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EXPERIÊNCIA HUMANA E SENTIDO DA VIDA

8a LIÇÃO: AMOR FATI EM NIETZSCHE

Filosofia, para Nietzsche, não é um �po de conhecimento, mas é tarefa e


missão. “Por isso, o filósofo, em sua concepção, assume dois papéis primor-
diais: é o médico da cultura e o legislador da cultura. Como médico, sua tarefa
consiste em observar os sintomas de uma cultura, realizar um diagnós�co e
apresentar seu remédio; como legislador, sua tarefa consiste em estabelecer
as normas da cultura e do futuro da humanidade, estabelecendo novos valo-
res e definindo os des�nos da polí�ca. Há sempre, na obra do filósofo, um
ponto de vista crí�co, nega�vo, no qual ele desmonta os argumentos da tradi-
ção; há outro, contudo, tão importante quanto o primeiro, que é sua faceta
posi�va, afirma�va, no qual ele apresenta suas propostas para a superação
dos problemas por ele apontados.” (Dicionário Nietzsche). A vertente corrosi-
va e crí�ca trata da “crí�ca dos valores” e do “procedimento genealógico”: 1)
“crí�ca da civilização ocidental”, 2) “a morte de Deus e o além-do-homem” e a
3) “moral dos nobres e os ressen�dos”. A vertente constru�va trata de sua
“cosmologia” (vontade de potência, teoria das forças e doutrina do eterno
retorno do mesmo): 4) “a vida como vontade de potência”, 5) “o eterno retor-
no do mesmo” e a 6) “transvaloração dos valores e a noção de amor fa�”.

No intervalo entre o fracasso inicial e o sucesso subsequente há sofrimento,


dor, ansiedade, frustação etc. Nietzsche defende a importância do sofrimento
como uma etapa da conquista. Disse Nietzsche: “o que não nos mata nos forta-
lece”. E Freud: “Agradeço à vida por nada ter sido fácil para mim”.

Três histórias que inspiraram Nietzsche: 1°) Rafael Sanzio não adquiriu espon-
taneamente o domínio de seu talento; tornou-se grande porque soube reagir
com inteligência a um sen�mento de inferioridade que, para os pobres de
espírito, seria uma fonte de desespero. Desis�mos prematuramente dos desa-
fios que poderiam ter sido vencidos; 2°) Somos levados a pensar que os En-
saios brotaram da mente de Montaigne como num passe de mágica. Devería-
mos, em vez disso, considerar o esforço de 20 anos e de inúmeras revisões que
os Ensaios exigiram; 3°) Alguns esboços de peças medíocres marcaram o início
da carreira literária de Stendhal. Foram necessárias várias décadas de trabalho
árduo antes que surgissem suas obras-primas, como O vermelho e o negro.
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Nietzsche disse que devemos encarar as dificuldades como se fossemos jardi-


neiros. Por suas raízes, uma planta pode parecer feia, mas aquele que a conhe-
ce e acredita em seu potencial pode fazê-la florescer e fru�ficar. Assim é com
a vida: em uma fase de raiz, surgem emoções e situações di�ceis, que podem
resultar, depois de um cul�vo cuidadoso, em grandes êxitos e alegrias. Mas
muitos de nós deixam de reconhecer o quanto devemos a essas “sementes de
dificuldades”. Eliminar toda raiz nega�va significaria simultaneamente sufocar
os elementos posi�vos. Nem tudo que nos faz sen�r melhor é bom para nós.
Nem tudo que magoa é ruim.

Os nossos momentos mais di�ceis são portas abertas em direção a algo que
precisávamos conhecer. A dor e o possível sofrimento serão para nós uma
escola que nos permi�rá entender mais profundamente o significado de ser
um ser humano.

Se você usar essas duas metáforas de Nietzsche, sua vida vai mudar: as metá-
foras “Zaratustra enxerga ao meio-dia” e “ver do alto da montanha” de Nietzs-
che se referem a uma perspec�va ampla e profunda da vida, que permite ao
indivíduo enxergar a sua existência de uma forma mais clara e livre de ilusões.
“Zaratustra enxerga ao meio-dia” representa o estado mental de clareza e ilu-
minação que permite ver a realidade de forma ní�da, sem as limitações das
crenças preconcebidas. O meio-dia é o momento em que o sol está a pino, sem
sombra, sou eu e eu mesmo; não tem nada na frente, nem atrás, nada a se
esperar, a reclamar. Já “ver do alto da montanha” representa a perspec�va
ampla e profunda da vida, que permite enxergar a existência de uma forma
mais elevada, de longe. O “meio-dia” é a arte de amar o agora; e “no alto da
montanha”, as coisas parecem muito menos problemá�cas do que de perto.
(cap. “Além do bem e do mal”, de Ecce homo).

O que significa ser sábio? Em Ecce homo, Nietzsche diz: 1°) “Eu domo ursos”: a
sua vida era cheia de limitações e ele tem que sempre domá-las e não ter au-
topiedade ou ser vi�mista; 2°) “Sempre extraio bons sons dos instrumentos”:
Nietzsche é um músico da vida; podem dar qualquer instrumento para ele,
que ele irá conseguir fazer uma boa música, ou seja, ele fará uma boa
“música” diante de qualquer situação que ele não pode alterar; 3°) “A fortuna
de minha existência, sua singularidade talvez, está em sua fatalidade”: quando
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ele esteve doente é que ele começou a saborear as boas e pequenas coisas da
vida, como frutas, especialmente uvas e passeios nas montanhas onde o ar era
bom para a sua saúde frágil; 4°) “Transmutar todo foi em um assim o quis”: o
ser humano reconhece suas dificuldades e transcende a elas, busca meios
para se curar e u�liza as situações desagradáveis em seu favor. Assim, torna-se
mais forte e disposto, ao invés de se sen�r pequeno e frágil. O amor fa� não é
uma resiliência ou aceitação, nem uma humildade diante dos acontecimentos,
mas uma postura afirma�va diante das coisas que nos acontecem.

Alguns conceitos da filosofia de Nietzsche: 1) Niilismo a�vo: defende valores


em consonância com o corpo, com a vida e com a terra, diferentemente dos
valores estabelecidos que privilegiavam a alma em detrimento do corpo, que
privilegiavam a outra vida em detrimento desta, que privilegiavam o além em
detrimento deste mundo; 2) Vontade de potência: encorajando-nos a buscar e
direcionar nossa energia para alcançar nossos obje�vos; 3) Eterno retorno do
mesmo: nos ensina a viver de forma significa�va, considerando que cada ação
poderia se repe�r indefinidamente e isso nos ins�ga a fazer escolhas conscien-
tes e a valorizar o presente; 4) Amor fa�: aceitar integralmente a vida, mesmo
em seus aspectos mais dolorosos. Não é uma resiliência ou aceitação, nem
uma humildade diante dos acontecimentos, mas uma postura afirma�va
diante das coisas que nos acontecem independentemente da nossa escolha e
o jeito como reagimos é nós que escolhemos. O ser humano é uma pedra feia
que necessita de escultor e é ele mesmo o escultor.

9a LIÇÃO: VIDA AUTÊNTICA EM HEIDEGGER

Heidegger (1889-1976) faz uma fenomenologia da existência. Sua concepção


de existência está fortemente influenciada pela ideia de mundo da vida. Exis-
tência não é um dado obje�vo, mas uma condição da consciência e não uma
condição natural.

Ex-Sistere: colocar-se ou elevar-se (no sen�do de ficar de pé). O prefixo “ex” diz
respeito ao que está fora. Heidegger entende por exis�r uma postura do Eu
que olha para si mesmo e se pergunta desde fora, para então elevar-se. Por-
tanto, exis�r não é uma condição natural, mas é um tomar consciência de si.
Exis�r, como algo que não está obje�vamente dado, mas que implica consci-
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ência de, supõe abertura, possibilidade e projeto (não determinação prévia e


abre espaço para possibilidades). Ele volta aos pré-socrá�cos que pergunta-
vam sobre o ser: O que é o Ser? Por que existe o Ser e não o nada? O que signifi-
ca Ser? O que significa Não-Ser?

Perguntar pelo Ser é exis�r e, portanto, filosofar: ele retoma a ontologia, mas
sem meta�sica (conteúdos pré-determinados). Ele rompe com os an�gos/me-
dievais (ser) e modernos (sujeito/subje�vidade). Em sua fenomenologia da
existência, ele chega ao conceito de ser-aí (em alemão Dasein: neologismo
que nasce da junção de “Da” + “Sein”).

O Ser não é obje�vável nem definível; por isso, ele exige constante abertura
sob a forma de pergunta. Quando conseguimos dizer o que algo é, não expres-
samos o Ser, mas o ente (o tornamos ente, o tornamos coisa: o ente é a forma
substan�vada do verbo “ser”; é todo ser que conseguimos definir; seu adje�vo
é ôn�co): definimos o papel, o quadro, a chuva ou sabemos dis�nguir as esta-
ções do ano (entes – coisas e suas manifestações). Porém, nós humanos,
somos capazes de exis�r: exis�r depende da consciência e de um modo de
olhar a si mesmo como quem olha de fora; exis�r não é um ato obje�vo; a exis-
tência não se dá como ente: ela não é coisa ou manifestação da coisa; o ser
humano, assim como as pedras, as árvores ou a lua, é um ente, porém, dife-
rente de todos os outros entes, é capaz de olhar sobre si como se fosse de fora.

Quando o ser humano pergunta sobre outra coisa que não ele mesmo, ele a
define como ente, mas quando pergunta sobre si mesmo, já não pergunta pelo
ente, mas pergunta pelo ser; portanto, o ser humano é o único ente que
também é ser. Mas o ser é sempre indefinível; é o ser que atribui sen�do; o
ente recebe o sen�do que lhe é dado; por isso, a pergunta pelo ser é a pergun-
ta pelo ser do ente, pelo sen�do da coisa. Quando o ser humano pergunta pelo
seu próprio Ser, pelo seu próprio sen�do, então ele existe. E exis�r é possibili-
dade, é abertura, é indeterminação. Aqui está o “aí” do Ser-aí. O ser humano
é o “lugar” a par�r do qual se abre a possibilidade, para um ente, de compre-
ender o que é ser.

Eis como Heidegger, em sua perspec�va fenomenológica, concebe o Eu: o Eu


é Ser-aí. E mais: é Ser-aí-no-mundo, ser-com-os-outros e um ser-para-a-morte.
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O Eu não tem fundamento meta�sico que lhe determine previamente alguma


essência, mas sua existência é inteiramente aberturas a possibilidades. O
Ser-aí – o Eu – apresenta-se como projeto: aqui não há espaço para conceber
qualquer �po de natureza humana ou outro �po de determinação prévia; o
Ser não está dado desde sempre, mas o Ser é o que resulta dos esclarecimen-
tos da pergunta pelo Ser. O Ser determina a essência. E como o Ser resulta da
pergunta sobre ele, a essência virá no correr da existência. O Ser-aí primeiro
existe, primeiro é possibilidade e depois cons�tui seu sen�do. O Eu é projeto,
portanto, abertura. Heidegger distancia-se de qualquer visão naturalís�ca
acerca da existência humana, inclusive das determinações biológicas que afir-
mam determinações gené�cas e das atuais tendências dos segmentos das
neurociências em determinar condutas e processos de modo bioquímico. Hei-
degger concebe o ser humano como abertura a possibilidades e, portanto,
pensa-o a par�r de suas potencialidades.

Heidegger descobre no ser humano alguns traços fundamentais do seu ser


(existenciais):

i) O Ser-aí é um ser-no-mundo: fac�cidade. Não há o que falar em ser humano


em abstrato, fora de uma situação mundana específica. Ser homem é estar
numa situação mundana em par�cular (nisso consiste sua “mundanidade”),
situação a par�r da qual certas projeções são possíveis (mundanidade como
condição), mas a par�r da qual também certas projeções se tornam impossí-
veis (mundanidade como limite). Pense em como ser homem no An�go Egito
e ser homem no mundo atual: um a�vista polí�co influente não seria possível
no An�go Egito, enquanto o projeto de ser Faraó não seria possível hoje.

ii) O Ser-aí é um ser-com-os-outros: mundo-da-vida, quer dizer, aquela rede de


crenças, valores e afetos compar�lhados pelos homens que vivem em certo
meio social, rede que serve ao mesmo tempo de matéria-prima das projeções
e de limite para elas.

iii) O Ser-aí é um ser-para-a-morte: temporalidade. A angús�a reconecta o ser


humano com seu ser-para-a-morte e faz com que se relembre da sua incontor-
nável condição de Ser-aí. Se, na tradição ocidental, sob impulso de Parmênides
e a par�r do cânone de Platão, o tempo, como promotor do devir havia sido
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sempre pensado como aquilo que é contrário ao ser (pois o ser, inspirado no
ser dos entes que são as coisas, é aquilo que não muda, sempre permanece
igual e idên�co a si próprio), agora, a par�r da reflexão de Ser e Tempo, era
possível visualizar o tempo como a condição sem a qual não existe o ser, desde
que este seja entendido a par�r do ser do ente que se pergunta sobre o ser,
isto é, a par�r do ser do homem, o Ser-aí. Só no tempo é que o Ser-aí pode se
projetar, só no tempo é que pode se enfrentar com o mundo em busca de seu
projeto projetado, só no tempo, e na consciência do tempo e certeza da
morte, é que pode reencontrar o sen�do de seu Ser-aí para além de toda
ilusão ou esquecimento. O tempo deixa de ser o temido inimigo do ser e passa
a ser – de agora em diante – seu aliado necessário.

É no mundo (ser no mundo e com os outros) que o ser humano realiza o seu
ser: a pessoa deve projetar-se na direção de potencialidades do futuro; toda a
sua vida torna-se um constante projetar-se, rumo a possíveis realizações, um
lançar-se para a frente; é no caminho que se dá o sen�do de exis�r: diante das
potencialidades, ele descobre aquilo que é e, finalmente, descobre o Ser.

O ser humano é constantemente ameaçado pelo nada: existe o perigo dele


perder-se entre os entes (vive uma “vida inautêntica”, perdendo o Ser entre os
entes e aproximando-se do nada: o inautêntico sabe aquilo que a massa sabe,
diverte-se como se diverte a massa, julga sobre literatura, arte, esporte etc.
como julga a massa) e há também um mecanismo inerente à própria existên-
cia que é a morte (a consciência dessa contradição existencial provoca a an-
gústia existencial; mas, a mesma angústia que conscientiza o ser humano da
morte é também capaz de provocar uma abertura para o Ser: essa abertura
possibilita transcender tudo aquilo que simplesmente é, de tal maneira que o
ser humano, como através de um véu, descobre o Ser; dessa maneira, é capaz
de achar o sentido da sua existência. Em Heidegger, encontramos uma possibi-
lidade de “transcender” a absurdidade de Camus. O caminho para isso começa
com aquilo que ele chama “a descoberta do Ser”). Leva vida autên�ca quem a
assume como própria, quem a forja e a constrói segundo um plano próprio,
quem aceita a morte.

10a LIÇÃO: EM BUSCA DE SENTIDO EM VIKTOR FRANKL


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Nunca um animal perguntou se a sua vida tem sen�do. Por outro lado, é exata-
mente a indagação sobre o sen�do da vida que demostra o específico daquilo
que é o ser humano. Conforme Frankl, “o homem é um ser em constante
busca de sen�do”. À medida que o descobre, ele se torna feliz, à medida,
porém, que não o encontra, começa “o sofrimento por causa de uma vida sem
sen�do”. O ser humano até pode negar que tal sen�do exista. No entanto, essa
negação e a subsequente perda de sen�do da sua própria vida jogam o ser
humano num vácuo existencial. Subs�tuir a busca pelo sen�do pelas promes-
sas do prazer aproximará o ser humano desse vazio.

Segundo Frankl, psiquiatra e sobrevivente do Holocausto, o sen�do da vida


(significado e propósito) não pode ser encontrado externamente, mas deve
ser buscado dentro de nós mesmos, em nossas experiências (como os mo-
mentos de alegria, amor e realização que experimentamos ao longo da vida),
em nossos relacionamentos (com os outros e a conexão com a comunidade) e
em nosso trabalho (através dele podemos expressar nossa cria�vidade e habi-
lidades, contribuir para a sociedade e sen�r que estamos fazendo algo valio-
so). Precisamos encontrar um equilíbrio entre essas três áreas para uma vida
plena e significa�va. Quando não podemos mais mudar uma situação, somos
desafiados a mudar a nós mesmos.

Toda a problemá�ca do sen�do revela, assim, estar profundamente interliga-


da com a vontade pelo sen�do. É só pela decisão concreta da pessoa que a po-
tencialidade se torna a�tude definida. Baseado nesse fato, Frankl formula a
seguinte exigência ao homem de hoje: a busca pelo sen�do deve tornar-se
opção fundamental; ela necessariamente inclui a a�tude do querer achar sen-
�do. A par�r desses pressupostos, o problema do homem contemporâneo
pode ser descrito nos seguintes termos: é ele mesmo que, numa situação con-
creta, deve descobrir o seu próprio sen�do. Essa descoberta, às vezes, não é
muito fácil. Um número cada vez maior de pessoas nem mais tenta descobri-lo
e outras pessoas desistem depois de poucas tenta�vas. Ali, porém, onde desa-
parece a vontade pela busca do sen�do, esta é subs�tuída pela vontade pelo
prazer.

Quem vive está sujeito a frustrações, e quem é capaz de suportar a dor de tais
frustrações cria as possibilidades para viver. Mas, nesta caminhada da vida,
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além de frustrações, vamos experimentar também fracassos. Todo fracasso,


além de ser o termo de uma tenta�va, se apresenta também como possibilida-
de para um novo começo.

A fábula dos três operários (da obra 7 maneiras de ser feliz, de L. Ferry) relata
que um carro precisou parar na estrada por causa de uma obra: 1) Um operá-
rio está quebrando pedras com uma pesada marreta, o semblante transfigura-
do pelo esforço e pela fadiga. “O que o senhor está fazendo?” o motorista o
interroga. “Preparando argamassa”, responde o operário, “com chuva ou com
vento, um trabalho de burro de carga!” (sem sen�do); 2) O sujeito do carro
retoma o trajeto e topa com um segundo canteiro de obras, idên�co ao pri-
meiro. Também ali, um homem tritura pedras, só que parece mais sereno. À
mesma pergunta, a resposta é diferente: “Sim, este o�cio é penoso, é verdade,
mas pelo menos permite trabalhar ao ar livre e alimentar a família, o que não
é tão ruim assim!” (sen�do externo); 3) Nosso condutor parte de novo e en-
contra um terceiro canteiro. Mesmo trabalho, mesma marreta pesada. Mas,
desta vez, o homem exibe uma expressão bea�fica, a face iluminada. Intriga-
do, o motorista repete a pergunta: ” O que o senhor está fazendo? Parece
muito feliz!” “Eu?”, responde o infa�gável operário. “Estou construindo uma
catedral. Isso me esgota, mas me enche de alegria!” (sen�do interno).

Em suma, discu�r sobre o sen�do ou a sua ausência é um tema filosófico. Mas,


acreditando ou não nele, algo que devemos fazer sempre é aprender a gostar
de nossa ro�na (e mudá-la, se necessário), porque assim é mais fácil ter uma
vida boa.

A parábola “A Estação” (de autoria desconhecida, mas usada para explicar a


teoria de Frankl) exemplifica a ideia central da Logoterapia de que o sen�do da
vida é algo que cada indivíduo deve encontrar por si mesmo: a nossa vida, em
muitas casos, se apresenta como a vida daquele sábio que ficava sentado anos
e anos numa estação de trem, aguardando aquele trem, com o qual havia
sonhado e que lhe traria o sen�do da sua vida. Só que aquele trem demorou.
Nunca chegou, e sempre as expecta�vas do sábio eram novamente frustradas.
Então, para fazer passar o tempo, começou a ajudar as pessoas que saíam dos
trens. Começou a carregar as malas delas, a cuidar dos filhos e dos cachorros
delas e, por fim, até deu indicações sobre o caminho. Ajudava aqui e ali e,
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assim, o tempo passou e o homem envelheceu cada vez mais. Mas muitas pes-
soas se tornaram felizes por causa de sua ajuda. Os anos passaram e, finalmen-
te, o homem chegou ao fim da sua vida. À beira da morte, quase já sem condi-
ção de se mexer e sem possibilidade de enxergar, ele perguntou ao chefe da
estação: “Esperei a vida toda por aquele único trem que traria até mim o sen�-
do da minha vida, mas ele nunca chegou. Será que um dia ainda chegará?” O
chefe da estação se baixou para ele e, vendo que o homem estava para morrer,
levantou a voz e gritou na orelha: “Aqui não passará mais trem nenhum,
porque esta estação só foi feita para você. Todos os trens que pararam aqui, e
as centenas de passageiros que saíram neste lugar, eram des�nados somente
a você. Foi neles que se realizou o sen�do da sua vida. Agora que você morre,
vou lá fechar a estação”.

O impera�vo da filosofia de Frankl diz: “Viva como se já es�vesse vivendo pela


segunda vez, e como se na primeira vez �vesse agido tão errado como você
está prestes a agir agora.” Esse conselho dá ênfase à responsabilidade para
com as situações da vida, e “convida a imaginar primeiro que o presente é pas-
sado e, em segundo lugar, que o passado ainda pode ser alterado e corrigido”,
dessa forma servindo como base reflexiva para a decisão do comportamento
e da a�tude adequadas para a situação enfrentada. O desejo de viver uma vida
com propósito e significado é parte do que significa ser humano. “Quando não
podemos mudar uma situação somos desafiados a mudar a nós mesmos.”
(Frankl, Em busca de sentido).

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