Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
2
Favela toma conta
Alessandro Buzo
Patrocínio
Copyright © 2008 Sérgio Vaz
COLEÇÃO TRAMAS URBANAS
curadoria
HELOISA BUARQUE DE HOLLANDA
consultoria
ECIO SALLES
projeto gráfico
CUBÍCULO
FAVELA TOMA CONTA
produção editorial
ROBSON CÂMARA
copidesque
DIANA DE HOLLANDA
revisão
JULIANA WERNECK
revisão tipográfica
ROBSON CÂMARA
B996f
Buzo, Alessandro, 1972-
Favela toma conta / Alessandro Buzo.
-Rio de Janeiro : Aeroplano, 2008.-(Tramas urbanas ; 10)
ISBN 978-85-7820-008-4
1. Buzo, Alessandro, 1972-.
2. Homens - Brasil - Biografia.
I. Título. II. Série.
Nos últimos anos, tenho ouvido falar cada vez mais em globali-
zação. É um termo meio genérico, que muita gente usa sem nem
saber direito o que significa, mas para mim é o fato de que o
mundo parece ficar menor e que as distâncias são percorridas
mais facilmente. É muito comum hoje em dia acompanharmos
as notícias da Europa, consumirmos produtos chineses, ali-
mentos argentinos, roupas americanas e por aí vai. A Internet
chegou de vez pra colocar lenha nessa fogueira. Ao navegar no
universo virtual, tenho acesso a cidadãos iraquianos, estudan-
tes mexicanos, vídeos amadores feitos em toda parte.
8
9
Sérgio Gagliardi
SP maio, 2008
for-
Cap.01
Minha formação
ma-
ção
Cap.01
ação Minha formaçã
Posso dizer, sem medo de errar, que minha infância e adolescên-
cia nada tiveram de diferente das dos moradores das milhares
de periferias espalhadas pelo Brasil. Cresci no Itaim Paulista,
no extremo da Zona Leste de São Paulo, e, acredite, se lá hoje
temos poucas opções de lazer e cultura, nos anos 1970 e 1980
essas opções eram quase zero. Em meio a isso, cresci sendo
um rapaz comum. Morador do Jardim Olga, de onde eu gostava
muito pelos amigos dali – pois o lugar não tinha nem tem nada
de especial –, na rua Francisco Emídio Pacheco, antiga rua 5.
Trata-se de uma travessa da estrada Dom João Nery que liga
os bairros do Itaim Paulista a Guaianazes. Na região do Jardim
Olga, é Itaim ainda. Próximo dali, na favela do Torresmo, é onde
promovo a maioria das edições do meu evento “Favela toma
conta”, que dá título a esta obra – mas disso vamos falar mais
pra frente,14 anos depois. Por enquanto, estamos no início dos
anos 1990, e o jovem Alessandro Buzo de Souza – por muitos
chamado de Alemão, seu apelido de infância – tem 18 anos.
12
Minha formação 13
Por volta de 1987, meu pai se separou da minha mãe, e ela teve
que começar a trabalhar, encarando muita faxina em casa de
1 Chegava.
2 Briga, confusão.
14 Favela toma conta
Minha formação 15
16 Favela toma conta
3 Bagunça.
Minha formação 17
Cap.02
As drogas
o
Cap.02
As drogas
dR
ogas
Além da leitura, sempre gostei muito de música. Curtia samba
– Bezerra da Silva, Zeca Pagodinho, Almir Guineto, Fundo de
Quintal, Leci Brandão, Jovelina Pérola Negra, entre outros – e
também gostava de rock nacional – Titãs, Legião Urbana, RPM,
Barão Vermelho etc. Ainda na infância, conheci a primeira febre
mundial por uma banda, os latinos do Menudo. Eles domina-
ram a cena de um jeito que beirava a histeria e nós, os meninos,
os odiávamos, pelo simples fato de as meninas os amarem. Há
pouco tempo, teve uma febre parecida – talvez um pouco mais
para o público infantil do que para o juvenil –, Os Rebeldes.
20
As drogas 21
A minha relação com meu ex-patrão – com quem hoje não tenho
mais contato – era difícil. Eu acelerava o processo, achava que
merecia ganhar mais, ficava puto porque em muitas vezes ele
não aparecia no dia do pagamento, e noutras ele nos pagava
com cheques de terceiros que davam um puta trabalho de tro-
car. Por isso, eu gastava em bares no Centro para conseguir
pagar com o cheque e pegar o troco – se eu tivesse recebido em
dinheiro, não teria que gastar em bar pra trocar.
não usasse –, ele tinha esse perfil. Sempre nos víamos na pada-
ria, até que um dia trocamos idéia, e nasceu uma grande ami-
zade. No mesmo dia em que nos conhecemos, ele disse que “ia
ali e já voltava” – no caso, foi na sala dele cheirar –, e quando
voltou, perguntei inocentemente:
— Foi aonde?
— Dar um tiro?
Assim, eu seguia minha vida – com tudo para ser preso, morrer,
ou, quem sabe, matar minha mãe de desgosto, se ela sonhasse
com metade das coisas que eu fazia. Mas ela sempre achava
que era mentira – se algum vizinho me cagüetava –, e, quando
me perguntava sobre drogas, eu sempre a enrolava. O fato de,
aos trancos e barrancos, continuar trabalhando, ajudava que
acreditasse em mim. Nunca fiz nada tão errado – roubar, trafi-
car – justamente para não decepcioná-la. Minha mãe sempre
dizia que não nos queria presos, e que, se isso acontecesse,
não nos visitaria e nem leria nossas cartas. O amor que tinha
por ela, de tão grande, me salvou, pois nunca passei de um dro-
gado para coisa pior. Ela morreu sem nunca ter tido uma grande
decepção comigo e, em 2001, quando se foi, eu nem cheirava
mais. Parei em 1997 ou 1998, porque estava namorando a
Marilda – que virou minha noiva, com quem casei e tive meu
único filho. Larguei a cocaína para me casar, não daria para
fazer as duas coisas.
33
O Mulinha é meu amigo até hoje. Há anos não o via, mas, por
esses dias, parei na Silveira Martins para almoçar com a Marilda
e, muito rapidamente, o avisaram que eu estava na área. Ele,
então, colou na lanchonete e, depois que comi, fui à sua sala.
7 Pessoal, galera.
34 Favela toma conta
As drogas 35
me
virand
dando
adical
ente
Cap.03
Virando gen
do gente
mudando d
radicalmen
Passei vários venenos nesse tempo. Quando saí da contabi-
lidade, achava que arrumaria um outro emprego no mesmo
ramo, na mesma função que estava quando saí, chefe de Dpto.
Pessoal, ou ao menos a de auxiliar. Durante muito tempo pro-
curei um trampo nesse ramo, mas nunca encontrei. Queriam
segundo grau completo, queriam a função que dizia praticar na
carteira, mas eu trabalhara mais sem registro do que propria-
mente registrado no antigo trampo.
Eu vacilei, deveria ter dito que sim, depois enrolava para levar
diploma se fosse preciso, mas no ato respondi:
38
Virando gente e mudando de vida radicalmente 39
— É campeão.
Só agüentei trabalhar ali por três meses e vinte dias. Nesse meio
tempo, meu irmão Álvaro entrou para trabalhar de office-boy.
—Refaz essa porra toda, tira cem conto de cada um, cobre o
que falta, e tira pelo menos quinhentos reais pra mim.
—Tirando isso de cada um, eles vão reclamar, dizer que está
errado.
50
1998 – Ano do meu casamento, 51
e as mudanças continuam
Toca o telefone:
—Da onde?
—Gil falando...
e
cr
to
es- Cap.05
Virando escritor
cri-
or
O grande marco da evolução aconteceu recentemente. Escrevo
essas linhas em maio de 2008, quando, há menos de um mês,
minha loja Suburbano Convicto, no Itaim Paulista, completou
um ano. Acabo de contratar meu primeiro funcionário, pagarei a
ele R$ 500,00 mais almoço – e pensar que há um tempo era eu
quem estava atrás de um trampo para ganhar o que pago hoje
para o Eduardo B.Boy.
Foi esse o ano divisor de águas da minha vida: 1998. Pelo bre-
que definitivo na cocaína, pelo casamento com a Marilda, e por
um texto que rabisquei, intitulado “Ferrovia nua e crua”. Tudo ia
bem, trabalho, vida sentimental.
58
Virando escritor 59
60 Favela toma conta
—Tô duro.
De fato, passei a ler cada vez mais. Nesse ano, estou lendo uma
média de três livros por mês. Isso sem forçar a barra, não quero
entrar em nenhum livro dos recordes.
1 Bagunceiros.
64 Favela toma conta
Muita gente fumava, não tinha nem como conhecer todo mundo.
Nossa galera colava num canto do vagão e no meio do mesmo,
na outra ponta eram outras galeras. Isso porque eu pegava um
horário – tipo 18:30h -, mas já no horário seguinte – 18:40h –
haveria outras turmas, e assim por diante. Milhares de maco-
nheiros que só não fumam mais porque, depois que se iniciou a
atual reforma, a polícia caiu em cima. Blitz todo santo dia, gente
passando na TV, câmera escondida, mídia na plataforma. Esses
enquadros eram feitos geralmente na Estação Engenheiro
Goulart, no meio do nada – de um lado, o muro e, atrás, a av.
Assis Ribeiro que não dá vista para a plataforma, do outro, ao
longe, a rodovia Ayrton Senna. Hoje, praticamente acabou o
consumo de droga no trem, ainda que por esses dias eu tenha
visto uma turma da tarde acender um fininho. Bem, depois que
a reforma acabar, aí estará acabado definitivamente.
O nome sempre foi “último vagão”, mas não era bem assim. Pela
manhã – quando saíamos da Zona Leste para o Centro –, era
o último de fato, mas, à tarde, era o primeiro, o do maquinista.
2 Baseado fino.
Encarando a vida e escrevendo a história 65
66 Favela toma conta
Virando escritor 67
Cap.06
Encarando a vida e
escrevendo a história.
v
histó
es-
cre-
vend
tória
A vida continuava dura, só que agora eu estava escrevendo,
narrando essa dureza. O tempo foi passando e o trem um lixo.
Comecei a escrever o tal livro num caderno pequeno, à mão.
70
Encarando a vida e escrevendo a história 71
72 Favela toma conta
— Filhoooooooooo !!!
Aí, até ele tirou barato da minha cara e deixou por menos.
—O que um sofá velho estava fazendo ali nos trilhos ? Por que
nos trilhos do metrô não tem sofá jogado?
76 Favela toma conta
Assim foi por dias, eles me xingando e dando risada pelo fato de
os trens não estarem circulando. Mas, no fim daquela semana,
seria carnaval, e eu viajaria pra praia, precisava mesmo de um
descanso. Fui, curti, bebi, zuei e voltei um dia antes de ter de
ir ao trabalho.
— Estava onde, filho? Não vê TV? Vai demorar uns seis meses
para voltarem a circular.
80
Primeiro Livro 81
82 Favela toma conta
Primeiro Livro 83
Lendo o livro Estou viva – não uso mais drogas, da Bell Mar-
condes, vi que, apesar de eu ter feito menos merda do que ela,
também magoei muito a minha mãe por causa da cocaína,
pois o dinheiro que gastei usando drogas poderia ter lhe dado
uma vida mais digna, o que ela merecia. Mas, assim como a
Bell Marcondes em seu livro, não conseguia brecar a fissura de
usar cocaína. Tinha uma biqueira próxima à estação de trem
do Itaim Paulista – que hoje não existe mais –, e eu simples-
mente não conseguia passar ali com dinheiro no bolso e não
pegar um, dois, três papelotes de cocaína. Custava R$ 10,00
cada – a droga no Brasil é um dos poucos produtos tabelados,
faz anos que o papelote custa dez e a paranga de maconha
custa R$ 5,00.
Quando não tinha grana, pedia fiado, e isso era humilhante, por-
que, antes de liberar, o traficante sempre falava um monte. Um
dia fiquei devendo R$10,00 a um que vendia no trem, pagaria
no dia seguinte. Então, no dia seguinte, colei pra pegar o trem,
e ele me cobrou na frente de um monte de gente. Eu não tinha o
dinheiro e disse:
—Não sei o que fico fazendo aqui, correndo o risco de ser preso.
Vocês não valem a pena.
1 A gíria pode ser usada tanto no lugar de amigo, colega, como no de você ou
alguém.
84 Favela toma conta
O tempo é rei. Esse mesmo cara foi preso, e, depois que saiu
da cadeia, passou a vender produto no farol. Muitas vezes,
me pediu um baseado pra fumar. Eu liberava um fino pra ele e
pensava:
—Mano, faz uma cara que parei de usar farinha, mas, se não me
engano, fiquei te devendo R$10,00. É isso ?
—Se todo mundo que ficou me devendo pagasse como você fez
agora, eu ficaria rico.
Assim ele agiu, me mandou embora por causa dos meus pro-
blemas particulares. Isso me deixou puto da vida. Ele não podia
fazer isso, eu era um bom vendedor, bastava ver a minha colo-
cação – 3º ou 4º lugar em vendas entre 12 vendedores. Ficou
claro pra mim que nenhuma empresa valia a pena, porque você
não tem direito a ter problema e, se tiver, não pode pedir ajuda
no trabalho – vai pedir onde então? O sentimento de que um
88 Favela toma conta
dia não trabalharia mais pra ninguém nasceu ali, mas demorou
anos para eu conseguir concretizá-lo. Hoje, é assim que eu vivo:
sem patrão, gerente ou chefe.
—Alô ?
Houve uma Bienal do livro em que a Rede Globo queria fazer uma
matéria para o SPTV sobre pessoas que queriam lançar seu pri-
meiro livro. Uma editora – não sei qual foi, mas através da qual
eu tentara publicação – indicou o meu. A Globo me procurou e
marcamos de fazer a entrevista na plataforma da Estação Brás,
dos trens da CPTM. Afinal, meu livro falava desse cotidiano, dos
trens da linha F, que acaba de mudar de nome de novo – já foi
Variant, F, e agora é Linha 12. O repórter que foi fazer a entre-
vista comigo era bem conhecido – o Brito Jr. que hoje apresenta
o Programa “Hoje em Dia” na TV Record. Formou-se uma multi-
—Te vi na TV.
A galera não entendeu que o livro ainda não existia de fato, que
estava escrito mas não publicado. Fiquei pensando:
—Como pode o livro já ter tido mídia, ter gente querendo com-
prar, e ele não existir?
—E o livro?
Eu era o cara. Ainda bem que a casa não caiu – isto é, que o
livro saiu de fato –, pois dei minha cara pra bater e, como prefiro
dizer, coloquei o meu na reta.
—Uns R$ 4.000,00 reais por 500 livros – era mais ou menos isso.
Rezei muito para dar certo, senão já estava vendo que o livro
não sairia nunca e teria que dar muita explicação pros amigos,
principalmente no trem. Uns dias depois, ele me chamou, e
disse que o dono, o “todo poderoso”, Sérgio, me receberia. Ele
Primeiro Livro 95
Então, tive uma idéia. Era melhor, agora com R$ 1.000,00, ir dire-
tamente às editoras negociar, em vez de ligar. O Hélio ajudou
de novo, descolando algumas saídas para eu ir às reuniões das
editoras independentes. Acabei fechando com uma que aceitou
os R$1.000,00 de entrada e o restante parcelado. Assim, saiu o
meu primeiro livro.
Outro B.O. – e esse mais grave ainda – é que não teria como
saírem as fotos, encareceria o custo. Dava para serem ilustra-
ções em desenho. Então, peguei aquele do Paraguai – que guar-
dei por mais de seis meses – e acrescentei outros que fiz sob
encomenda com o Magu – meu primo – e um amigo do Jonilson
Montalvão, o Alex. Peguei as fotos que sairiam no livro e pedi
para que eles as desenhassem. O Magu seguiu mais fielmente
o meu pedido, fez alguns desenhos que eram muito parecidos
com as fotos, possibilitando até reconhecer as pessoas. Já o
Alex fez outro estilo, só as usou como base, mas seus desenhos
não eram cópias das fotos. Juntei uns do Magu, outros do Alex,
mais o do Paraguai, e lancei o livro com eles. Para o povo que
esperava as fotos, foi fácil justificar: com elas, o livro ficaria
bem mais caro do que os R$ 15,00 que estava custando. Muita
gente se viu nos desenhos e ficou feliz.
nesse dia – hoje faço matérias para esta revista. Na foto cen-
tral do encarte, tem uma banca nervosa onde eu estou com uma
camiseta do meu livro: O trem. Qual não foi a minha surpresa
quando o CD saiu e, no restante do encarte, um monte das fotos
que esqueci na laje do Helião – o Cia tinha pego. Fiquei dupla-
mente feliz, apesar de não ter nenhuma referência das imagens
serem Itaim paulista muitos pensam que é Pirituba, quebrada
do RZO –, afinal, periferia é periferia em qualquer lugar.
Cap.08
Tudo novo na minha vida.
Chamei o lançamento do meu livro de “Mega evento da peri-
feria”, e comecei a divulgá-lo, sua data e seu local. Este, como
disse, afastado do centro do Itaim Paulista, que já é, pra alguém
que vem de fora, bastante longe.
E não é que deu certo? Por incrível que pareça. Não sei se
naquele tempo era mais difícil alguém da periferia lançar um
livro e isso chamou a atenção, mas descolei duas revistas e um
jornal – fora os de bairro e as rádios comunitárias.
100
Tudo novo na minha vida 101
1 Muito boa.
102 Favela toma conta
Tudo novo na minha vida 103
104 Favela toma conta
Mas, voltando. O resultado dos fax não poderiam ter sido melho-
res: duas matérias de duas páginas em revistas, e mais meia
página no jornal.
—Alô, é do RZO?
O Davi, mais pra frente, tomou uns tiros, quase morreu, e sumiu.
Mas depois apareceu de novo na cena, o revi no 2º “Conduta
na rua”, que apresentei no Largo do Paissandu. Grande figura.
Do Sandrão virei amigão no lançamento. Depois do Helião, colei
várias vezes na famosa laje de sua casa, onde o RZO ensaiava.
Ali, conheci Negra Li, DBS, Tom – hoje, Função RHK –, Wando –
hoje, U TIME – e toda a rapa da familia RZO, que curto demais.
Torço pela volta plena do grupo, coisa que ainda não rolou, mas
deve acontecer.
3 As correrias.
a
Cap.09
Altos e Baixos
baixos
altos
Cap.09
Altos e Baixos
s
Saí da Super do Brasil em 23 de agosto de 2001. Forcei um pouco
a barra para ser mandado embora, porque a firma ia muito mal
das pernas. Faltava muita mercadoria, por isso, estava per-
dendo meus clientes. Em outra firma, poderia batalhar para
ganhá-los de volta, mas antes queria evitar bater de frente com
todos eles. A vantagem desse ramo é justamente a carteira de
clientes, você muda de empresa e ela vai junto. A única coisa
que lhes interessa é o prazo de pagamento – geralmente, 28
dias – e o preço, claro.
110
Altos e Baixos 111
Passei ali quase oito meses, e saí porque não dava mais: cada
vez menos produtos e preços mais caros, cada vez menos
dinheiro no bolso e mais dívidas se acumulando. Tinha ódio
disso, trabalhar tanto e nunca ter grana.
Quanto ao livro O trem, ele foi indo, indo, indo, vendendo de mão em
mão, de mano em mano, até que acabou. Para meus clientes, e em
todas essas firmas pelas quais passei, pouco falava desse meu
lado cultural. Não queria misturar as estações. Sabia que para os
patrões e gerentes de vendas eu era o vendedor, não o escritor.
Além do mais, era muito patrão. Pai, mãe, filho – que era para
ter assumido a responsa da divisão de alimentos mas não tinha
condições para isso, era fraquinho, sem poder de decisão –, e
outras duas ou três filhas. Uma família em crise, várias tretas
entre eles – tipo saindo do padrão classe média e entrando na
classe média baixa –, ou virando pobre. Não sei como estão os
outros, nunca mais os vi depois que saí de lá. Eles tratavam
seus funcionários muito mal. Comigo, era um pouco melhor,
porque eu carregava a divisão de alimentos nas costas, mas,
com o tempo e a crise, os problemas só aumentaram. O cara
fazia que esquecia o dia de me pagar, o Hélio já não era mais o
poderoso chefão – a casa dele ali estava caindo antes da minha
–, mas pra mim também não dava.
1 Passeio, volta.
2003
Cap.10
2003, último ano turbulento
tu
b
le
Cap.10
2003, último ano turbulento
tur-
bu-
ento
Arrumava emprego tão rápido, que uma vez o escritor Ferréz me
disse por telefone:
—Caraio mano, têm uns caras aqui no Capão que passam anos
desempregado, dizendo não encontrar nada, e você sai de um e
em seguida arruma outro.
Nem tudo na vida é tristeza. Duas coisas nessa fase negra foram
positivamente marcantes. Uma foi as fotos de que participei pro
encarte do CD do RZO, outra o convite para participar da Revista
Literatura Marginal. Vamos por parte.
120
2003, último ano turbulento. 121
122 Favela toma conta
Não sei onde descolei o contato, mas liguei e falei com o cara,
que foi logo dizendo que tinha visto meu livro numa livraria.
Pensei que era um caô1 – como diriam os cariocas -, porque
meu livro tinha estado numa única livraria em São Paulo, que o
aceitou em consignação. Isto é, não foi via distribuição normal.
Perguntei, esperando uma mentira como resposta:
—Qual livraria?
Não é que o cara tinha visto mesmo?, afinal era lá que o livro
estava. Nem sei se o Ferréz lembra disso, mas marquei de
conhecê-lo e entrevistá-lo pro jornal Página 1.
1 Mentira.
2003, último ano turbulento. 123
Até hoje acredito que ganhei um status maior por ter partici-
pado desta edição especial da Caros amigos. Afinal, eram os
dez mais da Literatura Marginal, e eu estava entre eles. Mais
pra frente, participei ainda do ATO III da coleção – a última que
saiu – e, posteriormente, do livro: Literatura marginal – Talentos
da escrita periférica, pela Agir Editora, e também organizado
pelo Ferréz.
—Acorda irmão, você não pediu mais uma chance, como Deus
é bom né não nego, mais um dia, todo seu, vamô acordar, vamô
acordar, porque o sol não espera, demorou, vamô acordar.
Não sei em que ano, mas, no meio dessa época, conheci atra-
vés de carta, um pessoal do Rio de Janeiro, do Movimento
Enraizados. Um quarteto: Dudu de Morro Agudo, Neném, Fiell e
Dinho K2. Conheci o Rio através deles, e fui várias vezes à cidade
124 Favela toma conta
2003, último ano turbulento. 125
—Quem gostaria?
Trabalhei um ano e meio na Tabor. Era para ter sido bem mais, só
que fui boicotado pelo fraco gerente Benê, que não tinha capaci-
dade para o cargo e me traiu na situação que narro na seqüência.
—Sim, somos.
Até que chegou o dia da traição. Nem Cristo fugiu da inveja, fui
só mais um que alguém, nessa vida podre de disputa que é uma
empresa de vendas, prejudicou. Esse alguém era o Benê. Um
dia – sexta-feira –, anunciaram que teria um churrasco, mas eu
2003, último ano turbulento. 129
ções até o Brás e, dali, o cara de lata pro Itaim Paulista. Fumava
olhando o trânsito, o rio e pensando nas vendas do dia, no pro-
gresso que estava sendo fazer compras também, em tudo isso,
e agradecia a Deus por ter me dado de novo uma chance, um
emprego bacana.
—Se vai sair pega sua toca e seu moletom porque faz dez graus
em São Paulo.
—Mas hoje tinha a reunião com o novo dono. Você não pode ir
embora!
—Benê, calma lá. Você disse hoje pela manhã que teria um chur-
rasquinho, não disse nada de reunião. Eu não sabia, sinceramente.
—Fui demitido.
134
Hip-Hop 135
Tive então uma idéia. Se não descolei uma editora, vou promo-
ver um evento com bilheteria e arrecadar fundos para bancar
o livro independente. Mas quem estará no evento que a galera
pague para ver? Dos que eu tinha contato na época, só pensei
em um nome: RZO. “O trem é assim é assim que é, sem precedê
não pára em pé”. Pra trocar uma idéia dessas, só mesmo pesso-
almente, e liguei pro Helião:
1 Firme e forte.
2 Concordando com alguma coisa; mesmo que dizer sim.
Hip-Hop 137
138 Favela toma conta
Hip-Hop 139
140 Favela toma conta
—Se o Helião disse que vai, tô dentro também. Então, faz assim:
liga pro Davi do Gueto, vê uma data disponível, tira da bilheteria
o dinheiro de uma van pra nóis ir e já é.
3 Abatida
Hip-Hop 141
O show foi demais, mas muita gente entrou de graça, a grana foi
pouca e não deu para fazer quase nada do livro. Usei o dinheiro
para pagar uma correção e mais alguma coisinha, mas o livro
ainda esperaria – e muito – para sair, o que ocorreu em 2004.
Todos os grupos arrebentaram, e o RZO fez uma apresentação
inesquecível, que até hoje muitos comentam. Veio o time com-
pleto: Helião, Sandrão, DJ Cia, Negra Li, Calado, Wando, Tom,
Bem Bom, Davi do Gueto e o reforço da Dina Di do Visão de Rua.
Puta sucesso de crítica na quebrada; todo mundo pirou com o
show bem loko dos caras.
142 Favela toma conta
Hip-Hop 143
144 Favela toma conta
Hip-Hop 145
146 Favela toma conta
Tem gente que pensa que o show do RZO foi o primeiro “Favela
toma conta” mas o “Favela” só nasceu em 2 de maio de 2004. De
toda forma, este show foi o primeiro evento de porte que promovi.
De novo Racionais MCs: “Nem imaginava o que estaria por vir”.
Assim, dia após dia, grupo após grupo, quebrada após quebrada,
fui me envolvendo com o hip-hop e com o rap nacional, que é o
meu barato, nunca curti os gringos. Hoje, 90% dos vários CDs
que tenho são de rap, é o que mais ouço. Mas curto um samba,
reggae, rock. Grandes são as lembranças de ter entrevistado
por telefone – durante quase uma hora – o Bezerra da Silva, e
também de ter visto ao vivo Zeca Pagodinho, Fundo de Quintal,
Hip-Hop 147
148 Favela toma conta
Muitas das coisas que citei nesse capítulo, rolaram nas piores
fases de trampos; ganhando pouco, trabalhando longe ou, por
vezes, desempregado. Ainda bem que não cheirava mais, só
jogava fumaça pro ar, senão tinha dançado.
2
elhor
udança
pra melhor
2004
Antes de minha situação mudar pra melhor, tive que passar por
mais uma fase negra, e das mais dificeis. Aconteceu de, depois
de sair da Tabor, em setembro de 2003, passar seis meses
desempregado. Só que, dessa vez, eu tinha família e a respon-
sabilidade de um filho pra sustentar. A minha esposa sempre
foi guerreira nas fases ruins, essa é uma das razões por que a
valorizo. Mas, mano, que sufoco.
156
2004, ano da mudança pra melhor 157
Fiz uns treinamentos por três dias, e fui para a batalha. Não
era fácil, há anos eu trampava de telemarketing, mas nada a
ver com isso. Nas distribuidoras de alimentos, era minha mesa,
eram meus clientes, e eu só lhes telefonava quando as vendas
estavam fracas, em caso contrário, eles que me ligavam. Tinha
o axé de serem os mesmos clientes, e de vários deles terem
virado amigos – o bate-papo durante o tempo em que eu tirava
um pedido era sobre futebol, bebidas importadas, família, coti-
diano etc. Diferente de na Nick Tell, vendendo assinatura de jor-
nal, pressão pura.
—Alô.
—Tudo.
Nunca esqueci essa frase, nem esse amigo com quem depois
perdi o contato. Isto porque sua namorada, com quem acabou
se casando, não ia com a minha cara, mesmo eu nunca tendo
feito nada pra ela.
Cap.13
Nasce o “Favela toma conta”
asce
favela
toma
conta
Eu estava em ritmo de primeiro mês de trabalho na Logiodice,
superfeliz. Retomei as vendas e os clientes, além de vales tran-
porte e dia 20, ticket refeição, e pagode no quinto dia útil.
164
Nasce o “Favela toma conta” 165
—A gente arruma.
Mas não ache que minha vida virou um mar de rosas, o que
nunca foi e continua não sendo. Hoje tenho quatro livros lança-
dos – este é o quinto –, uma coletânea que organizei e outra que
estou para lançar esse ano – Pelas Periferias do Brasil, vol II. O
meu último livro – Guerreira – foi lançado pela Global Editora,
já com distribuição nacional. Além disso, tenho um quadro –
Buzão – Circular Periférico – no programa “Manos e Minas” –
apresentação Rappin’Hood – na TV Cultura. Ainda assim – com
a realização de 15 edições do “Favela toma conta”, a publicação
de vários livros, o êxito de ter chegado a uma editora grande e
até na TV – não tenho uma grande situação financeira. Claro que
melhorou, não ando mais endividado como na época em que era
empregado. Montei uma pequena estrutura para trabalhar, com
um computador e um notebook – este recém-comprado -, inter-
net banda larga em casa, speed, fax, etc. Isso faz a diferença
e, graças a essa estrutura e a parcerias como a da DGT Filmes,
cheguei aonde estou.
172
A periferia em destaque 173
174 Favela toma conta
Diferente do que pensam alguns, nada pra mim cai do céu, luto
por cada conquista. Lembro das calças remendadas que usava
porque não tinha outra e vejo agora, depois de quase três anos
sendo patrocinado pela Conduta, tendo para escolher. Em vários
aspectos progredi, isso é inegável.
Muita gente hoje diz que sou referência. Não sei como pude me
tornar um nome tão forte, tendo feito tudo tão sem dinheiro.
Realizei várias edições do “Favela toma conta” sem um real
no bolso. Sabe o que é ser a semana do evento, e você não ter
um real furado? Aceito ser referência, porque, se o moleque da
favela não tiver pessoas como eu em quem se espelhar, ele o
A periferia em destaque 175
176 Favela toma conta
A periferia em destaque 177
1 Exibir-se, mostrar-se.
178 Favela toma conta
Acho que esses fatos – e alguns outros que não citei – foram
importantes para a periferia passar a ser vista além dos progra-
mas policiais.
A periferia em destaque 179
1º Cap.15
Primeiro “Favela toma c
Fa
to
co
ma conta”
avela
oma
onta
Em abril de 2004, já tinha o Trio Elétrico do Turco Loco, e passei
a ver quem seriam as atrações para o 1º evento “Favela toma
conta”. Articulei uns nomes, e fiz uns contatos. Chamei o Tribunal
MCs – que conheci naquele show que fiz do RZO –, o DCM – Dois
contra o mundo, da banca do Tribunal –, e os Autênticos MCs –
o primeiro grupo da quebrada que vi ao vivo, anos antes, e que
cantou no lançamento do meu primeiro livro, em 2000.
Tudo foi feito meio de improviso – primeira vez é foda –, por isso,
alguns nomes que estiveram no cartaz não vieram – caso da
banda Tuca & Mell, que viria de graça, mas precisava de trans-
porte para a aparelhagem, e não tinha essa grana. Por causa
182
Primeiro “Favela toma conta” 183
tin
da
on-
inui-
ade
Eram poucos os eventos culturais no bairro. A associação de
que cheguei a fazer parte durou mais alguns meses, fez mais
alguma coisa, depois parou de vez. Outro que surgia – e ainda
existe – se estruturando também era o “Balada Gospel”, do
Pastor Anderson Hip Hop. No dia 29 de maio de 2004 – mesmo
mês do primeiro “Favela” –, ele fez uma edição na favela do
Tijuco Preto, com os grupos Alerta Vermelho, DCM, Tribunal MCs,
Ao Cubo – que nascia ali, mas depois cresceu muito –, King, Rap
Sensation, Fornalha Negra, Lito Atalaia, Projeto Crescer, Êxodo
e Impacto Soul. Colei nessa festa e, tive certeza, teria que conti-
nuar minha caminhada – já pensava no 2º “Favela toma conta”.
190
Continuidade 191
192 Favela toma conta
Continuidade 193
194 Favela toma conta
Não sei por quê, nem como, mas a banca Tribunal MCs/DCM, com
a ausência de algumas atrações, se envolveu na festa e acon-
teceu um fato que chocou e, por conseqüência, tirou o evento
da rua de casa. O B.O. que rolou foi que a banca era enorme e
não sei quem – nem era diretamente do grupo – bolou um mega
baseado de uns 30 gramas de maconha. Quem via na mão do
cara tinha a impressão de que era uma bomba – daquelas de
Continuidade 195
Formação Acadêmica
EXL
Ephezius
Estratégia
Atividade de Rua
Conexão Local
Pânico Brutal
Banka Terror
Tribunal/DCM
Walter Limonada
3ª
Da segunda edição em diante, nasceu um problema que só
recentemente resolvemos, o número de grupos por edição.
200
3ª edição do evento e 201
segundo livro se aproximando
Voltei para Logiodice e tive uma séria conversa com o Sr. Pedro
– um dos donos –, pedi R$ 2.000,00 emprestados, para serem
descontados aos poucos. Ele disse que veria com seus irmãos e
sócios. No dia seguinte, me deu a resposta: me emprestaria 1/3
do valor, cerca de R$ 700,00. Fiquei agradecido, mas onde arru-
mar o restante? Ele então me disse:
Cheguei ao bar e a cena era o Douglas Kim – que nesse dia pas-
sou a ser chamado de Skim – servindo no balcão, e o Dudu de
Morro Agudo na chapa, assando uns hambúrgueres. Os caras
tomaram conta do lugar geral. Resolvi que tiraria eles dali –
senão alguma merda ia dar –, convidei os mais chegados, os
amigos de fora do bairro, para uma pizza na Nova Barão.
1 Aparecer, chegar.
208 Favela toma conta
—E mais tarde tem uma atração surpresa. “Sou vida loka é né jão.”
Eu pedindo direto para sair – ora para ir à editora, ora para dar
entrevista. Meu patrão me apoiava, mas tinha medo de que os
outros funcionários se sentissem no direito de fazer o que bem
entendiam. Fomos levando, e trabalhei durante 2005 todo na
Logiodice. Finalmente, me firmei em uma empresa – apagando
aquela imagem de funcionário que pula de galho em galho –, e
retomei a confiança dos clientes.
212
Um livro por ano e o Buzo crescendo 213
214 Favela toma conta
Um livro por ano e o Buzo crescendo 215
jovem, magra, loira, muito delicada, diria que bonita, e uma sim-
patia. Peguei seus livros, não sei se trezentos ou quinhentos, e
saí dando para quem passava na minha frente. No trem, o distri-
buí para todo mundo do último vagão, pensava “Já que é grátis,
vamos incentivar a leitura onde é preciso”. Amigos de trabalho
na Logiodice ganharam, acho que a firma toda ganhou, por onde
eu passava, distribuía – e divulgava, por tabela – a Babi Akylla.
1 Neste caso, um lugar derrubado, que não seria qualquer um que iria.
216 Favela toma conta
vamo que vamo com o Trio do Turco Louco – que por tabela me
ajudou, mesmo sem eu nunca, até hoje, ter trocado uma idéia
com ele, só tê-lo visto e cumprimentado em eventos – como o
Prêmio Hip Hop Top, para o qual fui indicado duas vezes mas
nunca ganhei.
Fora os que faltaram, eram ainda dez atrações, e foi rap das
13:00h às 22:00h. Favela em peso, casa cheia.
Essa é a hora da verdade das ruas, hora em que o que você plan-
tou será colhido, seja pro bem ou pro mal, dependendo do que
se plantou. Outra vez, no metrô, aconteceu também, mas sobre
essa conto mais pra frente. O cara continuou falando:
—Estava preso com um mano que falava bem pra porra de você
e do evento, ele disse que dançava na parada.
LITERATURA MARGINAL.
LITERATURA PERIFÉRICA.
ca
b-
te-
Desde aquele “Favela” lá de trás, em que eu disse que receberia
livros para a organização de uma biblioteca comunitária, que eu
recebia doações. Em minha casa de dois cômodos, já não cabia
mais nada, impossível. O bom disso é que com tantos livros eu
lia muito, aliás, eu leio muito. Mas chegou uma hora em que a
minha esposa Marilda deu o veredicto:
—Então é sua.
224
Biblioteca Comunitária Suburbano Convicto 225
226 Favela toma conta
O tiozinho motorista:
Biblioteca Comunitária Suburbano Convicto 227
do a
r
nso-
an-
acar-
reira
Dias antes da inauguração da Biblioteca Suburbano Convicto –
em 23 de julho de 2005 –, mais precisamente no dia 16, acon-
teceu o 6º “Favela toma conta”. Pela primeira vez no vão de
entrada da favela, entre o D’Avó e seu Mc Donald’s no estaciona-
mento ao lado desse vão e o Viaduto da China, ao lado da Unidos
de São Miguel. Justamente onde fizemos a terceira edição, só
que, em vez de ser debaixo do viaduto, era nesse vão, entre o
hipermercado e ele.
232
Consolidando a carreira 233
—E o primeiro livro?
O projeto durou um ano. Tinha tudo para dar certo e ter conti-
nuidade, mas infelizmente – para os arte-educadores que per-
deram o emprego – e para as comunidades – nove bairros de
Consolidando a carreira 235
1 Prostitutas.
236 Favela toma conta
que qualquer outro arte-educador, uns nem iam lá, davam suas
aulas e recebiam no banco.
Vamos às atrações.
7º Favela Toma Conta – Especial Dia das Crianças.
12 de Outubro de 2005
Shows com
THAÍDE
Tribunal MCs
Filosofia de Rua
Livre Ameaça
Consolidando a carreira 237
238 Favela toma conta
Consolidando a carreira 239
240 Favela toma conta
Consolidando a carreira 241
Walter Limonada
Conexão Local
Causa P
Ultima Profecia
Realistas NPN – direto de Belo Horizonte-MG
EXL
Autênticos MCs
Almas Errantes
Terror Periférico
Ideológicos.
Nos cartazes tinha ainda Break com Andrezinho – mas ele foi
preso antes – e Eduardo, DJs Zóio – que por várias edições
emprestou suas Pick-ups – e Guga. Fora os doces – foi uma
grande onda distribuí-los –, numa quantidade maior que a do
ano anterior.
Saíram uns ônibus grátis de São Paulo com vários grupos, mas
fui por conta própria. Aproveitei, e passei uns dias com a rapa
do Enraizados que, no dia da premiação, foi em peso ao Canecão
comigo. Pensamos numa grande festa se ganhássemos, mas o
Prêmio na minha categoria foi para o escritor Ferréz – mere-
cido, porque ele veio antes de mim e era minha referência para
242 Favela toma conta
vários corres. Não fiquei chateado, e sim feliz por ele. Para mim,
já havia sido uma honra estar entre os cinco finalistas.
1 Indica dificuldade, podendo se aplicar a alguém que está sem dinheiro também.
246
2006 – Só duas edições do Favela 247
—Não como chocolate. Se não der pra ele, vou dar para outro
mesmo – então, meio sem jeito, aceitei.
—Que bom que está na rua, agora é cabeça no lugar, e bola pra
frente.
2 Mesmo.
3 Gente fina, pessoa bacana, legal.
4 Numa boa.
livr
Cap.22
Livre de vez do sistema e do
trabalho escravo
re
do
Na virada de 2006 para 2007, deixei de vez de vender alimento,
não parava em casa. Com o fim das vendas e das oficinas do
“Fábricas”, o Pádua tendo ido pro Japão e a dificuldade de entrar
grana, me apertei bastante. Mas ia levando. Só tinha de pensar
em como fazer para entrar algum.
256
Livre de vez do sistema e do trabalho escravo 257
1 À luta.
258 Favela toma conta
Oest Rap
Stillo Radical
Holocausto
Depoimento Ocular
Resistência Lado Leste
Mc Tabaco & Elaine
Dez atrações, mais a 11ª que era uma atração surpresa – Realidade
Cruel –, e que quebrou tudo, puta show. Assim, cheio dos proble-
mas, sem grana e na raça, fazíamos mais uma festa de rap.
Dia 28 de julho era nóis que tava de novo na cena. Confira o que
rolou em mais esta edição do “Favela”:
13º Favela toma conta
Dia 28 de Julho de 2007, pela última vez na Santa Bárbara – tínha-
mos que levar o evento de novo pra rua, pra favela.
Shows com
A Família
Criolo Doido
Herança Negra
H2P
NaMaha
Triste Realidade
Herdeiros na Missão
EXL
Posse Enigma
SubMundo Racional
Premonição.
per
Pelas Periferias do Brasil
rias
if
Cap.23
Pelas Periferias do Brasil
rasil
fe-
O ano de 2007 foi foda. Viajei para vários estados, ora como
palestrante e, hoje, como repórter da revista Rap Brasil. Uma
dessas viagens foi para o Acre, onde fui cobrir o “1º Encontro
Norte de Hip Hop”, organizado pelo Augusto.
262
Pelas Periferias do Brasil 263
264 Favela toma conta
uma amiga e a sua filha, antes de pararmos num local que ven-
dia lanche, o superdog – um mega hotdog que daria trabalho
para comer, se não fosse a fome com que eu estava naquela
hora. De lá, fomos conhecer a casa dele, simples e grande, uma
casa em que se via muito respeito e união. Conheci a senhora
sua mãe, que fala na introdução do álbum Tarja Preta. Fiquei
muito emocionado de conhecê-la. Estava também o irmão do
GOG, super gente boa e, fácil de perceber, fã número 1 do GOG.
Ficamos lá até se aproximar a hora de meu vôo. E, então, o GOG
me deixou no aeroporto – valeu, mano, por esse dia.
A fase era muito boa nesse momento. Dez dias depois de lançar
essa importante coletânea, lançava meu primeiro livro por uma
grande editora. O Guerreira saía pela Global e o lançamento era
na Livraria Nobel do Center 3, na avenida Paulista. Não posso
negar, sempre quis lançar numa livraria assim. Depois do sonho
realizado, fomos todos beber num boteco da rua Augusta.
O ano de 2007 estava bom demais para ser verdade, mas era.
E, para fechá-lo com chave de ouro, ganhei pela terceira vez o
Prêmio Cooperifa, e fui indicado pela terceira vez seguida ao
Prêmio Hutúz – na categoria Ciência e Conhecimento. Nesse
ano, eu concorria com o livro Guerreira, o Róbson Canto com
o livro Noite Adentro, Fuzzil com o seu Presente para o Gueto,
além dos documentários É tudo nosso!, do Toni C, e Favela no
Ar, da 13 Produções. A parada era dura, mas dessa vez levei o
prêmio. Estávamos na cidade maravilhosa, no Canecão – local
da entrega do Hutúz–, cheio de gente famosa e a nata do Rap, aí
chegou a vez da nossa categoria. Por dois anos, fiquei no quase,
e, dessa vez, quando anunciado “O vencedor é Guerreira, de
Alessandro Buzo”, fiquei feliz. Na nossa banca, tinha eu, minha
amada Marilda, Dudu de Morro Agudo, Dumontt, Toni Nogueira e
Trutty. Depois, ainda fomos a uma balada comemorar, na Boate
Six, foi da hora.
Assim, se encerrou 2007. Será que ainda tinha alguma coisa pra
melhorar no profissional? “Pior” que tinha. O que até agora falta
melhorar é o pessoal, pois ainda, apesar de estar de boa, não
consegui juntar grana para comprar minha casa. Esta pode ser
no Itaim Paulista mesmo, mas não pode ser de dois cômodos,
porque moro assim há dez anos e não dá mais.
poe
sia
e-
Cap.24
Poesia
v
o jogo
da
vida
Enfim, chegamos a 2008, e o barato ficou loko de vez. Em 2007,
tínhamos – a DGT – apresentado uma proposta de programa
para a TV Cultura: o Buzão – Circular Periférico., E então, no
começo do ano, a TV Cultura nos procurou e fez uma contrapro-
posta. Disse que o quadro Mano a Mano, que o Rappin’ Hood
apresentava no programa “Metropolis”, viraria um programa
de uma hora, o “Manos e Minas”. Então, perguntou se nós não
nos interessávamos por transformar o Buzão num quadro do
programa do Hood. Topamos na hora e, assim, dia 7 de maio
de 2008, estreou na grade da TV Cultura o programa “Manos e
Minas”, com uma hora em horário nobre – 19:30h. O programa é
semanal, e meu quadro quinzenal.
274
2008: segue o jogo da vida 275
O futuro a Deus pertence, mas nada como um dia após o outro dia.
276 Favela toma conta
2008: segue o jogo da vida 277
Imagens:
índice e créditos
CAP. 01
P.14 Buzo na 1ª série.
Foto: arquivo pessoal do autor.
P.15 Rua do Jardim Camargo Velho, Itaim Paulista, anos 1990.
Foto: Alessandro Buzo.
P.17 O pai, a mãe (Luzia Buzo, in memorian) e a sobrinha de
Alessandro Buzo. Foto: arquivo pessoal do autor.
CAP. 02
P.22 Banca da rua Cinco no Jardim Olga.
Foto: arquivo pessoal do autor.
P.24-25 Bar Nhô Bento no Itaim Paulista.
Foto: arquivo pessoal do autor.
P.27 Paulão, Deni e Buzo no Tempo Livre.
Foto: arquivo pessoal do autor.
P.28-29 Buzo na época da contabilidade na Silveira Martins,
no Centro de São Paulo. Foto: arquivo pessoal do autor.
P.34 Marilda Borges. Foto: Alessandro Buzo.
CAP. 03
P.40-41 Os famosos “gatos” na rede elétrica. Foto: Jonilson Montalvão.
P.43 Hospital Santa Marcelina do Itaim Paulista, onde o filho do
autor nasceria em 2000. Foto: Jonilson Montalvão.
CAP. 04
P.53 Buzo, na época de vendedor de alimentos na Super do Brasil.
Foto: arquivo pessoal do autor.
279
CAP. 05
P.59-61 Sebo Mutante. Fotos: Jonilson Montalvão.
P.62 Buzo nos trilhos do trem que o levou à literatura.
Foto: Jonilson Montalvão.
P.65 Antiga Estação Itaim Paulista da CPTM.
Foto: Jonilson Montalvão.
P.66 Reunião de amigos em São Bernardo do Campo.
Foto: Marilda Borges.
CAP. 06
P.71 Manos no trem da CPTM, linha Brás-Calmon Viana.
Foto: Jonilson Montalvão.
CAP. 07
P.81 acima: Buzo com o filho.
abaixo: Evandro, filho do autor. Fotos: arquivo pessoal do autor
P.82 Torcida do “Da Rocha”. Foto: Alessandro Buzo.
P.86 Cido e Buzo em Limeira, Evandro no carrinho.
Foto: Marilda Borges.
P.93 Vários manos no “Favela toma conta”. Foto: Marilda Borges.
CAP. 08
P.102-103 Lançamento do primeiro livro de Alessandro Buzo,
Jardim das Oliveiras (24/12/2000). Foto: Marilda Borges.
P.105 acima: detalhe do lançamento primeiro livro.
Foto: Marilda Borges.
abaixo: Pré-lançamento do primeiro livro no Sebo Mutante.
Foto: Jorge Lins.
CAP. 09
P.112 Itaim Paulista, anos 1960. Foto: arquivo pessoal.
P.116 Marilda Borges, Alessandro Buzo e o pequeno Evandro Borges.
Foto: Jonilson Montalvão.
CAP. 10
P.121 Djair e Buzo, início de carreira, colunista do jornal Página 1.
Foto: Jonilson Montalvão.
P.124 Revista Caros amigos, matéria sobre a literatura das periferias.
Foto: Marilda Borges.
280
CAP. 11
P.136-137 Sandrão (RZO) e Buzo. Fotos: Marilda Borges.
P.138-139 Markão, DJ Cia. e Buzo no “Favela toma conta”.
Foto: Marilda Borges.
P.142 Afrika Bambataa. Foto: Marilda Borges.
P.143 Thaíde. Foto: Marilda Borges.
P.144-145 DMN. Foto: Marilda Borges.
P.147 O 1º prêmio Cooperifa 2005. Foto: Marilda Borges.
P.149 Buzo e Sérgio Vaz na Bienal do Livro. Foto: Marilda Borges.
P.150 Buzo na Câmara dos Vereadores de São Paulo.
Foto: Marilda Borges.
P.152-153 Espaço Enraizados, no Rio de Janeiro. Foto: Marilda Borges.
CAP. 12
P.160 Lançamento do segundo livro na Santa Bárbara no
Itaim Paulista. Foto: Marilda Borges.
CAP. 13
P.167 Povo do rap. Foto: arquivo pessoal do autor.
CAP. 14
P.173 acima: Buzo e Rappin’ Hood, hoje juntos no “Manos e Minas” da
TV Cultura. abaixo: Buzo, Toni C. e Mandrake.
Fotos: Marilda Borges.
P.175 acima: Buzo e Elizandra Souza. abaixo: Buzo, Juliana Penha e
Marques Rebelo. Fotos: Marilda Borges.
P.176 Buzo no extinto programa “Musikaos” da TV Cultura.
Foto: Marilda Borges.
P.179 acima: Buzo e Rodrigo Ciriaco. abaixo: Mano Brown e Buzo.
Fotos: Marilda Borges.
CAP. 15
P.184-185 A favela tomando conta. Foto: Marilda Borges.
P.186 acima: Pádua (que ajudou em várias edições do “Favela toma
conta”), Buzo e Tia Dag (Casa do Zezinho).
abaixo: “Favela toma conta”. Fotos: Marilda Borges.
CAP. 16
P.191 Grupo A Família no “Favela toma conta”. Foto: Marilda Borges.
P.192 Dimenor, Buzo e Terno. Foto: Marilda Borges.
P.193 Buzo declama em “O Autor na Praça”. Foto: Marilda Borges.
281
CAP. 17
P.204-205 Oliveira, Buzo, Sacolinha e Róbson Canto em lançamento de
livro do Buzo no Itaim Paulista. Foto: Marilda Borges.
CAP. 18
P.213 Eduardo B.Boy. Foto: Marilda Borges.
P.214 Léo da XIII e DMA no “Favela toma conta”. Foto: Marilda Borges.
P.217 acima: Manos no “Favela”. Foto: Marilda Borges. abaixo: Buzo
na Feira do Livro, em Porto Alegre. Foto: Arquivo pessoal.
P.220 Buzo em palestra no Corredor Literário da Paulista,
em hotel de luxo. Foto: Marilda Borges.
CAP. 19
P.225 Buzo na Biblioteca Suburbano Convicto que montou na
quadra da Escola de Samba Unidos de Santa Bárbara no
Itaim Paulista. Foto: Marilda Borges.
P.229 Buzo e Walter da Conduta, lançamento livro Guerreira na
Livraria Nobel do Center 3, em São Paulo. Foto: Marilda Borges.
CAP. 20
P.237 Molecada da favela no “Favela toma conta”.
Foto: Marilda Borges.
P.238-239 Expressão Ativa no “Favela toma conta”. Foto: Marilda Borges.
P.240 Thaíde no “Favela toma conta”. Foto: Marilda Borges.
CAP. 21
P.250-251 Buzo e internos da Febem na Bienal do Livro. Foto: Marilda Borges.
CAP. 23
P.263 acima: GOG na loja Suburbano Convicto no Itaim Paulista.
abaixo: Buzo e DMA em Madureira, bairro da Zona Norte
do Rio de Janeiro. Fotos: Marilda Borges.
P.266 acima: Buzo e Falcão no Prêmio Cooperifa. abaixo: Buzo em
Salvador, Bahia com Walê, Nelson Maca e amiga.
Fotos: Marilda Borges.
CAP. 25
P.276-277 Montagem de jornais. Imagens: arquivo pessoal do autor.
sobre
o autor
Alessandro Buzo nasceu em São Paulo e desde sempre mora no
bairro do Itaim Paulista. Está casado há dez anos com Marilda
Borges, com quem tem um filho, Evandro Borges, de oito anos.