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5ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS DA

BAHIA

PROCESSO Nº 0000004-02.2014.805.0238-1
CLASSE: RECURSO INOMINADO
RECORRENTE: BANCO MATONE S.A.
RECORRIDA: MARIA JOSÉ FERREIRA ALVES
JUIZ PROLATOR: LUIZA ELIZABETH DE SENA SALES MAIA
JUIZ RELATOR: ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

EMENTA

RECURSO INOMINADO. RESPONSABILIDADE CIVIL.


DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE
PRESTAÇÕES PERTINENTES A EMPRÉSTIMO SEM PROVA DA
CONTRATAÇÃO PELA TITULAR. RESPONSABILIDADE CIVIL
OBJETIVA DO FORNECEDOR NÃO ILIDIDA POR CAUSA
LEGAL EXCLUDENTE. SENTENÇA QUE RECONHECEU A
ATUAÇÃO ILÍCITA, ORDENANDO À INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA QUE RESTITUA, EM DOBRO, DOS VALORES
EFETIVAMENTE DESCONTADOS, CONDENANDO-A, AINDA,
AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO EM VALOR
MODERADO. MANUTENÇÃO INTEGAL DO JULGADO. NÃO
PROVIMENTO DO RECURSO.

Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/95.

Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro,


saliento que o Recorrente, BANCO MATONE S.A., pretende a reforma da sentença lançada
nos autos que ordenou a restituição, em dobro, em favor da Recorrida, MARIA JOSÉ
FERREIRA ALVES, dos valores efetivamente descontados em seu benefício previdenciário
a título de empréstimo sem prova da contratação, condenando-o, ainda, ao pagamento de
indenização por danos morais, no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais).

Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o,


apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros
desta Egrégia Turma.

VOTO

A sentença recorrida, tendo analisado corretamente os aspectos


fundamentais da lide, merece confirmação integral por seus próprios e jurídicos
fundamentos, não carecendo de qualquer reparo.

O intricado conceito da figura do consumidor não se resume ao texto do


art. 2º do CDC, já que nesse mesmo diploma se encontram outras equiparações (arts. 17 e
29), não havendo dúvida de que a parte recorrida se apresenta na condição de vítima do
evento debatido, que, assim, à luz do CDC, deve ser investigado.

Nesse diapasão, sobressai a responsabilidade civil do Recorrente, oriunda


do próprio risco do desenvolvimento de sua atividade econômica, sem olvidar a óbvia
impossibilidade de se compelir a parte consumidora a fazer prova negativa de qualquer
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contratação, atribuindo-lhe, assim, na condição de fornecedor, o ônus de provar causa legal
excludente, algo de que não se desincumbiu.

“A simplificação de procedimentos para agilização da atividade


econômica, em prejuízo da segurança, é risco assumido pela empresa para bem exercer sua
atividade de fins lucrativos. Se houve falha nesse procedimento, advindo dano à vítima, esta
não pode ser responsabilizada, mas a própria empresa, que assumiu o risco de sua
ocorrência ao exercer a atividade econômica”. (TAPR – AC 0244359-0 – (209920) – Foz do
Iguaçu – 6ª C.Cív. – Rel. Juiz Luiz Carlos Gabardo – DJPR 20.08.2004).

Merece salientar ainda que a culpa exclusiva de terceiro não se confunde


com a culpa concorrente. Somente a atuação isolada e exclusiva de terceiro faz desaparecer
a relação de causalidade entre a atuação do fornecedor acionado e o evento danoso,
dissolvendo-se a responsabilidade civil cogitada. Concorrendo de alguma forma para o
resultado lesivo, mediante ação ou omissão, o fornecedor envolvido atrai para si a
responsabilidade integral perante o consumidor pelas consequências advindas, podendo até
mesmo manejar ação regressiva contra quem entender responsável maior, mas não se negar a
responder pelos fatos quando acionado pela vítima, segundo a inteligência do parágrafo
único, do art. 7º, do CDC.

Com isso, não comprovada a culpa exclusiva de terceiro, já que concorreu


para o evento, deixando de verificar a veracidade dos dados que lhe foram apresentados
antes de conceder o empréstimo, nem evidenciada a eventual participação da parte recorrida
na relação contratual discutida, deve a parte recorrente responder pela sua desorganização
administrativa, sendo, portanto, absolutamente acertada a ordem de restituição dos débitos
efetivados indevidamente no benefício previdenciário da parte recorrida, que deverá ocorrer
em dobro, conforme assegurado na sentença guerreada, porque, estando presente
comportamento culposo, incide a regra inserta no parágrafo único, do art. 42, do CDC, a qual
não contempla somente a má-fé.

De igual modo, deve ser mantida a condenação do Recorrente ao


pagamento de indenização pelos inegáveis prejuízos morais sofridos pela parte recorrida.

Encontrando previsão no sistema geral de proteção ao consumidor inserto


no art. 6º, inciso VI, do CDC, com recepção no art. 5º, inciso X, da Constituição Federal, e
repercussão no art. 186, do Código Civil, o dano eminentemente moral, sem consequência
patrimonial, não há como ser provado, nem se investiga a respeito do animus do ofensor.
Consistindo em lesão de bem personalíssimo, de caráter subjetivo, satisfaz-se a ordem
jurídica com a demonstração do fato que o ensejou. Ele existe simplesmente pela conduta
ofensiva, sendo dela presumido, tornando prescindível a demonstração do prejuízo concreto.

Com isso, uma vez constatada a conduta lesiva e definida objetivamente


pelo julgador, pela experiência comum, a repercussão negativa na esfera do lesado, surge a
obrigação de reparar o dano moral.

Na situação em análise, a parte recorrida não precisava fazer prova da


ocorrência efetiva dos danos morais decorrentes dos fatos descritos. Os danos dessa natureza
se presumem, especialmente pela diminuição mensal dos proventos, sem causa legal, não
havendo como negar que, em razão do evento, ela sofreu angústia, desconforto, extrema
preocupação e sensação de impotência, sentimentos que se instalariam em qualquer
indivíduo, decorrentes da atividade negligente do Recorrente.

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Quanto ao valor da indenização, entendo que, não se distanciando muito
das lições jurisprudenciais, deve ser prestigiado o arbitramento do juiz de primeiro grau que,
próximo dos fatos, pautado pelo bom senso e atentando para o binômio razoabilidade e
proporcionalidade, respeita o caráter compensatório e inibitório-punitivo da indenização, que
dever trazer reparação indireta ao sofrimento do ofendido e incutir temor no ofensor para que
não dê mais causa a eventos semelhantes.

In casu, entendo que o MM. Juiz a quo respeitou as balizas assinaladas,


tendo fixado indenização em valor moderado, não caracterizando, assim, enriquecimento
sem causa da parte recorrida, nem ocasionando abalo financeiro ao Recorrente face ao seu
potencial econômico.

Assim sendo, diante ao exposto, voto no sentido de CONHECER e


NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto, confirmando, consequentemente, todos os
termos da sentença hostilizada, com a condenação do Recorrente, BANCO MATONE S.A.,
ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 20% (vinte
por cento) sobre o valor da condenação pecuniária imposta.

Salvador-Ba, Sala das Sessões, 09 de junho de 2015.

Rosalvo Augusto Vieira da Silva


Juiz Relator

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