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Mestrado em Econometria Aplicada e Previsão

Séries Temporais para Finanças


2016/2017

MODELAÇÃO E PREVISÃO DOS RETORNOS DO


FUTEBOL CLUBE DO PORTO

Autores:
Daniel Abreu, nº 43759
Fernando Cascão, nº 43446
Nuno Aparício, nº 43507

ISEG, 5 de Maio de 2017


MODELAÇÃO E PREVISÃO DOS RETORNOS DO
FUTEBOL CLUBE DO PORTO

Por Daniel Abreu, Fernando Cascão e Nuno Aparício

Resumo
O objetivo deste trabalho é estudar a série dos retornos do Futebol Clube do Porto
(FCP) onde é dado o principal foco à modelação quer da sua média condicional como da
heterocedasticidade condicional e à previsão dessas mesmas componentes. Na especificação da
média condicional é notório o efeito da variável dependente desfasada assim como dos choques
sentidos no período anterior. Já na especificação da heterocedasticidade condicional foi
considerado um GARCH(1,1) onde não se verificou a significância estatística do efeito de
calendário, do efeito assimétrico ou do volume de transações. Em termos de previsão verificou-
se a convergência veloz dos retornos para zero e a divergência da variância.

1. Introdução
A medição da volatilidade do retorno de ativos financeiros é um dos problemas centrais na
área da economia monetária e financeira. O estudo desta variável é essencial para várias
aplicações como a análise de risco, a gestão de portefólios ou o pricing de instrumentos
financeiros. Desde a introdução dos modelos de Autoregressive conditional heteroscedasticidy
(ARCH) por Robert Engle, deu-se um desenvolvimento substancial nas ferramentas e
estratégias utilizadas para a modelização da volatilidade das séries financeiras. Neste trabalho
recorremos aos modelos de heterocedasticidade condicionada para estudar o retorno das ações
do Futebol Clube do Porto (FCP) e procuramos encontrar quer um modelo estrutural como um
modelo para previsão. No entanto, convém desde já notar as várias debilidades da série em
questão, que levarão a produzir resultados que vão contra o que seria de esperar de uma série
financeira. Por exemplo, um dos grandes problemas na realização deste trabalho passou por a
série dos retornos apresentar muitos valores nulos ao longo da amostra devido a esta ser uma
série de dados diários. Ou seja, conclui-se daqui que os preços das ações do FCP não flutuam
muito ao longo do tempo1, o que torna este um mercado pouco líquido e pouco apetecível. Isto
leva a problemas de estimação e distorção dos resultados teóricos esperados, como se verá mais
à frente, nomeadamente a verificação da não significância estatística de variáveis como high-
low ou o volume de transações na especificação da variância condicional. O restante trabalho
está organizado da seguinte forma: na secção 2 será feita uma breve caracterização da série em
estudo; na secção 3 serão discutidos alguns dos factos empíricos estilizados da série em questão;
na secção 4 apresenta-se a modelação para a média condicional e para a variância condicional;

1
É facilmente verificável que o preço de uma ação do FCP no presente mês de Maio mantém o mesmo
preço desde Março, apenas com uma pequena flutuação entre 22/03 e 05/04.

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 2

na secção 5 apresenta-se os resultados da previsão; a secção 6 apresenta as conclusões do


trabalho.

2. Caracterização da série
Ao analisar o cronograma da Figura 1, podemos observar claramente que a série apresenta
períodos de diferentes volatilidades. Por exemplo, no período entre 2003 a 2007 a variância da
série aparenta ser baixa quando comparada com a variância do período entre 2008 a 2016. Já a
média da série parece estar claramente em torno de 0, sendo que esta estatística é apresentada na
Figura 2. Dito isto, será importante estudar a estacionaridade da série para mais tarde serem
aplicados modelos capazes de modelar tanto a média condicional como a variância condicional.
Como tal, recorremos ao teste de Dickey-Fuller com dimensão do teste ( ) a 5%, onde se
obteve o valor-p de 0,00. Assim sendo, existe evidência estatística forte contra a hipótese nula
de não estacionaridade da série e esta não necessita de ser transformada. Este é um resultado
que seria esperado, sendo esta uma das vantagens de se modelar séries de retornos contínuos em
vez de preços.

Figura 1 - Cronograma dos retornos contínuos do FCP


.6

.4

.2

.0

-.2

-.4

-.6
00 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16

Já quando passamos para a análise do histograma da série (Figura 2), vemos que não existe
grande dispersão da distribuição, sendo que grande parte dos retornos se situam em torno da
média. É também de notar o valor muito baixo do desvio-padrão (0,039). No entanto, tal como
seria de esperar numa série financeira, verifica-se a presença de valores extremos na
distribuição, com valores máximos (0,511) e mínimos (-0,503) muito distantes da média da
distribuição.

2
Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 3

Figura 2 - Histograma e estatísticas descritivas da série de retornos contínuos do FCP


2,800
Series: R_FCP
2,400 Sample 1/03/2000 2/20/2017
Observations 4318
2,000
Mean -0.000423
Median 0.000000
1,600
Maximum 0.510826
Minimum -0.502793
1,200
Std. Dev. 0.038938
Skewness -0.174189
800
Kurtosis 25.02307

400 Jarque-Bera 87284.20


Probability 0.000000
0
-0.4 -0.2 0.0 0.2 0.4

Pelo correlograma apresentado na figura 3 podemos observar que a magnitude dos


coeficientes de autocorrelação da série são muito reduzidos. A FACP reporta valores
estatisticamente significativos apenas até ao lag 5 enquanto que a FAC cai logo ao segundo lag.
Daqui podemos concluir que a ordem de autocorrelação é reduzida. Estas características
sugerem que a relação entre observações consecutivas é muito fraca, o que é comum em séries
financeiras. Consequentemente, devemos esperar que o poder preditivo de um modelo ARMA
(tal como o seu ajustamento) seja fraco. De facto, a versão fraca da hipótese dos mercados de
capital eficientes postula que não é possível prever o retorno de instrumentos financeiros com
base na sua informação histórica. Apesar de o principal objetivo deste trabalho ser a previsão da
variância condicionada, poderemos avaliar o desempenho do nosso modelo na previsão dos
retornos na secção 6.

Figura 3 - FAC e FACP da série dos retornos do FCP, com bandas de significância.

3. Discussão de alguns factos estilizados


A literatura empírica relacionada com séries temporais financeiras tem vindo a identificar
um conjunto de propriedades estatísticas comuns às variações dos preços de vários instrumentos

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 4

financeiros em vários mercados2. O ponto de partida para este trabalho passa precisamente por
estudar o andamento geral da série e verificar a existência, ou não, de alguns destes factos
estilizados.

3.1 Distribuição marginal dos retornos com caudas pesadas

Na generalidade das séries de retornos, a existência de valores muito afastados da média


tende a ocorrer com maior frequência que na distribuição normal. Esta característica reflete-se
no menor achatamento das caudas da distribuição, levando ao termo de caudas pesadas. O valor
da kurtosis, que mede o grau de achatamento, permite confirmar essa ideia. Enquanto que na
distribuição normal a kurtosis assume o valor 3, em séries financeiras observa-se
frequentemente um valor superior, i.e. a distribuição marginal é geralmente leptocúrtica.

Na figura 2, podemos ver que a kurtosis é de 25 para a série de retornos do FCP.


Adicionalmente, o associado ao teste Jarque-Bera leva-nos a rejeitar a hipótese
de que a distribuição marginal dos retornos tenha distribuição normal. Podemos confirmar que
a distribuição marginal é leptocúrtica fazendo o teste utilizando a seguinte estatística

de teste: que converge em distribuição para uma . Para esta série obtivemos

o que constitui forte evidência contra . Assim sendo, existe evidência estatística
de que valores extremos tendem a ocorrer mais frequentemente que na distribuição Normal.

Dada a existência de caudas pesadas, podemo-nos perguntar qual a massa de probabilidade


associada a valores extremos na amostra. Uma forma de modelar os valores que se encontram
muito afastados da média passa por considerar caudas de Pareto, já que a função densidade de
probabilidade desta função apresenta um decaimento polinomial para zero. Uma função
densidade de probabilidade tem caudas de Pareto quando: . Para
estimar o índice de cauda , vamos utilizar o estimador de Hill que apenas considera os valores
da série superiores (ou inferiores) ao quantil . O estimador é definido da seguinte forma para a
aba direita:

Onde se e zero no caso contrário. O estimador da aba esquerda pode ser


obtido substituindo por . Adoptando obtivemos um valor de
para a aba esquerda, e de para a aba direita. Estes valores são relativamente baixos, o
que sugere uma elevada massa de probabilidade associada a valores extremos.

2
Veja por exemplo Cont (2001)

4
Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 5

3.2 Volatility Clustering


Como vimos na secção 3.1, os valores extremos ocorrem com mais frequência numa série
financeira do que numa outra série que seja bem representada com uma distribuição normal. No
entanto, estes valores extremos não ocorrem de modo aleatório. Ou seja, é de esperar que fortes
(baixas) variações sejam seguidas de fortes (baixas) variações em ambos os sentidos devido à
chegada de informação ao mercado que faz com que os investidores reavaliem as suas carteiras.
A este fenómeno dá-se o nome de volatility clustering. Tomando como proxy da volatilidade a
variável , pode-se verificar este acontecimento através da medida que
apresenta um valor de 0,325. No entanto, a correlação desta série não aparenta ser muito forte.
Podemos, no entanto, verificar o comportamento da função de autocorrelação de para
verificar estatisticamente através do teste de Ljung-Box se a autocorrelação é estatisticamente
significativa, sendo que temos ausência de autocorrelação sob a hipótese nula. Como é possível
observar pela figura 4, a FAC e a FACP apresentam coeficientes estatisticamente significativos
em lags muito recuados, o valor-p associado ao teste de Ljung-Box ao lag 36 é de 0,00 o que é
evidência estatística favorável à existência de autocorrelação da série . Como tal,
consideramos que esta série apresenta o fenómeno de volatility clustering.

Figura 4 - FAC e FACP da série dos quadrados dos retornos do FCP, com bandas de
significância.

3.3 Efeito Assimétrico


As séries de retornos financeiros exibem frequentemente efeito assimétrico, isto é, aquando
de uma diminuição dos retornos num momento t, espera-se que, em média, ocorra um aumento
da volatilidade no período seguinte. Assim sendo e tomando novamente como proxy da
volatilidade a variável , podemos detetar este efeito através da medida , sendo
que esta deverá vir negativa no caso de existir o referido efeito. No caso concreto dos retornos
do FCP tem-se que . Visto que temos uma correlação negativa
(apesar de muito baixa), parece haver evidência de que a série apresenta efeito assimétrico.
Como tal, espera-se que quando , em média, haverá um aumento de volatilidade no

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 6

período seguinte. A existência deste efeito será formalmente testada numa fase posterior do
trabalho.

4. Modelação da série

4.1 Modelação da média condicional

Nesta secção do trabalho pretende-se aplicar a metodologia de Box-Jenkins3 para encontrar


um modelo para a média condicional do processo. Um primeiro passo para se chegar a um
modelo corretamente especificado passa por identificar as ordens p e q do modelo ARMA4
através da análise das FAC e FACP que se apresentam na Figura 3. Devido ao rápido
decaimento da FAC no lag 1 comparativamente ao decaimento mais lento da FACP, parece
adequado fazer a estimação de um modelo MA(1). No entanto, visto que o decaimento da FACP
é também muito acentuado, apesar de não tanto como na FAC, torna-se difícil verificar
visualmente se os modelos ARMA são adequados. Como tal, iremos também estimar os
modelos ARMA(1,1), ARMA(1,2) e ARMA(2,1). Visto que temos quatro potenciais modelos, o
procedimento para a escolha do melhor modelo passa pela comparação dos testes de
diagonóstico, i.e, à significância estatística individual dos parâmetros, teste Ljung-Box, teste
Jarque-Bera e verificação da condição de estacionaridade e invertibilidade do modelo5.
Posteriormente, far-se-á a escolha do modelo com base no critério de informação Bayesiano de
Schwarz.

No entanto, apesar da Figura 3 sugerir um MA(1), quando procedemos à estimação deste


modelo, verificamos que este não passa no teste Ljung-Box, visto que o valor-p a qualquer lag é
de 0,000. Ou seja, existe forte evidência estatística favorável à hipótese alternativa de presença
de autocorrelação dos resíduos. Como tal, o modelo MA(1) será excluído. Para além dos
problemas encontrados com um regressor de médias móveis, quando passamos à estimação dos
restantes modelos encontramos sempre o problema da não significância estatística quer dos
retornos do SLB como do SCP. Como tal, após um estudo detalhado, decidimos retirar os
retornos do SLB da estimação dos restantes modelos, sendo a principal razão a perca de cerca
de 50% das observações quando utilizamos este regressor. Ao fazer a estimação com um
regressor autorregressivo e um de médias móveis, obtemos valores muito baixos para os testes
Ljung-Box, sendo que os primeiros lags apresentam evidência estatística favorável à hipótese de
autocorrelação dos resíduos com dimensão ( ) a 5%. Sendo assim, a decisão passa pela escolha
entre o modelo com um regressor autorregressivo e dois de médias móveis e um outro modelo
com dois regressores autorregressivos e um de médias móveis. Visto que ambos os modelos têm

3
Veja Box et al. (1994)
4
Sendo p a ordem do polinómio autorregressivo e q a ordem do polinómio de médias móveis.
5
Ou seja, verificar-se-á se as raízes inversas dos polinómios AR e MA estão dentro do círculo unitário.

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 7

todos os coeficientes estatisticamente significativos, as condições de estacionaridade e


invertibilidade são verificadas, passam no teste Ljung-Box a qualquer lag, mas não passam no
teste Jarque-Bera6, a decisão para a escolha do modelo passa por analisar o critério de
informação Bayesiano de Schwarz, onde o modelo com um regressor autorregressivo e dois de
médias móveis é o que melhor se ajusta aos dados, visto que minimiza este critério. Apresenta-
se de seguida o referido modelo e as respetivas estimativas e testes referidos anteriormente na
Tabela 1.

Tabela 1- Resultados de estimação do Modelo 1

Modelo 1
Parâmetro Coeficiente Valor-p Resultados gerais do modelo
0,1244 0,0000
Teste Ljung-Box aos primeiros 16 lags (valor-p) 0,554
0,0576 0,0000

0,6992 0,0000 Teste Normalidade dos resíduos de Jarque-Bera (valor-p) 0,000

-1,0113 0,0000
Critério de informação de Schwarz -3,752
0,1351 0,0000

Torna-se pertinente nesta fase discutir alguns dos parâmetros estimados nesta secção para
mais tarde, quando se utilizar os modelos GARCH, verificar se estes são estimados com mais
precisão, tal como sugere a teoria. Como tal, ao analisar a Tabela 1 estima-se que, em média,
por exemplo, o aumento de 1 ponto percentual (p.p.) nos retornos do SCP leva a um aumento
nos retornos do FCP de 0,0576 p.p., mantendo os restantes regressores do modelo constantes. Já
o efeito de um aumento de 1 p.p. nos retornos do PSI20 levam em média a um aumento dos
retornos do FCP mais que duas vezes superior ao que tínhamos no caso anterior. Já o coeficiente
autoregressivo tem um valor bastante mais expressivo que os anteriores, visto que se estima
que, em média, um aumento de 1 p.p. dos retornos do FCP num período leva a um
aumento de 0,6992 p.p. desses mesmos retornos no período seguinte, .

Por fim, estudou-se ainda o efeito de calendário na média condicional. No entanto, a sua
modelação não correu como seria de esperar, dado que nem o coeficiente da segunda-feira veio
estatisticamente significativo, o que vai contra a teoria subjacente ao efeito de calendário. Por
outro lado, obteve-se uma estimativa de -0,0006, que para além de vir muito baixa, vem
negativa, o que vai contra o que seria de esperar do ponto de vista económico e financeiro. Isto,
6
Pelo que rejeitamos a hipótese nula dos resíduos apresentarem uma distribuição normal, o que não é
satisfatório.

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 8

porque se está à espera que os retornos neste dia sejam, em média, um pouco mais altos face aos
demais dias da semana, dado que a posse de títulos à segunda-feira representa um investimento
de 72 horas face à última-sexta-feira.

4.2 Modelação da variância condicional


Nesta secção do trabalho deixamos de assumir homocedasticidade condicional para
passarmos a assumir heterocedasticidade condicional (HC). Esta última hipótese parece ser a
mais razoável dadas as características singulares da série, tal como foi apresentado na secção 3.2
onde, por exemplo, se viu que a volatilidade da série do FCP não era constante ao longo do
tempo. Tal acontece por variados motivos, sendo que a especulação e especialmente a
fragilidade face a graves crises económicas parecem ser fatores decisivos nos comportamentos
fortemente voláteis das séries financeiras. Uma outra motivação para a utilização de modelos de
HC passa por conseguirmos estimar de forma mais eficiente os parâmetros definidos na média
condicional (secção 4.1). Os modelos estudados nesta secção são os modelos ARCH e GARCH,
desenvolvidos por Engle (1982) e Bollerslev (1986), respetivamente.

Na secção anterior concluímos que o Modelo 1 é uma especificação correta para a média
condicional. Nesta fase, importa perceber se será realmente pertinente utilizar um modelo de
heterocedasticidade condicionada, ou seja, estamos interessados em apurar se a série exibe um
efeito ARCH. Para tal, testou-se formalmente a existência do referido efeito recorrendo ao teste
LM, que tem por base o quadrado dos resíduos obtidos na estimação do Modelo 1, . O
resultado do teste considerando 36 lags, confirma a necessidade de especificação da variância
condicional uma vez que o valor-p associado à estatística de teste é de 0,00, permitindo
rejeitar a hipótese nula. Também o teste de Ljung-Box corrobora esta conclusão, dado que o
valor-p de 0,00 permite rejeitar a hipótese de ausência de autocorrelação do quadrado dos
resíduos estimados.

Dado este resultado importa em primeiro lugar perceber as ordens p e q a estimar.


Respeitando o principio da parcimónia começámos por ajustar um modelo ARCH(1). No
entanto, esta especificação não conseguiu expurgar a autocorrelação do quadrado dos resíduos e,
como tal, decidiu-se aumentar progressivamente a ordem do ARCH. Este procedimento não
produziu melhores resultados e acabámos por adotar uma especificação GARCH(1,1) que se
revelou eficaz em expurgar a autocorrelação do quadrado dos resíduos, utilizando a mesma
especificação para a média condicional do Modelo 1.

Face ao facto estilizado referido anteriormente da presença de um efeito assimétrico,


decidiu-se incorporar o fenómeno estimando o modelo GJR-GARCH. Para além disso, foram
consideradas outras variáveis explicativas na modelação da volatilidade, a saber: variável ,
que representa a diferença entre os valores do preço mais alto (High) e o mais baixo (Low) das

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 9

ações registados durante o dia i; variável , que representa a diferença entre o preço de
abertura (Open) e o preço de fecho ajustado (Adjclose) das ações no dia i; , que
representa o volume de transações no dia i, que pode ser visto como uma proxy da variável
latente de chegada de informação; e ainda variáveis dummy referentes aos diferentes dias úteis
da semana.

Nenhuma das variáveis acima referidas passaram nos testes de significância individual
incluídas tanto em conjunto como separadamente na estimação da variância condicional e,
consequentemente, não as vamos incluir no modelo. Na secção 3.3 falou-se da potencial
existência de um efeito assimétrico, devido ao valor negativo de que já seria de
esperar. No entanto, esta correlação vem muito baixa e, como tal, torna-se necessário testar a
sua significância estatística. Assim sendo, face ao resultado da significância estatística do efeito
assimétrico, pode-se concluir que não existe evidência estatística da presença desse efeito na
série do FCP, visto o seu valor-p associado ser superior a 5%. Em relação às variáveis
explicativas HL e OA, facilmente se percebe o porquê de se provar estatisticamente a ineficácia
na explicação da variância condicional – já que as variáveis HL e OA são compostas por valores
nulos em 38% e 45% da amostra, respetivamente.

Face às diferentes condições de estimação, comparativamente com o modelo da secção


anterior (3.1), seria eventualmente necessária uma revisão da especificação da média
condicional. No entanto, como os resíduos da estimação GARCH parecem expurgados de
sintomas de autocorrelação concluímos que a especificação da média continua correta. Perante
isto, chega-se ao modelo final escrito em baixo.

Para garantir que a equação da variânicia está bem especificada, o processo dos resíduos
estandardizados do modelo deve ser não autocorrelacionado e condicionalmente homocedástico.
Para tal, efetuaram-se os testes de Ljung-Box à autocorrelação dos resíduos estandardizados e à
autocorrelação dos quadrados dos mesmos. O modelo passa em ambos os testes para qualquer
lag, sendo que o valor-p associado à estatística de teste é de 0,599 para o lag 10, e 1 para o lag
36, dos respetivos testes (ver tabela 2).

Uma nota importante a reter é de que os resíduos estandardizados apresentam um valor de


kurtosis muito acima de 3 e, como tal, diz-se que a distribuição condicional de é
leptócurtica. Nesse sentido, houve uma tentativa de estimar o modelo com .
No entanto, esta especificação foi imediatamente rejeitada dada a não convergência do

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 10

algoritmo de maximização do programa Eviews. Em alternativa assumiu-se e


utilizou-se o estimador de Pseudo Máxima Verosimilhança na estimação, razão pela qual se teve
o cuidado adicional de se utilizar a matriz de variâncias-covariâncias de Bollerslev-Wooldridge.
Os resultados da estimação empregue encontram-se sumariados na tabela 2.

Tabela 2 - Resultados de estimação do Modelo 2

Modelo 2
Parâmetro Coeficiente Valor-p Resultados gerais do modelo
0,1230 0,0000
Teste Ljung-Box aos resíduos nos primeiros 10 lags 0,599
0,0759 0,0000 (valor-p)

0,7255 0,0000 Teste Ljung-Box ao quadrado dos resíduos nos primeiros 1


36 lags (valor-p)
-1,0835 0,0000
Teste Normalidade dos resíduos de Jarque-Bera (valor-p) 0,000
0,2029 0,0000

3,68.10-6 0,0000 Coeficiente de kurtosis dos resíduos 65,67

0,0905 0,0000
Critério de informação de Schwarz -4,188
0,9258 0,0000

Dada a estimação final, importa agora fazer a devida interpretação. Em primeiro lugar, é de
notar que o valor dos coeficientes na média condicional não sofre grandes alterações. Em
relação ao coeficiente dos retornos do PSI 20, estima-se que, em média, o aumento de 1 p.p.
leve a um aumento nos retornos do FCP de 0,1230 p.p., mantendo os restantes regressores do
modelo constantes. Já o efeito de um aumento de 1 p.p. nos retornos do SCP, leva em média a
um aumento dos retornos do FCP em 0,0759 p.p., nas mesmas condições. Mais uma vez, o
coeficiente autoregressivo é dos que apresenta maior magnitude, levando a que, em média, o
aumento de 1 p.p. dos retornos do FCP num período tenha um aumento de 0,7255 p.p. nos
mesmos, no período seguinte .

Em relação à especificação da variância condicional, é de notar estarmos perante um


modelo IGARCH, dado que a soma dos parâmetros da variância condicional , estimados
pela pseudo máxima verosimilhança é aproximadamente igual a 1, o que sugere que a
volatilidade apresenta forte persistência temporal. Assim sendo, não é estacionário em
segunda ordem mas é estacionário em sentido estrito, o que não implica problemas na
estimação. No entanto, devemos ter presente que alterações de estrutura dos coefecientes e
podem causar um falso modelo IGARCH. Como o Eviews não inclui testes de estabilidade dos

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 11

coeficientes para modelos GARCH vamos proceder assumindo que não existem alterações de
estrutura.

5. Previsão
Uma das principais aplicações dos modelos de heterocedasticidade condicionada passa pela
previsão da volatilidade. Nesta secção, construimos um modelo para esta finalidade. Apesar de
existirem variáveis com poder explicativo sobre a média condicional vamos excluí-las do
modelo de forma a operacionalizar o exercício de previsão, i.e. vamos utilizar modelos
univariados. Para testar a qualidade das previsões vamos dividir a amostra em duas partes: as
observações entre 03/1/2000 a 9/2/2017 vão servir para a estimação do modelo; a qualidade das
previsões será analisada no período entre 10/2/2017 e 20/2/2017.

Tal como na secção 4.1, a modelação da média será feita de acordo com a metodologia
Box-Jenkins. Note-se que agora o objectivo não é encontrar um modelo estrutural mas sim
modelar o padrão de autocorrelação da série. Após termos estudado vários modelos concluímos
que a média condicional é bem especificada por um ARMA(1,1).

Mais uma vez, o teste LM indica a presença de efeito ARCH. Começamos por especificar
um ARCH(1) para a variância condicional, com este modelo tanto a série como a série dos
resíduos estandardizados, , não passam no teste de Ljung-Box. Ao aumentar a ordem do
ARCH, até obtermos um coeficiente que não fosse estatisticamente significativo, não foi
possível diminuir a severidade do problema. Porém, ao considerar um GARCH(1,1), com
matriz de variâncias-covariâncias de Bollerslev-Wooldridge, o teste de Ljung-Box passa a
indicar a ausência de sintomas de autocorrelação na série de e de . A soma dos coeficientes
da variância condicional é igual a um pelo que estamos novamente no contexto do modelo
IGARCH.

O histograma de revela excesso de kurtosis, pelo que decidimos voltar a estimar o


modelo adotando a hipótese de que segue uma distribuição t-student. Desta forma foi possível
reduzir o valor da kurtosis. No entanto, o ajustamento do modelo às dinâmicas dos retornos e da
volatilidade piora substancialmente pelo que decidimos voltar a adotar a hipótese da
normalidade.

Assim sendo, o modelo ARMA(1,1)-IGARCH(1,1) é adequado para efetuar o exercício de


previsão. Os resultados de estimação podem ser consultados na tabela 3. Note-se ainda que este
modelo passa no teste de significância global de Wald. O modelo de previsão pode então ser
representado da seguinte forma:

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 12

Tabela 3 - Resultados de estimação do modelo de previsão

Modelo de previsão
Parâmetro Coeficiente Valor-p Resultados gerais do modelo
0,212 0,00
Teste Ljung-Box aos primeiros 36 lags de (valor-p) 0,785
-0,520 0,00
Teste Ljung-Box aos primeiros 36 lags de (valor-p) 1,00
0.083 0,00
Teste Normalidade dos resíduos de Jarque-Bera (valor-p) 0,000
0.930 0,00

4.71E-0.6 0.03 Critério de informação de Schwarz -4,156

Na figura 5 apresentamos os resultados obtidos no exercício de previsão a dez passos, e


comparamos a previsão da volatilidade com a volatilidade estimada pelo modelo apresentado na
secção 4.

Figura 5 - Resultados de previsão da média e da variância condicional

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Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 13

Figura 6 - Comparação da previsão da média condicional e de obtido pelo modelo 2

Em primeiro lugar, importa referir que a previsão dos retornos tende rapidamente para zero,
reforçando a ideia de que as variações dos retornos são imprevisíveis. Como estamos no
contexto de um modelo IGARCH a previsão a passos da volatilidade incorpora a totalidade do
valor da previsão para o período logo, à medida que aumenta, a previsão tende para
infinito o que explica a tendência crescente observável na previsão desta variável. Apesar da
utilidade dos modelos IGARCH ser cada vez menor à medida que , estes proporcionam
uma boa aproximação ao verdadeiro processo gerador de dados quando o horizonte de previsão
é curto7.

Os resultados da figura 6 são, de certa forma, dececionantes. A previsão da volatilidade não


consegue replicar as oscilações da série , muito menos a magnitude dos seus movimentos. O
que poderá explicar estas diferenças? Segundo Bollerslev (1998) devemos ter em consideração
dois fatores: Em primeiro lugar, a volatilidade é uma variável latente que, caso a especificação
do modelo seja correta, pode ser estimada consistentemente com , outra variável que não é
diretamente observável. Assim sendo, a série pode não ser uma medida adequada da
verdadeira volatilidade. Em segundo lugar, a nossa previsão, por incorporar a informação das
observações anteriores, tenderá a ter um comportamento suave ao longo do tempo. Por outro
lado, a série é o resultado de um modelo construído para obter resíduos que se
assemelhassem a ruídos brancos. Ou seja, a componente gera bastante “ruído” na série o
que leva a que esta tenha um comportamento mais “nervoso” que a série de valores previstos.
Assim sendo, é natural que as previsões da volatilidade e sejam diferentes.

Por último, a previsão a dez passos obtida para fora da amostra, ou seja para 3/06/2017, é de
com = 2/20/2017.

7
Veja-se Morana (2002)

13
Abreu, Aparício, Cascão Séries Temporais para Finanças 14

5. Conclusão
Era objetivo deste trabalho estudar a série dos retornos do Futebol Clube do Porto através da
modelação da média condicional do processo assim como da sua variância condicional e fazer a
previsão a 10 passos dessas mesmas componentes. Numa primeira abordagem foi feito um
estudo detalhado sobre as propriedades da série para mais tarde se conseguir obter a melhor
especificação possível para a média condicional onde se destaca a magnitude do efeito da
variável dependente desfasada assim como dos choques sentidos no período anterior. Com base
nessa especificação para a média condicional, modelou-se posteriormente a heterocedasticidade
condicionada, sendo esta uma importante característica das séries financeiras. Concluiu-se
através deste estudo que: a série não demonstra ter o efeito de calendário; esta não apresenta um
efeito assimétrico; variáveis potencialmente explicativas da variância condicional, como é o
caso do volume de transações ou da diferença entre o valor máximo e mínimo do preço das
ações do FCP em cada dia, não têm poder explicativo sobre a mesma. Por fim, em termos de
previsão verificou-se uma tendência rápida da série dos retornos para o seu valor médio, i.e,
para 0. Já no caso da variância verificou-se o oposto, visto que a previsão feita para esta tende a
divergir para mais infinito, sendo que esta não verifica o comportamento da série de quer nas
suas oscilações como na magnitude dos seus movimentos.

Bibliografia

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745-748.
Nicolau, J. (2012). “Modelação de Séries Temporais Financeiras”, Fundação
Económicas/Editora Almedina.

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