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AULA 06 – RELIGIÃO, ÉTICA E FORMAÇÃO MORAL – Parte 1/2

A – ÉTICA:

O termo “ética” vem do vocábulo grego “ethos” que tem dois significados distintos, mas
complementares:

a) Designa a morada do homem e do animal em geral, ou seja, um lugar de estada


permanente e habitual, um abrigo protetor (morada), um refúgio. É a raiz semântica que
da origem a significação de ethos como costume, estilo de vida e ação.

b) Refere-se ao hábito resultante da repetição. Nesse caso ethos expressa uma orientação
habitual para agir de determinada forma visando o bem comum de
determinada comunidade.

Ao discutir o termo ética Boff (2011)1 o define como um conjunto de valores e princípios
fundamentais que valem para todos, pois está de acordo com nossa humanidade. Segundo Boff
(2011) a ética responde à pergunta: “O que significa agir humanamente?” A resposta a esse
questionamento vem da experiência do “ato de morar”, ou seja, habitar o ethos não simplesmente
de forma material literal, mas num significado existencial como “modo do ser humano habitar e
organizar a vida em família”, já que morar implica na a “harmonia dos que moram” a fim de que
todos se sintam bem. No fundo, complementa Boff (2011), ética significa “viver humanamente”.
De acordo com Boff (2011) esse “viver humanamente” diz respeito ao relacionamento com
outro ser humano e é sustentado sobre quatro princípios: o amor, o cuidado a solidariedade e o
perdão.

O PRINCÍPIO DO AMOR implica em realizar a chamada “Regra de Ouro” que teve origem
numa frase proferida por Jesus Cristo e registrada no Evangelho de Mateus 7.12 que diz o
seguinte: "Em todas as coisas façam aos outros o que vocês desejam que eles façam a vocês”.
Esse princípio áureo pode também ser expresso e entendido como “amar ao próximo como
a si mesmo”. É o princípio do amor universal e incondicional, um desejo de todo ser humano, pois
todos querem ser amados.

O PRINCÍPIO DO CUIDADO estabelece que toda vida precisa de cuidado. O cuidado é tão
essencial quanto o amor, já que tudo que amamos também cuidamos. Boff (2011) aponta que o

1 BOFF, Leonardo. Ética e Ecoespiritualidade. Petrópolis-RJ: Vozes, 2011


cuidado é fundamental, por exemplo, para o planeta Terra, e se manifesta em ações de
preservação. É fundamental também na política, visando o bem do povo.

O PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE UNIVERSAL se manifesta como “compaixão”, ou seja,


ter a mesma “paixão” que o outro. Se alegrar e sofrer com o outro para que o outro não se sinta
só no seu sofrimento e assim se construa algo bom para todos.

O PRINCÍPIO DO PERDÃO. Perdoar significa não permitir que o ódio tenha a última
palavra. A prática do perdão fica evidente quando se percebe que todos somos falíveis e
podemos prejudicar o outro voluntária ou involuntariamente. Perdoar significa também conceder
uma chance ao outro para que se possam restabelecer os relacionamentos.

B – MORAL

O termo “moral” tem origem no vocábulo latino “moralis”, que significa “maneira, caráter,
comportamento próprio”.
A moral pode ser definida como o conjunto de regras, padrões e normas aplicados no
cotidiano de uma sociedade por meio da cultura, educação e costumes. Tais regras orientam os
indivíduos da sociedade, norteando seus julgamentos e ações sobre o que é certo ou errado.
Desta maneira, a moral é fruto do padrão cultural vigente e engloba as regras necessárias
para o bom convívio entre os membros que fazem parte de determinada sociedade.
Boff (2011) relaciona ética e moral apontando que enquanto ética é a “morada humana”, a
moral é entendida como “formas diferentes de se organizar a casa”. Sendo assim, a moral está
atrelada ao comportamento, ou seja, à cultura de um povo, ou comunidade.
Neste sentido, por exemplo, um indígena, um chinês e um africano vivem do seu jeito o
amor, o cuidado, a solidariedade e o perdão. Essa forma diferente de viver os princípios éticos é
chamada de moral.
Na prática, as finalidades da ética e da moral são bastante semelhantes, pois ambas são
responsáveis por construir as bases que guiarão a conduta do homem, determinando o seu
caráter e a sua forma de se comportar a fim de se ter uma vivência humana harmoniosa.
TABELA COMPARATIVA – ÉTICA E MORAL

Segue abaixo uma tabela com algumas diferenças básicas entre ética e moral. Então vejamos:

ÉTICA MORAL
PRINCÍPIOS pelos quais a pessoa se guia. COMPORTAMENTO assumido pela sociedade.
É essencial ao indivíduo É uma convenção histórico-social
Permanente Temporal
Universal Cultural (local)
Aprendida (interna ao indivíduo) Imposta (externa ao indivíduo)
Fundamentada na Fundamentada na
(i) Autonomia; (i) Cultura;
(ii) Consciência (ii) História
(iii) Coerência (iii) Conveniência

C – EXEMPLOS DE ALTERNATIVAS (OU ABORDAGENS) ÉTICAS

Existem leis éticas objetivas? Tomando-se essa pergunta como ponto de partida para expor
quatro sistemas éticos elementares. Então vejamos:

1 – ANTINOMISMO

Antinomismo significa literalmente “contra lei”. Os antinomistas negam a existência de


qualquer lei moral objetiva que seja obrigatória a todos seres humanos e defendem que tudo.
Apesar de rejeitarem qualquer lei moral objetiva os antinomistas não negam o fato de que
as pessoas possam optar por viver de acordo com algum padrão moral. Eles se negam a aceitar
que esses padrões vão além das escolhas pessoais (subjetivas) dos indivíduos.

Ex.: Mentir não é nem certo nem errado, pois não existem leis.

“É PROIBIDO PROIBIR” – Caetano Velosos e os Mutantes

(Em 15 de Setembro de 1968 Caetano Veloso participa do Festival


Internacional da Canção, o FIC, defendendo a musica "É Proibido Proibir" a
plateia no teatro TUCA, da PUC-SP vaia selvagemente Caetano que
explode num discurso inflamado, neste vídeo o áudio legendado do discurso
e fotos desse momento histórico da musica brasileira.)

2 – GENERALISMO

Os generalistas rejeitam a ideia do antinomismo de que não existem normas objetivas. Eles
defendem que existem regras, mas elas podem ser quebradas dependendo dos fins.
Uma frase generalista seria “OS FINS JUSTIFICAM OS MEIOS.”.
Na visão generalista se deve definir o que é certo e o que é errado com base em algumas
normas gerais, não universais.

Ex.: Mentir em geral é errado, mas nem sempre, pois não existem leis universais.

3 – SITUACIONISMO

É um meio-termo entre o Antinomismo e o Generalismo. Admite a existência de apenas


uma norma universal, a lei do amor. Para os generalistas o certo e o errado dependem da
situação, em função do amor as pessoas.

Ex.: Mentir ás vezes é certo, desde que esteja de acordo com a norma universal do amor.

“Se uma mentira for contada com amor, é boa e certa...”


“Somos obrigados a contar a verdade, somente se a situação exigir.”

Ex.: (Adultério altruísta) – Na Segunda Guerra Mundial, na Ucrânia a lei permitia que uma
prisioneira fosse liberta, se ficasse grávida. Uma presa pediu a
um guarda que a engravidasse. Assim aconteceu, e foi liberada
da prisão.

Ex.: (Prostituição patriótica) – Uma jovem nos Estados Unidos aceitou atrair um espião
inimigo, tendo relações sexuais com ele. Seus superiores
lhe disseram que era certo, pois ela estava ajudando seu
país.
i – Os quatros princípios funcionais do Situacionismo:

a) PRAGMATISMO – Só o que é útil (RESULTADO POSITIVO) é visto como correto. Só é


útil o que funciona a favor do amor. As decisões são julgadas, não
em termos das motivações ou princípios morais envolvidos, mas dos
resultados que produzem.

OBS.: não pergunta se tal atitude é certa ou errada, mas sim se funciona ou não.

b) RELATIVISMO – Existe apenas um absoluto, uma realidade suprema e fundamental, o


amor, tudo mais é relativo ele.
As estratégias (planos) são pragmáticas e as táticas (ações) são
relativas, pois cada pessoa possui um ponto de vista diferente sobre
determinada questão.
Neste contexto palavras como “nunca, perfeito, sempre, completo e
absolutamente” são evitadas.

c) POSITIVISMO – Sustenta que os valores são derivados voluntariamente e não


racionalmente. O homem decide sobre seus valores; não os deduz
da natureza.
Também é chamado "emotivismo" porque considera-se que os
valores são expressões dos sentimentos mais do que preceitos para
sua própria vida.
Defende que as declarações éticas não procuram a verificação, mas
sim a justificação;

d) PERSONALISMO – Considera que somente as pessoas têm valor intrínseco, ou seja, as


pessoas são fins e nunca os meios. O significado do amor está
relacionado com o bem das pessoas.
As coisas devem ser usadas e as pessoas amadas. Pois as coisas
só têm valor para as pessoas.
O foco absoluto é realizar o bem às pessoas.
4 – ABSOLUTISMO NÃO QUALIFICADO

Defende que existem muitas leis morais absolutas e que nenhuma delas devem ser
quebradas. A verdade é uma dessas leis. Desse modo a pessoa precisa falar a verdade sempre,
mesmo que alguém venha a morrer como resultado disso. A verdade é absoluta e absolutos não
podem ser quebrados. Assim, não há nenhuma exceção quanto ao falar a verdade. Os
resultados nunca podem ser usados como um meio racional para se quebrar regras, mesmo que
eles sejam desejáveis. Dessa forma, mentir é sempre errado.
O absolutismo não qualificado acredita que as leis absolutas nunca são conflitantes, que
sempre há uma saída para dilemas morais aparentes. Por exemplo, se alguém estivesse numa
guerra e escondesse judeus no porão da sua casa e os guardas nazistas batessem em sua porta
procurando por eles, ele não deveria mentir, mas sim responder dizendo que eles não têm o
direito de entrar em sua casa e se os nazistas invadissem a casa, o morador, da mesma forma
que foi corajoso para esconder judeus, deveria ser corajoso o suficiente para enfrentar os
perseguidores e, se fosse o caso, até morrer como um mártir protegendo os judeus.

5 – ABSOLUTISMO CONFLITANTE

Reconhece que nós vivemos num mundo degenerado e cheio de conflitos e que as leis
morais, algumas vezes, entram em conflito. Neste caso deve-se fazer o mal menor. Nossos
dilemas morais são inevitáveis, mas somos responsáveis pelos erros cometidos.
Neste sentido, quando se esta entre um dilema ético, deve-se optar por atitude que cause
menos mal. Tomando como exemplo mentir ou matar, o menor dentre dois males pode ser
julgado por aquilo que resultaria no número menor de consequências más de maneira utilitária.
Ex.: Mentir é perdoável.

6 – ABSOLUTISMO GRADUADO

Defende que existem muitas leis morais absolutas e que algumas vezes elas entram em
conflito. Entretanto algumas são maiores que as outras. Então quando há conflito se deve seguir
a lei mais elevada.
Considerando o caso de se esconder judeus que estivessem sob perseguição dos nazistas,
a preservação da vida dos judeus era mais importante que dizer a verdade e provavelmente
causar uma tragédia maior.
Neste caso, não há culpa por não guardar as leis menores em relação às maiores.
Nenhuma culpa é aplicada quando é feito aquilo que é inevitável. Ninguém é perfeito e o mundo
é imperfeito. Todo mundo está sujeito a errar, e o ser humano tem um instinto de sobrevivência, e
na hora de salvar outro ser humano nem pensa no que é certo ou errado, mesmo correndo risco
de morrer.
Pode ser argumentado, por exemplo, que há muitas normas éticas universais, mas que não
são iguais na sua importância intrínseca, de modo que quando duas entram em conflito, a pessoa
é obrigada a obedecer a mais nobre. Desta maneira, portanto, na escolha entre matar e mentir,
sendo que as duas ações são universalmente erradas na ausência de qualquer conflito entre
elas, deve-se escolher poupar a vida, por ser ela um valor intrinsecamente mais alto. Contar a
verdade é bom, mas não ao custo de sacrificar uma vida. Dessa forma, mentir é certo algumas
vezes.

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