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10 15 25 45 Leitura LB texto com atengio e, de seguida, responde és questdes com frases completas: Lourenca, 20s seis anos, sabia muitas coisas que ninguém suspeitava. Guardava-as para ela, porque as pessoas que nos connecem de perto nao 30 capazes de nos levar a sério. Aru na-se da ‘Sabedoria de Lourenca, a ponto de ela jugar que se tratava de algo de felo. E 0 proprio pal babcava 0 jpmal para olhar para ola de maneira divertida. Lourenca no compreendia como os adultos tratavam ‘agente pequena daquela maneira: como se fossem s6 nimeros de circo e mais nada. ‘Quando Falco chegou a idade de aprender a le, ndo foi & escola como os outros meninos. Era um rapazinho débil a quem aconteciam todos os desastres possiveis. Guiomar, uma amiga da me, dizia que Felco procurava ser protegido © amedo, ¢ por isso sempre se metia em sarihos. Mas a verdade & que passava 0 Inverno na cama, com um pouco de febre e a comer batatas fritas. NBO (gostava de aprender, ainda que fosse muilo engenhoso e inventivo. Dona Inés, a professora dele, no © apreciava nem o ajudava muito. Era uma Senhora pequenina, com pemas gordinhas multo bem calgadas com meias brihantes @ muito caras. Tinha um sinal na cara que encantava Lourenca, Punha-se a olhar para ele esperando vé-lo vost, porque Ihe disseram que se chamava «a mosca». ‘Ainda que fosse nova demais para receber ligtes, assistia as aulas de Falco. Em breve liao jomal ‘sem que ninguém adivinhasse; ¢ estava a par das noticies e dos folhetis. O primeiro que leu foi Som Familia, uma histéria triste e um bocado tola. A mie discutia o enredo com grande emogio, & Lourenga achava que ela exagerava. Depois publicaram outras coisas mais apaixcnantes © por elas Lourenga ficou a saber a vida de Lucrécia Borgia © de Rosa Vanossa, a senhora mae dela que era ‘amiga do Papa. Aprendeu a calar-se a respeilo dessas lelluras; e quando Dona Inés the trazia as ‘Histontas de Rebolinno, um menino gordo que se embebedou com medronnos, fingia que achava uma ‘Deleza tudo aqui. Era simplesmente uma magada e 6 as criancas atrasadas podiam gostar daquilo. ‘Amie procurava fazer de Lourenca uma menina maravihosa; escolhia para ela vestidos com florinhas, solos como camisas, o que a aborrecia. Sonhava usar modas extraordinérias @ saltos alos, ‘que acontecia quando imagnava as peripécias das suas proprias historias antes de sair da cama. A famosa cama era como um Falco e emi que os travesseiros eram personagens to cheias de cardcter ‘como de 1a de evelha. Decerto era porque 0 colchéo tirha dentro também Id de evetha, que Lourenga Pensava estar no alto mar. Baloigava em cima da cama como se ela saltasse em cima das ondas, © isto sugeria-the acontecimentos passados a bordo dum navio. Umas vezes tratava-se de historias ‘omanieas, outas tram hstrias de crimes. No er raro um ravesseo i pe boda fora, e Mara — Que estas a fazer, ciatura? Aparha isso. Ela niio podia entender o que era um corpo langado desde o tombaditho quando havia tutardes no rasto do barco. Mas também estava tio entreida a soprar o verniz das unhas, que ro pensava a sério em mais nada, (..) Lourenga entrou para as primeiras letras, © houve uma certa confustio com ela. Sabia ‘demais, mes no tinha feito exame nenhum. As professoras clhavam para ela com aborrecimerto. Proferiam que ola fosse ignorante © que comegasse pelo principio. Experimentaram deixi-la na primeira classe, mas Lourenga lia tio bem e estava tio segura de si que incomodava a professora. Era uma freira bonita e que corava muito quando tinha que mostrar autoridade. Lourenga punha-se a ‘olhar para as botinhas pretas que ela usava e que apareciam debaixo da saia, e pensava onde ola tera ido buscé las. Era coisa que ninguém vendia mais em parte nenhuma. © caso de Lourenra foi discutico e ola teve que ser examinada por cinco professores, incluindo ‘a Mestra-Goral. Esta era uma senhora que vivia dentro dum quiosque, no patio do colegio, como se vvendesse solos ¢ revistas. Via dali tudo o que se passava e. como nos quiosques. tinha la dentro um frasco de rebugados que dava como prémio is mais pequenas. Lourenga ficava orgulhosa quando Falco ia ao colégio para ter aulas de doutrina cristl. Uma freira tio velha que parecia um ppepino em vinagre vinha a sala ensinar-the os mandamentos. Com a ponta do avental preto tapava as pemnas de Falco, porque ela era do tempo em que os meninos traziam meias altas © calgSes até 20s jocthos Lourenga no se ria, achava que ela tinha razées para fica' to penalizada eo ver as pernas: de Falco. Na verdade, pareciam duas trombinhas de elefante, e essa ideia enjoava Lourenca. Mas, 70 75 Falco ia para casa e diveria a mie a contar aquelas coisas. Lourenga no achava assim to tengragado, porque gostava da velha madre. Constava que ela nao tinha um 86 cabelo na cabega, LLourena pensava na maneira de ver se isso era certo, Porém a touca dela, e 0 véu espeiado com alfinetes na touca, pareciam bem sequros. 'No segundo trimestre mudaram Lourenga de classe, ¢ ela ficou esquecida entre vinte meninas ‘mais crescidas e que chavam para ela com indiferenca. Al, a professora gritava constantemente @ vivia preocupada em encontrar erros de ortografia. Marcava-os a lapis vermelho, arreganhando os dentes, como se fizesse sangue com o lapis na pele das alunas. E abanava a cabeca com ar colérico. Exagerave muito a8 cosas. Por exemplo, gotava de imentarprelexos para aplcar requadas nas lunas. Lourenca achava aquilo um pequeno desastre, como chover quando era a hora do ‘0 bem e o mal. Era s6 um contratempo. ‘que sofria mais castijos. Nao porque as meninas fossem dferentes das outras, mas 0 fetio da professora tornava-as descaradas e malicosas. Tinham razor em desafié-ia © descobriam que tinham gostos © vontades, assim, porque a desafiavam, Lourenca no gostava da mestra, mas aprendeu algumas formas de dissimulagdo muito habilidosas gragas a ela. Era melhor nao ter motivos para gostar dela do que tor de amar at professoras mais elegantes e sabedoras. Algumas eram mesmo capazes de tomar uma pessoa triste @ infelz 86 com distrbuir 0 rocusar amor como 90 foas0 po quent. ‘Amelhor maneira de passar o tempo de aulas era no dar muito na vista, Lourenga escondeu que dava pele nome de Denies de Raio, para nio ter de aceilar isso publicamente. Uma ofensa com imaginacio ¢ carinho; mas com troga é mais do que ofensa, porque se serve daquela espécie de ‘amor que ha na imaginagdo para fers. Claro que Lourenga nbo pensava nas coisas desta mancira; tinha 86 seis anos e andava ocupada em pequenas exploragées, assim como ver qual dos amigos de Falco era maior e reparava nela. Sentava'se num banguinho no jardim © dava 4 manivela da sua equena maquina de costure, com um ar de boa operaria. Mas nao perdia de vista os jogos de Falco Com 0s outros rapazes, quase sempre muito mals crescidos do que ele. Tratavam Lourenga com ternura e os olhos deles pareciam velados de lagrimas quando falavam com ela, Quando viem Marta, ue se mostrava na varanda da cozinha como se fosse dar a sua écharpe branca a um cavaieiro com langa e escudo, eles coravam e perdiam a alegria de brincar. Marta ria-se doles © no vollava para dentro to depressa como seria de esperar. Agustina Bessa Luis, Dens do Rato (com suprosses) 4. O texto inicia-se com uma expressiio que situa a ago temporaimente. Transcreve-a, 2. Como reagia a famia de Lourenga a sus inteligéncia fora do normal? 3. Faz acaracterizago drota 0 indireta do Falco. 4. Qual eraa opinido de Lourenga sobre as historias infantis? 5. Qual era o motivo que fazia com que as professoras olhassem para Lourenca com desagrado? 6. “Lourenga escondeu que dava polo nome de Dentes de Rate, pera no ter de aceitar isso pubicamento" (71-72) Porque tratavam Lourenga por Dentes de Rat? Pagina 2 7. Explica, por palavras tuas. como é que Marta tratava os rapazes. " ti 4. Lé.as frases que se segueme identifica as alineas onde detetas um verbo copulativo: a) ARita tomou-se uma bela rapariga. b) AMatide teparou no teu penteado novo. €¢) meu encontro com o Joaquim sera no domingo. @) Dra. Monica continua jover. ) Ele disse que continua o teu trabaho, 2. Faza anise sintética das frases que se sequem: a) Lourenga reparava em toda a gente. 'b) O carte entregou uma encomenda &D. Alice. ©) Depois do jantar, éa hora do descanso. 3. Das frases que se sequem, distingue 0 pronome invariavel “que” das conjungSes: a) Ele anda palido desde que esteve doente. 4. Associa as frases da coluna A ds subclasses de conjungées coordenativas da coluna B: * copulatva 2) O André fez 0 trabalho @ teve boa nota. 2 adversativa b) Estive doonte, mas ndo fate’ as aulas. 3. explcativa ©) Vens ou ficas? 4. dsuntva 5. conclusva 5. Alenta nos enunciados retirados do texto © identifica os recursos expressivos: 2) “Lourenca ndo compreendia como os adultos tratavam a gente pequena daquela maneira: como se fossam s0.nimeros de circa e mais nada’ (I 4-5) ») “Algumas eram mesmo capazes do tomar uma pessoa trite @ infeliz sd com dlistnbulce recusar ‘amar’ (i. 69-70).

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