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A PEDAGOGIA DE PAULO FREIRE: DA OPRESSÃO À LIBERTAÇÃO

ROYER, Arcielli1
SILVA, Tânia Pereira da2

Este artigo tem por objetivo fazer uma análise acerca da idéia central do livro intitulado
Pedagogia do Oprimido, cujo autor Paulo Reglus Neves Freire parte do pressuposto de que
vivemos numa sociedade dividida em classes, e os privilégios de uns impedem que a maioria
usufrua dos bens produzidos. Dentro destes bens produzidos está a educação que é em grande
parte excluída da população. Iremos retratar a pedagogia dos dominantes (opressores), que tem
por objetivo a prática da dominação, e a pedagogia dos dominados (oprimidos), esta que precisa
ser realizada na qual a educação surgiria como prática da liberdade. Este movimento para a
liberdade deveria partir dos próprios oprimidos, este que deverá ter consciência crítica desta
opressão e que esteja disposto a transformar esta realidade.
O autor defende que nesta divisão da sociedade, encontramos os opressores e os
oprimidos. O primeiro é responsável por oprimir, desumanizar os demais, que já se adaptou à
essa condição e chegando a sentir medo de uma possível libertação.Após entendermos a relação
opressor e oprimido, que é um conceito importante e indispensável para prosseguirmos com a
nossa análise, iremos tratar agora do concepção bancária de educação.
O autor nos retrata a relação entre os educadores e educandos, uma relação de caráter
puramente narrador. Nesta relação são narrados e dissertados valores, conteúdos ou dimensões
concretas da realidade, e estas narrações tendem à se petrificar, tornar-se de certo modo “morto”
como algo que nunca poderá ser mudado, questionado. O educador, que também pode ser
chamado de narrador, realiza um papel fundamental que se resume em “encher” os educandos
com os conteúdos de sua narração, em que os conteúdos não passam de “pedaços” da realidade,
desconectados e que se fossem juntos formariam uma totalidade com significado ou então algo
completamente alheio a sua realidade, e os educandos que são propriamente ouvintes passivos,
como objetos pacientes.
A partir destas descrições podemos começar a esboçar uma educação, em que sua função
é narrar sempre, uma narração da realidade como se esta fosse algo estático, parado e bem

1
Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE - arcielli@pop.com.br
2
Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE - tania_222@hotmail.com
comportado. É importante informar o modo de utilização da palavra nessa concepção de
educação, que perde seu significado e passa-se à dar maior ênfase no som que ela exerce.
Nessas narrações são utilizados métodos que não oferecem ao educando um entendimento
real do objeto estudado, a sonoridade é mais valorizada do que a força transformadora que a
palavra possa exercer. Inicia-se aqui um processo de memorização mecânica, onde os educandos
são vistos como recipientes que devem ser enchidos, e quanto mais encher os educandos melhor
será a capacidade de trabalho do educador enquanto os educandos se deixarem encher melhores
educandos eles serão.
Neste ato de “encher” os educandos é que se dá o nome de concepção bancária de
educação, onde o depositante (educador) deposita conteúdos nos depositários (educandos). Não
há um relacionamento regado com participação democrática, construtiva e transformadora, e sim
um relacionamento onde o educador faz comunicados (depósitos) e os educandos recebem
passivamente, memorizando e repetindo, desse modo há apenas uma ação oferecida aos
educandos que é receber os depósitos, guardá-los e arquivá-los.
O autor nos mostra que ao realizarem os papéis fundamentais de educadores e educandos,
ambos se arquivam na medida em nesta distorcida concepção de educação não resta espaço para a
criatividade, para a transformação e para o saber, este que é visto como uma doação dos que se
julgam sábios aos que acham que nada sabem, esta doação é encontrada nas manifestações
instrumentais da ideologia dominante. Como grande sábio que é o educador, ele aliena a
ignorância e se mantém em posições fixas, assim sempre será o detentor do saber, ele se põe
frente aos seus educandos reconhecendo na absolutização da ignorância dos educandos a razão de
sua existência e por sua vez os educandos alienados reconhecem na sua ignorância a razão da
existência do educador, negando a educação e o conhecimento como processos de busca.
Nesta relação sendo o educador o sábio e os educandos os leigos, é função do primeiro
levar e transmitir o seu saber aos outros que necessitam dele. Este saber deixa de ser experiência
feito para ser experiência narrada ou transmitida. Como o educador põe em prática sua narração e
o educando apenas memoriza, chega-se à concluir que os homens são seres de ajustamento e
adaptação. À partir do entendimento da palavra o homem pode transformar as coisas ao seu
redor, e para que sejam inseridos no mundo como sujeitos e transformadores dele é necessário
utilizar-se da consciência crítica, consciência esta que não é desenvolvida durante o processo de
arquivamento dos depósitos pelos educandos. E é aqui que encontramos o interesse dos
opressores, pois quanto mais se é anulado o poder de criação dos educandos ou ao menos
diminuídos e crescendo sua ingenuidade melhor poderá se propagar a teoria dos opressores, que
beneficia a eles próprios. Eles buscam melhor adaptar para que seja melhores dominados, desse
modo podemos perceber o motivo ao qual eles são contrários a uma educação que estimula o
pensar. Buscando benefício próprio e dominação dos oprimidos, os opressores se utilizam da
concepção bancária de educação, que pode ser associada a um caráter assistencialista, para ajustar
os oprimidos a essa sociedade organizada e justa, transformando-os em “seres dentro de” em uma
estrutura que os transforma em “seres para outro”.
Encontramos nos próprios depósitos contradições, e se os homens são seres de busca e
eles enquanto seres tentam se humanizar-se, podem em qualquer momento perceber a contradição
que a educação bancária objetiva mantê-los e como uma revolução unir-se para libertar-se. A
educação bancária repelindo o diálogo e o companheirismo do educador para com o educando,
não abre brechas para a atuação de um educador humanista e revolucionário, pois se o educador
superasse a contradição deixaria de ser bancário passaria a estar à serviço da libertação.
Neste contexto de divisão de classes onde a minoria prescreve e a maioria se adapta as
finalidades e interesses da primeira, cada vez mais e mais a minoria prescreve, tendo a certeza
que sempre haverá quem exercer suas idéias, por isso, esse trabalho é realizado desde que o
homem é pequeno, lembramo-nos também que a escola pública é uma instituição gratuita e que
está presente desde cedo na vida das pessoas, e que hoje é obrigatório estar em dia com as
atividades escolares, por isso considera-se fácil de propagar a educação das classes dominantes.
A opressão é tida como um controle esmagador, e a concepção bancária, que a ela serve
de instrumento eficiente, também é conceituada como necrófila, pois ao momento que se toma
por bases conceitos mecânicos, estáticos e espacializados da consciência, assume essa marca de
atração pelo morto, por isso o autor afirma que a opressão nutre-se do amor à morte, sem ao
menos pensar em libertar o pensar, utilizando a ação de vários homens em conjunto com o
objetivo de tornar o mundo mais humano, mais o que vivenciam é justamente o oposto, inibindo
o poder de criação e atuação e ao obstaculizar a atuação dos homens como sujeitos de sua ação
acaba por frustrá-los e consequentemente sofrendo por esta frustração.
É importante ressaltar que muitos educadores exercem a educação bancária sem
perceberem e, é claro que ao ser exposto esta concepção para o povo não se espera que ela seja
extinta, o que se busca é chamar a atenção dos verdadeiros humanistas para essa contradição,
rechaçando a opressão da sociedade revolucionária, esta que se por ventura mantém a prática da
educação bancária estará ameaçada pela reação.
Nesta luta em busca da liberdade, muitos que correm atrás deste ideal acaba por se perder
de seu objetivo, pois eles estão tão envolvidos e recebendo influências dessa educação bancária
que acabam por não perceberem o verdadeiro significado e a força desumanizadora dela, assim
se utilizam dela no esforço de libertar, e para que haja esta libertação é necessário que os homens
não sejam mais alienados e não se mantenham alienados, pois à partir disso é que começa o
processo da humanização, na práxis que implica na ação e reflexão dos homens para transformar
o mundo, uma educação que em momento algum se utilize da dominação e que conceba os
homens como corpos conscientes e na consciência como consciência intencionada ao mundo,
utilizando-se da problematização dos homens em suas relações com o mundo.
E aqui iniciamos uma nova concepção de educação, a problematizadora (libertadora), ela
que tem como base a essência do ser da consciência que é intencionada. Nela não se utiliza dos
atos de depositar, de narrar ou transmitir conhecimentos, nela se supera e extingue a contradição
educador-educando, pois é no ato de companheirismo que se pode obter o diálogo, que é
indispensável na vida das pessoas que buscam o conhecimento e através dele se opera a
superação de que resulta um novo termo, abandona o educador do educando e passa a se utilizar
do termo educador-educando e educando-educador, observando esse novo termo percebemos que
o educador perde a sua função de apenas educar e passa a ser educado enquanto educa, devido a
dialogicidade na relação. Ambos se tornam sujeitos e a autoridade já não é válida. A idéia dessa
concepção de educação é que ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, e como
resultado positivo homens se educam em conjunto através do mundo.
O educador problematizador refaz seu ato de conhecer na possibilidade de conhecimento
dos educandos que passam a ser investigadores críticos como o educador. Cabe ao educador
proporcionar aos seus educandos as condições para que possam sempre superar o conhecimento
já adquirido, instigando-os o caráter reflexivo, num ato de desvelamento da realidade que ocorre
quando através da emersão das consciências resulta na inserção crítica da realidade.
Quando os homens vão se tornando mais críticos e passam a perceber os problemas ao seu
redor, e ao mesmo momento resolvendo-os, acrescem o seu crescimento e passam a estabelecer
uma nova forma de pensar e atuar repletos de autenticidade. A concepção problematizadora, ao
contrário da bancária que desconhece o homem como ser histórico, parte justamente do caráter
histórico e da historicidade dos homens, e isto leva a reconhecê-los como seres que estão sendo
(inacabados), e o próprio homem reconhece esse estar sendo.
O que caracteriza o homem é essa busca pela humanização, e qualquer que seja o ato que
objetiva proibir o homem de buscar sua humanização, a sua vocação histórica, é entendida como
uma violência. Essa busca não acontece no individualismo, mas na comunhão, por isso não há
esta busca onde há opressores e oprimidos. Por motivos já citados, entendemos o porquê a
educação problematizadora não pode servir aos opressores, pois estes seriam questionados a
qualquer conhecimento narrado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Notamos na realização da pesquisa deste livro, que existe uma opressão na nossa
sociedade, e que até os dias de hoje ainda persiste. E ainda dois grupos distintos se encontram
com suas diferenças: um que oprime e um que é oprimido, diante disto o que resta a fazer?
Paulo Freire, acredita que a educação é uma das vias fundamentais para a libertação da
situação opressora dos homens, e esta não pode estar restrita a uma teoria verbalista sem ação. A
ação educativa deve ser construída com bases na práxis humana, na ação e reflexão.
Vemos os homens sendo reduzidos ao estado de coisas, de meros objetos onde são
depositados idéias prontas, mitos de um mundo inexistente. Esta relação cria no homem o
sentimento de “ser menos”, inferiorizado diante da sombra da superioridade do opressor, as ações
caem num mecanismo que visa somente os objetivos da elite dominadora. Por outro lado, muitos
oprimidos não vêem o ato revolucionário como meio de transformar o contexto e sim como meio
de oprimir o outro, de transformar-se de oprimido para opressor.
A relação que deve permear a esta concepção problematizadora é a dialógica, que deve
levar em consideração a visão de cada um enquanto ser inacabado que é, construindo uma síntese
entre as diferenças, os paralelos de cada um. A libertação dos homens só pode acontecer numa
relação que promove a comunhão entre todas as partes, trabalhando com a totalidade, a
desmistificação, temas totalmente contraditórios da ação antidialógica desencadeada pela elite
dominadora.
A proposta da pedagogia do oprimido, vem como uma idéia de teoria construída pelos
oprimidos juntamente a liderança revolucionária para combater a teoria da ação do opressor.
Como fazer uma revolução sem ter ação, teoria e reflexão? A ação revolucionaria só tem real
valor enquanto não se reduz ao verbalismo sem ação, a burocratização, por isto a importância da
práxis.
É de grande valor ressalta o aspecto do homem como sujeito inacabado que promove sua
própria história, através daquilo que pode refletir e agir. É inegável a existência das diferenças de
classes, assim como é inegável também que a revolução não é algo que se dê com tanta
facilidade. O importante nisto tudo é a crença na capacidade dos homens, não os considerando
como meros espectadores de um mundo irreal mais sim como construtores, desveladores dele.
Vemos que esta opção não é fácil, pois os mitos propostos tão fortemente estão impregnados na
nossa sociedade e aqueles que têm a ousadia de combatê-los pode ser visto como um utópico.
Paulo Freire, possui um pensamento muito importante e muito bem elaborado, e como o
mesmo diz.não devemos acreditar que exista quem nasceu para saber tudo e aquele que nada
sabe, aprendemos sempre com os outros e com o mundo e suas relações.
O importante é valorizar o aspecto do diálogo, do ser mais do humano sem acreditar que
existe uma verdade absoluta, uma certeza, uma resposta, sem sectarização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 8ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1980.
FREIRE, Paulo. Conscientização – Teoria e Prática da Libertação uma introdução ao
pensamento de Paulo Freire. 3º ed. Editora Moraes. São Paulo, 1980.
FREIRE, Paulo. Educação Como Prática da Liberdade. 19ª ed. Paz e Terra. Rio de Janeiro,
1989.

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