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1
SUMÁRIO
Introdução ...................................................................................................... 4
Entre objetivismo e subjetividade ..................................................................6
Habermas e a crítica ao positivismo .............................................................. 7
O “método histórico-hermenêutico” ............................................................10
A subjetividade em Boaventura de Sousa Santos ....................................... 13
O sujeito interpretante e a intersubjetividade .............................................. 14
Conclusões ................................................................................................... 15
Referências Bibliográficas ...........................................................................17
2
As raízes da árvore
rebentam
nesta página
inesperadamente,
por um motivo
obscuro
ou sem nenhum motivo,
invadem o poema
e estalam
monstruosas
buscando qualquer coisa
que está
em estratos fundos.
3
Introdução
1
CHALMERS, A. F. O que é ciência afinal? Tradução de Raul Filker. Editora Brasiliense, 1993.
2
DURKHEIM, ÉMILE. As regras do método sociológico. Tradução de Maria Isaura Pereira de Queiroz.
12. Ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1985.
3
DESCARTES, René. Discurso do método. Tradução de Maria Ermantina de Almeida Prado Galvão.
São Paulo: Martins Fontes, 2009.
4
Ibidem, p.19.
4
Mas, depois de ter empregado alguns anos estudando assim no livro do
mundo e procurando adquirir alguma experiência, tomei um dia a resolução
de estudar também a mim mesmo e de empregar todas as forças de meu
espírito escolhendo os caminhos que deveria seguir. O que me deu melhor
resultado, ao que me parece, do que se nunca me tivesse afastado de meu
país, nem de meus livros.
Antes disso o autor alerta para a utilidade de estudos desenvolvidos com interesse (o
que soa até contraditório com seu método), de modo que o pesquisador possa avaliar
pessoalmente as consequências de suas conclusões5:
Pois me parecia que poderia encontrar muito mais verdade nos raciocínios que
cada qual faz sobre os assuntos que lhe dizem respeito, e cujo desfecho deve
puni-lo logo depois, se julgou mal, do que naqueles que um homem de letras
faz em seu gabinete, sobre especulações que não produzem nenhum efeito, e
que não terão outra conseqüência a não ser, talvez, a de que extrairá delas tanto
mais vaidade quanto mais afastadas estiverem do senso comum, pelo fato de
ter tido de empregar tanto mais espírito e artifício para torná-las verossímeis. E
eu tinha sempre um imenso desejo de aprender a distinguir o verdadeiro do
falso, e caminhar com segurança nesta vida.
Assim, pensar a subjetividade implicada na pesquisa pode iluminar o lugar de quem fala,
e contribuir com a constatação de sua multiplicidade, ao contrário de seu rotineiro
silenciamento, que já construiu tantos a prioris de unicidade e etnocentrismo7.
5
DESCARTES, René. Discurso do método. Tradução de Maria Ermantina de Almeida Prado Galvão.
São Paulo: Martins Fontes, 2009, p.18-19.
6
POPPER, Karl. A lógica das ciências sociais. 3. ed. Tradução Estevam Rezende Martins. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 2004.
7
ACHUGAR, Hugo. Imagens da integração. São Paulo: Fundação Memorial da América Latina, 1997.
5
Entre objetivismo e subjetividade
Pensar a subjetividade na pesquisa jurídica, por sua vez, pode oferecer condições para
apontar um querer próprio dentro dos estudos jurídicos, que não seja irrefletidamente
comprometido com a reprodução de dogmas e maquinários.
Mas será que a subjetividade resiste à ideologia (ou aos desejos criados pelo capitalismo,
ou como prefere Habermas, ao irrefletido instinto de auto-conservação social)?
8
ROCHA, Janine Resende. Limites do sentido: hermenêutica literária e o papel do leitor na
contemporaneidade. 2009. Dissertação apresentada à Faculdade de Letras da UFMG. Programa de Pós-
graduação em letras: estudos literários.
9
HABERMAS, Jürgen. Técnica e Ciência como ideologia. Reimpressão. Tradução de Artur Mourão.
Lisboa: Edições 70, 2009, p.139.
10
Ibidem. p.141.
11
WARAT, Luis Alberto. Territórios desconhecidos: a procura surrealista pelos lugares do
abandono do sentido e da reconstrução da subjetividade. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2004.
12
DELEUZE, Gilles. Foucault. Tradução de Claudia Sant´Anna Martins. São Paulo: Brasiliense, 2005, p.
111.
6
poderes; a relação consigo é inclusive, uma das origens desses pontos de resistência
(...)”. Continua o autor13:
A luta por uma subjetividade moderna passa por uma resistência às duas
formas atuais de sujeição, uma que consiste em nos individualizar de acordo
com as exigências do poder, outra que consiste em ligar cada indivíduo a
uma identidade sabida e conhecida, bem determinada de uma vez por todas.
A luta pela subjetividade se apresenta então como direito à diferença e
direito à variação, à metamorfose.
13
DELEUZE, Gilles. Foucault. Tradução de Claudia Sant´Anna Martins. São Paulo: Brasiliense, 2005, p.
113.
14
HABERMAS, Jürgen. Técnica e Ciência como ideologia. Reimpressão. Tradução de Artur Mourão.
Lisboa: Edições 70, 2009.
15
HABERMAS, Jürgen. Conhecimento e interesse. Tradução e introdução de José N. Heck. Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1982.
16
HABERMAS, Jürgen. Opus Cit. p.136.
17
Ibidem. p.132.
18
Ibidem. p.136.
7
proposições são relativas ao sistema de referência previamente nelas posto, a
ilusão objectivista desfaz-se e liberta o olhar para um interesse que dirige o
conhecimento.
O autor parte de Kant, quem resolve o embate que existia entre o racionalismo
dogmático e o empirismo com a noção de “fenômeno”. Kant restringe os limites do
conhecimento humano ao “fenômeno”, ou seja uma “experiência” que pressupõe o
sujeito observador, ou a coisa que aparece para cada um. Este o limite do conhecimento,
pois o intelecto não chega à “coisa em si”.
Mas Habermas o critica, por separar a “razão especulativa/ pura” da “razão prática”, e
assim acabar por cair em um solipsismo, a justificar que o conhecimento seja possível a
priori, nos emparedamentos da razão. Para que haja um interesse cognitivo é preciso
conectar a razão especulativa com a razão prática19. Veja a síntese de Freitag20:
Com a referência a Fichte, e sua crítica a Kant, Habermas enfatiza o papel do sujeito
para a síntese do conhecimento (com a devida crítica ao eu-absoluto): a intuição
intelectual seria então o ponto de interseção entre a razão especulativa e a prática.
19
HABERMAS, Jürgen. Conhecimento e interesse. Tradução e introdução de José N. Heck. Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1982, p.224.
20
FREITAG, Barbara. Dialogando com Jürgen Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2005,
p.16.
8
O sujeito (das Ich) é para Fichte o ponto de partida de todo pensamento e demandaria o
objeto, não-eu (das Nicht-Ich). A mediação entre eles seria possível através do que ele
denomina Einbildungskraft, que pode ser traduzido por faculdade imaginativa, e revela
a capacidade criativa do sujeito.21
Mas Habermas não concorda com o “eu absoluto” de Fichte. O autor vale-se então da
reconstrução da teoria psicanalítica de Freud para resgatar a importância da história de
cada um, que move o interesse, bem como para ressaltar a interação intersubjetiva que
permite o conhecimento.
Com Freud, Habermas consegue então por em evidência, além do interesse pela
libertação como impulso inicial, o exercício crítico, auto-reflexivo, que evidencia
atitudes dogmáticas, repetidas irrefletidamente; bem como a intersubjetividade
implicada no conhecer 22. Analista e paciente atuam conjuntamente na reconstrução dos
fragmentos de história, de modo que o “eu” do paciente é elaborado através da interação.
Na síntese de Freitag23: “a comunicação é impossível através desse código particular, já
que ele é incompreensível, não somente no contexto da interação intersubjetiva, mas
também incompreensível para o próprio Eu (...).”
21
BAUMANN, Barbara; OBERLE, Brigitta. Deutsche Literatur in Epoche. Max Hueber Verlag, 1996, p.128.
22
HABERMAS, Jürgen. Conhecimento e interesse. Tradução e introdução de José N. Heck. Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1982, p.253.
23
FREITAG, Barbara. Dialogando com Jürgen Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2005,
p.23.
9
Com isso percebe-se como o sujeito está implicado no objeto (história). Este último não
existe sem o sujeito que lhe atribui sentido: “O sujeito da compreensão estabelece uma
comunicação entre dois mundos; apreende o conteúdo objetivo do que é legado pela
tradição, ao aplicar esta última à sua própria situação.”24
O “método histórico-hermenêutico”
24
HABERMAS, Jürgen. Técnica e Ciência como ideologia. Reimpressão. Tradução de Artur Mourão.
Lisboa: Edições 70, 2009, p.139.
25
Ibidem. p.132 e 133.
26
FREITAG, Barbara. Dialogando com Jürgen Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2005,
p.13.
27
HABERMAS, Jürgen. Opus Cit. p.137.
10
viabilidade técnica, deriva exclusivamente de regras segundo as quais
aplicamos as teorias à realidade.
Mas estas ciências propõe uma objetividade que sequer conseguem atingir, uma vez que
os fatos analisáveis só se tornam relevantes em razão de sua organização prévia. Trata-
se somente de um interesse diferente, qual seja, pelo controle e “segurança
informativa”28: “(...) a construção lógica dos sistemas de enunciados admissíveis e o
tipo das condições de comprovação sugerem a interpretação de que as teorias das
ciências experimentais desvendam a realidade sob a direção do interesse pela possível
segurança informativa e pela ampliação da ação de êxito controlado.”
Ao desenvolver seu método, Habermas apresenta cinco teses, com as quais demonstra
que o interesse que leva ao conhecimento está fundado na auto-reflexão, capaz de
distanciar o sujeito da ideologia da auto-conservação social, em favor dos impulsos
individuais, unindo assim o que foi separado pela ciência objetivista: “na força da auto-
reflexão, o conhecimento e o interesse são uma só coisa”31:
Esclarecedora a quinta tese, visto que sintetiza o percurso do autor a respeito do método
que apresenta: “a unidade de conhecimento e interesse verifica-se numa dialética que
reconstrói o suprimido a partir dos vestígios históricos do diálogo abafado”32.
31
HABERMAS, Jürgen. Técnica e Ciência como ideologia. Reimpressão. Tradução de Artur Mourão.
Lisboa: Edições 70, 2009, p.143.
32
Ibidem. p.145.
33
DELEUZE, Gilles. Foucault. Tradução de Claudia Sant´Anna Martins. São Paulo: Brasiliense, 2005, p.
127.
12
A subjetividade em Boaventura de Sousa Santos
Boaventura Sousa Santos34, por sua vez, além de criticar o monopólio da ciência para a
construção do conhecimento, segue caminho semelhante ao de Habermas, em busca dos
contornos do que ele denomina um “paradigma emergente” a partir da crítica do
paradigma positivista dominante, que afasta a subjetividade da discussão científica.
A nudez total, que será sempre a de quem se vê no que vê, resultará das
configurações de analogias que soubermos imaginar: afinal, o jogo
pressupõe um palco, o palco exercita-se com um texto e o texto é a
autobiografia do seu autor. Jogo, palco, texto ou autobiografia, o mundo é
comunicação e por isso a lógica da existencia da ciência pós-moderna é
promover a ‘situação comunicativa’ tal como Habermas a concebe. (...) Não
se trata de um amálgama de sentido (que não seria sentido mas ruído), mas
34
SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. 3. ed. São Paulo: Editora Cortez,
2005.
35
Ibidem. p. 83.
36
Ibidem. p.73.
13
antes de interações e de intertextualidades organizadas em torno de projetos
locais de conhecimento indiviso.”
37
HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. Trad. Guido Antônio de Almeida. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989.
38
HABERMAS Jüngen. Direito e democracia: entre a facticidade e validade. V. I. Tradução Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, p. 19.
39
Ibidem. p. 19.
14
nenhum ator singular nem a um macrossujeito sociopolítico. O que torna a
razão comunicativa possível é o medium lingüístico, através do qual as
interações se interligam e as formas de vida se estruturam. Tal racionalidade
está inscrita no telos lingüístico do entendimento.
Com o paradigma da linguagem não se supõe mais a idéia de indivíduo isolado; mas
sim a idéia de “discussão”, interação, de um processo discursivo de formação da
vontade, em que o significado de um proferimento está ligado à sua validade, assim: os
“usuários da linguagem” lançam-se mutuamente pretensões à validade orientados para o
entendimento acerca da pretensão levantada. E os falantes compreendem a pretensão
quando compreendem as condições exigidas para sua validade, as quais não se resumem
a uma pretensão à verdade da proposição, ou seja, não se restringe ao seu conteúdo, mas
também à uma pretensão à correção normativa da pretensão, e uma pretensão à
veracidade da proposição, a qual pretende perquirir se a intenção pretendida
corresponde à proferida.
Conclusões
Uma subjetividade crítica pode então ser vista como uma problematização do lugar de
onde se fala, sob pena de pressupor novamente sua unicidade40. Uma subjetividade
auto-reflexiva insurge como uma necessidade, em uma democracia sobretudo, de
maneira que os atores sociais sejam instigados sempre a buscar, em interação com os
demais atores, um sentido para seu papel. A ausência de um caminho previamente
conhecido estimula a criação do intérprete.
40
ACHUGAR, Hugo. Imagens da integração. São Paulo: Fundação Memorial da América Latina, 1997.
16
Referências Bibliográficas
POPPER, Karl. A lógica das ciências sociais. 3. ed. Tradução Estevam Rezende
Martins. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2004.
17
______. A crítica da razão indolente. Contra o desperdício da experiência. V.1. 7. ed.
São Paulo: Cortez, 2009.
18