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A definição da arte

A maior parte das pessoas que visitam galerias de arte, leem romances e poesia, vão ao teatro e ao ballet
veem cinema ou ouvem música, já perguntaram a si próprias, num momento ou noutro, o que é a arte.
Esta é a questão básica que subjaz a toda a filosofia da arte. (…)
O facto de terem emergido novas formas de arte, tais como o cinema e a fotografia, e de as galerias de
arte terem exibido coisas como um monte de tijolos ou uma pilha de caixas de cartão, forçou-nos a refletir
acerca dos limites do nosso conceito de arte. É óbvio que a arte tem tido significados diferentes em
culturas diferentes e em épocas diferentes: tem servido fins rituais e religiosos, tem servido como
diversão e tem dado corpo às crenças, medos e desejos mais importantes da cultura na qual é produzida.
Dantes, o que contava como arte parecia estar mais claramente definido. No entanto, nos finais do século
XX parece que chegámos a uma situação em que tudo e mais alguma coisa pode ser arte. Se isto é assim,
o que fará que um certo objeto - um escrito ou uma peça musical -, e não outro, seja digno de se chamar
arte?

Pode a arte ser definida?


Há uma imensa variedade de obras de arte - pinturas, peças de teatro, filmes, romances, peças musicais,
dança - e todas elas parecem ter muito pouco em comum. Isto levou alguns filósofos a defender que a
arte não pode de maneira nenhuma ser definida; defendem que é um erro completo olhar para um
denominador comum, uma vez que existe, pura e simplesmente, demasiada variedade entre as obras de
arte para que uma definição que as cubra a todas possa ser satisfatória. (…)
Consideremos, então, algumas das tentativas de definição da arte. Examinaremos a teoria da forma
significante (…).

A teoria da forma significante


A teoria da forma significante, popular no princípio do século XX e particularmente ligada ao crítico de arte
Clive Bell (1881-1964) e ao seu livro Art, começa pelo pressuposto de que todas as obras de arte
genuínas produzem uma emoção estética no espectador, ouvinte ou leitor. Esta emoção é diferente das
emoções da vida quotidiana: distingue-se por não ter nada a ver com interesses práticos.
Que características das obras de arte fazem que as pessoas reajam daquela forma? Porque evocam as
obras de arte aquela emoção estética? A resposta dada por Bell é que todas as obras de arte genuínas
partilham uma qualidade conhecida como «forma significante» - um termo por ele introduzido. A forma
significante é uma certa relação entre as partes - as características que distinguem a estrutura de uma
obra de arte, e não o seu tema específico. (…)
Assim, por exemplo, ao considerar o que faz que um quadro de Van Gogh representando um par de botas
velhas seja uma obra de arte, um teórico da forma significante faria notar a combinação de cores e
texturas que possuem forma significante e que produzem, portanto, a emoção estética em críticos
sensíveis.
A forma significante é uma propriedade indefinível que os críticos sensíveis podem intuitivamente
reconhecer numa obra de arte. Infelizmente, os críticos insensíveis são incapazes de apreciar a forma
significante. Bell (…) acreditava que a arte era um conceito valorativo: isto significa que afirmar que algo é
uma obra de arte não é apenas classificá-lo, mas também atribuir-lhe um certo estatuto. Todas as obras
de arte genuínas, de todas as épocas e culturas, possuem forma significante.

Críticas à teoria da forma significante

© Areal Editores
Circularidade
O argumento a favor da teoria da forma significante parece ser circular. Parece estar apenas a dizer que a
emoção estética é produzida por uma propriedade que produz emoção estética, propriedade acerca da
qual nada mais pode dizer-se. Isto é a mesma coisa que explica: como funciona um soporífero referindo a
sua propriedade de provocar o sono. É um argumento circular porque o que se pretendia explicar é usado
na explicação. (…)

Irrefutabilidade
Outra objeção à teoria defende que esta não pode ser refutada. A teoria da forma significante pressupõe
que todas as pessoas que genuinamente desfrutam da arte sentem um único tipo de emoção quando
apreciam verdadeiras obras de arte. Contudo, isto é extremamente difícil, se não impossível, de
demonstrar.
Se alguém afirmar ter desfrutado genuinamente uma obra de arte, sem no entanto ter sentido a referida
emoção estética, Bell afirmará que essa pessoa está enganada: ou não a desfrutou genuinamente ou
então não é um crítico sensível. (…) A teoria parece, portanto, irrefutável. Muitos filósofos acreditam que
uma teoria que seja logicamente impossível de refutar, porque todas as observações possíveis a
confirmariam, não tem qualquer significado.
Analogamente, se um exemplo de algo que consideramos uma obra de arte não evoca emoção estética a
um crítico sensível, um teórico da forma significante defenderá que não se trata de uma obra de arte
genuína. Mais uma vez, não há qualquer observação possível que possa demonstrar que esse teórico não
tem razão.
N. Warburton, Elementos Básicos de Filosofia, Gradiva, 2007, pp. 218-223.

1. Por que razão defende o autor do texto que a questão da definição da arte ganhou uma
ênfase especial na contemporaneidade?

2. Que resposta dá a teoria da arte como forma à possibilidade de definição e delimitação da


obra de arte?

3. Identifique e explique as duas críticas apontadas no texto à teoria da arte como forma
significante de Clive Bell.

© Areal Editores

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