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Licenciatura em Espanhol

Teoria da Literatura II
Ana Santana Souza e
Ilane Ferreira Cavalcante

Mito e texto narrativo

Aula 05
INSTITUTO FEDERAL DE
EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA
RIO GRANDE DO NORTE
Campus EaD

GOVERNO DO BRASIL TEORIA DA LITERATURA II


Aula 05
Presidente da República Mito e texto narrativo
DILMA VANA ROUSSEFF
Professor Pesquisador/conteudista
Ministro da Educação
ALOIZIO MERCADANTE ANA SANTANA SOUZA E
ILANE FERREIRA CAVALCANTE
Diretor de Ensino a Distância da CAPES
JOÃO CARLOS TEATINI Diretor da Produção de Material
Didático
Reitor do IFRN ARTEMILSON LIMA
BELCHIOR DE OLIVEIRA ROCHA
Coordenadora da Produção de
Diretor do Câmpus EaD/IFRN Material Didático
ERIVALDO CABRAL ROSEMARY PESSOA BORGES

Diretora Acadêmica do Câmpus EaD/IFRN Revisão Linguística


ANA LÚCIA SARMENTO HENRIQUE HILANETE PORPINO DE PAIVA

Coordenadora Geral da UAB /IFRN Coordenação de Design Gráfico


ILANE FERREIRA CAVALCANTE LEONARDO DOS SANTOS FEITOZA

Coordenador Adjunto da UAB/IFRN Diagramação


JÁSSIO PEREIRA MARÍLIA PAIVA

Coordenador do Curso a Distância


de Licenciatura em Letras-Espanhol
CARLA AGUIAR FALCÃO

Ficha Catalográfica
Aula 5
Mito e texto narrativo

Apresentação
Apresentação e
e Objetivos
Objetivos
Olá! Dando continuidade às nossas reflexões sobre a literatura, nesta aula vamos
discutir um pouco sobre os mitos, sua origem e sua influência para a literatura, tanto
dos mitos tradicionais e primitivos, quanto dos mitos modernos. Pois bem, ao final
desta aula, esperamos que você possa:

●● compreender o conceito de mito;

●● reconhecer a importância dos mitos para a literatura; e

●● conhecer como surgem os mitos modernos.

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Para Começar

Mito de Édipo

Laio, Rei de Tebas e marido de Jocasta, vivia


amargurado por não ter filhos, pelo que, decidiu
consultar o Oráculo, tendo-lhe, este, advertido
que filho que gerasse o haveria de assassinar.
Apesar das advertências, Jocasta engravida e Laio,
quando o bebê nasceu, ordenou a um servo que o
pendurasse pelos pés numa árvore, para que este
morresse. Daí o nome Édipo (que significa pés
inchados).

O servo de Laio, desrespeitando as ordens,


acabou por colocar a criança num cesto e jogou-a
ao rio, acabando este, por ser resgatado por um rei
duma terra distante, que o elegeu como seu filho.
Fig. 01 - Édipo. Este, já homem, também consultou o Oráculo, o
qual o aconselhou a evitar a sua pátria, pois iria
ser o assassino de seu pai e marido de sua mãe.
Desconhecendo as suas origens e pensando-se filho de Pôlibo e Mérope, reis de
Corinto, Édipo decidiu partir rumo a Tebas. Durante o seu percurso, e no meio de
uma encruzilhada, deparou-se com um velho com o qual manteve uma acérrima
discussão acabando por matá-lo.

Chegando a Tebas, decifrou o enigma da Esfinge (monstro com cabeça de


mulher e corpo de leão), que impossibilitava a entrada na cidade, e como nunca
ninguém o havia decifrado, a Esfinge jogou-se ao mar, tendo Édipo libertado a
cidade da sua maldição. Creonte, irmão de Jocasta, havia prometido a mão desta a
quem libertasse a cidade da Esfinge, ganhando assim, Édipo, o direito a casar com
Jocasta, agora viúva.

Casaram. Édipo foi proclamado Rei e tiveram dois filhos e duas filhas,
reinando sem grandes dificuldades, até o dia em que se instala a peste na cidade
e Édipo decide consultar o Oráculo, que lhe refere que a peste cessaria quando
fosse expulso o assassino de Laio. Édipo dispôs-se a encontrá-lo, mas quando se
apercebeu que ele próprio fora o assassino de Laio, seu pai, e o esposo de sua mãe,
e vendo que apesar de fugir contra a profecia, esta acabou por se realizar, arrancou
os olhos e deixou a sua pátria.

Disponível em: http://levitasm.blogspot.com.br/2008/05/mito-de-dipo.html


Acesso em: 21 janeiro 2013.

A narrativa que você acabou de ler é um mito, como o próprio nome já diz.
Conta uma história antiga, de que praticamente todos nós, pelo menos os ocidentais, já
ouvimos contar, falar ou fazer referência. A história de Édipo já fundamentou, inclusive,
um importante conceito da psicanálise. Essa história nasce na cultura grega e explica

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alguns valores que fundamentam essa cultura, principalmente, a ideia de que o destino
está acima da vontade humana. Afinal, o erro de Édipo é tentar fugir ao seu destino,
que estava traçado desde antes do seu nascimento, por um erro cometido por seu
pai contra as leis dos deuses e dos homens e pelo qual os filhos de Édipo também
pagarão.

Sobre mitos como esse e mitos do mundo moderno é que nos debruçaremos
nesta aula. Vamos à aula?

O complexo de Édipo é um conceito criado por Freud, pai da psicanálise, para


explicar a mudança que ocorre na criança ao chegar à segunda infância e ao período
fálico, passando a concentrar a sua atenção libidinosa em pessoas do sexo oposto
no ambiente familiar. Freud utiliza o mito para explicar que há um desejo incestuoso
da criança pela mãe e, consequentemente, um ódio pelo pai nesse período inicial de
formação da sexualidade infantil.
Leia mais em: http://www.brasilescola.com/psicologia/complexo-edipo.htm

Assim é

1. Sobre mito

Mitos são pistas para as potencialidades espirituais da vida humana.

Joseph Campbell, O poder do mito

O conceito de mito sobre que, em geral, ouvimos


falar, é exatamente aquele das histórias antigas, cuja
origem se perde no tempo, e que tentam explicar o sentido
da vida, ou a existência humana. São os mitos fundadores,
aqueles a que o teórico Joseph Campbell se refere e que,
em geral, passam de sociedade para sociedade, de geração
a geração. O teórico Massaud Moisés, por exemplo, em seu
Dicionário de termos literários, informa que o mito é um
Fig. 02 - Mito. conceito amplo que, dependendo da área que o aborda,
pode adquirir diversos significados. Assim, do ponto
de vista antropológico e filosófico, por exemplo, “dizer um mito é proclamar o que
ocorreu ab origine” (MOISES, 1985, p. 342). Sob essa perspectiva, o mito remete a um

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tempo fora da História, caindo numa atemporalidade absoluta e que pressupunha uma
unidade entre os seres e as coisas. Sob esse prisma, “o mito encadeia-se ao sagrado,
traduz o profundo vínculo entre o biológico e o religioso, e contém regras para ação,
descortinadas no rito” (MOISÉS, 1985, p. 343).

Existem inúmeras definições de mito.


Independentemente do que se diga, é inegável que “o
mito explica e sanciona a ordem social e cósmica vigente
numa concepção de mito, própria de uma dada cultura
e explica ao homem o próprio homem e o mundo que
o cerca para manter essa ordem” (MIELIETINSKI, 1987, p.
197). Nas epopeias e tragédias gregas, podemos conhecer
muito dos mitos que circulavam no mundo clásico, como
o de Édipo, que você viu no início desta aula, narrado na
tragédia de Sófocles: Édipo Rei. Geralmente, a narrativa
mítica, de acordo com Mircea Eliade, no livro Mito e
realidade (1972), atribui ao sagrado e ao sobrenatural
a causa da existência de uma realidade. O mito de
Prometeu, por exemplo, em Prometeu acorrentado, de
Ésquilo, explica a origem do conhecimento humano,
Fig. 03 - Prometeu acorren- pois Prometeu roubou dos deuses do Olimpo o fogo
tado. do saber e o levou para a humanidade, possibilitando-
lhe o desenvolvimento. Pela desobediência aos deuses,
Prometeu é acorrentado no alto de um monte e bicado no fígado por uma águia, todos
os dias.

Os rituais de cada sociedade são, na verdade, os mitos postos em ação. O


casamento, por exemplo, percebido como um ritual, é a ideia da convivência em
sociedade, a ideia da reprodução aceita pela sociedade, marcada pela separação
do vínculo do homem com a mãe e da mulher com o pai, a manutenção de uma
organização social. Todos esses princípios sociais, históricos, culturais fundamentam o
casamento como um rito que remete a mitos originais.

No entanto, o mito também pode ser analisado sob a perspectiva da literatura


e, para isso, ele remete à linguagem e, portanto, à narrativa. Aliás, “o aparecimento da
linguagem produziu uma crise nas relações entre o homem primitivo e o mundo; é que
à identidade entre ambos correspondia análoga aderência da palavra à coisa” (MOISÉS,
1985, p. 344). Ou seja, a palavra não designava a coisa, primitivamente, ela era a coisa.
No instante em que a palavra passa a ser uma representação, o pensamento se dissocia
das coisas e instala-se uma separação também entre o humano e o que o cercava, a
natureza.

Para Cassirer (1985), o mito e a linguagem têm uma mesma concepção mental:
o pensamento metafórico. Porém, se antes o mito era uma tentativa de racionalização
sobre as coisas e servia para explicar o mundo e o homem a si mesmo, com a evolução
do pensamento lógico-científico, a relação entre mito e linguagem ficou mais restrita

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ao campo das artes. Na literatura, o mito encontrou seu
lugar. Ela absorve o mito enquanto uma representação da
relação primitiva entre o homem e a natureza. O mito passa
a representar o sentido profundo das coisas e o representa
a partir de uma narrativa.

A presença dos mitos na literatura tem um sentido


de algo fundador e algo também criado a partir dos
modelos primitivos, dialogando, inclusive, com a cultura
que fundamenta a civilização, no nosso caso, a civilização
Fig. 04 - Sófocles. ocidental. São, portanto, elementos constantemente
retomados e fazem parte de nosso inconsciente, pois, como
afirma Campbell:
As literaturas grega e latina e a Bíblia costumavam fazer parte da educação
de toda gente. Tendo sido suprimidas, toda uma tradição de informação mi-
tológica do Ocidente se perdeu. Muitas histórias se conservavam, de hábito,
na mente das pessoas. Quando a história está em sua mente, você percebe
sua relevância para com aquilo que esteja acontecendo em sua vida. Isso dá
perspectiva ao que lhe está acontecendo. Com a perda disso, perdemos efe-
tivamente algo, porque não possuímos nada semelhante para pôr no lugar.
Esses bocados de informação, provenientes dos tempos antigos, que têm a
ver com os temas que sempre deram sustentação à vida humana, que con-
struíram civilizações e enformaram religiões através dos séculos, têm a ver
com os profundos problemas interiores, com os profundos mistérios, com os
profundos limiares da travessia, e se você não souber o que dizem os sinais
ao longo do caminho, terá de produzi-los por sua conta. Mas assim que for
apanhado pelo assunto, haverá um tal senso de informação, de uma ou outra
dessas tradições, de uma espécie tão profunda, tão rica e vivificadora, que
você não quererá abrir mão dele (2013, on line).

Campbell demonstra o quanto os mitos são úteis na construção de nossa


identidade e em nossa formação enquanto sujeitos pertencentes a uma determinada
sociedade e a um determinado tempo. Ele também aponta que essas informações,
trazidas pelos mitos, se misturam com a nossa vida e com as nossas atitudes diárias.
Dessa forma, quanto mais conhecemos sobre esses mitos primitivos, mais temos
consciência de nossa condição humana. Ainda discutiremos sobre o mito, explorando
melhor sua presença na modernidade, antes, porém, faz-se necessário acrescentar,
através da pesquisa, mais alguma coisa ao que aprendemos até agora.

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Mãos à obra

Conhecer os mitos é conhecer também como se constroem os


comportamentos das pessoas e das sociedades. O mito de Lilith está
estreitamente relacionado com a imposição social sobre o comportamento
das mulheres. Você conhece esse mito? Pesquise-o e demonstre como ele
foi manipulado para oprimir as mulheres.

2. Os mitos na modernidade
Com a evolução da sociedade, o impulso criador do homem inventa a mitopoética,
criando mitos a partir da utilização da transfiguração e da junção de mitos originais
e a imaginação criadora de poetas e escritores. Ou seja, nas narrativas fundadoras da
sociedade, como é o caso das narrativas épicas, há uma junção de mitos originais e a
criação de novos mitos por parte dos poetas criadores.

O termo mitopoética significa fazer mitos, o fazer dos mitos, o estudo de como
surgem os mitos.

Sob essa perspectiva, os mitos entram no mundo moderno e se inserem na


psicanálise, por exemplo, fundamentando conceitos importantes, como o do complexo
de édipo, que você observou no início desta aula. Da mesma forma, o teórico Carl
Jung, ao estudar o inconsciente coletivo, revela os arquétipos, imagens gravadas na
mente humana por sucessivas gerações e que explicam comportamentos, valores e
reverberam também em representações sociais como a música e a literatura.

Arquétipos - do grego arché, seria o princípio e tipós, uma impressão,


marca). Seria o primeiro modelo das coisas existentes, ou imagem de alguma coisa,
as antigas impressões sobre algo. É um conceito explorado em diversos campos de
estudo, como a Psicanálise, a Filosofia e a Narratologia.
Leia mais em: http://oficioliterario.com.br/2008/03/03/arquetipos-e-a-criacao-de-personagens/

Muitos mitos da antiguidade são retomados na modernidade, seja em áreas


não literárias, como o complexo de Édipo, elaborado por Freud, como você já sabe,
seja em narrativas mais simples que revisitam os clássicos. Uma bem conhecida é O
ladrão de raios, de Rick Riordan, publicada no Brasil em 2008, que narra as aventuras
do problemático adolescente Percy Jackson, um semideus, filho de Poseidon e uma
mortal, em pleno século XX. O enredo da obra, através dos mitos, promove a discussão
sobre a identidade do jovem protagonista.

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Os mitos também podem ser criados, ou seja, surgirem a partir da imaginação
autoral, do escritor ou do homem moderno. Refletindo sobre o mito na modernidade,
Roland Barthes afirma que o mito, hoje, seria uma “representação coletiva” e se deixa
perceber “nos enunciados anônimos da imprensa, da publicidade, do objeto de grande
consumo” (BARTHES, 1977, p. 11).

Esse mito moderno, ou como afirma


Barthes, contemporâneo, não é perene como
o mito primitivo; ao contrário, é fragmentado,
descontínuo. Ele “não se enuncia mais em
grandes narrativas constituídas” (BARTHES,
1977, p. 11). Assim, diz ele, o mito “está
presente por toda parte onde se faz frases,
onde se conta histórias (em todos os sentidos
das duas expressões): da linguagem interior
à conversação, do artigo de jornal ao sermão
político, do romance (se é que resta algum) à Fig. 05 - Super Homem.
imagem publicitária” (1977, p. 14).

O mito é narrativa. E o que seriam esses mitos descontínuos e fragmentados da


atualidade? Justamente formas de explicar, ou de conviver, com situações e problemas
surgidos em contextos culturais que não conseguiram ainda responder às próprias
contradições.

O mito não está livre da manipulação política e/ou social. Portanto, tem um
fundamento histórico, isto é, não é uma essência. É uma fala escolhida pela história,
portanto, é cultural. Mas, depois de tornada mito, a fala faz parecer natural aquilo
que é cultural. Assim, se o mito é uma invenção, pode ocorrer, em qualquer tempo, a
criação de mitos, ou a revitalização de antigos mitos por novas narrativas, podendo ter
como objetivo, de acordo com Smaniotto (2008, p. 74), “validar os interesses daquele
que conta a história”. É um modo de autoafirmação e de busca do reconhecimento
pelo outro. É o caso das narrativas míticas fundadoras da nação. Europeias, asiáticas,
africanas e americanas, as culturas nacionais têm sempre um mito que explicam seus
costumes.

O mito teria, entre outras, uma função restauradora,


por isso, regimes políticos podem explorá-los. Você, com
certeza, sabe quem é Tiradentes. Ele é um herói que
representa a liberdade na sociedade brasileira. Além de
herói, ele é um mártir, não é mesmo? Pois morreu em defesa
de um ideal durante aquele episódio que conhecemos como
Inconfidência Mineira. Muito bem. Qual a imagem que você
tem desse herói? Seria a exposta na figura 06, a lado?

Esse Tiradentes que aparece na figura 06 tem bigode,


barba, veste uma bata e tem uma corda em volta do pescoço.
Será que ele não lembra mais ninguém que você conheça? Fig. 06 - Tiradentes, o
Observe a figura 07. Notou alguma semelhança? mártir.

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As semelhanças são bem evidentes, não é mesmo?
Ambos possuem um olhar significativo, ambos têm bigode
e barba, ambos trazem, em sua representação visual, as
marcas da morte pelos seus semelhantes. É muito evidente
que a imagem de Tiradentes tenha sido criada a partir
da de Jesus Cristo. Mas, por que isso? Ora, como todos
sabemos, ao estudar História do Brasil, aprendemos que
Tiradentes era um Alferes, ou seja, um militar. Militares
não usavam barba no Brasil, na época. E Tiradentes não
ficou tanto tempo preso a ponto de deixar crescer uma
barba tão grande. Muito provavelmente, a imagem mais
adequada de sua pessoa seria a apresentada na Fig. 08.
Fig. 07 - Jesus Cristo. Evidentemente, ele deveria estar mais mal vestido
e, talvez, com o cabelo solto ou mesmo, com evidentes
marcas de sofrimento ao ser levado à forca. Mas, isso não
justifica a semelhança com Jesus Cristo exposta na figura
06. A questão é que, na passagem da Monarquia para a
República, a nova nação que nascia no Brasil precisava
de mitos, de imagens que representassem o seu valor e
a sua luta pela liberdade. Onde buscar essa imagem?
Evidentemente, em uma sociedade preconceituosa como
a nossa, os mitos não poderiam ser negros nem índios. Os
índios funcionaram muito bem como mitos fundadores
de nossa história, mas não como representações de um
país que se queria republicano, moderno e urbano. Ao
refletir sobre a criação do mito de Tiradentes, Ballaroti
afirma: “Tiradentes não foi criado pela República, mas sua
imagem foi apropriada pelos vencedores, uma vez que o
novo regime necessitava de uma figura forte que apagasse
o então herói D. Pedro I, a imagem forte da monarquia”
(2009, p.202).

Fig. 08 - Tiradentes, o A imagem de Tiradentes, que passa a fazer parte


alferes. dos livros de história a partir de então, é a de um mártir,
associado a Jesus Cristo, posto que nossa sociedade é
cristã. Mas, acima de tudo, representante de valores como coragem e ousadia e de
princípios como a luta pela liberdade.
A República tratou de conferir um rosto ao herói, pois que o mesmo não dei-
xou um retrato. Assim, criou bustos, quadros, data comemorativa e histórias:
Tiradentes pode aparecer como Jesus Cristo (de barba e cabelos compridos)
ou elegante e bonito em sua roupa de alferes. A imagem não importava, mas,
sim, o ideal que Tiradentes representava e que a República queria alcançar
(BALLAROTI, 2009, p. 203).

Por mais que louvemos esse herói de nossa pátria e aquilo que ele representa,
precisamos reconhecer que a sua imagem e a sua história, passada a nós pelos livros

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escolares, passou a fazer parte da História do Brasil a partir do surgimento da República
e foi forjada por ela para representar a nova nação.

De certa forma, é assim que nascem os mitos modernos. Hoje em dia, esses mitos
surgem com ainda mais velocidade, assim como desaparecem e são criados pela mídia,
pois estamos na era da informação, não é verdade?
O jornal, a televisão, revistas e outros meios de comunicação são os inter-
mediários entre a ficção e a realidade. O ponto de partida estaria no real, ter-
ritório fluido e por onde as fabulações têm o seu referente, mas que por uma
série de transformações acabam por ser tornar algo totalmente diferente. As-
sim, temos a construção de mitos a partir da imbricação da esfera do público
na do privado. Os famosos “quinze minutos de fama” disputados por todos
que querem aparecer, são a oportunidade para a transformação de simples
mortais em “imortais” (MACHADO, 2012, p. 25).

Essa criação de mitos, cada vez mais recorrente na contemporaneidade se explica,


em parte, pela imensa força que possui a indústria cultural. Assim, na antiguidade ou
na modernidade, o mito está sempre presente e ele tem uma função importante na
identidade das pessoas e das sociedades, mas falaremos sobre isso em outra aula.

Já sei!

Nesta aula, você estudou o conceito de mito, sua origem e sua reatualização
na modernidade, bem como a criação de novos mitos. Viu que eles são criados, a
princípio, com uma conotação que o associa ao sagrado, como forma de explicação
do mundo ao próprio homem. Com o progresso do pensamento lógico, o mito ficou
restrito ao universo da linguagem metafórica, como a literatura. Porém, ressurge no
conhecimento científico da psicanálise e em outras configurações na modernidade,
mantendo, assim, sua força de construção identitária.

Autoavaliação

Elabore uma definição de mito estabelecendo diferenças entre o mito tradicional


e o mito moderno.

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Referências

BARTHES, Roland. Mudar o próprio objeto. Trad. Carlos Arthur R. do Nascimento. In:
Barthes et al. Atualidade do mito. São Paulo: Duas Cidades, 1977.

CASSIRER, Ernst.. Linguagem e mito. São Paulo: Perspectiva, 1985.

ELIADE, Mircea. Mito e realidade. São Paulo: Perspectiva, 1972.

MIELIETINSKI, E. M. A poética do mito. Tradução de Paulo Bezerra. Rio de Janeiro:


Forense, Universitária, 1987.

MOISÉS, Massaud. Dicionário de termos literários. 4 ed. São Paulo: Cultrix, 1985.

RIORDAN, Rick. O ladrão de raios. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2011.

SÓFOCLES. Édipo rei. Trad. Domingos Paschoal Cegalla. 3ª edição. Rio de Janeiro:
DIFEL, 2005.

BALLAROTTI, Carlos Roberto. A construção do mito de Tiradentes: de mártir


republicano a herói cívico na atualidade. In: Antíteses. Vol. 2, n. 3, jan.-jun. de 2009,
pp. 201-225. Disponível em: <http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/antiteses>.
Acesso em: 21 jan. de 2013.

CAMPBELL, Joseph. O poder do mito. Disponível em: <http://www.culturabrasil.pro.


br/campbell.htm>. Acesso em: 21 jan. de 2013.

ÉSQUILO. Prometeu acorrentado. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/


adobeebook/prometeu.pdf>. Acesso em: 20 jan. de 2013.

MACHADO, Rodrigo Vasconcelos. Mito e imagen em The memory of Pablo Escobar.


In: Revista Lumen et Virtus.Vol.3, n.6, Jan de 2012, pp. 25-38. Disponível em: < http://
www.jackbran.com.br/lumen_et_virtus/numero_6/PDF/MITO%20E%20IMAGEM%20
EM%20THE%20MEMORY%20OF%20PABLO%20ESCOBAR.pdf>. Acesso em: 21 jan. de
2013.

SMANIOTTO, Edgar Indalecio. Mitos Culturais: da autoafirmação de uma identidade


nacional ao reconhecimento internacional. Saber acadêmico, n º 05, jun. 2008, p.
70 – 82. Disponível em: <http://www.uniesp.edu.br/revista/revista5/pdf/8.pdf>. Acesso
em: 14 fev. de 2013.

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Fonte das figuras
Fig. 01 - http://3.bp.blogspot.com/_W5jtq0y8vwA/TFzUW_05tAI/AAAAAAAADJ0/KiAj02pIBmk/s1600/edipoesfingevati-
cano.jpg

Fig. 02 - http://s3.amazonaws.com/data-prod/data/4711/original/Mito%20-%20Avatar.png

Fig. 03 - http://opontodemutacao.blog.com/files/2005/06/prometeu.jpg

Fig. 04 - http://www.superdownloads.com.br/imagens/telas/edipo-rei-sofocles-129664,1.jpg

Fig. 05 - http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI210694-17779,00-JOGADORES+VIRAM+SUPERHOMEM
+COM+HACK+DE+KINECT.htmlFig. 06 - http://www.matutando.com/wp-content/uploads/2008/12/Tiradentes.jpg

Fig. 07 - https://encrypted-tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcQP4Z9Jo5ksgR4ePgiXrhawxUWSeMc7TtetnPmZ_
DXn4Gys5swB0g

Fig. 08 - http://seguindopassoshistoria.blogspot.com.br/2009/09/tiradentes-o-homem-por-tras-do-mito.html

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