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Definições
Antes de prosseguirmos, preciso estabelecer definições funcionais do calvinismo
e dispensacionalismo. Em primeiro lugar, ao mencionar calvinismo me refiro,
principalmente, ao sistema teológico relacionado à doutrina da graça ou
calvinismo soteriológico. Incluem-se nessa categoria o calvinismo estrito e o
modificado (i.e, o calvinismo de cinco pontos e o de quatro pontos,
respectivamente). Refiro-me àquele aspecto do calvinismo que trata da natureza
decaída do ser humano e da graça eletiva de Deus.
A lógica teológica
Em concordância com o ímpeto calvinista de olhar teocentricamente a história,
creio que o pré-milenismo dispensacional propõe o mais lógico final escatológico
dos decretos soberanos de Deus quanto à salvação e à história. Visto que os pré-
milenistas dispensacionais consideram as promessas divinas, tanto a da eleição
de Israel quanto a da eleição da Igreja, como incondicionais e certas no seu
futuro cumprimento, tal convicção é lógica e coerente com a Bíblia. Um teólogo
aliancista diria que a eleição de Israel era condicional e temporária. Muitos
calvinistas são teólogos aliancistas que acreditam na incondicionalidade e
irrevogabilidade da eleição dentro da Igreja. Estes entendem que o plano divino
para Israel está condicionado à escolha humana, ao passo que o plano de Deus
para a salvação no âmbito da Igreja é, em última análise, um ato soberano dEle.
Não há simetria em tal lógica. Enquanto isso, os pré-milenistas dispensacionais
entendem ambos os atos como uma expressão soberana do plano divino na
história, que vem a ser uma aplicação coerentemente lógica da vontade
soberana de Deus nas questões humanas.
Qual era a posição de Darby nessa questão? John Goddard comenta que Darby
“cria na predestinação de indivíduos e rejeitava o esquema arminiano de que
Deus não predestinou aqueles que de antemão sabia que se conformariam à
imagem de Cristo”.[10] Em sua “Letter on Free-Will” (i.e., “Carta Sobre o Livre-
Arbítrio”), Darby deixa claro que rejeita esse conceito. “Se Cristo veio salvar o
perdido, o livre-arbítrio não tem mais razão de ser”.[11] “Creio que devamos nos
apegar à palavra”, prossegue Darby, “mas, filosófica e moralmente falando, o
livre-arbítrio é uma teoria falsa e absurda. Livre-arbítrio é um estado de pecado”.
[12] Em virtude de crer na escravidão do pecado, Darby, logicamente, manteve
sua crença na graça soberana como condição para a salvação:
O desdobramento desse princípio da graça soberana é tal que sem ele ninguém
seria salvo, pois não há quem entenda, não há quem busque a Deus, nenhuma
pessoa que, por seus próprios esforços, consiga um dia ter vida. O julgamento
baseia-se nas obras; a salvação e a glória são fruto da graça”.[13]
Outra evidência do calvinismo de Darby é que ele, pelo menos em duas ocasiões,
foi convidado por calvinistas não-dispensacionalistas para representá-los na
defesa do calvinismo. Um dos biógrafos de Darby, W. G. Turner, registrou a sua
defesa no debate ocorrido na Universidade de Oxford:
Foi numa data mais remota (acredito que em 1831) que F. W. Newman convidou o
Sr. Darby para ir a Oxford: um momento memorável por sua refutação pública
dos argumentos levantados pelo Dr. E. Burton que rejeitavam as doutrinas da
graça defendidas pelos reformadores e sustentadas não somente por Bucer, P.
Mártir e pelo bispo Jewell, mas também pelos artigos IX-XVIII da Igreja Anglicana.
[14]
De minha parte, em sã consciência, reputo como sábio o artigo XVII. Talvez possa
dizer que se trata da mais sábia e condensada declaração humana, que eu
conheça, sobre o conteúdo em questão. Estou plenamente satisfeito em
interpretá-lo em seu sentido literal e gramatical. Creio que a predestinação para a
vida é o propósito eterno de Deus, por meio do qual, antes que os fundamentos
do mundo fossem estabelecidos, Ele decretou firmemente salvar dentre a raça
humana aqueles que escolhera em Cristo, pelo Seu conselho que nos é secreto, e
apresentá-los, por intermédio de Cristo, como vasos de honra, para a eterna
salvação.[18]
Até esse ponto na história, aqueles que eram de tradição arminiana e wesleyana
estavam mais interessados nas questões relativas à santificação pessoal no
presente, do que à atenção calvinista em explicar a obra soberana de Deus no
decurso da história. Contudo, o surgimento da controvérsia fundamentalista-
liberal na década de 1920 despertou um interesse pela defesa da Bíblia contra os
ataques anti-sobrenaturalistas dos críticos liberais, que ultrapassava o âmbito do
calvinismo. O dispensacionalismo foi visto como uma resposta bíblica e
conservadora ao liberalismo, não apenas no meio fundamentalista, mas também,
e cada vez mais, entre os pentecostais e outros grupos. Timothy Weber faz a
seguinte observação:
Conclusão
O dispensacionalismo é mais bem entendido como um sistema teológico que
compreende Deus como o Soberano Governante dos céus e da terra e a história
como uma lição na concretização da glória de Deus exibida tanto no céu quanto
na terra.