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A CONSTRUÇÃO DE CÔNICAS E

O TEOREMA DE PASCAL

Lenimar Nunes de Andrade


UFPB – João Pessoa, PB

Introdução
As curvas planas conhecidas como cônicas são estudadas desde a
antigüidade e podem ser obtidas como interseção de um cone circular reto
com um plano. Elas têm propriedades geométricas notáveis, algumas
delas relacionadas com fenômenos físicos, com órbitas dos planetas em
torno do Sol ou com trajetórias de projéteis, entre outras ([1] e [2]).
Um dos axiomas da Geometria euclidiana afirma que “dois pontos
distintos determinam uma única reta”. Uma afirmação análoga para
circunferências seria: “três pontos não colineares determinam uma única
circunferência”. Este artigo é sobre a quantidade mínima de pontos
necessária para determinar, de forma única, uma cônica e sobre sua
construção geométrica.

Determinando quantos pontos definem uma cônica


Sabemos do estudo da Geometria Analítica plana que a equação de
uma reta é da forma ax + by + c = 0 , onde a ≠ 0 ou b ≠ 0 . Dividindo
essa equação por a ou por b, temos que qualquer reta no plano tem
equação da forma x + Ay + B = 0 ou da forma Ax + y + B = 0 .
Conhecidos dois pontos distintos da reta, basta substituir esses pontos em
uma dessas duas equações para se obter um sistema linear 2 × 2 , cuja
resolução fornece os valores de A e B. Dessa forma, verificamos
analiticamente que dois pontos distintos determinam uma única reta.
Analogamente, a partir da equação geral de uma cônica (ver [3],[5]),
Ax 2 + By 2 + Cxy + Dx + Ey + F = 0 , onde A ≠ 0 ou B ≠ 0 ou C ≠ 0 ,
é possível provar que dados cinco pontos quaisquer do plano existe uma
única cônica determinada por eles. Não é nosso objetivo e não faremos a
demonstração desse resultado aqui.

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No que segue, vamos supor que nos cinco pontos dados não existam
três alinhados, mas vale ressaltar que o teorema de Pascal, enunciado a
seguir, é válido para qualquer cônica definida pela equação anterior.

O teorema de Pascal
Blaise Pascal, matemático, físico e filósofo francês do século XVII, foi
o inventor, entre muitas outras coisas, da máquina de calcular e tem seu
nome associado ao triângulo aritmético formado pelos números
binomiais. Seu primeiro livro, escrito aos 16 anos de idade, foi o Essai
sur les coniques (Ensaio sobre as cônicas). Um dos resultados mais
importantes descobertos por Pascal foi o seguinte:
Teorema de Pascal: Em um hexágono inscrito em uma cônica, as retas
que contiverem os lados opostos interceptam-se em pontos colineares.
Em um hexágono definimos lados opostos como sendo os lados que
estão separados por dois outros lados. Nessa definição, não importa se o
hexágono é convexo ou não. Por exemplo, num hexágono ABCDEF os
pares de lados opostos são ( AB, DE ) , ( BC , EF ) e (CD, FA) .
Nas figuras da página seguinte, temos um hexágono P1 P2 P3 P4 P5 P6
inscrito em uma elipse e em uma hipérbole, respectivamente. Em
qualquer caso, observe que os pares de lados opostos são ( P1 P2 , P4 P5 ) ,
( P1 P6 , P3 P4 ) e ( P2 P3 , P5 P6 ) e que as retas que contêm esses lados
interceptam-se nos pontos colineares A, B e C.
O teorema de Pascal pode ser verificado facilmente em alguns casos
particulares simples, por exemplo, quando a equação da cônica for do tipo
xy = 1 ou y = x 2 ou x 2 + y 2 = 1 . O caso geral pode ser reduzido a
esses por mudanças de variáveis no plano que levam retas em retas.

Construindo a cônica que passa por cinco pontos dados


O teorema de Pascal é a base do funcionamento de um algoritmo para
a construção de uma cônica que passa por cinco pontos dados, desde que
quaisquer três deles não sejam colineares.
Dados os pontos P1 , P2 , P3 , P4 e P5 , queremos obter um outro

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ponto P6 da cônica. Para isso, basta determinar o ponto A de
interseção das retas P1 P2 e P4 P5 e considerar uma reta qualquer r
que passe por ele (veja figuras abaixo).
C
Seja B a
interseção de r
com a reta P3 P4 e
C a interseção de r A
com P2 P3 .
r
P3 P4 P5
O sexto ponto da B
cônica, o P6 , é P2
definido como
sendo a interseção P1
das retas BP1 e P6
CP5 .

Girando-se a reta r por


r P4 uma volta completa em
torno do ponto A, obtemos
P1 A todos os pontos da cônica.

B P2
P5 Nota:
Um pequeno programa de
C P6 computação, elaborado para
P3 colocar em prática o que foi
mencionado neste artigo, está
disponível na Internet no
endereço
fttp://mat.ufpb.br/pub/mat/conicas.zip

Referências bibliográficas
[1] ÁVILA, G. A hipérbole e os telescópios. RPM 34, págs. 22-27, 1997.
[2] WAGNER, E. Por que as antenas são parabólicas? RPM 33, págs. 10-15, 1997.
[3] WEISSTEIN, E. Conic Section – from Eric Weisstein’s World of Mathematics. Internet em
http://mathworld.wolfram.com/ConicSection.html, 2000.
[4] VALLADARES, R. J. C. Elipse, sorrisos e sussurros. RPM 36, págs. 24-28, 1998.
[5] BOULOS, P. e Oliveira, I. C. Geometria Analítica – Um tratamento vetorial. Mc Graw-Hill.

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VOCÊ SABIA?

Que a maior potência do número primo p que divide

exatamente o coeficiente binomial  a + b  é igual a p c ,


 b 
onde c é o número de vezes em que “vai um” quando se
somam a e b escritos na base p?

Exemplos:
1) Se p = 3 , a = 6 e b = 4 , então  a + b  = 210 = 3 × 70 , de modo
 b 
que c = 1 . De fato:
a = 6 = 2 × 31 + 0 × 3 0 = ( 20) 3 , b = 4 = 1 × 31 + 1 × 3 0 = (11) 3 ,
a + b = 2 × 31 + 0 × 3 0 + 1 × 31 + 1 × 3 0 =
= 3 × 31 + 1 × 3 0 = 1 × 3 2 + 0 × 31 + 1 × 3 0 = (101) 3 , e
20
na soma 11 “vai um” uma vez.
101

2) Se p = 2 , a = 7 e b = 2 , então  a + b  = 36 = 3 2 × 2 2 , de modo
 b 
que c = 2 . De fato:
a = 7 = 1 × 2 2 + 1 × 21 + 1 × 2 0 = (111) 2 , b = 1 × 2 1 + 0 × 2 0 = (10) 2 ,
a + b = 1 × 2 2 + 2 × 21 + 1 × 2 0 = 1 × 2 3 + 0 × 2 2 + 0 × 2 1 + 1 × 2 0 = (1001) 2
111
e na soma 10 “vai um” duas vezes.
1001
Um bom desafio é demonstrar esse resultado, devido a Kummer,
algebrista alemão do século XIX.

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