque, defendeu no calor das manifestações de junho a
dissolução dos partidos políticos e da convocação de uma Assembleia Constituinte para decidir que
tipo de modelo político substituiria o tipo de representação que temos diante de nós. A perplexidade
não pode ir muito mais longe. Ela atesta entre outras coisas, e para nos mantermos nos limites
que nos propusemos neste ensaio, da dificuldade de tornar efetiva uma política de representação
baseada na ideia de identidade26, diante das reivindicações de participação política que, em sua
multiplicidade e dinamismo, não conseguem operar a partir daquela lógica nem encontrar espaço
adequado naquele âmbito. Devemos lembrar, com preocupação e a propósito, o fato de a
hostilização aos partidos ter encontrado espaço nas ruas. Talvez não seja demais enfatizar o óbvio:
a democracia representativa é uma conquista que não pode simplesmente ser abandonada, sob

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pena de abrirmos espaço para formas indigestas de exercício político. Porém, mais a propósito,
devemos também assinalar o fato de a demanda por reconhecimento de jovens da periferia
implícita nasações mobilizadas pela internetos “rolezinhos”, de evento político, num sentido amplo
do temo, e social tenha sendo convertido em caso policial. Uma vez mais, não nos interessa a
efetividade de tal evento, mas a sua existência, a disputa simbólica que ele dá lugar e o fato de ele
parecer concebível como resultado do aprendizado que as manifestações de junho deram lugar.

Em Hegemonia e Estratégia Socialista, Ernesto Laclau e Chantal Mouffe propõem a retomada do
conceito de hegemonia para pensar dinâmicas políticas difíceis de serem analisadas a partir de uma
leitura mais estrutural do marxismo (ver Alves, 2010). Neste contexto, ao se debruçar sobre a obra
de Rosa de Luxemburgo, eles observam alguns pontos que nos interessam aqui, mas sobretudo a
ideia de que a unidade da classe operária seria algo da ordem do simbólico. Para Rosa Luxemburgo,
apenas o momento revolucionário seria capaz de transformar essa unidade que é apenas “teórica”
e “latente”, dadas as incontáveis especificidades que essa luta assume, em uma unidade “prática”
e “ativa” (Laclau e Mouffe, 1987, p. 21 e 22). O que interessa a Laclau e Mouffe da análise de Rosa
de Luxemburgo é certamente a atenção que ela confere à contingência no processo de luta em
direção ao socialismo. A partir desta constatação, e abandonando uma perspectiva analítica que
privilegia a noção de totalidade, e, portanto, os momentos analíticos transcendentes que criticamos
acima, lhes será possível afirmar: “Não existe um espaço saturado que possamos conceber como
uma 'sociedade', já que o social careceria de essência” (ibid. p. 161). A percepção do processo
político como algo contingente, sem garantias estruturais, aproxima os autores de uma visão não
essencialista e agônica de tal processo. Trata­se, pois, de operar uma deconstrução do conceito de
hegemonia tal qual ele surge no movimento comunista no começo do século vinte, buscando a
partir de tal gesto uma possibilidade mais ampla de pensar o político. Isso é feito quando os autores
colocam em perspectiva as formulações teóricas que delimitaram tal conceito a partir de sua
contextualização histórica e conflituosa: por um lado, tratava­se de pensar a possibilidade de
unificação de uma classe operária complexa, fragmentado em demandas políticas diversas e
contingentes, tal como o teríamos na Europa industrializada e, por outro lado, era necessário
entender o papel de uma classe operária imatura, num contexto de transição do feudalismo para a
modernidade, necessitando realizar tarefas históricas da burguesia. O conceito amplo de hegemonia
servia a uns e a outros como forma de contornar a dificuldade teórica de constatar que a história
não estava se comportando como devia, como o marxismo esperava; tratava­se, pois, de definir
estratégias para colocar a história de volta em seus trilhos. A oportunidade teórica que se abre a
Laclau e Mouffe apresenta­se quando a ideia de totalidade da história, e de uma oposição entre
estruturas econômicas e contingência dos fatos, são simplesmente postas de lado. O conceito de
hegemonia passa a ser, então, um aparato teórico importante para pensar a dinâmica política
contemporânea em sua complexidade e indeterminação. Assim, é possível agora perguntar: como
se operaria um processo de busca política por hegemonia num contexto em que essas garantias
são abstraídas?

“Devemos situar­nos firmemente no campo da articulação, e para isso
devemos renunciar a concepção da sociedade como uma totalidade
fundante de seus processos parciais. Devemos pois considerar a abertura
do social como constitutiva, como 'essência negativa' do existente, e as
diversas 'ordens sociais' como tentativas precárias e em última instância
falidas de domesticar o campo das diferenças” (Ibid. p. 160­161)

O processo de articulação é, portanto, uma resultante contingente de uma luta por hegemonia e
cujo âmbito “posições diferenciais” ­ relativas a grupos, indivíduos ­ se conectam “no interior do
discurso” (ibid., p. 171), tendo em vista uma sedimentação discursiva que estabelece em relação a
um opositor comum. “Um discurso é sempre constituído em relação ao que ele exclui, isto é, em
relação ao campo de discursividade” (Jørgensen e Phillips, 2002, p. 27; Cf. Mouffe, 1993, cap. 1).
Desta perspectiva, o “sentido nunca pode, em última instância, ser fixado e isso abre o caminho
para lutas sociais constantes acerca de definições de sociedade e identidade, com efeitos sociais daí
resultantes” (Jørgensen e Phillips, 2002, p. 24). Analisado sob a perspectiva de Laclau e Mouffe,
portanto, a própria ideia de classe social como unidade de fato ou em potência parece não fazer
qualquer sentido. “Se […] movemos a fronteira no sentido oposto, ao ponto que a identidade
classista dos sujeitos políticos perca seu caráter necessário, o espetáculo que surge ante nossos
olhos nada tem de imaginário: é o espetáculo das formas originais de sobredeterminação que
assumiram as lutas sociais no terceiro mundo, com identidades políticas que pouco tem a ver cm
estritos limites de classe” (Laclau e Mouffe, 1987, p. 26­27). Essas observações, efetivamente,
tem impacto na apreciação que possamos fazer de manifestações onde um forte elemento de
contingência parece se apresentar, ou, para falarmos o jargão desses autores, onde os momentos,
as posições discursivas diferenciadas parecem se articular apenas 'fracamente', onde os
significantes ainda flutuam sem estabilizar um campo discursivo.

Com respeito às manifestações que, desde junho de 2013, apresentam­se como novidade política
no Brasil, é possível dizer, à luz dessas reflexões, que a aparente falta de unidade que as caracteriza
não é o único fator a ser considerado. Mas é precisamente a constatação da articulação que se
produziu na diferença que existe entre vários grupos, entre vários lugares discursivos, que enseja
análises mais generosas e abordagens metodológicas capazes de perceber, por exemplo, no
“rolezinho” não exatamente um protesto contra a discriminação e contra, propõem alguns, o
“apartheid” social que temos diante de nós, ou, de uma outra perspectiva, a baderna etc. O
“rolezinho” parece ter se constituído em significante vazio, em objeto de controvérsia, de disputa,
de busca de articulação e estabilização de significado, que passa por uma disputa 'semântica' dentro
de um espectro amplo de significados ­ que vai desde a oportunidade de dar uns beijinhos, à
ostentação e defesa de uma cultura funk, de periferia, aos “rolezinhos” solidários e politicamente
motivados de jovens de setores da “classe média alta”, ou do MST diante de um grande shopping
de São Paulo, ao medo puro e simples que caracteriza a posição de outros setores da “classe
média” diante daquilo que julgam ser uma perturbação inaceitável da paz de seu quintal – e que
neste contexto aparece como “elemento”, ou seja, como o outro diante do qual a regularidade de
uma articulação é buscada por estes outros setores da vida social.

A teoria do discurso, tal como preconizada por Laclau e Mouffe, além de sua motivação política,
nomeadamente, abraçar uma ideia de democracia baseada no caráter inevitável do conflito, uma
democracia radical, propõe­nos uma reflexão política sobre a circulação e articulação de significados
que respondem a muitas das questões que deixamos abertas ao analisar a teoria das redes e a
inteligência de enxame. A primeira destas respostas é a percepção de que a realidade social é
constituída de significados, de sentido, e não apenas de padrões. Esses significados, além disso,
revelam tanto o traço mediante o qual a tradição se faz presente, quanto a diferença, mediante a
qual, tensos, contraditórios, agônicos, eles se abrem também em sua contingência para o futuro.
Se entendermos que a forma como as instituições políticas se tem organizado guarda uma íntima e
inexorável relação com as questões relativas à identidade ­ ao estabelecimento de agendas
prioritárias, de táticas e estratégias que levariam à sua efetivação, e os partidos políticos como
materialização disso tudo ­ o que as ruas trouxeram não pode deixar trazer uma sensação de
estupor. Como agendas tão distintas podem se tornar objeto de negociação política? Ora, essa
pluralidade sempre foi imaginada como fragmentação, como impotência política estimulada por
aqueles que desejam governar ­ e aí vale a máxima latina, divide et impera. No entanto, é inegável
que a articulação de uma agenda tão diversa configurou um acontecimento político de vulto e com
algumas vitórias expressivas: a PEC 37, afinal, foi engavetada; o deputado João Campos, a pedido
de seu partido, retirou o projeto que autorizava tratamentos psicológicos da homossexualidade –
que tornou tristemente célebre o pastor e deputado Marcos Feliciano; fala­se na divisão dos
royalties do petróleo entre as áreas de educação e saúde; fala­se, por vezes com incorrigível

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oportunismo, acerca do que todos sabiam há muito, a necessidade de reforma no modelo político.

Há algum tempo, Ernesto Laclau e Chantal Mouffe vêm insistindo no que chamam de “democracia
radical”, ou seja, a compreensão do conflito como elemento fundamental nos processos
democráticos, o entendimento de que o exercício da política pressupõe sempre encarar a questão
da hegemonia, de como ela é obtida e como pode ser questionada. De acordo com tal reflexão, há,
na luta por hegemonia, um grande espaço para táticas mais contingentes. É possível, segundo
pensamos, tirar aqui algumas lições que lancem alguma luz sobre o que ocorre hoje no Brasil,
exemplo de articulação de interesses políticos tão diversos quantos oposição ao ato médico,
condenação da homofobia, defesa da probidade na administração pública, melhoria da mobilidade
urbana etc. O que impressiona exatamente tem sido o fato de as mídias sociais terem conseguido
promover uma articulação de agendas que só podem estar num mesmo campo de luta se tivermos
em mente ideias suficientemente amplas para expressar a insatisfação diante de algo que
chamaríamos de arrogância e de viés autoritário que ainda definem o exercício da política em nosso
país. Em que medida essas agendas continuarão a se articular no médio e longo prazos no contexto
de uma luta contra­hegemônica é algo que não podemos avaliar ainda. Mas chama a atenção o
fato de vários segmentos da população brasileira terem encontrado um espaço para exercer seu
descontentamento, para condenar a distância histórica que separa a política profissional no Brasil
de um sentido público, para questionar a dificuldade que os governantes tem tido em dar respostas
ao clamor por uma vida mais justa. Essa dificuldade é técnica, política, cívica e moral.

Algumas observações à guisa de conclusão

Nosso ponto de partida para redigir este ensaio foi a percepção de que o político não pode ser
cancelado por teorias da história que constituem algum tipo de grande narrativa para localizar
eventos específicos, como as manifestações de junho de 2013. Ora, tomar tal pressuposto como
ponto de partida não é algo original do ponto de vista teórico, muito já se falou do colapso de tais
visões de mundo e da necessidade desnudar os fundamentos essencialistas que os põe de pé. Mais
difícil, todavia, parece ser pensar o político sem de algum modo introduzir inadvertidamente
algumas das categorias que pretendem reduzir o político ao econômico, ou de tratá­lo de modo
instrumental, como se não houvesse alguma diferença específica que conferisse ao social uma
abertura e indeterminação que apenas a linguagem podem conferir. Assim, por não perceber o
político como âmbito em que a “diferença ontológica” se descortina é que um olhar transcendente
acerca de eventos políticos ainda nebulosos pode ser compreendido como uma saída. O
economicismo é uma manifestação desse esquecimento. De igual maneira, teorias sociológicas que
enfrentam sistemas complexos e procuram reduzi­lo a dimensões analíticas operacionais também
se deparam com o mesmo problema. Caso típico é modelo teórico desenvolvido por
Luhmann(1998), onde, no limite se considera a possibilidade de observar o sistema social como
comunicação pura, quase que se esquecendo da existência das pessoa. Por reduzir a uma dimensão
comunicacional (no sentido que a palavra comunicação assume para a teoria da informação) aquilo
que, por ser linguístico, por mobilizar significado, abre um conjunto de questões que o pensar
instrumental é incapaz de perceber. Da mesma forma, a Análise das Redes Sociais, quando limitada
aos fluxos interativos entre os atores (nós e pontos), pode resultar em generalizações abusivas a
partir de um campo estrutural que ignora os conteúdos das relações, a singularidade das práticas
interativas. E, no entanto, tanto a economia quanto a teoria das redes podem oferecer
contribuições para pensarmos um fenômeno no qual a relação umbilical entre o político e o técnico
se mostra de forma tão evidente.

Já nos seus escritos sobre estética, Hegel advertia, em sua crítica ao romantismo, acerca dos
perigos de pensar o ser humano sem o apoio de alguma pressuposição acerca de sua essência, ou
seja, já advertia para o perigo da indeterminação. Não teríamos aqui o espaço para reforçar a
importância de Hegel na constituição de uma teoria política da soberania, tal qual ela aparece de
forma mais contundente na obra de Schmitt. Mas fica o registro desta conexão, das perguntas
filosóficas que sustentam aquela reflexão e do seu significado político. Como pensar nos limites
éticos que o político pode assumir? Ou, dito de outra forma, sem alguma ideia de essência humana,
deixada a política ao sabor das lutas por hegemonia, o que impede a indeterminação de nossa
condição de gerar o pior dos mundos? Ora, em princípio, nada. Nada garante que a crítica às
instituições políticas que alinhavou a articulação que produziu os eventos de junho de 2013 não
possam redundar num espaço perigosamente despolitizador. Já a grande mídia acena com a
construção de um novo superhomem que, tal qual um famoso caçador de marajás, iria “varrer”,
para os de memória mais larga, ou aspirar, as mazelas morais que estariam na base da política que
praticamos. Afinal, algumas bandeiras de partidos políticos foram rasgadas nessas movimentações,
o que dá tanto uma ideia do desgaste de nossa representação política, quanto mostra os riscos
contidos naquele gesto. Não existe qualquer garantia ontológica de que as articulações que
tornaram possível as manifestações de junho não possam ser capturadas por uma forma qualquer
de instrumentalização. É curiosa a capacidade de nossos políticos de escutarem dessas
manifestações exatamente o que querem, o que lhes convém.

Isso não quer dizer que, pelo fato de garantias transcendentais não nos serem dadas, falamos aqui
muito das esperanças numa coerência essencial da classe operário, ou de um resgate pelo trabalho,
estaremos necessariamente fadados ao niilismo ou ao pior dos mundos. Muito pelo contrário. O
político se instala precisamente aí: onde não existem garantias é preciso que nos mobilizemos para
pensar num mundo melhor. E o que é melhor não está de forma alguma dado. Do ponto de vista
de uma discussão teórica e metodológica acerca dos eventos de junho de 2013, e que se
prolongam em manifestações de menor porte, essa conclusão nos obrigada ao que gostaríamos de
chamar de ato de generosidade para com o real, que nos obriga à atenção, a investigação
minuciosa, a fugir das respostas prontas. Se Heidegger está certo, se a essência do ser humano é
um estar a caminho, ou se Riobaldo do Grande Sertão: Veredas está certo e que mesmo a
proximidade do fim só nos dá a certeza de que o humano é sempre uma travessia, o social e o
político são o espaço em que o evento, o novo, podem acontecer. Muito pode acontecer, inclusive
nada, o que em nosso caso é o pior, que os grupos que se perpetuam no poder procurando conter
as possibilidades do político não possam ser vencidos. A forma como as manifestações políticas que
consideramos neste ensaio possam estabelecer um diálogo e uma disputa com formas mais
consolidadas de representação política, acreditamos, será fundamental para avançarmos na nossa
embrionária democracia.

* Professor Associado do Departamento de Sociologia da Universidade
Federal de Pernambuco. 
** Breno Augusto Souto Maior Fontes, Professor Titular do
Departamento de Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco.
1 Agradecemos a Remo Mutzenberg e a Tâmara Oliveira por terem comentado e
criticado uma primeira versão deste ensaio.
2 Parece­me que este também é o sentido da opinião do Presidente Lula, que,
em entrevista concedida a jornalistas em Brasília, julga importante os jovens
participarem da política, mas de forma certa, isto é, preenchendo os espaços dos
partidos políticos; a política ainda não pode ser pensada de outra forma, resulta
em vazio (http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas­noticias/2013/07/23/lula­
pede­para­jovens­procurarem­politica­dentro­de­si.htm. acesso em 08/02/2014
3Habermas, Jürgen. Philosophische Texte Band 4: Politische Theorie.
Studienausgabe, Suhrkamp Verlag, Frankfurt am Main, 2009.
4 ADORNO, Theodor e HORKHEIMER, Max. (1985). A Dialética do
Esclarecimento. Rio de Janeiro, Jorge Zahar.

http://www.revista.ufpe.br/revsocio/index.php/revista/article/view/405/331 9/11
10/09/2015 Ágora eletrônica: algumas reflexões teórico­metodológicas | Ferreira | Estudos de Sociologia
5http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/07/1304569­alberto­goldman­o­
povo­nao­se­deixara­enrolar.shtml; acessado em 21 de janeiro de 2013.
6 Singer, André. Esquerda ou direita: surpreendendo a todos os atores
tradicionais. Folha de são Paulo, Opinião, 22/06/2013
7http://www.valor.com.br/cultura/3187036/o­mal­estar­contemporaneo;
acessado em 21 de janeiro de 2014.
8 Antônio Prata. A passeata. Folha de são Paulo, Cotidiano 10/06/2013
9 Cf. Sills(1957). Sobre redes e mobilização coletiva, consultar Snow(1980)
10 Outro caso também muito interessante, a análise de Gould(1991) sobre as
barricadas de Paris, onde mostra a articulação entre as redes organizacionais do
movimento, com aquelas derivadas das interações face a face dos
manifestantes, ancoradas territorialmente
11 As observações que se seguem dizem respeito aos estudos designados por
ARS (Análise de Redes Sociais), orientados a partir de desenhos metodológicos
que privilegiam a formalização matemática das estruturas reticulares. Outra
importante tradição, Teoria das Redes Sociais, também conhecida por sociologia
relacional (Haussling,2012) – de recorte mais próximo as ciências sociais ­
constrói modelos teóricos mais discursivos. É o caso, entre os clássicos, de
Simmel, Leopold Von Wiese, Norbert Elias, Schutz, Bourdieu, entre outros
12 Barabási, Albert­László. Linked: how everything is connected to everything
else and what it means for business, science and everyday life. New York,
Penguin, 2003
13 Watts, Duncan. Seis Graus de Separação (six degrees). A evolução da ciência
de redes em uma era conectada. São Paulo, Leopardo, 2009
14 Milgran S. The Small world Problem. Psychological Today 2, 60­67 (1967);
15 Evidentemente, que o poder seja algo, uma coisa, que possa ser distribuído é
algo que será questionado mais adiante.
16 Cf. Barabási, Albert­László (op.cit)
17 Sobre a dificuldades, e como as ciências sociais vêm trabalhando o problema
da análise dinâmica das redes sociais, consultar Trier(2010
18“Basicamente, um grafo consiste de um conjunto finito de pontos x1, x2, ….,
xn mais o conjunto de setas que os conecta. Cada ponto é denominado um nó e
cada seta é um arco. Se o número total de arcos direcionados num sentido de xi
to xj não puder exceder p, nós teremos um grafo­p” (Degenne e Forsé, 1999, p.
63).
19A confusão entre coletividade e conectividade, insiste Thacker, é responsável
pela percepção de que na 'sociedade da conectividade e da informação'
estaríamos necessariamente diante de uma nova forma de poder, ou de política;
por outro lado, ideias como mobs, netwars desafiariam às noções correntes de
vida biológica. Assim, não causa espanto que um grupo de estudiosos venha
procurando estabelecer um campo novo de conhecimento, a ciência das redes,
baseado numa ontologia específica em que o funcionamento de grupos
terroristas, a disseminação de um vírus específico podem ser estudados com
fenômenos similares.
20Consultar sobre o assunto, Social Cognitive Maps, Swarm Collective
Perception and Distributed Search on Dynamic Landscapes de Vitorino Ramos,
Carlos Fernandes, Agostinho C. Rosa LaSEEB­ISR­IST, Evolutionary Systems
and Biomedical Eng. Lab.,Technical Univ. of Lisbon (IST),
21Assim, Segundo, Tarde, “Les trois principales formes de la répétition
universelle, l'ondulation, la génération, l'imitation, je l'ai dit ailleurs, sont autant
de procédés de gouvernement et d'instruments de conquête qui donnent lieu à
ces trois sortes d'invasion physique, vitale, sociale : le rayonnement vibratoire,
l'expansion génératrice, la contagion de l'exemple. Gabriel Tarde (1893)
Monadologie et sociologie. Collection: "Les classiques des sciences sociales"
Fonte: http:\\classiques.uqac.ca; acessado em 21/01/2014.
22 Sousa, Edson. (2013) Psicologia de Massas: uma reflexão em contrafluxo.
In: Freud, Sigmund. Psicologia das massas e análise do eu. São Paulo, L&PM
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23 Social Cognitive Maps, Swarm Collective Perception and Distributed Search
on Dynamic Landscapes Vitorino Ramos, Carlos Fernandes, Agostinho C. Rosa
disponível em: http://arxiv.org/ftp/nlin/papers/0502/0502057.pdf
24 Deleuze, Gille. Foucault. Paris, Les Editions de Minuit, 2004
25A esse respeito, vale a pena ler o capítulo 8 de Mouffe (1993).
26 O que entre nós converte­se numa luta pela ocupação de lugares no
aparelho de Estado

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Artigo recebido em: 10/09/13
Aprovado em: 20/12/2013

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@ 2012 ­ PPGS ­ Revista do Programa de Pós­Graduação em Sociologia da
UFPE.

ISSN Impresso 1415­000X

ISSN Eletrônico 2317­5427

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