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COMENTÁRIO
Em grau de apelação, foi a sentença "O Estado de Minas Gerais, ora re-
confirmada, por seus próprios funda- corrente, por intermédio do seu Depar-
mentos. tamento Jurídico, em as razões de fls.
Do acórdão, que está a fls. 183, re- 185-188, demonstra a procedência do seu
correu extraordinàriamente o Estado, recurso extraordinário, por haver o ve-
apoiando-se na Carta Política de 1948, nerando acórdão recorrido não só di-
art. 101, n. o IlI, letras a e d, ut petição vergido de jurisprudência, como ainda
a fls. 185. contrariado a letra dos arts. 15 e 159
do Código Civil.
Teve processo regular o recurso, jun-
tando o seguinte parecer a douta Pro- De acôrdo, portanto, com as: alegações
curadoria-Geral da República: do recorrente, somos pelo conhecimento
2 Rui Barbosa. Obras completas, vol. XXV, 1898, tomo IV, pág. 163: tomo V,
págs. 1 e 107; Amaro Cavalcanti, Responsabilidade civil do Estado, 1905; Pedro Lessa,
Do Poder Judiciário, pág. 161; Filadelfo Azevedo, O Direito, vol. XXII, pág. 245;
Aguiar Dias, Responsabilidade civil, vaI. lI, pág. 142.
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3 Ver, a respeito, Anual Survey of American Law, 1956, pág. 374 e 1957,
pág. 396.
4 Mais de metade dos Estados Americanos ainda mantêm a tradição de imuni-
dade do poder público pelos atos ilícitos. Contudo, o Estado de Nova York foi o
pioneiro na reforma, adotando em 1929 a primeira lei de responsabilidade governamental
(Edmond Cahn, in Annual Survey of American Law, 1956, pág. 584).
5 Anual Survey, dt .. 1956, pág. 377.
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:tsse ato legislativo que, no dizer de Hood Phillips, foi "a mais
revolucionária das leis dêsse país nos tempos modernos", 6 contém,
ainda, limitações acentuadas à responsabilidade do Estado, como a
exclusão de atos das autoridades postais, militares, judiciais e policiais,
ou as atividades das emprêsas públicas (public corporations) , ou o exer-
cício de deveres legais exclusivos (statutor'lj duties).7
No direito italiano os critérios teóricos variam sensivelmente, desde
a obra clássica de Vacchelli, com a semente do princípio do risco social, 8
passando por Orlando, Cammeo, Rannelletti, Santi Romano, Forti e
outros, adeptos de tendências diversas de responsabilidade objetiva,
para alcançar a larga discrepância moderna de opiniões: subjetivistas,
como Renato Alessi, para quem la colpa (in senso lato: trasgressione
imputabile ad un obbligo) e ancora il {ondamento normal e della respon-
sabilità civile, salientando que a denominada "responsabilidade por atos
lícitos" tem fundamento distinto, compensando-se o sacrifício de direi-
tos e interêsses legítimos mediante indenização imposta por lei ou
decorrente de princípio geral de direito; 9 objetivistas, como Santi
Romano 10 ou Zanobini, 11 que prescindem do elemento de culpa, pró-
pria do direito privado.
Observa, porém, Cino Vita, na crítica às teorias sôbre a responsa-
bilidade sem culpa, que a jurisprudência não lhes deu agasalho. 12
Andrea Torrente fêz, recentemente, um completo inventário da
jurisprudência italiana sôbre o tema,13 demonstrando a influência
6 Hood Phillips. The Constitutional Law oF Great Britain and the Commonw!!alth.
2. a edição. 1957. pág. 428. Ver. a respeito. H. Street. Govemment liability. A com-
parative study, 1950.
7 S. A. de Smith. Judicial review oF administrative action, 1959. págs. 12 e 423:
Griffith and Street. Principies oF Administrative Law, pág. 246.
8 Giovanni Vacchelli, La responsabilità civile della pubblica amministrazione eá
il Diritto comum, 1892. pág. 226 e passim.
9 Renato Alessi. La responsabilità della pubblica amministrazione, 1951. pág. 158.
10 Santi Romano. Responsabilità dello Stato e riparazione alie victime degli errod
giudiziari, in "Scritti minori", vol. lI. pág. 157.
11 ZanobinÍ, Corso di Diritto Amministrativo, 5. a edição. vol. I. pág. 265.
12 Ma le loro teoria non Furono seguite della giurisprudencia (Cino Vitta. Diritto
Amministrativo, 3. a edição, voI. lI, pág. 735).
13 Andrea Torrente. Sulla responsabilità della pubblica amministrazione (anni
1947, 1952) - in "Rivista Tri~strale di Diritto Pubblico", 1952. pág. 996.
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"O Sr. Ministro Ribeiro da Cosro - serviço policial não tomou a Polícia as
Sr. Presidente, também acompanho o providências necessárias para evitar que
voto do Sr. Ministro Mário Guimarães, a multidão amotinada causasse danos à
com a devida vênia de V. Excia. Só propriedade particular, responde o Es-
tenho admitido a isenção do Estado em tado pelos prejuízos que o Estado não
indenizar nos casos em que fique pro- soube ou não quis impedir.
vada a fôrça maior; fora daí concedo
a indenização, porque o Estado é obri- Acordam, em sessão de Primeira Tur-
gado a garantir a propriedade privada". ma, por maioria de votos, negar pro-
Tomou-se, em conseqüência, o vene- vimento ao presente recurso, que foi,
rando acórdão de fls. 207: entretanto, conhecido unânimemente, tu-
H Ementa _ Se por negligência das do na conformidade das notas taquigrá-
autoridades, ou mau aparelhamento do ficas. É recorrente o Estado de Minas
Gerais e recorrida a Emprêsa Cine Tea- fundamentos e pelos dos votos venci-
tro Santa Helena e outro. dos dos eminentes Ministros Barros Bar-
Rio, 21 de maio de 1953". reto e Nélson Hungria (fls. 201 e 202),
Daí, os presentes embargos, expostos que se ajustam ao que temos sustentado
a fls. 209 (ler) . em casos idênticos".
Correu in albis o prazo de impugna- À revisão.
ção. ~ste o parecer do eminente Sr. Dr.
Plínio Travassos, D.D. Procurador-Ge- VOTO
ral da República:
"&>mos pelo recebimento dos embar- o Sr. Mini8'tro Orosimbo Nonato (Pre-
gos de fls. 209-212, pelos seus doutos sidente e Relator) - Como se verifica
da exposição que acabo de fazer, a maio- nia, vou além, para entender que o Es-
ria da egrégia Primeira Turma adotou tado é sempre responsável, porque não
a seguinte tese: ao Estado compete de- pode se eximir dos ônus de garantir o
monstrar, em casos simílimos ao dos au- particular. Sempre entendi que o fun-
tos, a ausência de culpa, ou a sua im- damento não é o de culpa civil. O Có-
potência para evitar os danos ao par- digo Civil, é certo, versa o assunto, mas
ticular, ou que o fato se deu por mo- não o esgota. E tanto assim que a
tivo excusável. É a tese ponderável do própria Constituição prevê a hipótese
venerando acórdão recorrido. Data 00- de regresso contra o funcionário quan-
22 Waline. ob. cit .. pág. 697; Laubadere. ob. cit.. pág. 485; Benoit. ob. cit ..
n. o 165. pág. 25.
23 Waline. ob. cit .• pág. 728/s.; Laubadere. ob. cit .. pág. 507/s.; F. P. Benoit.
Regimes speciaux de responsabilité - Jurisclasseur Administratif. fase. 735.
24 Duez e Debeyre. ob. cit.. pág. 458.
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do tiver culpa, o que sUPJÕe, data venia, Mas, de fora parte essa tese, que
casos em que o Estado será responsabi- podia render ensejo a grandes discepta-
lizado, ainda sem culpa do funcionário. ções, há ainda o aspecto mencionado pelo
É o caso do mau aparelhamento do ser- acórdão: não ficou provada ausência de
viço, de sua insuficiência. negligência ou que não ocorria o mau
A meu ver, tem razão Maurice Hau- aparelhamento e seria mister que o Es-
riou, quando entende que a responsa- tado provasse essa ausência de culpa
bilidade do Estado não se assenta em ou provasse não lhe ter sido possível
critério relacionado à culpa, como com- debelar o movimento; porque, segundo
preendida no direito privado. o voto do eminente Sr. Ministro Mário
pág. 137). Foram inúmeros, porém, os acórdãos do Supremo Tribunal Federal que
negaram a responsabilidade do Estado pela defesa das instituições, nesse período (ver:
Amaro Cavalcanti, ob. cit., pág. 524: Mendonça de Azevedo, ob. cit., pág. 511/s.).
29 Ver, p. ex., Mendonça de Azevedo, ob. cit .. ns. 749, 1252, 1796, 1865.
1888, 1889, 1907 e 1908. Acórdãos in Revista de Direito Administrativo, vaI. I.
pág. 561. 602 e 603; vaI. V, págs. 155 e 159; vaI. VII, pág. 115; vaI. X, pág. 128;
voI. 47, pág. 208; Revista de Direito da Procuradoria Geral da Prefeitura do Distrito
Federal, vaI. 7, pág. 386. Citações in Filadelfo Azevedo, voto cit., Revista de Direito
Administrativo, vaI. I, pág. 566.
3 O Ver, a respeito, Renato D' Alessi, La responsabilità della Pubblica Amministra-
zione, 2. a edição, 195 L pág. 215/s.
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