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2011‐2014

Os textos postados no blogPsicologia
e Trânsito podem ser divulgados por
meio de outros blogs, desde que
sejam atribuídos os créditos ao autor
e disponibilizado olink para o
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C o mo uma pe s s o a bo a e co r dia l po de a gir de ma ne ir a má e e go ís t a no


t r â ns it o ?

postado em 20 de jan de 2015 07:31 por Fábio de Cristo   [ 20 de jan de 2015 08:31atualizado​
(s)​
 ]

Autor: Fábio de Cristo,
psicólogo (CRP­17/1296),
doutor em psicologia e
pesquisador colaborador na
Universidade de Brasília, onde
desenvolve pós­doutorado sobre
o comportamento no trânsito.
Professor do Centro
Universitário de Brasília
(UniCEUB), administrador do
Portal de Psicologia do Trânsito
(www.portalpsitran.com.br) e
coordenador da Rede Latino­
Americana de Psicologia do
Trânsito. Autor do
livro"Psicologia e trânsito:
Reflexões para pais, educadores
e (futuros) condutores".

* * *

As frases abaixo são como
“vozes” da consciência, segundos
antes do comportamento...

“– Vou parar aqui mesmo! É só
pra João Marcos entrar no
colégio com segurança...” (para
em fila dupla).
“– Não atrapalha tanto assim o
trânsito... Vou atender!” (usa o
celular enquanto dirige).
“– Ele vai desfilar em vez de
passar.” (não prioriza o pedestre
que está esperando na faixa).
“– Não há fiscalização!” (dirige
em alta velocidade).

O que elas têm em comum? São
justificativas que damos a nós
mesmos (ou autojustificativas),
após a consciência interrogar
sobre a razão de fazermos algo
errado. Autojustificativas como
estas, que atentam contra nossa
moralidade, isto é, contra nosso
conjunto de princípios sobre o
que é certo ou errado, com o
objetivo de alcançarmos um
benefício momentâneo,
chamam­se: Desengajamento
moral.
 

Sua função é fazer com que não
soframos – ou não soframos
tanto – por uma ação que
normalmente reprovamos em
nós mesmos. Ao “relaxarmos” a
autocensura, diminuímos o
sentimento de culpa. Por essa
razão, uma pessoa tão boa e
cordial como você, amigo leitor,
poderá agir de maneira muito
má e egoísta no trânsito. Mesmo
que seja um intelectual
reconhecido
internacionalmente, professor
da Universidade de Harvard, ex­
professor do atual presidente
dos Estados Unidos, e ministro
de estado no governo Lula (veja
foto ao lado e a nota:"Ministro
Mangabeira Unger estaciona
carro em vaga para deficientes").

Mas, como se constrói esse tipo
de autojustificativa? De várias
maneiras, afinal, o ser humano é
muito criativo. Para entender, é
preciso, primeiramente, ter
clareza que, em qualquer
situação, existe pelo menos: (1) a
conduta repreensível, (2) seu
efeito e (3) a possível vítima.
Esses três elementos – ou a
combinação entre eles –, por sua
vez, são as bases racionais da
transgressão.
 
A autojustificativa com base
naconduta repreensível, por
exemplo, geralmente é feita
reinterpretando nossa ação para
torná­la aceitável. Interessante,
não? Um exemplo é o primeiro
pensamento no início do texto:
“...É só pra João Marcos entrar
no colégio com segurança...”.
Neste caso, a mãe de JM tenta
tornar a conduta transgressiva –
parar em fila dupla – numa
conduta aceitável e prioritária,
que é proporcionar segurança ao
filho.

A autojustificativa com base
noefeito da transgressão, por sua
vez, é realizada pela deturpação
ou desconsideração das
consequências danosas da nossa
ação. Visa especificamente a
minimizar a intensidade dos
(possíveis) danos causados,
como no segundo pensamento:
“– Não atrapalha tanto assim o
trânsito... Vou atender!”. Com
isso, o motorista desconsiderou
as consequências de atender o
celular enquanto dirige.

A autojustificativa a partir
davítima acontece quando o
praticante da ação, isto é, o
transgressor, inverte a situação.
Ele culpa ou desmerece a vítima,
conforme o terceiro
pensamento: “– Ele vai desfilar
em vez de passar”. O pedestre é
o culpado do motorista não
parar (por “desfilar” em vez de
“passar”), razão pela qual não
merece prioridade. Quanta
criatividade!

Finalmente, existe outra
maneira de se construir essas
autojustificativas. O praticante
da conduta ofusca a sua
responsabilidade pessoal sobre a
ação. Repare no quarto
pensamento acima: “– Não há
fiscalização!”. (dirige em alta
velocidade).
 
 
Apesar de todo esse esforço
pessoal – seja de reinterpretar a
situação tornando­a aceitável, de
deturpar ou desconsiderar as
consequências danosas, culpar a
vítima ou de ofuscar nossa
responsabilidade –, o
comportamento imoral pode ter
consequências muito graves
para as pessoas e para nós. Por
exemplo, num caso real, parar
em fila dupla para deixar o filho
na escola quase terminou em
assassinato. Semelhante ao
exemplo no início do texto, uma
mãe trancou, por alguns
minutos, uma pista em frente ao
colégio do filho. Profundamente
irritado, um motorista de van
escolar que estava logo atrás,
desceu armado para tomar
satisfação. Felizmente, os
transeuntes o imobilizaram.
Tudo começou com o
desengajamento moral...

Esse é um caso extremo, claro;
mas ilustra as consequências
potencialmente desastrosas
desse tipo de autojustificativa.
Isto porque, ao mesmo tempo
em que nos permitimos fazer o
que é errado, também
prejudicamos nossa avaliação
das consequências objetivas do
comportamento. Afinal, a
autojustificativa, de maneira
alguma, diminui objetivamente
o dano decorrente da
transgressão. Pense nisso!

Para ajudar ainda mais em suas
reflexões, seguem algumas
situações muito comuns em que
você poderá sentir­se propenso a
se desengajar moralmente. Para
cada situação, peço que
identifique as autojustificativas
mais frequentes que lhe
permitem fazer o que não é
certo.

Exemplo:
Ultrapassar o sinal
vermelho:“não tem fiscalização
eletrônica”, “tô atrasado”, “já
fiquei parado tempo demais
neste cruzamento”, “o sinal
verde fica pouco tempo” 

Dar uma “fechada” em
alguém:_______________________________________
Jogar lixo pra fora do
carro:__________________________________________
Estacionar em local
proibido:_________________________________________
Tomar uns choppinhos antes de
dirigir:_________________________________
Passar por cima de um canteiro
para cortar
caminho:______________________
Estacionar em vagas reservadas
inadequadamente:________________________
Virar em local
proibido:_____________________________________________
Não usar cinto de
segurança:_________________________________________
Estacionar em cima da
calçada:_______________________________________

Agora pense nas consequências
reais ou potenciais para as
pessoas ou para você
decorrentes disso...

Espero que, ao final deste
exercício, você mesmo possa
identificar as situações e evitar
seu desengajamento moral,
mantendo­se coerente como
uma pessoa boa e cordial em
qualquer situação, inclusive no
trânsito. 

Agradecimentos: 
À psicóloga Dra. Lílian de Cristo
e ao pesquisador e professor Dr.
Fábio Iglesias, do Instituto de
Psicologia da Universidade de
Brasília, pela leitura crítica da
versão preliminar deste texto.

Para saber mais: 
Bandura, A., Barbaranelli, C.,
Caprara, G. V., & Pastorelli, C.
(1996). Mechanisms of moral
disengagement in the exercise of
moral agency. Journal of
Personality and Social
Psychology, 71(2), 364­374.

Iglesias, F. (2008).
Desengajamento moral. In A.
Bandura, R. Azzi & S. Polydoro
(Eds.), Teoria social cognitiva:
Conceitos básicos (pp.165­176).
Porto Alegre: Artmed.

Neto, I. L., Iglesias, F., &
Günther (2012). Uma medida de
justificativas de motoristas para
infrações de trânsito. Psico,
43(1), 7­13. Disponível em:
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistapsico/article/viewFile/11088/7613

T á difícil e nfr e nt a r o ca o s no t r â ns it o ? E la bo r e um pla no

postado em 7 de out de 2014 15:36 por Fábio de Cristo   [ 20 de jan de 2015 08:26atualizado​
(s)​
 ]

Autor: Fábio de Cristo,
psicólogo (CRP­17/1296),
doutor em psicologia e
pesquisador colaborador na
Universidade de Brasília, onde
desenvolve pós­doutorado sobre
o comportamento no trânsito.
Administrador do Portal de
Psicologia do Trânsito
(www.portalpsitran.com.br) e
coordenador da Rede Latino­
Americana de Psicologia do
Trânsito. Autor do
livro "Psicologia e trânsito:
Reflexões para pais, educadores
e (futuros) condutores".

*  *  *     

Apresentadora[1]: – E veja a
seguir, depois dos nossos
comerciais: reportagem mostra
um motorista e um
caminhoneiro brigando às 7h da
manhã nesta segunda­feira,
durante um congestionamento
na Estrada Parque Taguatinga
(EPTG). Para falar sobre o
assunto, entrevistaremos o
psicólogo doutor Pedro Henry,
que ajudará o telespectador a
enfrentar as situações difíceis no
trânsito da Capital Federal... 

(comerciais) 

Apresentadora: – Voltamos
ao estúdio. Meio dia e trinta e
quatro minutos. O assunto agora
é violência no trânsito. Dirigir
em Brasília se tornou um desafio
perigoso, não só pelos índices
elevados de mortes por
acidentes de trânsito, mas
também pelos
desentendimentos que
terminam em agressão e em
pancadaria. Veja a reportagem. 

Repórter: – O vídeo foi
enviado por uma telespectadora
que flagrou o momento da briga
que ocorreu após um motorista
fechar um caminhoneiro. A cena
mostra um motorista entrando
no pequeno espaço entre o
caminhão e o veículo da frente.
O motorista, que saía da pista
marginal para entrar na pista
principal, entrou justamente
nesse pequeno espaço com os
veículos em movimento. O
caminhoneiro foi obrigado a
buzinar e a frear bruscamente.
Veja, mais uma vez, o momento
em que o motorista entra na
frente do caminhão. Como
resposta, o motorista coloca o
braço pra fora do carro com o
dedo médio esticado. Irritado, o
caminhoneiro acelerou com tudo
batendo forte na traseira do
veículo, obrigando o motorista a
parar. Foi aí que ambos
desceram do veículo e começou
a pancadaria. O trânsito, que já
estava lento, parou de vez. A
briga durou apenas 37 segundos,
mas foi o suficiente para ocorrer
uma demonstração de
selvageria. Eles trocaram vários
xingamentos, socos no rosto,
chutes e empurrões ao longo das
quatro faixas da pista. Muitas
pessoas estavam em volta
olhando, gritando e buzinando.
A briga só parou quando duas
pessoas interferiram separando
os agressores. O motorista
voltou para o carro e foi embora
após arrancar em velocidade. 

Apresentadora: – O psicólogo
doutor Pedro Henry está aqui
conosco para comentar as
imagens e para discutirmos
sobre a violência no trânsito.
Boa tarde, doutor! Essa
ocorrência, infelizmente, não é
isolada. Registramos outros
flagrantes que foram exibidos
numa reportagem especial, ao
longo dessa semana, sobre o
trânsito de Brasília.
Enfrentamos, no cotidiano,
situações de falta de educação,
de desrespeito e de
individualismo que nos colocam
em pé de guerra. Como evitar os
comportamentos agressivos
diante de situações difíceis que
acontecem em nosso cotidiano
nos engarrafamentos? 

Psicólogo: – Boa tarde ao
telespectador. Agradeço o
convite para esclarecer e
orientar a partir da psicologia do
trânsito. Antes de comentar as
imagens, cujo foco são os
indivíduos, o telespectador
precisa ter clareza acerca de um
contexto mais amplo do trânsito
e do transporte em Brasília, e no
país como um todo. 

A filmagem mostra, em uma
pequena escala, a forma como
vivemos em sociedade, ou seja,
em um ambiente de elevada
competição, de defesa dos
interesses pessoais em
detrimento da coletividade, de
pressão por rapidez... Além
disso, este acontecimento
também expressa as falhas no
sistema de transporte que não
possibilita alternativas para o
deslocamento, o que,
consequentemente, aumenta o
número de automóveis nas vias,
congestionando­as. 

Agora, voltando pra situação
foco na matéria, que foi a briga
entre os motoristas, observamos
a necessidade de as pessoas
aprenderem e utilizarem
estratégias psicológicas para se
proteger emocionalmente ou
para conviver em harmonia com
os outros motoristas no
ambiente social que é o trânsito. 

Apresentadora: – Mas por
que essas reações ocorrem,
doutor? 

Psicólogo: – Nós aprendemos,
ao longo das nossas
experiências, um conjunto de
reações psicológicas que nos
predispõem a determinados
comportamentos em situações
ameaçadoras. 

Os comportamentos que
fazemos sem pensar, sem ter
intenção, são também chamados
de automatismos. Esses
automatismos nos ajudam a
lidar com as demandas do dia a
dia, sem que tenhamos que
pensar prós e contras em todas
as ocasiões. Entretanto, os
automatismos podem não ser a
melhor resposta porque, quando
nos deparamos com uma
situação ameaçadora, nem
sempre agimos como
gostaríamos ou como seria
desejado socialmente. Pela
impossibilidade momentânea de
avaliar em detalhes as
alternativas de comportamento,
as pessoas manifestam uma
emoção raivosa, agem de
maneira agressiva ou se
comportam com extrema
violência. 

Apresentadora: – É possível
não reagir de maneira agressiva,
rompendo com nossos maus
hábitos no trânsito? 

Psicólogo: – Sim, é possível. O
ser humano é capaz de mudar e
de regular a si mesmo (o que
chamamos de autorregulação),
desde que ele esteja motivado a
fazê­lo. É possível substituir os
comportamentos automáticos
inadequados ou indesejados que
fazemos sem pensar, seja porque
nos fazem sentir mal ou porque
possuem consequências ruins
para os outros. 

No entanto, não basta só querer,
embora este seja um importante
começo. Tem que querer muito
mudar. Existem estratégias
psicológicas que podem
aumentar a probabilidade de dar
certo, isto é, de ajudar as pessoas
a colocarem em prática essa
vontade de mudar. As
estratégias de autorregulação
oferecem os “passos para o
sucesso”, mas não existe mágica!

Apresentadora: – O nosso
telespectador deve estar curioso.
Você poderia comentar uma
dessas estratégias? O que fazer,
então, pra não reagir de maneira
agressiva no trânsito? 

Psicólogo: – Uma estratégia
indicada pela psicologia é
aintenção de implementação.
Significa criar um plano para
transformar um objetivo (isto é,
uma intenção) em uma ação
concreta (ou seja, implementar
algo que estamos motivados a
fazer). Dito de uma maneira
mais simples – embora não
exista nenhum gênio da lâmpada
–, a intenção de implementação
é constituída por “passos para se
realizar um desejo”. Mas, nesse
caso, você é o seu próprio gênio! 

Estudos demonstram que criar
esse tipo de plano, por mais
simples que possa parecer, pode
ter grande efeito no
comportamento, inclusive não
só no contexto do trânsito, mas
em contextos de saúde (por
exemplo, fazer atividade física e
ter uma alimentação saudável). 

Quando criamos um plano,
buscamos garantir que uma
meta seja alcançada por meio de
alguns comportamentos. E esses
comportamentos não são
selecionados na hora da
situação. Eles são selecionamos
antecipadamente, isto é, antesde
nos depararmos com a situação
ou oportunidade. O plano deve
ser feito antes de entrar no carro
e de sair dirigindo, avaliando­se
as situações específicas
antecipadamente e os
comportamentos selecionados
para alcançar o objetivo. 

Apresentadora: – Alguns
telespectadores poderão pensar
“planejar exige tempo e reflexão;
não disponho desse tempo”. 
Psicólogo: – Sim, existe um
esforço inicial, um custo para
assim dizer. Isso demonstra que
mudar comportamento não é
fácil; mas vale a pena e traz
benefícios para todos. 

Apresentadora: –
Interessante! Então para ficar
mais claro, como o
caminhoneiro e o motorista
poderiam ter se preparado para
evitar aquela situação? 

Psicólogo: – É importante
dizer que, nessa situação
específica, o caminhoneiro não
teve culpa no início da situação,
uma vez que o motorista buscou
entrar na fila por um espaço que
era insuficiente para caber seu
veículo. Mesmo assim, ambos
poderiam estar mais preparados.

Agora, suponha que o
caminhoneiro pega essa pista
diariamente no mesmo horário.
Ele sabe, portanto, que haverá
engarrafamento e que alguns
motoristas mais apressados
poderão fechá­lo. Essa também é
a situação de muitas pessoas. 

Elaborar um plano significa
selecionar a oportunidade mais
adequada e os comportamentos
mais efetivos para alcançar o
objetivo almejado. Formar uma
intenção de implementação
nada mais é do que decidir
antecipadamente três coisas:quando,
onde e comoimplementar um
objetivo. A seguinte frase ajuda a
decidir esses pontos: “Se a
situação X acontecer, então eu
farei Y”. 

Dessa maneira, antes de entrar
no veículo, o caminhoneiro deve
elaborar um plano da seguinte
maneira: “se eu estiver na EPTG
(onde) próximo a um trecho
onde a pista principal se
encontra com a marginal
(quando), então eu deixarei um
carro passar na minha frente
(como)”. 

O motorista que trafega na
marginal, também deve fazer um
plano: “se eu estiver na marginal
(onde) próximo ao trecho onde
essa pista se encontra com a
EPTG (quando), então eu
entrarei na fila caso exista um
espaço adequado para meu
veículo (como)”. De certa forma,
a implementação de intenção é
um benefício para o sujeito e
para o outro que convive com ele
no trânsito, assim todos ganham
com isso. 

Essas novas respostas, com o
tempo, se tornarão tão
automáticas quanto as respostas
anteriores (que eram raivosas e
agressivas), substituindo­as. A
tendência é que a resposta
habitual anterior seja bloqueada.
Dessa forma, é possível proteger
com sucesso a busca pelo seu
objetivo, ou seja, de se
comportar de uma maneira mais
cordial. 

Apresentadora: – Muito
obrigado, doutor! Antes de
terminar, o senhor gostaria de
dizer algo? 
Psicólogo: – Sim, tenho uma
última mensagem ao
telespectador: quando você
notar que está difícil enfrentar o
caos no trânsito, elabore um
plano antecipadamente
identificando “quando, onde e
como fazer”, para não ser pego
de surpresa em situações
específicas! E lembre­se:
planejando, você evitará
situações ainda mais
estressantes para si e para o
outro. 

Apresentadora: – Estivemos
aqui com o psicólogo Pedro
Henry, seguimos agora com a
previsão do tempo... 

[1] A situação de entrevista e a
reportagem são originais,
embora criadas com base em
fatos reais.

Agradecimentos: 
À Dra. Lílian de Cristo e ao
professor Dr. Fábio Iglesias, do
Instituto de Psicologia da
Universidade de Brasília, pela
leitura crítica da versão
preliminar deste texto.

Para saber mais: 
Gollwitzer, P. W. (1999).
Implementation intentions:
Strong effects of simple plans.
American Psychologist, 54(7),
493­503. Disponível
em:http://www.psych.nyu.edu/gollwitzer/99Goll_ImpInt.pdf

Gollwitzer, P. M., &
Brandstätter, V. (1997).
Implementation intentions and
effective goal pursuit. Journal of
Personality and Social
Psychology, 73(1), 186­199.
Disponível
em:http://www.psych.nyu.edu/gollwitzer/97GollBrand_ImpIntGoalPurs.pdf

Gollwitzer, P. M., & Oettingen,
G. (2013). Implementation
intentions. In M. Gellman & J.
R. Turner (Eds.), Encyclopedia
of behavioral medicine (Part 9,
pp. 1043­1048). New York:
Springer­Verlag. Disponível
em:http://www.psych.nyu.edu/oettingen/Gollwitzer,%20P.%20M.,%20&%20Oettingen,%20G.

A dime ns ã o s o cia l do s a cide nt e s co m mo t o ciclis t a s

postado em 4 de abr de 2013 21:13 por Fábio de Cristo   [ 5 de fev de 2015 05:12atualizado​
(s)​
 ]

Autor: Fábio de Cristo,
psicólogo (CRP­17/1296),
doutor em psicologia e
pesquisador colaborador na
Universidade de Brasília, onde
desenvolve pós­doutorado sobre
o comportamento no trânsito.
Administrador do Portal de
Psicologia do Trânsito
(www.portalpsitran.com.br) e
coordenador da Rede Latino­
Americana de Psicologia do
Trânsito. Autor do
livro "Psicologia e trânsito:
Reflexões para pais, educadores
e (futuros) condutores".
 
 *  *  *
 
A maneira como as pessoas se
locomovem vem se modificando
nos últimos anos nas cidades
brasileiras, notadamente com o
aumento da venda de
motocicletas. Para se ter uma
ideia, antigamente, no interior,
andava­se predominantemente
de cavalo, carroça e bicicleta.
Hoje, as motos são usadas
inclusive para levar o gado do
pasto para o curral. Esta
mudança para um transporte
mais potente e veloz, não raro, é
feita sem maiores preocupações
pelas autoridades de trânsito e
pelos (novos) condutores. É
comum, em muitas cidades,
conduzir a motocicleta sem se
preocupar com a proteção e a
segurança. 

Muitos jovens têm sido vítimas
no trânsito, sendo estimado um
aumento de 32,3% no número
de óbitos por acidentes de
transporte terrestre na última
década – 2000 a 2010, segundo
um estudo com dados do
Ministério da Saúde. A taxa de
mortalidade de ocupantes de
motocicleta no Brasil, que tem
aumentado a cada ano, é uma
das responsáveis por este
aumento das mortes no geral.
Como consequência, causam um
prejuízo elevado ao país, devido
aos custos envolvidos com
internações, cirurgias,
medicamentos e afastamentos
remunerados do trabalho, para
citar alguns. Muito além disso,
quando o acidentado sobrevive,
ocorrem profundas mudanças
na sua rotina e na da família.
Mas como evitar tais
ocorrências? A matéria abaixo
pode ajudar a pensarmos numa
possibilidade.   

“Jovem motociclista fica
paraplégico após acidente
no interior da Paraíba.

Na noite de sábado, Francisco
de 19 anos ficou paraplégico
após colidir com outra
motocicleta num cruzamento da
cidade. As duas motos
transportavam passageiros
acima do permitido, cada uma
com três pessoas. Segundo os
policiais rodoviários, todas as
vítimas estavam sem capacete.
Francisco, que pilotava uma
das motos, foi encaminhado ao
hospital. Sua família está
transtornada com a situação do
rapaz, que perdeu a
sensibilidade e o controle das
pernas. Os demais envolvidos
no acidente sofreram
ferimentos leves.” 

(Jornal Popular do Interior,
janeiro de 2009) [1].
 
Esse acidente tem coisas bem
peculiares que instigam nossa
curiosidade, afinal: Por que
todos os seis envolvidos estavam
sem capacete? Será que
transportar mais de duas
pessoas na moto é comum nesta
cidade? Acidentes assim são
uma exceção neste lugar? 

Estas perguntas têm a ver com
um elemento importante para a
promoção da saúde e segurança
no trânsito: a análise da
dimensão social dos acidentes
com motociclistas. A dimensão
social, neste caso, significa
compreender que parcela dos
comportamentos indesejados,
inseguros ou de risco pode ser
influenciada e mantida pelo
grupo, como os outros
motociclistas, ou pela
comunidade, quer dizer, os
moradores de uma cidade. 
Isto é possível? Sim. Na cidade
de Francisco, na realidade, sair
sem capacete é tão comum
quanto andar com a família
inteira em cima da garupa. Por
lá, quem usa capacete é
reprovado socialmente, afinal:
“aqui não precisa, é tudo
pertinho”, “faz muito calor e o
capacete abafa pra danado” ou
“porque todo mundo anda assim
mesmo”, dizem motociclistas e
moradores locais. 

Parece, então, que as “causas”
dos comportamentos dos
motociclistas nem sempre estão
“dentro” deles, como se costuma
pensar (por exemplo, “fulaninho
é assim mesmo”, “é ruindade
dele” ou “sua índole é má”). Dito
de outra maneira, muito do que
se passa “dentro de nós” é
influenciado por coisas que
acontecem “fora de nós”, quer
dizer, são construídas a partir da
dimensão social. Vejamos isso
com mais detalhes...
 
O comportamento do
motociclista é fortemente
influenciado por sua intenção,
isto é, sua motivação para
realizá­lo (é algo que está
"dentro" da pessoa). A intenção,
portanto, é o elemento capaz de
explicar melhor o
comportamento, a ação. Nesta
lógica, concluímos que
Francisconão usou o
capacete(comportamento)
porque ele estava pouco
motivado para usá­
lo (intenção). 
Mas esta intenção, por sua vez, é
influenciada por outros três
elementos relativos à dimensão
social, ou como o indivíduo a
interpreta, conforme argumenta
uma importante teoria da
psicologia, a teoria do
comportamento planejado. Os
três elementos são: (1) a atitude
em relação ao comportamento,
(2) a pressão social e (3) o
controle percebido sobre o
comportamento. Segunda a
teoria, podemos planejar nossas
ações, se quisermos; mas nossa
motivação dependerá em grande
parte desses três elementos que
citei. Vejamos cada um deles a
seguir, tentando aplicar ao caso
de Francisco.

A atitude nada mais é do que a
avaliação positiva ou negativa
que fazemos em relação a
alguém ou a alguma coisa. No
caso de Francisco, pode ser a
avaliação negativa que ele fez em
relação ao uso do capacete
(pensamentos do tipo “usar
capacete é ruim” ou “fica
abafado”). Aqui vale uma
ressalva: repare que, na
psicologia, atitude é diferente
decomportamento, ainda que,
no senso comum, sejam
considerados semelhantes, como
quando se diz: “Francisco tomou
uma atitude e comprou uma
moto!”. Enquanto a atitude é
uma inclinação, disposição ou
avaliação para se comportar ou
não de determinada forma em
relação a algo, o comportamento
é aquilo que se observa, a ação
que a pessoa realiza de fato.
Entendido?

A pressão social é o que
pensamos que os outros acham
que nos devemos comportar.
Esses “outros” são pessoas que
valorizamos; podem ser outros
motociclistas ou moradores da
cidade. Geralmente, queremos
agir em conformidade com o que
eles pensam de nós. Na história
de Francisco, é possível supor
que ele não se sentiu
pressionado a usar capacete,
afinal, todos estavam sem a
proteção e não o cobraram. 

Finalmente, a percepção de
controle sobre o
comportamento, também
influencia a intenção. É o quanto
percebemos ter controle sobre o
nosso comportamento ou o quão
difícil ou fácil é realizá­lo. Por
exemplo, se os obstáculos para
usar o capacete eram percebidos
por Francisco como muito
grandes (dificuldades para
guardá­lo ou carregá­lo), ele não
se esforçaria – ou se esforçaria
pouco – para usá­lo. 

Mas, como esses elementos –
intenção, atitude, pressão
social e percepção de controle
– podem nos ajudar na
prevenção de acidentes com
motociclistas? Pode ser útil de
diversas formas, como
informar e educar as pessoas.
Imagine que a secretaria de
saúde (ou uma empresa
privada ou qualquer
instituição) da cidade de
Francisco está preocupada com
os acidentes de moto e quer
diminuir esta incidência. 
O objetivo da secretaria é,
portanto, incentivar o
comportamento de “usar
capacete”. Aplicando a teoria
neste caso, primeiramente, é
importante identificar o grau de
intenção de usá­lo (isto é, será
que a motivação de usar
capacete é elevada entre os
motociclistas da cidade?).
Posteriormente, identificar as
razões para isso, que são os três
principais elementos que
influenciam a intenção. Assim, a
análise poderia indicar que a
intenção é baixa porque a
atitude de usar o capacete é
negativa, isto é, usar o capacete é
avaliado como ruim; além disso,
pode revelar que a pressão social
para usar o capacete não existe,
ou seja, os motociclistas não
percebem que as pessoas que
lhe são importantes pensam que
eles devem usá­lo; e que os
motociclistas percebem ter
pouco controle sobre o uso do
capacete, uma vez que, segundo
eles, usá­lo requer “grande
esforço”. 

A secretaria de saúde, então,
poderia investir em informação
junto aos motociclistas (meios
de comunicação em massa ou
outra campanha) na tentativa de
reverter a situação identificada,
tentando aumentar o grau de
intenção dos motociclistas para
usar o capacete. Para isso,
poderia estimular a atitude
positiva e a pressão social para
usá­lo, além de tentar fazer os
motociclistas perceberem que
eles têm – e podem – exercer o
controle, e que é prático usar o
capacete. 

Além das campanhas, outras
estratégias devem ser pensadas e
implementadas em conjunto,
visando a influenciar a intenção
e os seus determinantes. O
aumento da fiscalização, por
exemplo, pode produzir impacto
nas pessoas e,
consequentemente, aumentar a
pressão social. A promoção de
cursos de atualização pode
influenciar positivamente na
atitude de usar capacete.
Disponibilizar estacionamentos
públicos com guarda­volumes
pode ajudar na percepção de
controle sobre o
comportamento, uma vez que
guardar o capacete
adequadamente ajuda a
minimizar estas barreiras. 

Em suma, se, por um lado, a
dimensão social mantem muitos
comportamentos de risco dos
motociclistas; por outro,
também pode ser usada em
favor da segurança para
influenciar comportamentos
individuais, considerando a
teoria do comportamento
planejado como exemplo.
Desconsiderar a dimensão social
fará com que a intervenção
preventiva tenha grande
probabilidade de fracasso, o que
tornará cada vez mais comum
matérias jornalísticas
semelhantes à do início do texto,
em que os Franciscos do nosso
país perdem a vida ou sofrem
severamente as consequências
dos acidentes de trânsito com
sua motocicleta. 
 
[1] Nota: A matéria é fictícia,
mas o conteúdo é baseado em
um caso real.
 
Para saber mais:
Manstead, A. S. R. (1996).
Attitudes and behaviour. In G.
R. Semin & K. Fiedler
(Eds.),Applied social
psychology (pp. 3­29). London:
SAGE.
 
Morais Neto, O. L., Montenegro,
M. M. S., Monteiro, R. A.,
Siqueira Júnior, J. B., Silva, M.
M. A., Lima, C. M., Miranda, L.
O. M., Malta, D. C., & Silva
Junior, J. B. (2012). Mortalidade
por acidentes de transporte
terrestre no Brasil na última
década: Tendência e
aglomerados de risco. Ciência &
Saúde Coletiva, 17(9), 2223­
2236. Disponível
em:http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n9/a02v17n9.pdf
 
Vasconcellos, E. A. (2008). O
custo social da motocicleta no
Brasil. Revista dos Transportes
Públicos, 119/120, 127­
142. Disponível
em:http://apatru.org.br/arquivos/%7B119C97E2­
4817­4324­B4C8­
978DC4F1A446%7D_revista­da­
antp­119­20­artigo­eduardo­
vasconcellos.pdf 
 

A ca r ga de t r a ba lho me nt a l do mo t o r is t a

postado em 29 de set de 2012 18:07 por Fábio de Cristo   [ 7 de out de 2014 16:54atualizado​
(s)​
 ]

Autor: Fábio de Cristo,
psicólogo (CRP­17/1296),
doutor em psicologia e
pesquisador colaborador na
Universidade de Brasília, onde
desenvolve pós­doutorado sobre
o comportamento no trânsito.
Administrador do Portal de
Psicologia do Trânsito
(www.portalpsitran.com.br) e
coordenador da Rede Latino­
Americana de Psicologia do
Trânsito. Autor do
livro "Psicologia e trânsito:
Reflexões para pais, educadores
e (futuros) condutores".
 
 *  *  *
 

Se você já usou um computador
com vários itens abertos ao
mesmo tempo, já percebeu que,
dependendo da quantidade e do
tipo de programa em uso
(internet, jogos e vídeos), ocorre
uma queda considerável no
desempenho da máquina. Neste
caso, a capacidade do
computador processar
informações ultrapassou o seu
limite ótimo de funcionamento,
especialmente quando ele não é
tão potente. Por esta razão, ele
fica lento e demora a abrir ou
executar um novo programa,
irritando o usuário. O
computador pode servir de
analogia para compreendermos
um pouco a tarefa do
motorista... 
 
No trânsito, nossos
comportamentos são realizados
de maneira dinâmica e num
ambiente que muda
constantemente. A atividade de
conduzir demanda certa carga
de trabalho mental, afinal, são
muitas informações que
devemos prestar atenção para
adaptarmos nosso
comportamento. Algumas
informações são oriundas, por
exemplo, da rua, dos outros
veículos, dos pedestres; outras
vêm do próprio veículo, como as
informações do rádio, do
passageiro, do computador de
bordo, do sistema de guia de
rotas (GPS – Global Positioning
System), cujo uso tem sido cada
vez mais comum. Mas não é só
por conta dos estímulos internos
e externos relacionados à
atividade de dirigir que têm
aumentado relativamente a
carga mental do motorista.
Existem outras tarefas, não
exatamente relacionadas ao
trânsito, impostas por nós
mesmos durante a condução... 

Uma vez, peguei carona com
uma motorista que me deixou
nervoso – mas não pelo fato de
ser uma mulher, é bom deixar
claro! Qualquer pessoa sentiria o
mesmo no meu lugar. Saímos
para um compromisso já
atrasados. Na rua, com o carro
em movimento, a motorista
começou a conversar comigo,
gesticulando muito – uma
característica sua. Ela falava
sobre o nosso atraso e sobre a
quantidade de coisas que ela
devia fazer naquele dia. Mais a
frente, ela se deu conta que
estava sem o cinto de segurança
e, com o carro em movimento,
soltou o volante para puxá­lo
com as duas mãos. O cinto, por
sua vez, travou no meio do
caminho. Ela tentou, tentou e,
enfim, conseguiu destravar e
afivelá­lo... Enquanto isso, o
carro seguia pela rua passando
por dois cruzamentos – em que
ficamos confusos de quem é a
preferencia de passagem, se
nossa ou do motorista que vem
na transversal –, e a conversa
também continuava... Logo em
seguida, de repente, a motorista
olhou para trás e pegou a bolsa
do banco de traseiro, botando­a
rapidamente no seu colo. Entre
uma olhada e outra na rua, abriu
a bolsa com uma das mãos,
pegou seu iFone e colocou­o
subitamente no colo. A
motorista começou a ver se tinha
mensagem, alternando sua visão
entre o trânsito e o aparelho,
com uma das mãos ao volante,
apertando aquelas teclas
pequenininhas com aparente
agilidade. Muito tenso, eu
preparava­me para o pior, claro;
afinal, se viesse algum carro
inesperadamente no
cruzamento, ela nem perceberia
e nem teria tempo para livrar­
nos do perigo. Finalmente, saí
do torpor e resolvi comentar a
situação. Foi aí que a motorista
se deu conta e voltou, graças a
Deus, a concentrar­se no
trânsito. Felizmente, estou aqui
são e salvo! (risos). 

O relato acima demonstra que a
tarefa de dirigir pode tornar­se
mais exigente quando incluímos
outras atividades que não são
prioridade quando estamos
dirigindo: pegar e manusear
objetos, afivelar o cinto de
segurança, mandar e ler
torpedos etc., coisas que,
geralmente, podemos (devemos)
fazer antes ou depois de dirigir.
Como nem sempre sofremos as
consequências aversivas do
nosso comportamento arriscado,
continuamos mantendo­o ao
longo do tempo. Assim,
infelizmente, esta maneira de se
comportar tornou­se um padrão
que nem nos damos mais conta,
até que alguém chame a atenção.

No caso do computador, a
solução para o aumento na
quantidade de tarefas pode ser
trocar o processador por um
mais potente. No caso do
motorista, como uma solução
semelhante não é possível, o
mais coerente é sermos
compreensíveis com
aslimitações naturais do nosso
organismo e da nossa
capacidade psicológica.
Busquemos, então, diminuir a
quantidade de estímulos que nos
impomos voluntariamente e que
interferem negativamente na
nossa tarefa de dirigir. Se você é
um carona, colabore para não
aumentar desnecessariamente a
carga de trabalho mental do
motorista, pois, diferente de
mim, você poderá não estar aqui
para contar a história. 

Para saber mais: 
De Waard, D. (1996). The
measurement of drivers´
mental workload (Tese de
doutorado, University of
Groningen). Retirado
dehttp://home.zonnet.nl/waard2/dewaard1996.pdf

Jahn, G., Oehme, A., Krems, J.
F., & Gelau, C. (2005).
Peripheral detection as a
workload measure in driving:
Effects of traffic complexity and
route guidance system use in a
driving study. Transportation
Research Part F, 8, 255–275. 

Piechulla, W., Mayser, C.,
Gehrke, H., & König, W. (2003).
Reducing drivers´ mental
workload by means of an
adaptive man–machine
interface. Transportation
Research Part F, 6, 233–248.

D a r “ dica s ” o u fa z e r “ pr o vo ca çõ e s ” ?

postado em 25 de ago de 2012 06:14 por Fábio de Cristo   [ 7 de out de 2014 16:47atualizado​
(s)​
 ]

Autor: Fábio de Cristo,
psicólogo (CRP­17/1296),
doutor em psicologia e
pesquisador colaborador na
Universidade de Brasília, onde
desenvolve pós­doutorado sobre
o comportamento no trânsito.
Administrador do Portal de
Psicologia do Trânsito
(www.portalpsitran.com.br) e
coordenador da Rede Latino­
Americana de Psicologia do
Trânsito. Autor do
livro "Psicologia e trânsito:
Reflexões para pais, educadores
e (futuros) condutores".
 
 *  *  *
 
Ao final da uma entrevista, um
jornalista pediu dicas sobre o
que seus leitores deviam fazer
para deixar o trânsito da cidade
melhor. O entrevistado pensou
um pouco e, por achar mais
apropriado ao público, resolveu
que, em vez de dar dicas, faria
algumas provocações, isto é,
colocaria questões para serem
pensadas. Assim foi feito. A
entrevista foi encerrada. 

No dia seguinte, inconformado,
o jornalista ligou novamente: “–
Professor, muito obrigado pela
sua colaboração; adorei as
provocações. Entretanto, será
que o senhor não poderia dizer
algumas coisas práticas para o
nosso leitor? Será que não
podemos dizer para eles
seguirem o código de trânsito...?
O que o senhor acha...?”. 

Pois bem, dar dicas ou fazer
“provocações” são estratégias
distintas que os formadores de
opinião devem ter clareza para
aplicá­las com proveito. 

Dar dicas, por exemplo,
fundamenta­se na seguinte
ideia: se as pessoas conhecerem
as normas de trânsito, logo se
comportarão corretamente, de
maneira segura. Todavia, nem
sempre este raciocínio está
correto, conforme demonstra o
nosso tricampeão mundial de
Fórmula 1 (e veja também a foto
do carro da polícia estacionado
em local proibido). 

As dicas têm a sua importância,
especialmente quando
relacionadas a situações menos
frequentes ou procedimentos
com maior nível de
complexidade, como, por
exemplo, instalar a cadeirinha
infantil e prestar os primeiros­
socorros ao acidentado. Estas
situações são incomuns para
muita gente e, portanto, dicas e
instruções são bem­vindas.
Todavia, quando são
elementares ou muito gerais –
como, “dizer que eles sigam o
código de trânsito” –,
dependendo do nível de
conhecimento do público a que
se destinam, as dicas podem não
ser atrativas, motivadoras. Em
suma, não agregarão
conhecimento por que as
pessoas que as recebem serão
indiferentes. Além disso, não
raro, elas produzem uma reação
aversiva. Quem já não ouviu
ironias do tipo: “– Oxente, e
precisava de um especialista só
pra dizer isso?!”. 

É oportuno reconhecer que, de
fato, muitos cidadãos já sabem o
que fazer – se não fazem, são
por outras razões. A legislação
de trânsito no Brasil tem mais de
100 anos de existência. Nesse
período, três códigos ajudaram
organizar nossos deslocamentos
(1941, 1966 e 1997). Muitas
regras foram naturalmente
incorporadas no nosso
cotidiano, seja por meio das
aulas na escola ou autoescola,
seja por meio das experiências
cotidianas... Talvez por isso, as
dicas soem, às vezes, como se
quiséssemos “ensinar o padre a
rezar missa” ou “ensinar o
'padre­nosso' ao vigário”, como
se diz popularmente. Até
quando, então, os formadores de
opinião e alguns de nós, ditos
especialistas, continuaremos
subestimando a inteligência das
pessoas?

A estratégia da “provocação”,
por sua vez, no melhor sentido
da palavra, se refere, aqui, a
promover, a estimular, a motivar
alguma reação positiva que se
reflita no comportamento no
trânsito. Sua importância reside,
por exemplo, na possibilidade de
produzir, de modo eficiente,
uma incompatibilidade ou
inconsistência entre uma nova
informação e o que o leitor
conhece ou faz. Na psicologia, tal
inconsistência é chamada
dedissonância cognitiva. (A
psicologia tem palavras
complicadas mesmo). 
Dito de outra maneira, assim
como a fome faz com que
busquemos saciá­la, nós
também temos a tendência de
buscar resolver a dissonância
estabelecida entre o que
pensamos e sentimos ou entre o
que acreditamos e fazemos. 
Na

narrativa acima, é possível
argumentar que o jornalista
entrou em dissonância, quer
dizer, em conflito consigo por
que as informações que ele
recebeu (provocações) não eram
as que ele almejava (dicas). Um
desconforto psicológico, então,
foi estabelecido, motivando a
busca para reduzi­lo ou eliminá­
lo. Resultado: ele agiu; ligou
novamente no dia seguinte. Era
mais ou menos essa reação que o
entrevistado esperava dos
leitores, após lerem suas
provocações: que eles se
sentissem motivados a mudar, e
mudassem realmente. O
jornalista não compreendera a
tática ou subestimara sua
eficiência.

A provocação pode ser mais
interessante do que as dicas,
especialmente nos tempos
atuais, em que as pessoas estão
cada vez mais escolarizadas,
conhecedoras dos seus direitos
e, portanto, com a capacidade
crítica mais aguçada. 

Os jornais cumprem um papel
esclarecedor importante sobre o
comportamento no trânsito.
Nesta seara, a dissonância
cognitiva tem um valor que não
deve ser desprezado. Se bem
compreendida e empregada, a
dissonância pode ser capaz de
produzir autorreflexão e fazer as
pessoas se esforçarem para
buscar coerência rumo ao
comportamento seguro no
trânsito. 

Amigo leitor, diante do que foi
dito, peço agora que tente
construir sua resposta sobre
qual é a melhor estratégia: dar
“dicas” ou fazer “provocações”?
(Sim, estou tentando deixá­lo
em dissonância!). 

Para saber mais: 
Festinger, L. (1957). A theory of
cognitive dissonance. California:
Stanford University Press.
Disponível parcialmente aqui.

Pla ne ja ndo o co mpo r t a me nt o de NÃ O be be r e dir igir

postado em 23 de fev de 2012 07:56 por Fábio de Cristo   [ 7 de out de 2014 16:46atualizado​
(s)​
 ]

Autor: Fábio de Cristo,
psicólogo (CRP­17/1296),
doutor em psicologia e
pesquisador colaborador na
Universidade de Brasília, onde
desenvolve pós­doutorado sobre
o comportamento no trânsito.
Administrador do Portal de
Psicologia do Trânsito
(www.portalpsitran.com.br) e
coordenador da Rede Latino­
Americana de Psicologia do
Trânsito. Autor do
livro "Psicologia e trânsito:
Reflexões para pais, educadores
e (futuros) condutores".
 
 *  *  *
 

Hoje em dia, dificilmente, as
pessoas desconhecem os riscos,
tanto para si quanto para os
outros, de ingerir bebida
alcoólica e conduzir um
automóvel ou motocicleta.
Dificilmente, elas também
desconhecem que este
comportamento é uma infração
ao código de trânsito. Caso seja
pego numa fiscalização, o
motorista alcoolizado terá uma
grande dor de cabeça, pela
ressaca física ou moral, pela
perda de tempo e pelos custos
financeiros – multa atualmente
de R$ 957,70, suspensão do
direito de dirigir por doze meses,
retenção do veículo até que
chegue um condutor habilitado e
recolhimento da habilitação.
 
Não beber e dirigir, em alguns
casos, é um comportamento
bastante desafiador,
necessitando planejamento para
obter sucesso. Mas, é possível
planejá­lo? Sim, é possível fazê­
lo, a fim de dirigirmos em paz,
com segurança e em
conformidade com a lei.
Contudo, para elaborar e
executar este plano, é necessário
ter consciência de, pelo
menos,três elementos que
estão em jogo influenciando
nossa intenção e
comportamento.
 
Com o aumento da fiscalização,
do rigor da lei e das possíveis
consequências punitivas, muitas
pessoas têm
desenvolvidoatitude favorável
ao ato de “não beber e dirigir”,
embora o comportamento ainda
seja pouco valorizado
socialmente. Esta avaliação
positiva sobre o não beber e
dirigir, associado a uma
avaliação negativa das
consequências de ser pego
embriagado, é
um primeiroelemento
importante que influencia nossa
intenção. É o nosso despertar
crítico para a situação, e um
sinal de mudança de nossa
parte.
 
 

O segundo elemento importante
é a pressão social, geralmente
exercida pelos amigos para
ingerir bebida alcoólica. Mas,
por que os amigos são tão
decisivos na nossa motivação e
até no comportamento? Em
geral, temos muita estima,
respeito e admiração pelos
amigos. Eles nos orientam, riem
e choram com a gente.
Conhecem nossos jeitos,
aspirações, problemas. Os
amigos são aquelas pessoas
importantes para nós e fazem a
vida valer a pena. É natural,
portanto, querer comportar­se
conforme achamos que mais
agradaria eles, ou seja,
acompanhando­os na cerveja.
Isto, por sua vez, interferirá na
nossa vontade de tentar e na
quantidade de esforço que
planejamos manifestar para
realizar o comportamento.
 
Resistir, portanto, à influência
deles é um dos grandes desafios
para muitos motoristas e
motociclistas que saem para um
barzinho ou uma festa. Em 70%
dos casos, os amigos conseguem
diminuir nossa intenção de não
beber... Tudo bem, em 99% dos
casos! É por isso que as
propagandas de cerveja usam
encontros entre amigos para
vender bebida. Se identificarmos
e administrarmos com
habilidade esta pressão,
possivelmente não
fracassaremos minutos depois
da chegada ao bar.
 
Quando dizemos “– Não!”, o
amigo, em geral, fica frustrado,
perguntando logo: “– Num vai
beber por quê?”. A pergunta tem
sua lógica, afinal, supostamente,
estaríamos ali pra beber.
Portanto, é isso que se espera de
nós: que bebamos. Ademais, foi
um gesto tão caloroso e
espontâneo... Por qual razão
negaríamos uma cervejinha,
contrariando­os logo na
chegada?
 
Tem amigo também que, antes
mesmo de justificarmos, ele já
responde com ar provocativo o
que havia perguntado, tentando
avaliar e diminuir o nosso grau
de motivação para não beber.
Sabemos como eles são bons
nisso (veja um exemplo de
propaganda de cerveja aqui).
Eles fazem pressão mesmo.
Alguns argumentos para nos
convencer são leves (mas
bastante eficientes), como: “–
Vai esquentar a cerveja!”. Outros
podem ser mais fortes, mexendo
com a nossa coragem, dizendo:
“– Rapaz, num lhe conheci fraco
assim, sem beber!”, ou apelam
para a amizade de longa data: “–
Tome só essa, em nome da nossa
amizade, vai...”. É fundamental,
portanto, resistir a essas
pressões.
  

O terceiro elemento que torna os
amigos tão decisivos na nossa
intenção e comportamento é
apercepção de controle. É
importante percebermos que
temos ou podemos ter o controle
sobre nosso comportamento, e,
mais importante, que podemos
exercê­lo no momento oportuno,
aumentando a probabilidade de
concretização da nossa intenção
de não beber.
 
O controle sobre o
comportamento está conosco, ou
seja, dependa da gente.
Podemos, assim, impedir
educadamente que o copo seja
cheio de cerveja, colocando a
mão em cima dele; se este já
estiver cheio, podemos afastá­lo,
agradecer pelo gesto e pedir um
refrigerante, água ou suco.
 
Em algumas situações, todavia,
por mais que o controle esteja
conosco, acreditamos que é
muito difícil dizer “– Não,
obrigado! Não vou beber”, antes
que o amigo encha o copo
americano com o “precioso”
líquido. Nestes casos, o nosso
controle percebido sobre o
comportamento é baixo. A
consequência disso é que, se os
“obstáculos” para resistir são
percebidos como muito grandes,
nos esforçaremos pouco paranão
beber.
 
Se conseguirmos, então,
administrar bem os momentos
que dizemos “não” (incluindo as
várias vezes que temos de dizê­lo
numa mesma ocasião), como
também as reações dos amigos,
nós teremos alguma esperança
de conseguir, de fato, não beber.
Em suma, nossos amigos podem
ter a “força”; mas nós também
temos a “fraqueza”.
 
Amigo leitor, o comportamento
de não beber e dirigir pode ser
planejado. Então, planeje­o
antes de sair conduzindo
automóvel ou motocicleta para
onde vai rolar bebida alcoólica.
Este comportamento dependerá,
em grande medida, tanto do
controle que você percebe ter
quanto do grau da sua intenção
de realizá­lo.
 
A intenção de realizar o plano,
por sua vez, dependerá de três
elementos, ou seja, será maior
quando a sua avaliação sobre as
consequências do seu
comportamento de não beber e
dirigir forem consideradas
positivas (atitude); quando,
segundo a sua avaliação, a
pressão dos seus amigos,
naquele momento, não exercer
tanta influência (pressão social);
e, finalmente, quando você
perceber que tem controle sobre
este comportamento (percepção
de controle)... 
 
  << Telefone celular
chamando... >> 
 
– Alô!
– E aíííí, meu amiiiigo! Tudo
bem?
– Vinícius?! Nããão acredito!
Tudo ótimo! E você?
– Tudo jóia! Escuta, tenho uma
novidade! Tô de casa nova, e
morando de frente pro mar!
Quero te convidar para conhecê­
la, pode ser hoje à noite?
– Claaaaro! Será um prazer.
– Perfeito! Quando você vier pra
cá de carro mais tarde, lembre­
se de trazer seu violão, ok?
Faremos um sonzinho. Outra
coisa, estou indo ao
supermercado preparar tudo.
Você vai querer beber o quê,
vinho ou cerveja?
– ... 
 
Para saber mais:

1. Åberg, L. (2001).
Attitudes. In P.­E. Barjonet
(Ed.), Traffic psychology
today (pp. 119­135).
Norwell: Kluwer Academic
Publishers.
2. Ajzen, I. (1991). The
theory of planned
behavior. Organizational
Behavior and Human
Decision Processes, 50,
171­211.
3. Brasil. (2008). Lei nº
11.705, de 19 de junho de
2008. [Dispõe sobre as
restrições ao uso de
bebidas alcoólicas].
Recuperado em 19 de
fevereiro 2012,
dehttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007­
2010/2008/Lei/L11705.htm
4. Parker, D., Manstead, A.
S. R., Stradling, S. G.,
Reason, J. T, & Baxter, J.
S. (1992). Intention to
commit driving violations:
An application of the
theory of planned
behavior. Journal of
Applied Psychology, 77(1),
94­101.

A lé m da s e s t a t ís t ica s : R e pe r cus s õ e s a fe t iva s da pe r da po r a cide nt e de


t r â ns it o

postado em 11 de fev de 2012 03:40 por Fábio de Cristo   [ 7 de out de 2014 16:47atualizado​
(s)​
 ]

Autor: Fábio de Cristo,
psicólogo (CRP­17/1296),
doutor em psicologia e
pesquisador colaborador na
Universidade de Brasília, onde
desenvolve pós­doutorado sobre
o comportamento no trânsito.
Administrador do Portal de
Psicologia do Trânsito
(www.portalpsitran.com.br) e
coordenador da Rede Latino­
Americana de Psicologia do
Trânsito. Autor do
livro "Psicologia e trânsito:
Reflexões para pais, educadores
e (futuros) condutores".
 
 *  *  *
 

Em uma noite inspiradora de
quarta­feira, falava um
palestrante à sua enorme
platéia, cuja grande maioria era
de estudantes universitários.
Depois de uma ligeira pausa,
demonstrando a face séria e a
voz serena, continuou dizendo: 

"– Meus amigos, tenho
mostrado aqui vários gráficos
com estatísticas de acidentes de
trânsito no Brasil e no mundo.
Temos discutido exaustivamente
o papel dos legisladores e da
fiscalização na minimização
dessa tragédia. Tenho indicado o
número de mortos e feridos,
além dos custos financeiros dos
atendimentos às vítimas e às
reformas nos espaços públicos
danificados. Mas ainda não falei
tudo. Embora veja no olhar e na
expressão de vocês que o
conteúdo apresentado foi
compreendido intelectualmente,
ou seja, pelo raciocínio, é
igualmente importante que
vocês compreendam o conteúdo
emocional do nosso tema, isto é,
que sintam em seu coração.
Existe um fato que não está
contabilizado nessas estatísticas
e que nos ajudará nesta tarefa: a
dor emocional de perder quem
se ama num acidente de
trânsito. O quê vocês sabem
dizer sobre isso?". 
Após esta pergunta, fez­se outra
pausa. A audiência,
surpreendida, permanecia em
silêncio, em atitude reflexiva, até
que o palestrante retomou a
palavra. 

"– Suponho que muitos aqui não
têm uma resposta pronta para
esta pergunta. Assim, eu os
ajudarei na sua construção... 
Por favor, de olhos fechados,
imagine que você perdeu agora
um ente muito querido, em
decorrência de um acidente de
trânsito. Agora, imagine que esta
pessoa é sua mãe. 
Não abra os olhos. Continue o
exercício. 

A partir deste minuto, sua mãe
simplesmente não estará mais
perto de você fisicamente nos
próximos natais, festas de
família ou no seu aniversário. 
Como seria viver sem ela pelo
resto da vida? Imagine que você
não terá mais seus paparicos,
nem aquele cafuné. 

A partir de hoje, ela não te
acordará mais carinhosamente
nos fins de semana, como
costumava fazer. Aquela
massagem leve nos dedos que te
fazia despertar lentamente, isso
não existirá mais. 

Sabe aquele abraço caloroso,
aquele que te cobre todo,
envolvendo a alma na mesma
vibração, de coração para
coração? Infelizmente, dele só
restará a sensação sentida na
última vez... 

Dificilmente, você saberá avaliar
a extensão do vazio no peito por
não tê­la nos momentos de
decisão que a vida te exigirá;
afinal, parece que só ela possuía
a sabedoria, o pensamento
visionário e o espírito orientador
capaz de te sensibilizar e
expandir a mente. 
Sabe aquelas risadas frouxas que
você costuma dar a cada anedota
que sua mãe conta? Sem elas
agora, você, certamente,
reconhecerá como é triste levar a
vida com menos graça. Nesses
momentos de descontração, você
não desfrutará daquela
gargalhada gostosa. 
Imagine que todas essas coisas
boas serão perdidas
subitamente, tudo de uma vez,
literalmente da noite para o dia. 

Sabe os apelidos carinhosos que
ela inventava para você, aqueles
no diminutivo, e que só ela
possuía autorização para
pronunciá­los? Eles serão
lentamente esquecidos pelo
desuso. Em alguns raros
momentos, alguém
inexplicavelmente pronunciará
um deles te chamando, e nessa
hora, um filme passará na sua
mente, relembrando alguma
cena dos bons momentos com a
sua mãe. Discretamente, poderá
rolar uma lágrima de saudade. 
Também será um golpe poder
vê­la 'de verdade' apenas nos
sonhos. Estes sonhos serão tão
emocionantes e reais que
dificilmente chegarão ao fim,
pois o choro e os soluços
intensos te farão acordar, seja no
meio da madrugada ou durante
um cochilo depois do almoço.
Você tentará voltar para o
sonho, mas em vão. 

Mesmo amando muito sua
mãezinha, só depois de muito
tempo – ou anos, quem sabe –,
você conseguirá visitá­la no
túmulo e deixar uma flor no
vaso. Isto ocorrerá depois de
você ter tentado e falhado
algumas vezes, o que é natural,
pois não é esse tipo de visita que
nos acostumamos a fazer. 

Você poderá sentir uma imensa
saudade de sua mãe quando
menos espera. Às vezes, a
saudade irromperá, seja quando
contemplar uma paisagem,
revirar antigas fotos ou ao tomar
banho. 

Em alguns dias, você a buscará
deliberadamente no
pensamento. Em outros, você
fará questão de não lembrar,
mesmo que a imagem dela
venha em sua mente
automaticamente por algum
estímulo. É muito duro não
querer pensar em quem se ama,
mas isso acontece. 
Quando você ganhar um prêmio
almejado há anos, sua mãe não
te dará os parabéns ao vivo, mas
não por que ela não queira.
Quando você fracassar, também
não haverá a palavra justa de
consolo que ela costumava dizer
(e funcionava para você): '–
Teeeenha paciência! Teeeenha
paciência!'. 

Passados vários anos, você ainda
sentirá enormemente a sua falta,
mas não é qualquer falta. Você,
então, haverá aprendido que
falar de acidente de trânsito não
é somente discutir números,
realçar a tragédia, o horror, o
sangue, as latarias amassadas ou
as sirenes das viaturas tocando,
momentos estes que serão
passageiros. Tampouco se trata
apenas do instante da morte,
mas fundamentalmente de algo
mais duradouro, que você levará
consigo até o fim: viver com a
ausência e conviver com as
lembranças. 

Passados 14 anos, muita coisa
terá mudado na sua vida. Você
se formou, casou, mora em outra
cidade... E, com tanta mudança,
você agora não conseguirá mais
imaginar como seria se ela ainda
estivesse aqui. 
Ainda que você escreva ou relate
a sua experiência para uma ou
mais pessoas, como eu faço aqui
e agora, você provavelmente
ainda sentirá a ausência daquela
figura amorosa cujo legado teve
de ser interrompido. É como se
fosse o reviver da mesma dor do
primeiro dia de perda, depois
que ela foi sepultada nos belos
jardins do cemitério...".  
 
* * *  
O exercício, que inicialmente
parecia ser “imaginário” e se
transformara lentamente num
belo relato pessoal sobre a perda
de bons momentos, seguia para
os seus minutos finais. De fato,
eu sentia no coração o que o
nosso interlocutor queria nos
fazer compreender naquela
palestra inesquecível. Abri os
olhos discretamente e reparei
que a platéia permanecia
silenciosa e de olhos cerrados.
Pelo semblante de muitos,
concluí que eles também
compreenderam aquele
ensinamento sobre as
consequências dos acidentes de
trânsito, um assunto cada vez
mais desumanizado e tão
baseado em números que se
torna, às vezes, incapaz de
produzir reflexão em quem ouve.
Imaginar a dor emocional de
perder quem se ama aproximou
o tema de cada um dos
participantes (ex­espectadores),
ajudando­nos a reconhecer que,
em matéria de acidente de
trânsito, tão importante quanto
compreendê­lo intelectualmente
é compreendê­lo
emocionalmente, a fim de que
possam germinar em nós as
sementes da mudança que
queremos nos outros. 

C o mo no s s o s há bit o s s e e xpr e s s a m no t r â ns it o ?

postado em 15 de dez de 2011 12:50 por Fábio de Cristo   [ 7 de out de 2014 16:47atualizado​
(s)​
 ]

Autor: Fábio de Cristo,
psicólogo (CRP­17/1296),
doutor em psicologia e
pesquisador colaborador na
Universidade de Brasília, onde
desenvolve pós­doutorado sobre
o comportamento no trânsito.
Administrador do Portal de
Psicologia do Trânsito
(www.portalpsitran.com.br) e
coordenador da Rede Latino­
Americana de Psicologia do
Trânsito. Autor do
livro "Psicologia e trânsito:
Reflexões para pais, educadores
e (futuros) condutores".
 
 *  *  *
             

A nossa capacidade de julgar e
decidir tem um papel
fundamental na nossa vida, pois,
assim, definimos
conscientemente como, quandoe onde fazer
as coisas. É por isso que
podemos realizar ou não alguma
ação dependendo do quanto
estamos dispostos a realizá­la.
Nossos comportamentos podem
ser explicados, portanto, pela
intenção que possuímos em
relação a alguém ou a alguma
coisa específica. Se eu digo, por
exemplo, que vou levar o
cachorro para passear na rua,
existe grande probabilidade de
isso acontecer, afinal, tenho
cachorro, coleira e gasolina no
carro (ver foto ao lado).
 
Porém, a intenção pode explicar
somente uma parcela dos nossos
comportamentos. Em muitas
situações, existe uma distância
grande entre nossa vontade de

fazer (intenção) e o
que fazemosde fato
(comportamento). Isto quer
dizer que nossas intenções nem
sempre guiarão o

comportamento. Por exemplo, a
motivação de ir a pé para o
trabalho, em vez de ir de
motocicleta, nem sempre se
concretizará na prática, mesmo

que o trabalho seja pertinho de
casa e que não esteja chovendo.
Outro exemplo é quando
planejamos usar o cinto de
segurança no banco de trás, que

nem sempre se realizará, mesmo
que ele esteja acessível e que
saibamos que não usá­lo é uma
infração de trânsito.
 
Em algumas situações, portanto,
parece haver algo em nós capaz

de nos manter presos a
determinados padrões de
conduta; algo que faz nossos
comportamentos permanecerem
fixos, repetidos ao longo do

tempo. Além disso,
esse algoparece impedir
qualquer mudança concreta,
apesar das nossas melhores
intenções de mudar. Quem
nunca disse ou ouviu as

expressões: “não tive a
intenção”, “foi sem querer” ou
“ops! fiz de novo!”, em tom de
arrependimento por não
conseguir parar de repetir um
comportamento? Mas que algo é

esse?
 
O hábito pode ser uma
resposta.Como assim? Para
ajudar você, amigo leitor, a
entender o que é hábito e como
ele está presente em nossa vida,
especialmente nas situações do
trânsito, acompanhe o
depoimento do jovem Abílio...
 
“– E agora, o que fazer?!”, disse

a mim mesmo com uma
expressão de angústia e
preocupação na voz, após
constatar que o meu carro
havia enguiçado. Não
acreditava no que estava

acontecendo. Para mim, após
anos dirigindo constantemente,
tornara­se natural não pensar
na maneira de deslocar­me
para a universidade ou

qualquer lugar; até aquele
momento. Resolvi, então, tentar
consertar: empurrei­o para lá e
para cá pela garagem, troquei a
gasolina, mexi algumas

conexões da bateria e... nada.
Fiz tudo o que podia dentro das
minhas possibilidades de tempo
e conhecimento. Após quase 40

minutos de esforço, já cansado,
suado e atrasado, concluí que
não conseguiria ir à parte
alguma. Paralisei e disse para
comigo: “– Meu Deus, perdi a

reunião!”. Todas as vezes,
quando chegava a hora de ir à
universidade, eu simplesmente
parecia cumprir o mesmo
roteiro, como se fosse algo

automático: pegava a mochila,
a chave e ia até a garagem.
Chegando lá, eu entrava no
carro, dava a partida e
acelerava... Eu já nem pensava

mais em como ir aos lugares.
Naquele momento, eu estava me
sentindo praticamente sem
pernas. Conscientizei­me que
estava tão conectado ao

automóvel que não percebi
alternativas, como, por
exemplo, pegar um ônibus – a
estação fica a menos de dez
minutos da minha casa.

Subitamente, tudo começou a
fazer sentido e o acontecimento
me pareceu revelador: a opção

por usar sempre o carro, talvez
pela facilidade, rapidez e
conforto, sem eu me dar conta,
há tempos havia se tornado um
hábito.
 
A história de Abílio se assemelha

ao que acontece com muitas
pessoas no dia a dia, não é
verdade? Ela ilustra como nos
comportamos quando
desenvolvemos um hábito, neste

caso, o hábito de dirigir
automóvel. Assim, o hábito é um
comportamento que, por ter sido
repetido muitas vezes ao longo
do tempo, se tornou
“automático”. Não no sentido

tecnológico, como se fôssemos
robôs. Na psicologia, um
comportamento é automático
quando é realizado sem
consciência completa, controle

total ou mesmo sem intenção de
realizá­lo.
 
É importante ressaltar que o
hábito, em si, não é nem bom,
nem ruim por natureza, mas
podemos desenvolver hábitos
saudáveis ou não saudáveis,
seguros ou inseguros.
Desenvolver o hábito de usar o
cinto de segurança é algo bom,

desejável. O hábito de andar em
alta velocidade é algo que não
deve ser estimulado. Em tempos
de poluição e congestionamento,
andar a pé ou de bicicleta pode
ser um hábito a ser estimulado, e

o de usar o automóvel tem sido
cada vez mais desestimulado.
 
Identificar e analisar nossos
hábitos no trânsito pode ser uma
estratégia importante, tanto
para as autoridades quanto para

nós, se quisermos mudar nossos
comportamentos inseguros no
trânsito ou se quisermos
construir um padrão mais
saudável de deslocamento.

Darmo­nos conta dos nossos
hábitos, especialmente aqueles
que podem trazer prejuízos para
nossa saúde, segurança,
plenitude é um primeiro passo

em direção à mudança de
comportamento desejada.
 
Para saber mais:
1. Aarts,  H.,  Verplanken,  B.,
&  van  Knippenberg,  A.

(1998).  Predicting  Behavior


from the actions in the past:
Repeated  decision  making
or a matter of habit?Journal
of  Applied  Social

Psychology,  28(15),  1355­


1374.
2. Bargh, J. (1994). The four
horsemen  of  automaticity:
Awareness,  intention,

efficiency,  and  control  in


social  cognition.  In  R.  S.
Wyer,  &  T.  K.  Srull
(Eds.),Handbook  of  social
cognition  (Vol.  1,  pp.  1­40).

Hillsdale,  NJ:  Lawrence


Erlbaum.
3.  Ronis,  D.  L.,  Yates,  J.  F.,
&  Kirscht,  J.  P.  (1989).
Attitudes,  decisions,  and

habits  as  determinants  of


repeated  behavior.  In  A.  R.
Pratkanis,  S.  J.  Breckler,  &
A.  G.  Greenwald
(Eds.),Attitude  structure
and  function  (pp.  213­239).

Hillsdale,  NJ:    Lawrence


Erlbaum Associates.

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