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ATIVIDADE AVALIATIVA II
Atendo-nos apenas aos sermões, podemos acreditar haver uma concepção de linguagem
em tudo destoante do discurso clássico a que os autores deram o nome de discurso
engenhoso ou de agudeza. Partindo dessa afirmação, dos textos apresentados em sala de
aula e do trecho acima, examine em um breve ensaio as características do discurso
engenhoso, principalmente, qual a concepção da língua/linguagem implícita na
produção dos sermões e na efetivação de seus resultados práticos nos ouvintes.
Utilize trechos de sermões, em especial o Sermão da Sexagésima e o Sermão de Santo
Antônio do Padre Antônio Vieira para apoiar sua análise.
O discurso engenhoso é um elemento considerado importante da expressão
barroca. Diz respeito à habilidade do artista e ao domínio das convenções poéticas. De
acordo com Saraiva (1999), ao discurso engenhoso: “Interessava menos a representação
do real do que a arte criada pelo puro engenho. A agudeza, mãe do engenho, não se
confunde com juízo, que serve para discriminar o verdadeiro do falso.” (p. 73).
É possível inferir, a partir da fala de Saraiva, o afastamento proposital da
realidade no discurso engenhoso. Ao poeta engenhoso cabe ter agudeza, ou seja, engenho.
A agudeza é demonstrada pelo domínio da linguagem e pelo diálogo com os códigos
artísticos estabelecidos, como, por exemplo, a criação de cadeias de imagens
correspondentes, o paralelismo, a correspondência entre dois elementos diferentes, por
imagens simétricas ou contrastes, o emprego da hipérbole, o preciosismo das imagens e
o falar com propriedade, usando as palavras mais adequadas possíveis para o que se deseja
exprimir.
No discurso engenhoso, o emissor aumenta suas possibilidades de
convencimento e sua capacidade de persuasão, operando uma influência sobre o receptor.
O emissor torna-se detentor de uma autoridade somente conferida pela suposta
ascendência que ele adquire ao dominar um discurso que o outro não é capaz de contestar.
Os sermões do Padre Antônio Vieira foram instrumentos expressivos de sua
reflexão sobre questões de seu tempo e demonstram o exercício do discurso engenhoso,
como pode ser vislumbrado neste trecho do Sermão da Sexagésima:
Será porventura o não fazer fruto hoje da palavra de Deus, pela circunstância
da pessoa? Será porque antigamente os pregadores eram santos, eram varões
apostólicos e exemplares, e hoje os pregadores são eu e outros como eu? Boa
razão é esta. A definição do pregador é a vida e o exemplo. Por isso Cristo no
Evangelho não o comparou ao semeador, senão ao que semeia. Reparai. Não
diz Cristo: Saiu a semear o semeador, senão, saiu a semear o que semeia. Entre
o semeador e o que semeia há muita diferença: uma cousa é o soldado, e outra
cousa o que peleja; uma cousa é o governador, e outra o que governa. Da
mesma maneira, uma cousa é o semeador, e outra o que semeia; uma cousa é
o pregador, e outra o que prega. O semeador e o pregador é nome; o que semeia
e o que prega é ação; e as ações são as que dão o ser ao pregador. Ter nome de
pregador, ou ser pregador de nome não importa nada; as ações, a vida, o
exemplo, as obras são as que convertem o mundo. O melhor conceito que o
pregador leva ao púlpito, qual cuidais que é? É o conceito que de sua vida têm
os ouvintes. Antigamente convertia-se o mundo, hoje por que se não converte
ninguém? Porque hoje pregam-se palavras e pensamentos, antigamente
pregavam-se palavras e obras. Palavras sem obras são tiro sem bala; atroam,
mas não ferem. A funda de Davi derrubou o gigante, mas não o derrubou com
o estalo, senão com a pedra. As vozes da harpa de Davi lançavam fora os
demônios do corpo de Saul, mas não eram vozes pronunciadas com a boca,
eram vozes formadas com a mão. Por isso Cristo comparou o pregador ao
semeador. O pregar, que é falar, faz-se com a boca; o pregar, que é semear,
faz-se com a mão. Para falar ao vento, bastam palavras; para falar ao coração,
são necessárias obras. Diz o Evangelho que a palavra de Deus frutificou cento
por um. Que quer isto dizer? Quer dizer que de uma palavra nasceram cem
palavras? Não. Quer dizer que de poucas palavras nasceram muitas obras. Pois
palavras que frutificam obras, vede se podem ser só palavras! (p. 19).