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METODOLOGIA DA PESQUISA CONCEITUAL EM PSICOLOGIA

Embora não seja suficiente para caracterizar a complexidade de aspectos que


definem a pesquisa científica, o uso de métodos contribui para dar visibilidade aos
critérios que servirão para aferir a plausibilidade das hipóteses levantadas no decurso da
investigação científica, bem como a confiabilidade dos dados obtidos.
Isso é bastante evidente quando se trata de pesquisas empíricas, pois, neste caso,
a explicitação do itinerário metodológico é um dos principais responsáveis pela
pragmática da pesquisa.
Quando a pesquisa é de natureza conceitual, a questão do método geralmente
perde destaque, conduzindo a ideia de que esse tipo de pesquisa seria refratário à
discussão de aspectos metodológicos.
Isso, muitas vezes, acaba relegando a pesquisa conceitual a um tipo de pesquisa
menor e, alguma vezes, cria suspeitas quanto ao seu próprio status de pesquisa.
Considerando esse panorama, parte-se da ideia de que a pesquisa conceitual
apresenta uma metodologia específica, o que garante não apenas seu status de pesquisa,
mas também seu papel no desenvolvimento da psicologia em geral.

1. OBJETO, OBJETIVO, NÍVEIS DE ANÁLISE E ESCOPO DA


PESQUISA CONCEITUAL

O que é uma pesquisa conceitual? Uma forma de tentar responder a essa questão
consiste em, primeiramente, delimitar o objeto de estudo desse tipo de pesquisa.
Investigações conceituais sempre são relativas a uma teoria particular.
Entendo “teoria” como um corpo coerente de conhecimentos sobre um campo de
objetos, a teoria psicológica pode ser entendida como um conjunto de enunciados verbais
a respeito do campo psicológico.
Os enunciados verbais de uma teoria psicológica compõem uma trama conceitual
ou uma rede de conceitos que fornecem uma definição e explicação dos fenômenos
psicológicos.
Na medida em que a trama conceitual que compõe uma teoria é escrita, a teoria
psicológica pode ser considerada como um texto. Desse modo, a pesquisa conceitual pode
ser definida como uma interpretação da teoria ou do texto psicológico.
Para a construção dessa interpretação, a pesquisa conceitual pode assumir
diferentes níveis de análise da teoria ou texto psicológico.
Em um nível mais restrito, a investigação conceitual interroga e interpela a teoria
psicológica sondando os conceitos nucleares da teoria, seus significados e suas
gramáticas. Trata-se de fazer um escrutínio da teoria psicológica, explicitando as regras
que regulam o uso de conceitos da teoria em diferentes contextos.
A pesquisa conceitual pode partir para um nível de análise sistêmico, mostrando,
que em uma teoria, um dado conceito está associado a outras noções ou conceitos, e que
sua compreensão exige justamente a explicitação dessa rede de relações.
Ainda nesse nível de análise, o conceito pode ser investigado em diferentes textos
de um mesmo autor, dando visibilidade às suas eventuais mudanças e inflexões (isto é,
sua evolução).
Outro nível de análise conceitual seria interpelar os conceitos psicológicos com as
categorias da filosofia, dando relevo às afinidades filosóficas do núcleo conceitual de uma
teoria psicológica.
Isso permitiria filiar o texto psicológico a certos compromissos filosóficos, como
determinadas metafísicas epistemologias, teorias éticas, ideologias políticas, e assim por
diante (cf. exemplos pág. 44).
Mas o esclarecimento conceitual do texto também pode advir de uma análise
histórica dos conceitos, já que eles, e o próprio texto, estão situados em uma dada época
e cultura.
Nessa perspectiva, o conceito é contextualizado em um dado período histórico ou
em diferentes períodos.
Situar o núcleo conceitual do texto em sua moldura histórica significa também
acionar um exame das visões de mundo que vigoravam em uma dada época, sondando
uma gama de aspectos culturais: metafísicos, éticos, estéticos, etc.
Para tanto, a dimensão histórica da pesquisa conceitual faz perguntas contextuais
e procura respostas na história intelectual e cultural do texto.
Assim, a pesquisa conceitual, a depender de suas dimensões de análise, envolve
uma análise intertextual, na qual são examinadas as inter-relações entre texto psicológico,
pressupostos filosóficos e contexto histórico.
Esses diferentes níveis de análise mostram que, do ponto de vista da história,
filosofia e sociologia das ciências, a pesquisa conceitual pode assumir contornos mais
internalistas, quando se volta estritamente para uma análise do uso de um conceito, de
sua rede conceitual, ou de seus pressupostos filosóficos.
Mas quando abrange também a análise histórica dos conceitos, a pesquisa
conceitual pode acabar ofuscando os limites entre internalismo e externalismo.
Tende em vista as suas diferentes possibilidades de análise, uma pesquisa
conceitual exige do pesquisador uma série de habilidades.
Por exemplo, ela requer um relativo domínio da teoria psicológica que se quer
investigar. A depender do escopo da investigação proposta, pode ser demandando: I. o
estudo de um conceito em um único texto de um autor; II. a investigação e um conceito
em vários textos de um mesmo autor; III. o exame de dois ou mais conceitos em um ou
vários textos de um mesmo autor.
Em cada uma dessas propostas de estudo exige-se um grau de familiaridade
distinto com a teoria psicológica sob investigação. Em uma pesquisa ainda mais ampla,
na qual um ou mais conceitos seriam examinados em textos de diferentes autores, o
intérprete teria que dominar as teorias envolvidas nessa proposta de pesquisa.
Supondo ainda que algumas teorias psicológicas podem ser consideradas
científicas, é necessário conhecer as discussões basilares em ciência para situar
minimamente o núcleo conceitual em exame nesse âmbito.
Como a pesquisa conceitual também pode envolver uma intertextualidade, o
intérprete precisa não apenas exibir um razoável nível de domínio com respeito à teoria
psicológica de interesse, mas também ter uma formação mínima em filosofia e história
das ciências.
Já a análise histórica dos conceitos, pode mobilizar algumas técnicas de
investigação típicas do historiador, como o escrutínio de diferentes tipos de documentos.
A depender do nível de complexidade da investigação pretendida, o pesquisador
conceitual precisa, portanto, de uma formação plural, como cientista, filósofo e
historiador, de modo a propiciar um conhecimento suficiente para esclarecer os diferentes
sentidos dos conceitos do texto psicológico.

2. COMPROMISSOS FILOSÓFICOS DA PESQUISA CONCEITUAL:


NOTAS SOBRE INTERPRETAÇÃO
Como discutido anteriormente, o objeto de estudo de pesquisas conceituais em
psicologia é a teoria psicológica ou, mais especificamente, o texto psicológico; e o
principal objetivo desse tipo de pesquisa é esclarecer conceitos que compõem esse texto.
O processo de esclarecimento do significado do texto pode ser denominado
interpretação. Se isso for assim, então, o objetivo de uma pesquisa conceitual em
psicologia seria propor uma interpretação do texto psicológico.
A noção d interpretação, contudo, envolve uma vasta e calorosa discussão a
respeito de sua definição. Neste cenário, três sentidos emblemáticos de interpretação se
destacam:

I. A concepção mais tradicional de interpretação considera que interpretar é


descobrir a intenção do autor do texto; o sentido que ele quis dar ao
escrevê-lo.

A origem de tal acepção remonta à atividade de exegese dos textos bíblicos, que
busca por um sentido verdadeiro e, portanto, único desses textos.
Pode-se dizer, então, que o texto é fechado, ou seja, há apenas um significado ou
itinerário possível, cabendo ao intérprete descobri-lo, trilhando o curso interpretativo
correto.
Uma pesquisa conceitual orientada por essa concepção de interpretação pressupõe
que o significado de um conceito está latente no texto, esperando que um intérprete
qualificado o traga à tona.
Esse modo de considerar a interpretação traz consigo ainda outra característica
clássica: a defesa da autoridade, que, nesse caso, é o intérprete qualificado para desvendar
o verdadeiro significado do texto.
Uma das críticas a essa concepção clássica de interpretação é que a descoberta do
significado originário da obra ou da intenção do autor, em relação aos leitores de seu
tempo, é praticamente impossível.
O leitor, ao interpretar um texto, o faz a partir de sua própria história de vida
pessoal e cultural, não podendo mais captar todas as condições que estavam presentes
quando da gênese do texto.
Mesmo que essa dificuldade possa ser contornada, por meio de um mapeamento
exaustivo de fontes bibliográficas e autobiográficas, ainda resta considerar a possibilidade
de que o texto não seja completamente fechado a interpretações diversas.
Mesmo que a intenção do autor possa ser considerada, tomando por base, por
exemplo, um relato autobiográfico, ainda assim é possível que o texto escape ao controle
do autor, abrindo caminhos interpretativos inicialmente imprevisíveis.
Outra objeção consiste na dificuldade de se tomar uma decisão quanto a quem
descobriu o verdadeiro significado do texto. Além disso, não se pode precisar o momento
exato em que se esgotaram as possibilidades de sentido de um texto.
Uma vez descoberto o sentido verdadeiro dos textos que compõem a obra de um
autor, interpretações ulteriores deveriam se reportar a essa interpretação canônica para
tratar dos mesmos textos, reiterando-a e jamais colocando-a em xeque.

II. Em outro extremo, interpretar passa a ser entendido como o processo de


invenção ou criação dos significados de um texto.

Essa acepção opõe-se em vários aspectos à ideia de que interpretar é descobrir ou


revelar o significado oculto de um texto.
Recorrendo as características irremediavelmente ambíguas da linguagem.
Argumenta-se que tudo o que é dito é passível de ser interpretado de modos diversos e
até mesmo contraditórios.
Desse modo, assume-se que o autor do texto nunca tem controle de todas as
possibilidades de significação por parte de seu intérprete. O texto seria, portanto,
infinitamente aberto: o sentido de um texto nunca poderia ser estabelecido de uma vez
por todas.
Neste cenário, a autoridade do autor é substituída pela liberdade do intérprete, pois
é apenas a leitura do intérprete que dará sentido ao texto. No entanto, não se exige aqui
um intérprete qualificado; qualquer leitura é, em princípio, válida.
Uma das principais críticas a essa proposta é justamente a ênfase exagerada no
leitor ou no intérprete.
Aqui a interpretação aprece repousar única e exclusivamente no processo de
imaginação do leitor. Desse modo, fica difícil encontrar critérios para decisão quanto à
adequabilidade de uma dada interpretação.
Se a primeira concepção de interpretação é excludente, havendo apenas uma única
interpretação possível, a segunda é demasiado inclusiva: qualquer interpretação seria
adequada.
Assumindo que o texto é indefinidamente aberto em suas possiblidades
interpretativas perde-se, por conseguinte, a ideia de que existam interpretações incorretas
ou equivocadas.
Além disso, parece não haver lugar para a disputa ou controvérsia, pois como não
há critério para avaliação dessas diversas interpretações, as contradições que
eventualmente surgirem entre elas não poderão ser enfrentadas.
Essa concepção abre flanco para o completo relativismo na pesquisa conceitual, e
para todos os problemas advindos desse posicionamento, como a falta de uma avaliação
rigorosa das interpretações propostas.

III. Uma terceira posição entende que interpretar é construir um significado


na inter-relação entre autor, leitor e texto.

A noção de construção opõe-se à ideia de que interpretar é descobrir um


significado latente. Dessa perspectiva, seria improcedente buscar, por meio de uma
investigação conceitual o “verdadeiro autor do texto”.
A depender do tipo de fonte em que se baseia a interpretação, como no caso de
correspondências, biografias e autobiografias, é até possível encontrar evidências da
intenção do autor para escrever o texto, mas isso não é a última palavra.
O texto permanece aberto a interpretações que ultrapassem a intenção do autor,
ou seja, o texto pode dizer mais do que o autor do texto quis dizer.
Nesse ponto admite-se que há uma contribuição positiva do intérprete; ele pode
construir sentidos por meio de diversas relações textuais.
Assim, o processo de interpretação pode filiar o texto a tradições de pensamento,
compromissos filosóficos, discussões políticas e outros fatores que foram invisíveis ao
autor do texto, mas que nem por isso são menos possíveis.
Por outro lado, isso não significa que qualquer interpretação é permitida, pois o
texto estabelece limites intransponíveis, a partir dos quais é possível identificar erros ou
equívocos interpretativos.
Assim, o texto exibe certa autonomia em relação ao seu autor, mas também em
relação ao leitor, que não está autorizado a forçar uma interpretação, ou seja, a apresentar
uma interpretação sem o devido amparo textual.
Em outras palavras, o texto é aberto a uma pluralidade de interpretações, mas não
a qualquer interpretação.
O limite ente várias e qualquer é dado ´por critérios de avaliação de uma
interpretação em termos de:
 Consistência lógico-filosófica (se é isenta de contradições, falácias ou equívocos
filosóficos);
 Natureza das fontes (se são fontes primárias, oriundas de edições confiáveis);
 Apoio textual (se é possível identificar claramente as partes do texto que
justificam a interpretação proposta);
 Apreciação crítica da comunidade acadêmica (se, depois de publicada, a
interpretação proposta resiste às críticas).

Em suma, por mais que a pesquisa conceitual possa, genericamente, ser definida
como processo de interpretação de textos, a relação com o objeto de estudo ganha matizes
distintos a depender da concepção de interpretação que orienta a investigação.

3. DIRETRIZES METODOLÓGICAS DA PESQUISA CONCEITUAL

Usualmente, é na sessão de método que surge as principais dúvidas quando se


tenta elaborar um projeto de pesquisa conceitual.
O método demarca, operacionalmente, qual é o caminho investigativo que será
trilhado para a obtenção das informações necessárias para se responder ao problema de
pesquisa ou para atingir os objetivos.
Considerando a necessidade de se mostrar, de modo mais sistemático, como lidar
com o objeto de estudo de uma pesquisa conceitual (o texto psicológico), será apresentada
uma descrição de um procedimento de construção de interpretações de textos.

3.1. SELEÇÃO DOS TEXTOS

Uma investigação conceitual precisa lidar com o texto do autor em sua língua
original. Isso porque nem sempre as traduções fazem justiça ao pensamento do autor.
Recomenda-se que a pesquisa conceitual lide com fontes primárias, no caso, o
texto do autor na sua língua. Resenhas, análises ou discussões elaboradas por
comentadores são fontes secundárias.
Se a leitura do texto na língua original do autor for realmente inviável, uma
alternativa seria buscar traduções comentadas e conhecer as recensões sobre as traduções
dos conceitos mais importantes do texto, mantendo sempre no horizonte suas limitações
para uma investigação conceitual.
O procedimento de seleção de textos de uma pesquisa conceitual depende também
do escopo da investigação. Por exemplo, se se trata de um único autor, do confronto entre
dois ou mais textos de um autor, da relação ente textos de diferentes autores, e assim por
diante.
Depende também do nível de análise pretendido: uso de um conceito, rede
conceitual, compromissos filosóficos, contexto histórico.
A despeito disso, a escolha das fontes sempre será orientada pelo problema de
pesquisa: que texto ou conjunto de textos poderiam conter as informações necessárias
para se alcançar o objetivo da pesquisa?
Em primeiro lugar, é preciso fazer um levantamento da(s) obra(s) do(s) autor(es)
do(s) texto(s) analisado(s). Essa informação pode ser encontrada consultando artigos
específicos, índices de obras completas, edições críticas e outras fontes que apresentam
uma lista dos trabalhos publicados pelo autor.
Como a elaboração de um projeto de pesquisa conceitual já supõe alguma
familiaridade com a obra do autor, a lista de trabalhos publicados pode ajudar a avaliar
se os textos inicialmente considerados para elaborar a pesquisa são suficientes e
adequados para os objetivos propostos.
Além disso, a lista de obras pode ser empregada para justificar a escolha de um
texto específico do autor, mostrando que se trata de um texto emblemático para um
período da obra, ou que marca uma transição importante, e assim por diante.
No caso se pesquisas conceituais que utilizarão um livro ou um conjunto de livros
de um mesmo autor, há um procedimento suplementar para a seleção dos textos. Trata-se
do uso de índice remisso ou index do livro.
Além de ser um recurso bastante útil para a seleção de textos em um livro, a busca
por conceitos em índices remissivos permite a construção de uma rede conceitual.

3.2. PROCEDIMENTO DE INTERPRETAÇÃO CONCEITUAL DE TEXTO:


CONCEITUAÇÃO E ETAPAS

Diferentemente do que acontece com muitas pesquisas empíricas, a descrição de


procedimentos metodológicos em pesquisa conceitual não tem a função de garantir a
reprodutibilidade dos resultados.
Trata-se, isto sim, de mostrar a maneira como uma proposta de interpretação foi
construída, o itinerário interpretativo, abrindo a possibilidade de críticas que apontem
falhas nesse processo, que, se corrigidas, culminariam em uma interpretação alternativa.
O Procedimento de Interpretação Conceitual de Texto (PICT) é uma maneira de
construir interpretações e, portanto, produzir material pertinente ao desenvolvimento de
pesquisas de natureza conceitual.
O PICT é composto por quatro etapas, sendo cada uma delas subdividida em
quatro passos:

A) LEVANTAMENTO DOS PRINCIPAIS CONCEITOS DO TEXO

Esta etapa consiste em listar os principais conceitos citados no texto e defini-los


pautando-se no próprio texto. O problema de pesquisa é o que estabelece, em um primeiro
momento, se um conceito é “principal” ou “secundário”.
Como a etapa exige que os conceitos listados sejam definidos pelo próprio texto,
o que deve ser feito de modo literal, diminuem-se as chances de uma superinterpretação,
ao mesmo tempo em que cumpre o critério de apoio textual da interpretação construída.

PASSO 1: grife e enumere, no texto, os conceitos e doutrinas que julgar


importante (o parâmetro desse julgamento é o problema de pesquisa).
PASSO 2: tente encontrar a definição d cada conceito e doutrina no próprio texto.
Isso significa registrar tudo aquilo que foi dito sobre cada conceito e doutrina, em todas
as partes do texto.
PASSO 3: anote todos os resultados. Transcreva as definições ente aspas, citando
a(s) página(s) e o (s) parágrafo(s) nos quais elas podem ser futuramente localizadas. Para
tanto, numere todos os parágrafos do texto.
PASSO 4: faça uma lista dos conceitos e doutrinas cujas definições não foram
encontradas no texto. Se um desses conceitos indefinidos dor prioritário para o seu
problema de pesquisa, isso indica que o texto não é apropriado e, portanto, você terá que
recorrer a outros textos do mesmo autor.
No caso de doutrinas indefinidas, deve-se buscar definições em obras de
referência, como dicionários específicos e compêndios. Anote a definição e registre que
ela foi encontrada em outra fonte, diferente do texto. Isso será importante para avaliar,
posteriormente, se o autor está considerando ou não essa definição-padrão.

B) CARACTERIZAÇÃO DAS TESES DO TEXTO

Esta etapa tem o objetivo de apresentar o texto em termos de sua estrutura


conceitual, explicitando a articulação de teses. Uma tese é uma afirmação que o autor faz
em relação a um determinado assunto, do qual participam os conceitos da primeira etapa.
A articulação das teses do texto se dá em termos de: 1) teses tradicionais –
afirmações que são feitas por outros autores, teorias ou doutrinas, e que serão discutidas
e criticadas pelo autor do texto; 2) críticas – problemas que o autor do texto menciona em
relação às teses tradicionais; 3) teses alternativas – a(s) proposta(s) do autor para substituir
as teses tradicionais criticadas evitando seus problemas.
A primeira contribuição desta etapa é explicitar o posicionamento do autor em
relação aos conceitos investigados, indicando em que sentidos são defendidos e
criticados.
Além disso, a identificação da estrutura conceitual de um texto evita um dos
equívocos interpretativos mais grosseiros: dizer que um autor está defendendo aquilo que
ele critica, ou vice-versa.
Esta etapa também permite uma avaliação crítica do autor, identificando, por
exemplo, o uso de argumentos retóricos falaciosos para fragilizar adversários, equívocos
cometidos em relação a doutrinas e teorias criticadas, e assim por diante.
Por fim, essa etapa também permite que um perfil do autor seja esboçado,
identificando adversários, compromissos e afinidades filosóficas, e seu estilo
argumentativo.

PASSO 1: escreva as teses tradicionais citadas no texto, identificando a


participação de conceitos e doutrinas listados na etapa anterior. É importante, neste passo,
definir as teses tradicionais com base no texto, atentando para como o autor as apresenta
ou define.
PASSO 2: escreva as críticas dirigidas às teses tradicionais.
PASSO 3: escreva as teses alternativas propostas pelo autor do texto com base na
crítica. Verifique se autores, doutrinas ou teorias são citados como precursores dessa
proposta.
PASSO 4: agrupe em categorias temáticas a articulação entre teses sobre um
mesmo assunto.

OBS: se nesta etapa for identificado que alguma tese que menciona conceitos ou
doutrinas que não foram listados na primeira etapa, volte a ela e tente defini-los.

C) ELABORAÇÃO DE ESQUEMAS

Esta etapa consiste em representar na forma de figuras e/ou diagramas, as relações


entre teses tradicionais, crítica e teses alternativas identificadas na etapa anterior. Os
esquemas ajudam a visualizar a estrutura argumentativa do texto, identificando relações
entre conceitos, doutrinas e teorias, bem como eventuais lacunas e equívocos cometidos
pelo autor.
A ideia é que o esquema seja capaz de substituir o texto original, de modo que sua
visualização seja suficiente para se falar ou escrever sobre o texto sem voltar a ele.

PASSO ÚNICO: faça um esquema geral do texto para evidenciar sua estrutura
conceitual. Isso pode ser feito na forma de tópicos ou de diagramas/fluxogramas com
setas, quadrados e outras figuras.

D) SÍNTESE INTERPRETATIVA

O objetivo dessa etapa é realizar uma síntese das relações conceituais construídas
ao longo das etapas anteriores. Trata-se de produzir um texto interpretativo pautando-se
principalmente nos esquemas elaborados na etapa c).
Se for necessário consultar a todo momento o texto original, talvez seja o caso de
refazer as etapas do procedimento. A ideia é que o pesquisador tenha familiaridade com
o texto sob investigação, sem, contudo, reproduzi-lo, no sentido de transcrever suas
partes.
Portanto, o texto deve ser escrito com linguagem e estilo próprios, discutindo o
texto original, valendo-se, quando for oportuno, de citações diretas, que podem ser
acessadas nos registros da primeira etapa do método.
Esse novo texto deve contemplar as lacunas, as afinidades filosóficas, bem como
outros elementos que foram identificados ao longo do procedimento.

3.3. SISTEMATIZAÇÃO DOS RESULTADOS

Considerando que uma pesquisa conceitual geralmente envolve um conjunto de


textos, cada texto analisado de acordo com o PICT dará origem a uma síntese
interpretativa.
Desse modo, será necessário articular todo o material produzido na forma de um
texto final, cuja organização dependerá do nível da pesquisa, da dimensão da investigação
conceitual proposta e do volume de material produzido. O objetivo desse texto final é
responder à pergunta de pesquisa, dando elementos para tornar a resposta confiável.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Além de uma explicitação metodológica, uma pesquisa conceitual precisa


produzir conhecimento novo, respondendo a uma pergunta de pesquisa.
Trabalhos conceituais que se resumem a repetições, afirmando aquilo que já se
sabe, com palavras diferentes, não seriam propriamente pesquisas.
A mediocridade de algumas análises conceituais, somada à falta de transparência
em relação aos procedimentos metodológicos, contribuem pata que a investigação
conceitual continue não sendo reconhecida como um tipo legítimo de pesquisa
acadêmica.

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