A minha trajetória profissional e acadêmica se iniciou em 1990 quando iniciei
os estudos na Faculdade de Direito da PUCRS. Neste período fui eleito vice- presidente do Centro Acadêmico Maurício Cardoso, tendo naquela oportunidade participado ativamente do impeachment do então presidente do Brasil Fernando Collor de Mello, movimento este que ficou conhecido como “caras pintadas”. Desde então, aspectos importantes de caráter filosófico-jurídico pertencentes à formação da comunidade política, da função do direito e promoção da democracia se tornaram ponto fulcral da investigação cientifica que tem me ocupado, e que gostaria de seguir desenvolvendo no doutoramento. Durante o mestrado realizado na Unisinos, a dissertação que produzi se pautou na tolerância e na diversidade como conceitos politico-jurídicos responsáveis pela integração e o diálogo entre culturas diferentes - estrangeiras, e que muito embora calcados no liberalismo, seriam capazes de compatibilizar as novas e múltiplas possibilidades que a sociedade pós-moderna oferece, especialmente no amplo espectro do mercado das religiões. Neste aspecto, as religiões sempre tiveram pretensões de verdade absoluta, e desta forma questões integrativas seriam muito mais difíceis de serem solucionadas, principalmente no âmbito moral e/ou ético. Além de autores clássicos, como Stuart Mill, Voltaire e Locke, a abordagem exigiu também o conhecimento das obras de Jónatas Eduardo M. Machado, Paulo P. Adragão, Fernando Catroga, Castanheira Neves e Sara Guerreiro, bem como de Heidegger, Vattimo e Habermas, dentre outros. Em que pese a relevância do trabalho, ainda assim os aspectos centrais produzidos no mestrado se circunscreviam à ontologia da religião e à própria ontologia jurídica e o seu papel no modo de ser do direito ocidental. Entretanto, a partir do contato com as obras de Emanuel Levinas e Jacques Derrida, aspectos e conceitos como substituição, hospitalidade e a própria noção de estrangeiro passaram a ter novos e importantes significados, levando ao questionamento da ontologia heideggeriana, o que, no dizer de Levinas, significaria o deslocamento da ética como sendo a filosofia primeira, e não a ontologia como objeto fundamental. É justamente nesta inflexão filosófica, da ontologia para a ética, e não meramente uma inversão fenomenológica, que se assenta a investigação que pretendo desenvolver no doutoramento e sua influência nas ciências jurídicas, para que assim se possa superar a tolerância, ainda com valores fundantes no ser, e caminhar em direção à hospitalidade, baseada na alteridade e/ou na responsabilidade ética. É a ação - isto é: o existir como origem, o começar, e não a faticidade do ser-no-mundo, mera subjetividade, que vislumbra ou desponta para uma liberdade e uma responsabilidade que se afasta de esquemas subjetivos que reduzem o Outro a uma extensão da consciência moderna - objetividade subjetiva. O Outro, nesta condição, é incognoscível - não pode ser apreendido e ressignificado pela subjetividade do sujeito, o que implica evidentemente em uma nova jornada para as ciências jurídicas. Por fim, a escolha da Universidade de Coimbra para a presente investigação se dá justamente pelas condições em que se encontra a mesma, com seus quase 20% de estudantes estrangeiros vindo de 90 países diferentes, pelos mais de 700 anos de história na educação e investigação científica, pela expertise dos autores portugueses citados e por sua biblioteca e o seu acervo construído ao longo dos séculos. No que concerne à Faculdade de Direito, pela inegável contribuição que seus docentes e pesquisadores têm trazido à pesquisa jurídica global. Enfim, constitui-se para mim um fator extremamente prazeroso e inspirador apresentar a presente candidatura ao doutoramento em Direito com curso em Ciências Jurídico-filosóficas e seria ainda mais satisfatório vê-la ser aceita.