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OS CAMINHOS DO PENSAMENTO DE MARÍA ZAMBRANO

Há 113 anos nascia a formuladora da razão poética, uma forma especulativa


situada entre a criação poética e as indagações de caráter filosófico

TEXTO EDUARDO CESAR MAIA


01 DE AGOSTO DE 2017
A filósofa María Zambrano
FOTO REPRODUÇÃO
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[conteúdo na íntegra (degustação) | ed. 200 | agosto 2017]
Em uma ocasião de homenagens póstumas, o pensador e ensaísta basco Fernando
Savater se referiu à filósofa María Zambrano, primeira mulher a ganhar o
prestigiado Prêmio Cervantes, usando de uma sugestiva analogia bélica: “uma
franco-atiradora necessária, à margem de todo academicismo”. De fato, Zambrano
foi uma das pensadoras mais interessantes e idiossincráticas do século passado, e
sua “marginalidade” vai muito além – como alguns poderiam supor – de qualquer
consideração sobre preconceitos de gênero na filosofia: sua forma especulativa se
constituiu e se realizou deliberadamente às margens da filosofia “oficial”, ainda
que sem abdicar do diálogo com essa tradição. Um dos mais respeitados estudiosos
de sua obra em nossos dias, o professor Francisco José Martín, da Universidade de
Turim, defende a ideia de que a concepção de filosofia da pensadora espanhola
alcançou uma forma tão particular – e divergente da tradição racionalista
ocidental – que a difusão de suas ideias acabou sendo dificultada, mesmo entre
especialistas. Assim, infelizmente, também no Brasil, seu nome é desconhecido fora
do circuito acadêmico – e muito pouco conhecido dentro dele.

Considero meu primeiro contato com sua obra uma verdadeira descoberta:
comprei num sebo no Centro do Recife uma edição velhinha de Filosofía y poesía e
enxerguei ali, já na leitura dos primeiros parágrafos, algo fora do ordinário, tanto
do ponto de vista conceitual quanto no que se refere ao estilo literário plasmado
em forma ensaística. Afinal, era filosofia ou literatura? A disjuntiva (isto ou
aquilo) ainda se me impunha como algo intransponível naquele tempo. Depois de
alguns anos, e superada a visão dicotômica e empobrecedora à qual eu mesmo me
aferrava, a pergunta simplesmente deixou de fazer sentido para mim. Mas, antes
de tratar disso, acho que é de bom-tom apresentar brevemente as circunstâncias
vitais da pensadora.

VIDA, INFLUÊNCIAS E EXÍLIOS


María Zambrano Alarcón nasceu na cidade andaluza de Vélez-Málaga (Espanha),
no dia 22 de abril de 1904 – há 113 anos, portanto –, e passou a maior parte da
infância e adolescência em Segóvia. Aos 24 anos, em Madri, realizou estudos de
Filosofia, tendo como mestres figuras como Ortega y Gasset, García Morente,
Julián Besteiro e Xavier Zubiri. Em 1932, Zambrano substituiu Zubiri na cátedra
de Metafísica da Universidad Central e começou a colaborar na importante Revista
de Occidente; depois, na Cruz y Raya e na Hora de España. Durante esses anos que
precederam seu exílio, conheceu e fez amizade com Bergamín, Luis Cernuda,
Jorge Guillén e Miguel Hernández.

Por razões políticas, Zambrano deixou a Espanha, e toda sua vida como exilada,
pesem todas as dificuldades, foi muito fecunda em produção literária e em
relacionamentos com intelectuais, artistas e políticos. No México, conheceu Octavio
Paz e León Felipe; na França, fez amigos como Albert Camus e o poeta René Char.
Viveu também em países como Porto Rico e Cuba, sempre exercendo a docência
em diversas universidades. Somente em 1953 ela pôde retornar à Europa, fixando
residência em Roma. No ano de 1978, mudou-se para a Suíça e, finalmente, em
1982, retornou à Espanha, onde faleceu em 1991.

SEU TEMPO E OUTROS


A influência no pensamento de Zambrano das correntes filosóficas do seu tempo é
muito clara: filosofia existencial, fenomenologia e, sobretudo, vitalismo vão ser
parte da sustentação e da motivação da sua peculiar forma de especulação
intelectual; por outro lado, suas grandes fontes de estudo e pesquisa estavam no
passado: os gregos antigos, o pensamento neoplatônico de Plotino e a ética e a
metafísica – inexoravelmente enredadas – de Espinosa.

Mas nenhuma de suas influências posteriores foi tão profundamente enraizada


quanto sua formação filosófica junto a José Ortega y Gasset. Vários temas e noções
que ela vai trabalhar durante toda a vida foram assimilados do pensamento de seu
principal professor. A razão poética zambraniana não poderia surgir sem a
revolução conceitual impulsionada pelo raciovitalismo orteguiano — que engloba,
simultaneamente, a noção de perspectivismo filosófico, a crítica a uma tradição
racionalista que oblitera os problemas fundamentais do indivíduo humano, e a
incorporação ao pensar da noção de vida como realidade radical, que se impõe
frente aos conceitos abstratos da filosofia tradicional. A razão vital de Ortega
buscou superar, unindo-os, racionalismo e vitalismo.

Não se pode separar o homem de suas circunstâncias, dirá Ortega, reivindicando


que a única realidade radical é a vida: a razão deveria, portanto, parar de
construir abstrações sobre abstrações, conceitos a respeito de conceitos. Todo
conhecimento parte da vida, e até a razão é só uma parte (um atributo) dela – é
razão vivente –, pelo fato de que viver, para o homem, é dotar de sentido (logos)
sua existência. A razão, pois, não poderia ser nada senão um modo de ser do
homem. A discípula irá se diferenciar do mestre naquilo que é justamente o fulcro
do pensar zambraniano: o método, ou, o que dá no mesmo em seu caso, o estilo. A
razão poética é uma ruptura no discurso racional, uma quebra a um nível a que
não chegou o próprio Ortega y Gasset. Para “criar” esse novo pensar – que em si
já é criação incessante –, María Zambrano fez uso de elementos próprios da
poética: metaforização, atitude criadora e imaginativa que pudesse refletir, de
algum modo, a dinamicidade da vida e sua infinita multiplicidade.

Em livros como Senderos, El hombre y lo divino e, principalmente, Filosofía y


poesía, Zambrano percorre um caminho de investigação a fim de rastrear a
essência do fazer poético e das relações dessa atividade com a filosofia. O seu
método, a razão poética, parece ter sido uma elaboração progressiva; e é ele, o
método, que confere unidade à produção intelectual da filósofa – mais até do que
suas temáticas.

OS CAMINHOS DO PENSAMENTO
“O próprio do homem é abrir caminho, porque, ao fazê-lo, põe em exercício o seu
ser; o próprio homem é caminho”, escreveu Zambrano. A citação é um ótimo
exemplo para ilustrar duas coisas: primeiramente, em relação ao seu estilo
literário, vê-se que utiliza a linguagem metaforizada para carregar a sua
concepção de um sentido vital; e, em segundo lugar, que o autor de Caminhos do
bosque, Martin Heidegger, foi outra grande influência para a filósofa. Aliás, a ideia
heideggeriana do homem como um eterno projetar-se no tempo parece que teve
muitas reverberações, tanto na filosofia como na literatura. Essa mesma concepção
está presente, por exemplo, em Ortega y Gasset (“El hombre es quehacer”), ou em
Antonio Machado (“El camino se hace al caminar”); e, também, para citar um
exemplo literário brasileiro, em Guimarães Rosa, quando ele sugere que o real não
está nem no princípio nem no fim, mas dispõe-se para cada um durante a
travessia, que é a vida mesma.

A razão poética, como método para uma recepção vital dos acontecimentos, é que
vai promover a “creación de la persona”, através desse caminho que é a existência.
Para tanto, inicia-se como “conocimiento auroral”: visão poética e atenção
disposta à recepção – sem rechaçar o que vem do espaço exterior,
permanentemente aberta e nascente. A partir de então, a razão poética se dará
plenamente, como ação metafórica, à maneira dos poetas, realizando um vínculo
através das palavras. E, neste ponto, pode-se vislumbrar novamente a visão de
Heidegger, para quem o pensador autêntico e o verdadeiro poeta estão
necessariamente ligados ao mesmo ato e ao mesmo testemunho do ser.

POESIA E FILOSOFIA
Investigar a essência do fenômeno poético e perscrutar os seus vínculos com a
filosofia: eis a instigante tarefa a que se propõe María Zambrano em uma parte
considerável de suas escrituras.

A filósofa considera – em aproximação ao pensamento de Unamuno e de Antonio


Machado – poesia e filosofia como “palavra no tempo”, já que, como ela mesma
disse, “na vida humana o decisivo é o tempo”. O vínculo, em síntese, que
Zambrano faz entre essas duas formas de expressão humana é o de que ambas são
a palavra tentando “nos curar da ferida do tempo”. A consideração sobre a
temporalidade como problema central da existência surge a partir da noção de que
tanto a filosofia como a poesia nasceram da admiração e do pasmo humanos ante o
que nasce e o que morre, pela ação impetuosa e inexorável do tempo. Esta
inexplicável condição, a da finitude, suscita uma resposta humana, criadora; uma
revolta pela existência e pela permanência. A forma primeira em que se estabelece
a luta pela vida nos deuses e em todos os seres, segundo a teologia de Hesíodo, é a
luta contra o tempo (Cronos, o deus que engolia seus próprios filhos).

A poesia é a primeira resposta criadora à voracidade do tempo: “O poeta é o


homem devorado pela nostalgia de um tempo perdido dentro deste tempo em
decadência”; é aquele que tenta devolver ao homem a inocência perdida e atingir o
fundo da sua alma, longe da diversidade das horas vividas. Aqui está fortemente
presente uma influência neoplatônica: nessa busca por uma idade de ouro e na
esperança de uma unidade “mais além do ser e da essência”. Poesia, assim
entendida, imiscui-se à filosofia, e já não podemos perceber os limites de cada uma.
Unamuno uma vez disse que “filosofia e poesia são irmãs gêmeas, ou talvez sejam a
mesma coisa”.
O REAL E A APREENSÃO RACIONAL
O filósofo hermeneuta Wilhelm Dilthey separava a mera explicação da verdadeira
compreensão: “Explicamos mediante meros processos intelectuais, mas
compreendemos mediante a cooperação de todas as faculdades anímicas na
apreensão.” De maneira mais simples, mas não menos sábia, o nosso Rosa dirá: “A
gente só sabe bem aquilo que não entende.” De maneira análoga, Zambrano
compreendia a experiência poética como uma forma de apreensão do real, uma
forma de sabedoria que se dá não por silogismos ou por sequências dialéticas, mas
por uma conexão vital com o real.

O filósofo italiano Benedetto Croce (1866-1952) tentou separar ou diferenciar


filosofia e poesia afirmando que a primeira é sistemazione do universo, enquanto
que a segunda é a sua ritmazione. Porém, a experiência da modernidade –
buscando, talvez, nas origens de ambas as formas de expressão humanas, um novo
caminho – tornou cada vez mais sutis os limites entre poesia e filosofia. Na obra ao
mesmo tempo filosófica e literária de María Zambrano, esses limites simplesmente
deixam de fazer sentido.

***

A edição das Obras completas (em quatro tomos) de María Zambrano começou a
sair em 2015 pela Editora Galaxia Gutenberg, e seria um grande acontecimento
intelectual por estas bandas se alguma boa editora resolvesse publicar, mesmo que
não em sua totalidade, boas traduções. Para ficar com três títulos fundamentais, eu
destacaria El hombre y lo divino, Filosofía y poesía e Persona y democracia.

EDUARDO CESAR MAIA crítico literário, mestre em Filosofia, doutor em Teoria


da Literatura e professor da UFPE.

A EMPATIA É BRANCA?

Sobre a centralidade política do lugar de fala: um artigo sobre empatia,


privilégios, o debate por igualdade e o desejo de reconhecimento
TEXTO ÉRICO ANDRADE
17 DE SETEMBRO DE 2018

A empatia tem que ser bilateral, mútua e ser, por assim dizer, simpatia?
ILUSTRAÇÃO HANA LUZIA
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Meu amigo e colega Filipe Campello traça, em artigo recente, uma distinção
importante no que diz respeito ao debate vital sobre o lugar de fala. Campello tem
razão em colocar inicialmente que em termos políticos não estamos mais dispostos
(as), ou pelo menos não deveríamos, a passarmos incólumes diante da omissão
histórica do lugar de fala de grupos significativos da população brasileira. Não
apenas grupos estatisticamente chamados minoritários, mas grupos que compõem
a maior parte da população brasileira, como as pessoas não brancas, por exemplo,
tiveram seu lugar de fala sequestrado em nome de uma suposta harmonia social
(chamada por alguns de democracia racial). O discurso da harmonia e da
cordialidade fez sombra sobre a explícita hegemonia branca, católica, masculina e
heteronormativa em todos os lugares de poder. Reparar essa dívida histórica, sim,
trata-se de uma dívida, parece algo tanto urgente quanto justo. O lugar de fala
importa.

Por outro lado, Campello chama de dimensão epistêmica a questão sobre a


possibilidade de compartilhamos um sofrimento, tanto no sentido de expressar
como comunicar, certos sofrimentos para os quais guardamos uma condição, as
expressões agora são minhas, fenomenologicamente e subjetivamente distintas.
Afinal, por exemplo, não posso viver na radicalidade a experiência de ser mulher
porque ontologicamente sou um homem. Um filósofo, num famoso artigo, dizia que
não podemos ser como um morcego. Nossa condição ontológica, as nossas práticas
sócio-históricas e a nossa constituição biológica, para ser mais claro, não permite
acessar fenomenologicamente e subjetivamente a experiência de viver como um
morcego. No meu caso, embora se trate da mesma espécie humana, não sei o que
significa na radicalidade viver como uma mulher. Essa dimensão do problema do
lugar de fala, meu colega tem razão, é a mais intricada e parece requerer uma
discussão estética sobre os limites da sensibilidade: podemos sentir a mesma coisa,
ter os mesmos sentimentos, apesar de nossas diferenças? Embora tencione mostrar
que essas considerações estéticas tenham certa importância, vou concluir que a
centralidade do lugar de fala é incontornável e ela é essencialmente política.
Debatemos.

A sensibilidade ganha a estatura de uma indagação filosófica quando Baumgartem


(século XVIII) questiona como através dos sentidos, historicamente entendidos
como particulares, isto é, relativos a cada pessoa, e, por isso, contingentes,
podemos alçar ao reconhecimento de imagens tomadas como a expressão do belo.
Do belo universal. Perde-se em lógica e ganha-se em estética, a palavra foi, aliás,
cunhada por ele, quando se faz uma reflexão aguda sobre a sensibilidade humana.
Essa reflexão, contudo, é eivada por outro aspecto, que também não aceitamos tão
facilmente hoje, a saber, a ideia de que existe uma universalidade do gosto, da
apreciação estética de uma obra de arte; essa última entendida igualmente como
universal.

A nossa resistência à compreensão de que uma obra de arte é universal está


conjugada a nossa justa desconfiança – pós-colonial – quanto ao lugar de quem
determina a universalidade da obra de arte. Novamente, voltamos à questão do
lugar de fala. A questão que era meramente estética passa a ser iminentemente
política. A razão é simples. Percorrendo os exemplos dados pelos filósofos da
tradição é difícil, para não dizer praticamente impossível, encontrar obras que
estivessem além das fronteiras do velho continente. Resta então saber se as demais
culturas não produziam arte no mesmo nível da europeia ou se a Europa, tal como
Narciso, achava feio o que não era espelho. A resposta obviamente incide sobre o
claro autocentramento europeu. Eurocentrismo, para dar o nome correto.

A questão, contudo, permanece. É possível compreender a sensibilidade como uma


faculdade humana que nos faz sentir as mesmas coisas? Quando dimensionada
para o campo da arte a resposta mais imediata parece dizer que não. A apreciação
de uma obra de arte, a despeito do que acreditava Hume (para quem a empatia era
uma categoria ética central), Kant, Hegel e tantos outros filósofos racistas ou
nazistas como Heidegger, incapazes em geral de admirar algo que não estivesse na
Europa, depende muito fortemente da audiência, da educação do olhar no interior
de uma cultura. Asserir que alguma obra de arte se apresenta por si só como a
expressão mais pura do humano é se comprometer com a tese de que um critério
filosófico pode normatizar todas as apreciações do gosto. Esse critério pode até
fazer sucesso nas revistas especializadas de filosofia, mas estará longe de ser um
ponto pacífico para todas as pessoas concernidas por esse debate.

Com efeito, a despeito das dificuldades que trago, podemos perguntar se não seria
possível treinar a sensibilidade para atingirmos uma espécie de padrão universal.
E, enfim, termos uma base sensível comum para, por exemplo, o exercício da
empatia mais generalizado e capaz, porquanto, de superar as diferenças
recalcitrantes que experenciamos hoje entre diferentes grupos políticos.
No entanto, parece-me que cabe uma questão anterior. Aliás, algumas. Precisamos
de um treinamento estético para o exercício da empatia? Ganha-se mais
politicamente sendo mais empático? É a empatia uma categoria política
incontornável? A empatia tem que ser bilateral, mútua e ser, por assim
dizer, simpatia? São várias indagações, mas vou me permitir voltar à questão do
lugar de fala que serve como uma lupa para recuperar nos discursos os lugares de
poder. Quem pede empatia? Qual o lugar de fala da empatia? Ele é, em geral,
privilegiado. Para retomar o exemplo do texto de Campello é a artista branca
Dana Schutz que se mostra empática em face do sofrimento do jovem negro
Emmett Til; pintado por ela. No entanto, o que alguns movimentos sociais pedem
não é propriamente empatia, mas reconhecimento; o que nos reporta para uma
discussão mais política do que apenas estética. Voltemos para a política.

O desejo de reconhecimento é, em alguma medida, o desejo pela igualdade, mas


por uma forma específica de igualdade. A igualdade que reivindica as mesmas
condições de existência para debelar vulnerabilidades construídas socialmente
(como, por exemplo, ser mais vítima da violência sexual, ser mais objeto de batidas
policiais, ganhar menos do que pessoas brancas do gênero masculino, etc.). Essa é a
razão pela qual os movimentos sociais estão muito mais preocupados, talvez
mesmo absortos, em fortalecer os seus laços identitários, que os permite se
reconhecer como socialmente irreconhecidos nos lugares de poder, do que em
exigir empatia dos setores que historicamente os oprimiram ou mesmo ser mais
solidário com esse tipo de empatia.

Proponho agora uma virada no caminho da discussão do lugar de fala em relação


à questão epistemológica de Campello e mesmo à estética na qual toquei no meu
texto. Inicialmente, é importante ressaltar que a empatia não pode ser protagonista
política porque estaríamos novamente dando protagonismo a quem sempre esteve
no lugar de fala privilegiado, considerando que não tem muito sentido exigir
(moralmente ou politicamente) que os movimentos sociais tenham empatia por
quem historicamente os oprimiu. No entanto, para as pessoas privilegiadas a
empatia pode desempenhar um papel importante para elas assumirem o seu
próprio lugar de privilégio em determinados lugares de fala e serem capazes de
lidar melhor com a sua própria dívida histórica.
Assim, os movimentos sociais não têm obrigação moral de assumir a empatia como
categoria política, mas podem acolher a expressão da empatia, de quem
historicamente esteve no lugar privilegiado, como arma política de combate a um
inimigo comum, qual seja, os que naturalizam seu lugar de privilégio como
expressão de sua própria identidade.

ÉRICO ANDRADE é professor de Filosofia da UFPE.

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