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ETNOGRAFIA E

QUESTÕES sócio-
AMBIENTAIS:
ESBOÇO DE UMA
ANTROPOLOGIA
SIMÉTRICA DA
PAISAGEM'

Pedro Castelo Branco Silveira

Este artigo tratado uso da etnografia numa do "natural", dando feudos diferentes para
chave teórico-metodológica que procura tra- cientistas naturais e cientistas sociais.
tardas relações entre natureza e cultura como Essa divisão há algum tempo parece ter
uma zona de fronteira entre disciplinas aca- perdido seu poder explicativo3. Assim, se ela
dêmicas. A fronteira abordada, no caso, é não fornece maneiras satisfatórias de tradu-
entre a antropologia e a ecologia. É uma pro- zir o mundo, o saber acadêmico precisa be-
posta de análise sócio-ecológica a partir do ber na fonte do senso comum, do "bom
cruzamento de diferentes formas de produ- senso" de que fala Clifford Geertz (1996), e
ção de conhecimento sobre a paisagem, vis- procurar novas formas de olhar para o mun-
ta como um campo híbrido onde se do. Como veremos à frente, não pretendo te-
relacionam humanos e não-humanos. cer fronteiras radicais entre a produção de
A formulação desta proposta parte de mi- conhecimento científico e não-científico, sen-
nha inserção no campo de estudos que há do na base da pesquisa etnográfica que dife-
não muito tempo passou a se chamar ques- rentes modos de produção de conhecimento
tões sócio-ambientais2, que leva ao questio- serão confrontados.
namento da "divisão acadêmica do trabalho" Mas por que o termo "processos sócio-
que separou o estudo do "social" do estudo ecológicos"? Ele busca fundir o campo do

Pesquisador do Instituto de Pesquisas sociais da Fundação


Joaquim Nabuco; Doutorando em ciências sociais, IFCHI
unicamp. E-mail: pedro.silveira@fundaj.gov.br
'social' e do 'ecológico" numa abordagem e circulação de gado em um ambiente pecu-
unificadora, ao mesmo tempo não-reducio- liar, a savana africana, com seus ciclos sobre
nista (o ecológico determina o social) e fu- os quais as personagens constroem sua no-
gindo de um paralisante relativismo absoluto ção de tempo e espaço. O ambiente, para
(o ecológico é só uma construção). Tarefa Evans-Pritchard, era um cenário onde se de-
ambiciosa, esta, dadas as fissuras talvez senvolvia a vida estrutural-funcionalmente
incontornáveis entre disciplinas nesta divi- regulada dos Nuer. O ambiente limitava as
são social do trabalho acadêmico a que nos possibilidades da criatividade cultural Nuer, e
so pensamento nos conduz. De qualquer ela respondia de uma das muitas maneiras
forma, assumo que estou partindo de uma possíveis. Uma sociedade em homeostase
dicotomia para tentar rompê-la, correndo in- existindo em condições ecológicas constan-
clusive o risco de reafirmá-la no percurso. tes, assim é a realidade mostrada por Evans-
Ou seja, fujo de uma separação que insiste Pritchard. O recorte sincrônico garantia a
em aparecer nas práticas discursivas que me estabilidade da explicação.
rodeiam. Dai a honestidade do "sócio-eco- Ambiente como fator limitante, criativida-
lógico", assim, misto de justaposição e sín- de cultural, homeostase na relação dos ho-
tese, uma nova-velha palavra. A separação mens entre si e com seu meio. É assim
pode aparecer ou desaparecer conforme o também que Mauss (2003) analisou a eco-
logia esquimó. E assim criou-se uma tradi-
eixo de análise.
ção na antropologia social em que o "social"
Procedo então o uso do termo "hibridis-
mo" para caracterizar a abordagem que bus- é ativo e criativo, e o "ecológico" é passivo e
limitante. A tarefa dos antropólogos seria
co. Mais que um hibridismo de disciplinas, que
entender o "social". O que sobra, a monoto-
se encontra um tanto desgastado pelas di-
nia do "natural", pode ser perfeitamente des-
versas formas de multi-inter-transdisciplinari-
crito em um capítulo denominado Ecologia
dade, tentadas nas últimas duas décadas - e
(Evans-Pritchard, 1993; Leach, 1995).
que no fundo acabaram gerando novas 'dis-
Outros autores preferiram enfocar a na-
ciplinas interdisciplinares" - procuro um hibri-
tureza como uma construção social do gru-
dismo de práticas de sentido, o que me faz
po estudado. Assim, a relação dos homens
tentar ultrapassar o campo acadêmico e cru-
com os animais na Inglaterra do século XVIII
zar conhecimentos. O instrumental utilizado
é um reflexo da relação entre os homens
é o da antropologia social que, na sua tentati- (Thomas, 1989); os tabus alimentares são Etnografia e
va sempre frustrada de "apreender o ponto conseqüências de reconhecimento de carac-
questões sócio-
ambientais:
de vista do nativo", têm inventado interessan- terísticas humanas em animais (Douglas, esboço de uma
tes processos relacionais. (Viveiros de Castro, antropologia
1966); o parentesco mítico com animais só simétrica da
2002; Goldman, 2003). tem sentido se analisado face à morfologia paisagem
Assim, nas próximas seções, trata de: 1) social (Radcliffe-Brown, 1973). Ou seja, o
as formas como o "ecológico" ou o "ambien- mundo não humano só interessa para o es- Pedro Castelo
Branco Silveira
tal" foi tradicionalmente tratado na antropolo- tudo das relações entre os homens.
gia; 2) a forma como o "social" ou o "humano" Desta maneira, na antropologia social
foi tradicionalmente tratado na ecologia; 3) a européia encontramos uma tradição de se-
relação entre conhecimento científico e não- paração analítica entre o "natural" e o "soci-
científico; 4) a perspectiva da disciplina eco- al", em que o primeiro é passivo porém
logia de paisagens; e 5) uma possível imitante, e o segundo é ativo e uma exclusi-
etnografia da paisagem; 6) uma conclusão vidade humana, sendo o foco do estudo. In-
indicando desdobramentos metodológicos teressa primordialmente como o "natural" é
1. O ecológico na antropologia pensado pelo "social", o que leva a uma vi-
Evans-Pritchard (1993) etnografa os Nuer são do não-humano como representação so-
vivendo suas relações sociais de parentesco cial. Na antropologia cultural americana até a

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década de 1970, parte-se da tradição boasia- gia simétrica por ele proposta deve romper
na de conceber múltiplas culturas com múlti- a dicotomia entre sujeitos e objetos.
plas histórias para chegar a conclusões Por outro lado, a antropologia cultural
convergentes com a antropologia social eu- gera nos anos 1990 uma nova antropologia
ropéia. Estamos falando da ecologia cultural ecológica, surgida no seio do envolvimento
de Julian Steward (1968). Aqui os homens de antropólogos nas questões sócio-ambi-
reagem ao ambiente com estratégias adap- entais, principalmente aquelas relacionadas
tativas diversas, e o que interessa é a análise ao uso e conservação de recursos naturais
comparada das estratégias4. A tecnologia é pelas assim batizadas populações tradicio-
considerada fator cultural determinante em nais (Redford e Padoch, 1992; para uma re-
detrimento das representações sociais, tão visão, ver Viveiros de Castro, 1996). Assim,
caras à antropologia social européia. A noção taxonomias, cosmologias e teorias indígenas
de estratégias adaptativas assim formulada perdem seu caráter de superestrutura e pas-
também pressupõe uma certa homeostase sam a ter uma dimensão adaptativa. Ecolo-
social em acordo com o equilíbrio ambiental. gias indígenas passam a ser levadas em
E quando a cultura do "primitivo" ou do "cam- conta seriamente no estudo de estratégias
ponês" é transformada pela entrada do capi- de manejo (Berkes, 1999). Esta mesma ver-
talismo, o equilíbrio do sistema social pode tente passa a mostrar que a própria floresta
ser quebrado, trazendo o colapso cultural e é moldada por ação cultural dos grupos hu-
incorporação ao capitalismo (Redfield, 1949). manos (Posey, 1983; Balée, 1992). Ou seja,
Tanto na abordagem clássica dos antro- postula-se que a cultura pode causar natu-
pólogos sociais quanto na dos antropólogos reza'. Dá-se valor aí ao "conhecimento eco-
culturais, o não-humano existe como algo lógico tradicional" ou "etnoconhecimento",
externo à sociedade, equivalente ao concei- como parte de lutas políticas para definição
to de ambiente. Este ambiente tem poder do detentor do conceito de biodiversidade,
explicativo próprio em sua exterioridade, em um momento em que biodiversidade
podendo funcionar como fator limitante ou transforma-se em poder.
alvo de estratégias adaptativas. Após tantos anos de separação ontoló-
A partir dos anos de 1980 e, mais acen- gica nos estudos acadêmicos, os antropólo-
tuadamente a partir dos anos de 1990, o fa- gos procuram hoje operar a desconstrução
tor ecológico parece começar a assumir da dicotomia natureza/ cultura, reposicionan-
Etnografia e
questões sócio- outro papel na antropologia. Por um lado a doa disciplina quanto a esta questão. A "na-
ambientais: tureza" não parece mais tão estática e
esboço de unia antropologia social começa a desconstruir a
antropologia dicotomia natureza/ cultura a partir de estu- monótona, não é nem uma construção soci-
simétrica da
paisagem dos etnográficos (Descola, 1994; Overing, al nem um fetiche das relações entre os ho-
1996; Viveiros de Castro, 1998). Se diver- mens. Não é também um fator instintivo de
Pedro Castelo sos grupos sociais vêem sua relação com o determinação de comportamento. E um novo
Branco Silveira
mundo não-humano de outras formas que outro? Um novo nós? Ou é simplesmente
não a separação ontológica entre natureza um conceito que não faz sentido? O campo
e cultura, então tal separação deve ser re- está aberto a proposições.
vista pelos antropólogos. Ou seja, começa 2. O humano na ecologia
a esboçar-se nos trabalhos de antropólogos A história da ecologia no século vinte é
como Philippe Descola (Descola e Pálsson, profundamente ligada ao diálogo com a eco-
1996) e Eduardo Viveiros de Castro (2002) nomia, com uma intensa apropriação e in-
a noção de um social ampliado, de que hu- tercâmbio de modelos entre a primeira e a
manos e não humanos fazem parte. Este segunda. A teoria da evolução, como "mito
social ampliado traz certa consonância com fundador', pegou de empréstimo modelos de
a tese de Latour (1994) de que a antropolo- maximização da economia, e a devolveu na

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forma de darwinismo social. Este foi inspira- regras naturais que as outras espécies- in-
dor dos primeiros antropólogos e fantasma clusive a de ser escravo de seus genes.
dos seguintes. O ser humano como uma gra- A ecologia de ecossistemas, outra das
dação de raças em evolução cultural me grandes áreas da ecologia, trata basicamen-
parece ser, portanto, muito mais uma pro- te defluxos sistêmicos de energia e maté-
dução de darwinistas sociais do que de bió- ria. E uma linha que ganhou grande
logos evolucionistas. A nova síntese da teoria popularidade nos anos de 1970 a partir da
da evolução, pelo contrário, trouxe a idéia difusão do livro-texto de Eugene Odum
de evolução como transformação no tempo, (1953). Os humanos estão incluídos na aná-
não necessariamente de melhora. Esta lise como outro fator qualquer do sistema,
transformação se daria por adaptação ao gerando biomassa e energia. Os sistemas
ambiente ou por motivos casuais. ecológicos foram vistos como homeostáti-
Falemos um pouco de como o humano cos; é daí que vêm os principais argumen-
aparece nas diversas linhas da ecologia. Na tos científicos para o conceito de equilíbrio
ecologia de populações e na ecologia de co- da natureza. Uma radicalização da ecologia
munidades, presume-se que a freqüência de de ecossistemas é a "hipótese Gaia", que
genes em uma população biológica, a fre- trata do Planeta Terra como um superorga-
qüência de indivíduos de uma espécie em nismo capaz de se auto-regular.
uma comunidade biológica, ou mesmo a Em resumo, nas linhas da ecologia co-
composição das espécies de uma comuni- mentadas acima o fator humano pode ser visto
dade biológica mudam no tempo. (Begon et como um ruído no estudo de processos natu-
ai, 1990). As populações e comunidades bi- rais, ou como espécie, preso à sua natureza
ológicas foram primeiro vistas como equili- biológica, ou como participante de fluxos de
bradas e auto-reguladas, inclusive com energia e matéria. No segundo caso, não se
mecanismos previsíveis de sucessão de es- trata de relações com seres de outra nature-
pécies em uma comunidade. O ser humano za (outras espécies); no primeiro e no tercei-
apareceu historicamente nestes ramos da ro caso, há uma idéia de equilíbrio natural
ecologia como um fator a ser isolado para instituído ou possível. O ser humano é um
não contaminar a análise das dinâmicas eco- agente desestabilizador do sistema, um ele-
lógicas. A ação humana sobre os processos mento externo que não evoluiu com os siste-
ecológicos é vista assim como ruído na co- mas e comunidades estudados. Etnografia e
leta de dados, um fator de perturbação de Nos últimos anos a noção de equilíbrio questões sócio-
ambientais:
processos naturais. ecológico tem sido criticada na ecologia. Al- esboço de lima
Na ecologia comportamental (Krebs e guns autores passam a duvidar da existên- antropologia
simétrica da
Davis, 1996), urna linha da ecologia que pre- cia de comunidades estáveis (Pimm, 1991), paisagem
tende explicar o comportamento de animais de processos determinísiticos de sucessão
por modelos de adaptação, há uma maior ten- ecológica e mesmo da capacidade preditiva Pedro Castelo
dos modelos ecológicos. Branco Silveira
dência a buscar determinismos, agora gené-
ticos, para os comportamentos animais. Se fatores casuais estão lado a lado da
Autores como Richard Dawkins (1979) e adaptação na evolução das espécies, se o
Edward O. Wilson (1975) têm grande prestí- ambiente que seleciona genótipos adapta-
gio no campo da ecologia comportamental. dos é instável e se a genética compreende
O último criou a disciplina Sociobiologia, que processos tão sutis e desconhecidos, então
postula que grande parte dos comportamen- alguns ecólogos passaram a tomar os pro-
tos animais- e humanos- são de ohgem ge- cessos ecológicos como processos comple-
nética e adaptativa. O ser humano aparece xos, de previsibilidade apenas aproximada.
aí como mais uma espécie, com suas carac- Holling (1978) afirma que não só a ciência
terísticas próprias, mas sujeito às mesmas ecológica é incompleta, mas o próprio siste-

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ma estudado é um alvo móvel. Está surgin- nistas, e cada vez mais procuram integrar
do, portanto, uma ecologia que trata de pro- análises sociais para funcionarem na práti-
cessos complexos, que se afasta da idéia ca. A idéia de manejo adaptativo (Holling,
de sistemas em equilíbrio. Nesta nova ver- 1978), em que as estratégias vão sendo
tente ecológica, a ação humana pode po- adaptadas a partir do monitoramento do
tencialmente ser analisada como parte manejo, tem ganhado força.
integrante dos processos ecológicos. Scoo- Há mais dois campos relativamente re-
nes (1999) critica a antropologia que dialo- centes da ecologia que têm incorporado a
ga com a ecologia o equilíbrio, e procura ação humana na análise. Os estudos de bi-
compreender os diálogos possíveis entre as odiversidade (Gaston e Spicer, 1998) têm se
ciências sociais e esta "nova ecologia". preocupado com questões políticas e estra-
No plano das aplicações da ecologia, há tégicas relacionadas à conservação e uso
uma série de discussões político-acadêmi- da diversidade biológica, e a ecologia de
cas. Ecólogos com uma posição política con- paisagens tem trabalhado em escalas em
servacionista têm defendido a conservação que a ação humana não pode ser ignorada
• de grandes áreas sem a presença humana, (Metzger, 2001). O uso de Sistemas de In-
na forma de unidades de conservação tais formação Geográfica (SIO) em ecologia de
como os Parques Nacionais (Terborgh, paisagem permite integrar dados sociais de
2002). Esta posição baseia-se na idéia de forma interessante. Estõs dois campos pro-
ser humano como agente externo aos pro- metem frutos importantes no estudo de pro-
cessos ecológicos; a manutenção de tais cessos sócio-ecológicos. Falaremos à frente
processos só se daria pela exclusão da ação da ecologia de paisagens, em especial.
humana. (ver Silveira, 2001). Com esta po- Do imbricamento de ecologia com ciên-
sição política, separam-se ontologicamente cias sociais têm surgido algumas ecologias
problemas ambientais e problemas sociais. híbridas, tais como a etnoecologia (Toledo,
Os ecólogos conservacionistas que têm esta 1992; Marques, 1996), preocupada com os
posição estão preocupados apenas com os sistemas de classificação, uso e conserva-
problemas ambientais. ção ambiental por populações indígenas e
Outra linha teórica, a agroecologia (Altie- tradicionais; e a ecologia humana (para uma
rh 1989), estuda os sistemas transformados revisão, ver Segossi, 1993), que tem uma
pela ação humana e procura as possibilida- vasta gama de interesses, desde a aplica-
Etnografia e des de manutenção das funções essenciais ção de modelos ecológicos à ação humana
questões sócio- dos sistemas agrícolas, baseado na idéia de
ambientais: até a compreensão das dimensões huma-
esboço de uma sustentabilidade. Projetos aplicados de agro-
antropologia nas das mudanças climáticas globais.
ecologia, postos em prática por ONGs, movi-
simétrica da Em resumo, a ecologia tem se deparado
paisagem mentos sociais e pesquisadores, têm sido
atualmente, no plano teórico, com a descons-
bem-sucedidos em incorporar conhecimentos
trução da idéia de equilíbrio dos ecossiste-
Pedro Castelo locais e científicos na criação de conhecimen-
Branco Silveira mas, com a exploração de modelos de
tos híbridos pragmáticos na conservação de
complexidade e com o questionamento dos
solos, uso de técnicas alternativas a agrotó-
modelos preditivos deterministas. No plano
xicos e desenvolvimento de sistemas resili-
aplicado, há um crescente reconhecimento
entes. Apesar disso, parece haver pouca
de que fatores sociais devem ser levados em
sistematização dos resultados destes proces-
conta em estratégias de manejo, recupera-
sos sócio-ecológicos.
ção e sustentabilidade.
Outras vertentes de ecologia de cunho
aplicado, como as que lidam com manejo 3. O conhecimento científico
de ecossistemas e com recuperação de e o conhecimento loca!
áreas degradadas, têm encontrado dificul- Os estudiosos da etnobiologiã passaram
dades em trabalhar com modelos determi- décadas tentando mostrar que o que eles

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chamaram de conhecimento tradicional, ou nolítico, uma sabedoria de longa data, pas-
etnoconhecimento, linha um grau de verda- sada entre gerações, o que o tornaria, ao
de similar ao chamado conhecimento cientí- contrário da tese proposta, de natureza di-
fico. Uma tarefa nobre, a de advogar pela versa do chamado conhecimento científico.
legitimação dos saberes e práticas, a res- Descola e Pálsson (1996), no mesmo
peito de processos ecológicos e de formas artigo acima citado, dizem que:
de se lidar com o ambiente, produzidos por 'a classificação das plantas e animais é
o que se convencionou chamar de popula- apenas um aspecto limitado da objetiva-
ções tradicionais, populações locais ou, em ção da natureza, este processo pelo qual
alguns casos, povos indígenas. a cultura doa, com um grau particular de
Essa busca parte, me parece, de um solenidade, certos atributos de seu ambi-
descorforto com as respostas que a ecolo- ente e certas formas de relação com ele.
Para compreender tal processo, deve-se
gia enquanto disciplina científica dava para
levar em conta dimensões como as onto-
as crescentes preocupações ambientais que logias dos seres não-humanos, as repre-
surgiram no final do século XX, somado com sentações espaciais dos domínios sociais
a subseqüente visibilidade que os chama- e não-sociais, as prescrições e proscri-
dos povos da floresta tomaram como agen- ções rituais a respeito dos seres, etc."6
tes políticos, principalmente após a Assim, sem deslegftimar o conhecimento
conferência Rio-92. Trabalhos como os de científico como importante forma de conheci-
Posey (1983), Berlin (1992), Toledo (1992), mento contemporâneo, torna-se urgente pen-
Marques (1996), Balée (1992) e Berkes sar em novas formas de legitimação de outras
(1999), para citar alguns, procuram dar visi- formas de conhecimento. Penso, remetendo-
bilidade e status científico ao conhecimento me novamente a Latour e Viveiros de Castro,
ecológico dos grupos estudados. que esta forma de legimação passa por re-
Ao longo do tempo algumas criticas sur- pensar a forma de legitimação do assim cha-
giram, e são questões que os próprios pes- mado conhecimento científico. Ou seja, o que
quisadores da etnobiologia têm sido obrigada proponho aqui é pensar em uma nova base
a repensar. A primeira delas vem dos cha- comum possível entre o conhecimento cien-
mados estudos de ciência, no sentido de, em tífico e outras formas de conhecimento, ad-
primeiro lugar, desconstruir a idéia da ciên- vogando que a contextualização que Descola
cia ocidental como parâmetro de validação. julga necessária para os estudos etnobiológi- Etnografia e
Trabalhos como o de Latour (1999) e outros cos também é necessária para a produção questões sócio-
ambientais:
têm procurado um olhar sócio-antropológi- científica, se queremos relacioná-la com ou- esboço de uma
co sobre o processo de produção científica. tras formas de conhecimento. E esta contex- antropologia
simétrica da
Deriva-se daí um questionamento, este tualização pode ser feita por meios paisagem
oriundo da antropologia social, sobre se a etnográficos (ver Velho, 2001).
melhor maneira de legitimar o dito conheci- Minha argumentação aqui é de que mes- Pedro Castelo
Branco Silveira
mento tradicional é submetê-lo às regras da mo se os conhecimentos científicos têm suas
ciência. Descola e Pálsson (1996, p. 85) especificidades, eles podem ter uma base
questionam, por exemplo, as equivalências mínima de diálogo, comparação ou justapo-
encontradas entre os sistemas taxonõmicos sição com os conhecimentos "não-científi-
nativos e os científicos. cos" (Almeida, 1999). Este "pôr em relação"
Ao lado disto, reside a constatação de presume, entretanto, uma contextualização
que, pelas suas próprias regras, a ciência etnográfica de todas as formas de conheci-
presta-se a uma constante auto-refutação, mento envolvidas, e não uma simples vali-
seja em termos de Popper (1959) ou de Kuhn dação do conhecimento não-científico a
(1970). O conhecimento tradicional foi visto partir de algumas conclusões convergentes
pelos estudiosos da etnobiologia como mo- com o conhecimento científico.

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4. Verdade científica e ecologia política dade de diálogo de saberes por sua inco-
É claro que, em um mundo em que o mensurabilidade e/ou pela desequilíbrio de
conhecimento científico é considerado, no forças entre as partes em comunicação.
plano político, como Verdade, pode ser uma Há, entretanto, uma produção interdisci-
grande vantagem política a legitimação do plinar recente, de raízes principalmente an-
conhecimento tradicional na chave acima tropológicas, que trata dos conhecimentos
criticada, Entretanto esta argumentação co- como multi-referenciais, híbridos, como uma
meça a não funcionar mais no plano da eco- característica do mundo contemporâneo
logia política. Após mais de uma década da (seja isto positivo ou negativo...). Penso que
Rio 92, encontramos hoje uma problemati- isto começa com o ensaio de Latour (1994)
zação da retórica das populações indíge- afirmando que "jamais fomos modernos", e
nas e "tradicionais" como preservacionistas que o processo de purificação (o oposto da
natos. Alguns projetos de "etnoconserva- hibridação) que caracteriza o pensamento
ção" tem sido vistos como mal-sucedidos, moderno se desconstrói face ao mundo con-
outros como bem sucedidos mas de difícil temporâneo de forma que se percebe que
auto-sustentação econômica sem financi- ele nunca foi a única forma de operação do
amentos externos. Alguns são vistos como pensamento "ocidental". Assim, a antropo-
bem sucedidos. O que ocorre, em minha logia esboça um movimento em direção ao
opinião, é a dificuldade de avaliar, no perí- estudo do "híbrido":
odo de 10 ou 15 anos, os resultados, em "hoje procuramos locais para testar nos-
termos ecológicos, de propostas do tipo sas teorias, onde pelo menos alguns de
"manejo comunitário de recursos naturais". seus habitantes são crioulos, cosmopoli-
Além disso, talvez seja uma crueldade et- tas ou cyborgs, onde as comunidades são
diásporas e as fronteiras na realidade não
nocêntrica exigir que os "ex-bons selvagens
imobilizam mas, curiosamente, são atra-
ecológicos" se transformem em "bons-em- vessadas. Freqüentemente é nas regiões
presários ecológicos". Se conservação rima fronteiriças que as coisas acontecem, e
com capitalismo ou não, este é um tema hibridez e colagem são algumas de nos-
que escapa dos objetivos deste capítulo. sas expressões preferidas por identificar
As criticas aos projetos de "etnoconser- qualidades nas pessoas e em suas
vação" geraram uma batalha eco-política produções.(Hannerz, 1997]'
que tem implicações importantes em termos Assim, existe uma tendência atual de re-
Etnografia e
questões sócio- da relação entre conhecimentos científicos cusara idéia de "conhecimentos tradicionais"
ambientais: e não-científicos. Por um lado prestam-se
esboço de uma enquanto entidades puras e monolíticas e
antropologia ao fortalecimento de propostas de conser- tratar de processos sociais que envolvem a
simétrica da
paisagem vação sem a presença humana, que pedi- produção e transmissão de conhecimentos.
riam decisões centralizadas e uso de força O "tradicional" estaria no processo, não no
Pedro Castelo policial (Terbourgh, 2002; Brandon et. ai, tipo de conhecimento (Manuela Carneiro da
Branco Silveira 1998). Por outro lado, existe uma produ- Cunha e Mauro Almeida, comunicação pes-
ção científica que advoga que os projetos soal). No Brasil, isso se reflete inclusive em
de conservação com participação de popu- algumas políticas públicas, como no reconhe-
lações locais podem mascarar práticas de cimento de Patrimônios Imateriais pelo Minis-
dominação (Escobar, 1996, Agrawal, 1995; tério da Cultura, neste início dos anos 2000.
Nygren, 1999; Nugent, 2003) que terminari- Cunha e Almeida (2001) mostram como o
am por prejudicar as próprias populações ecologismo entrou na agenda da luta por re-
locais. Por um lado, uma desqualificação forma agrária dos seringueiros amazônicos,
pragmática do "conhecimento tradicional" e desconstruido a visão "estrangeira" dos se-
um reforço do cientificismo e do centralis- ringueiros como ambientalistas natos, sem ti-
mo. De outro, a declaração da impossibili- raro valor ecológico de suas lutas. Para tanto,

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o foco é, mais uma vez, a etnografia dos pro- conservação por populações tradicionais
cessos sociais, que envolvem moradores da (Cunha e Almeida, 2001) e em projetos apli-
floresta, acadêmicos engajados, agências cados de agroecologia (Pretty, 1995, Vários
multilaterais, o mercado internacional da bor- Autores, 2002).
racha, o Governo Federal Brasileiro e uma As situações concretas que suscitam tais
alta dose dos imponderáveis malinowskianos debates e projetos indicam que: 1) 0 conhe-
da vida real. cimento ecológico científico disponível não
Parece, portanto, estar ocorrendo, na dá conta, sozinho, de prescrever estratégi-
antropologia, um estreitamento da distância as de conservação, manejo e uso sustentá-
entre o conhecimento antes visto como "tra- vel da biodiversidade; 2) a visão de natureza
dicional", o conhecimento científico (ele mes- como construção social não dá conta de re-
mo híbrido de processos objetivantes, solver questões sócio-ecológicas concretas;
concepções de mundo e experiência feno- 3) parece necessária a elaboração de no-
menológica) e o chamado "senso comum", vos parâmetros de relação entre conheci-
uma categoria pejorativa, polissêmica e ge- mentos científicos e não-científicos, que
neralizadora para os conhecimentos "não levem em conta a idéia de hibridismo.
científicos" e "não-tradicionais". Usar a idéia de paisagem numa análise
O que encontramos hoje é o questiona- sócio-ecológica é falar de um objeto híbrido
mento do conhecimento científico como úni- de natureza e cultura, cuja análise escapa
ca forma legitima, e com a percepção de que dos campos tradicionalmente delineados nas
os conhecimentos locais são dinâmicos, in- ciências naturais e nas ciências sociais. Et-
ventivos, ligados a cosmovisões mais am- nografar a paisagem significa debruçar-se
plas que a especialização acadêmica se sobre situações concretas em que a sepa-
presume (Descola e Pálsson, 1996), mas ração natureza/cultura pode ser posta em
que são recorrentemente atualizados na prá- cheque. Na próxima seção, revisarei como
tica cotidiana. Mais que isso, passa-se a a paisagem está presente no campo de es-
analisar situações em que há uma multipli- tudos denominado ecologia de paisagens,
cidade de formas de produção de conheci- para a seguir propor uma relação desta com
mento, tradicionais, modernas e formas que a etnografia.
não se encaixam nestas categorias. Estes 6. A ecologia de paisagens
contextos híbridos começaram a ser proble- Uma pista da utilidade do uso da idéia de Etnografia e
matizados recentemente. paisagem como objeto híbrido é o fato dos questões sócio-
ambientais:
5. Processos sócio-ecológicos ramos disciplinares que tratam do assunto esboço de uma
na paisagem serem geralmente zonas de fronteira das dis- antropologia
simétrica da
Na pequena revisão feita acima, pude- ciplinas. A ecologia de paisagens é um bom paisagem
mos posicionar as principais vertentes teóri- exemplo disto. A disciplina é um ramo relati-
cas da antropologia e da ecologia face à vamente recente da ecologia e tem uma du- Pedro Castelo
Branco Silveira
questão dos processos sócio-ecológicos. pla origem, a primeira na Geografia Humana
Vimos que as separações disciplinares nes- alemã e do Leste Europeu nos anos de 1930
te campo tendem a ser minadas em ambas (Troll, 1939; ver Bastian, 2001; Metzger, 2001),
as disciplinas. Me parece ser, no entanto, e a segunda nos anos de 1980, que corres-
na colaboração entre ecólogos, antropólo- ponde a uma retomada, agora por ecólogos
gos e populações locais, em situações con- norte-americanos (Forman e Godron, 1986;
cretas em que são colocadas questões ver Metzger, 2001), influenciada pela teoria
políticas, culturais e ambientais, enfim, ques- da biogeografia de ilhas (Mac Arthur e Wilson,
tões sócio-ecológicas, que avanços podem 1967). A ecologia de paisagens é hoje um
surgir (Escobar, 1998). Estas situações têm campo heterogêneo em que os pesquisado-
ocorrido por exemplo em debates sobre a res buscam uma identidade disciplinar.

122
As contribuição mais importante da eco- operando na escala humana, mais especifi-
logia de paisagens atual parece ser o reco- camente na escala dos impactos humanos
nhecimento da paisagem como um espaço na paisagem. O uso de Sistemas de Infor-
heterogêneo (Turner, 1989,2006; Pickett and mação Geográfica neste caso toma-se pra-
Cadenasso, 1995; Mezger, 2001; Bastian, ticamente imprescindível.
2001), formado por um mosaico de elemen- Apesar do predomínio da macro-esca-
tos dispostos neste espaço (Metzger, 2001). la, as tendências mais recentes da ecolo-
Procede-se então a uma análise horizontal gia de paisagens têm sido no sentido de
(não-hierárquica) da configuração espacial de trabalhar com múltiplas escalas, procuran-
uma área, em termos de processos e padrões. do cruzar análises em diferentes escalas
A ecologia de paisagem reconhece também (ver Turner, 2005). Metzger (2001, p. 4)
que a escala de analise é fundamental para a chega a afirmar que
compreensão da realidade. Isto significa que "...a ecologia de paisagens não pode ser
processos que ocorrem nesse espaço hetero- mais considerada como sendo uma eco-
gêneo (causando-o e/ou modificando-o) podem logia de macro-escalas. A escala é defi-
ser entendidos diferentemente de acordo com nida pelo observador, resultando em
a resolução da análise (por exemplo, um es- análises em micro-escalas ou macro-es-
paço amplo com uma compreensão genérica calas em função, em particular, do tama-
dos processos, ou uma espaço reduzido com nho e da capacidade de deslocamento
compreensão detalhada). Ou seja, a homoge- da(s) espécie(s) considerada(s)."
neidade ou a heterogeneidade do espaço é Dessa forma, introduzem-se aí duas idéi-
dependentes da escala e da resolução. Aques- as básicas: 1) a paisagem é um recorte arbi-
tão da escala, entretanto, não se limita à di- trário do pesquisador, segundo o tipo de
mensão espacial, fala-se também em escala análise desejado; e 2) existem escalas espa-
temporal. A ecologia de paisagens lida então ciais e temporais para diferentes organismos
com um mosaico espacial de relações ecoló- e processos que fazem parte da paisagem.
gicas que se alteram com o tempo, cuja com- Na prática, a principal referência dos eco-
preensão é dependente de escala. logos de paisagens foi a teoria da biogeo-
O uso de fotografias aéreas e imagens graf ia de ilhas (Mac Arthur e Wilson, 1967),
de satélite consagrou-se como um dos prin- que em resumo postula que a distribuição
cipais modos dos ecólogos trabalharem com de populações de uma determinada espé-
Etnografia e paisagem. De fato, o desenvolvimento das cie isolada em ilhas obedece a padrões re-
questões sócio- tecnologias de Sistemas de Informação Ge- lacionados ao tamanho, formato e distância
ambientais:
esboço de uma ográfica e das análises computacionais con- entre as ilhas. A generalização desta teoria
antropologia
simétrica da sistiram em grandes motores para a para áreas não insulares (qualquer parte da
paisagem popularização da ecologia de paisagens, a paisagem em que uma espécie encontra-se
partir dos anos de 1990. Entretanto, desde isolada pode ser considerada uma ilha para
Pedro Castelo suas origens, a visão de representações esta espécie) foi uma das bases do ressur-
Branco Silveira
aéreas do espaço geográfico já estava pre- gimento da ecologia de paisagens. Esta te-
sente. Troll, já nos anos de 1930, usou foto- oria trouxe à ecologia de paisagem os termos
grafias aéreas em sua análise da paisagem mancha ( patch), matriz (matrix) e conectivi-
da savana da África Oriental (Bastian, 2001). dade (conectivity), e a fez desenvolver uma
Alguns autores preferem trabalhar com serie de métricas e cálculos relacionadas à
a idéia de paisagem como uma macro-es- disposição de populações e comunidades
cala, ou seja, um nível de análise hierarqui- ecológicas nas paisagens.
camente superior a ecossistema. Esta A matriz é a unidade predominante na
abordagem busca a compreensão de aspec- paisagem. Em uma paisagem florestal, numa
tos na chamada escala regional, ou seja, pro- certa escala, a matriz é a mata. Em uma área
cessos ecológicos amplos que estão dominada por pastagens, a matriz são os

123
pastos. Nesta matriz, localizam-se manchas gem passaram então a lidar com a forma
de outras unidades de paisagem (em uma como indivíduos de uma população se dis-
matriz urbanizada, por exemplo, pode haver tribuem no espaço heterogêneo, como co-
manchas de vegetação nativa, áreas agrí- munidades se organizam neste espaço e
colas, etc.). O grau de ligação entre as man- como se dão os fluxos de matéria e energia
chas isoladas na paisagem representa a entre os diferentes elementos da paisagem.
conectividade entre as unidades. A conecti- Talvez a maior lacuna da ecologia de pai-
vidade é importante do ponto de vista bioló- sagem, em termos conceituais, se refira ao
gico porque é ela que determina o quão papel da ação humana na análise. Enquanto
isoladas estão as espécies numa paisagem. o nascimento geográfico da disciplina se re-
A teoria da biogeografia de ilhas foi a prin- fere a processos de modificação da paisagem
cípio usada para o delineamento de reser- pelo ser humano, seu renascimento ecológi-
vas naturais (Haila, 2002). Posteriormente, co deu-se no sentido de utilizar conceitos eco-
ajudou a delinear um objeto central na eco- lógicos na delimitação de reservas naturais
logia de paisagem, a fragmentação. Assim, (Haila, 2002). No segundo caso, a paisagem
a ecologia de paisagens, com base na bio- aí não é mais o palco de ação humana, mas
geografia de ilhas, e usando como ferramen- de processos ecológicos que se dão entre
tas Sistemas de Informação Geográfica, populações e comunidades biológicas. A teo-
passou a tratar em grande medida de paisa- ria da biogeograf ia de ilhas trouxe como he-
gens fragmentadas, ou seja, aquelas em que rança a parte dos ecólogos de paisagem o
a matriz original foi substituída por outra, foco nas "ilhas" ou manchas de vegetação
restando apenas manchas da matriz origi- natural, como por exemplo fragmentos flores-
nal, que seriam reservatórios das especies tais vistos como "remanescentes" de vegeta-
nativas. O foco então passou a ser o estudo ção natural em uma área desmatada. Há
do que acontece com os remanescentes das também diversos estudos que procuram pai-
paisagens modificadas pela ação humana. sagens "naturais" e aplicam os princípios da
A teoria da biogeografia de ilhas parte do ecologia da paisagem ao estudo de animais
princípio de que as populações naturais teri- e plantas em escalas relacionadas à área de
am pontos de equilíbrio em termos de taxas ocupação e dispersão das espécies de inte-
de crescimento e mortalidade. Esta ideia é resse (ver, por exemplo, Andrén, 1994). No
baseada no modelo de Lotka-Volterra, impor- caso das abordagens de ecossistemas, exis-
tado da economia (Begon, et. ai, 1990). O te uma independência maior da questão dos Etnografia e
questões sócio-
modelo ainda hoje é considerado importante, remanescentes de vegetação nativa, e enten- ambientais:
dem-se os processos na paisagem como flu- esboço de unia
ensinado em qualquer disciplina introdutória antropologia
de ecologia, mas mostrou-se na prática sim- xos de matéria e energia, sem um foco maior simétrica da
paisagem
ples demais para explicar os processos de nas relações sociais.
populações biológicas. Hoje os principios de Em termos das aplicações da ecologia
Pedro Castelo
equilíbrio das populações naturais, que fazem de paisagens, percebe-se uma grande ên- Branco Silveira
parte das bases da biogeograf ia de ilhas esta fase na questão do planejamento. Os estu-
sendo fortemente criticado (ver Pimm, 1991, dos que enfocam populações biológicas
Scoones, 1999 e Zimmerer, 2000) e, dentro buscam muitas vezes embasamento para o
da ecologia de paisagens, parte-se para vi- desenho de reservas naturais, na mais clás-
sões de estudos de habitas fragmentados em sica tradição da biogeografia de ilhas. Estu-
perspectivas de não-equilíbrio (Haila, 2002). dos mais voltados para áreas profundamente
A ecologia de paisagens trouxe para a modificadas, principalmente em países do
ecologia, portanto, uma perspectiva espaci- hemisfério norte, buscam uma perspectiva
al para ramos ja consagrados da disciplina, de planejamento do uso e ocupação do solo,
como a ecologia de sistemas, de populações seja de áreas rurais ou urbanas. No segun-
e de comunidades. Os ecólogos de paisa- do caso destacam-se abordagens mais vol-

124
fadas a área da geografia, tomando como distribuição e abundância de conjuntos
base o conceito de paisagens culturais. de espécies. Há muitos tipos de paisa-
O termo paisagens culturais constitui, pro- gens culturais, mas todas são dependen-
positalmente ou não, uma oposição à idéia tes das condições iniciais e da cultura
em um determinado tempo "7
de paisagens naturais. As paisagens naturais
seriam aquelas em que os processos ecoló- O autor define, em seu artigo, que paisa-
gicos/evolutivos tradicionalmente estudados gens culturais seriam aquelas pré-modernas
na biologia seriam o principal fator explicati- ou pré-tecnológicas, de base agrícola. Pre-
vo, enquanto as paisagens culturais seriam sume que nelas o impacto da ação humana,
aquelas em que o ação passada do homem é brando e por um longo intervalo de tempo,
o que explica a paisagem. teria permitido um convívio equilibrado entre
Assim, a abordagem de paisagens cul- conjuntos de espécies (não necessariamen-
turais toma por princípio que a História é o te os originais). Seriam paisagens modifica-
principal método para compreensão da pai- das, mas em equilíbrio. Esta representação
sagem. A História aí é vista em termos de da paisagem cultural procura ver nas paisa-
cronosequências de acontecimentos modi- gens rurais tradicionais da europa uma espé-
ficadores do espaço, e pode ser acessada cie de paraíso sustentável, ameaçado pelas
por meio de mapas e outros documentos his- formas modernas de uso da terra.
toriográficos, de pesquisas arqueológicas e A análise de Fama (2000) encontra ecos
de história oral. na discussão a respeito das ditas populações
Estes estudos são, em geral, feitos em tradicionais e a conservação dos ambientes
áreas urbanas e rurais de países industriali- onde vivem. Se, por um lado, já parece con-
zados do hemisferio norte, tais como Itália sensual atualmente que praticamente todas
(Fama, 2000), Suécia (Barthel et ai, 2005) e as paisagens do planeta já interagiram de al-
Estados Unidos (Toupal, 2003). Uma grande guma forma com populações humanas (Ba-
parte dos autores está preocupado com ques- lée, 2006), não podendo ser interpretadas
tões de planejamento urbano e ordenação do como ambientes totalmente selvagens (Die-
território. Um índice disto é que muitos traba- gues, 1994), por outro lado também parece
lhos sobre paisagens culturais são publica- razoável interpretar que, pela diversidade de
dos em um periódico chamado Landscape ambientes ocupados e práticas desenvolvi-
and Lithan Planning, voltado para aplicações, das por populações anteriores ou marginais
Etnografia e em uma zona de fronteira entre a geografia, à economia de mercado, os resultados de sua
questões sócio-
ambientais: o urbanismo e a ecologia. A definição da His- ação também devem ser variados (Cunha e
esboço de uma
tória como grande fator explicativo das paisa- Almeida, 2001). Juntando-se isto à tendência
antropologia
simétrica da gens deu origem a uma disciplina chamada atual da ecologia de recusar a idéia de que
paisagem as populações, comunidades e ecossistemas
ecologia histórica (Crumley, 1994).
Parece-me, no entanto, que o reconhe- funcionam pela lógica do equilíbrio (Scoones,
Pedro Castelo
Branco Silveira cimento das questões históricas ligadas à 1999 Zimmerer, 2000), parece-me uma ge-
paisagem acaba por promover uma análise neralização excessiva (e uma romantização)
rasa a respeito do que o campo da ecologia tratar as ditas paisagens culturais como pai-
determinou como sua area de abrangência, sagens em equilíbrio, mesmo que elas sejam
os chamados processos ecológicos. Por avaliadas como mais equilibradas que as pai-
exemplo, Farina (2000, p. 213) define pai- sagens urbano-industriais, em termos de ser-
sagens culturais como viços ambientais.
"áreas geográficas nas quais a relação Em outro artigo, Barthel et ai. (2005) pro-
entre atividade humana e o ambiente cedem a um estudo histórico e sociológico de
criou padrões ecológicos, sócio-econô- um parque urbano de Estocolmo (National
micos e culturais, e mecanismos de fee- Urban Park). Os autores realizam uma pes-
dback que governam a presença, quisa histórica dos usos da terra e formas de

125
manejo, um inventário social dos grupos ati- naturais e paisagens culturais. Isto significa
vos no parque e uma abordagem qualitativa que o estudo abrangente das paisagens não
dos serviços ecossistêmicos ligados a esses pode ser baseado apenas em métodos tradi-
grupos. Os autores afirmam que a área apre- cionais da ecologia, ou simplesmente em pes-
senta uma das maiores diversidades biológi- quisa histórica: E que tal afirmativa se aplica
cas da região, e a relacionam com três fatores: tanto ao estudo dos felinos de um Parque
o regime de propriedade da terra historica- Nacional quanto à ocupação de uma área
mente constituído, as políticas de proteção e urbana. Certamente vários pesquisadores de
replantio de carvalhos existente na Suécia, e, paisagem compartilham da mesma posição
por fim, a diversidade de biótopos existentes colocada aqui. Mas como fazê-lo? Não tenho
no parque, diversidade esta forjada pela ação a pretensão, aqui, de resolver este problema,
histórica dos seres humanos. Esta grande di- mas de apontar o caminho que escolhi se-
versidade estaria ameaçada face às novas guir, que é um dos possíveis.
formas de ocupação e expansão urbana em Um primeiro passo parece dizer respeito
curso na cidade. Suas conclusões vão no a pensar o status da ação humana nas aná-
sentido de negar a existência de um período lises. Mesmo quando o elemento humano é
sem manejo humano na área, e de propor ins- levado em conta, a abordagem em geral fica
titucionalmente propostas de co-manejo adap- no plano dos efeitos das ações humanas
tativo, com base nos grupos sociais já sobre a paisagem, ou seja, no plano de como
atuantes na área. as práticas humanas se refletem na confi-
Barthel et. ai. (2005) não partem da pers- guração da paisagem.
pectiva de equilíbrio, estando inserido no Há muitas décadas, os antropólogos,
debate a respeito dos sistemas sócio-ecoló- com perspectivas diversas, têm concluído
gicos e de questões de resihência. No en- que as práticas humanas estão embebidas
tanto, não há uma maior problematização de significados simbólicos e relações soci-
ecológica sobre o significado destes altos ais. No referencial antropológico é proble-
índices de diversidade. Estes, em si, são mático entender os impactos das práticas
considerados bons. humanas sem entender o contexto mais
Os pesquisadores com uma abordagem amplo em que tais práticas se dão. Trocan-
geográfica da ecologia de paisagens (o es- do em miúdos, os impactos das práticas so-
tudo de paisagens culturais) reconhecem a ciais humanas só tem sentido com a análise
necessidade dos estudos ecológicos, e os das práticas, e as práticas só fazem sentido Etnografia e
questões sócio-
pesquisadores com uma abordagem bioló- em seu contexto. E, mais ainda, o contexto ambientais:
gica da ecologia de paisagens (o estudo de das práticas é muitas vezes o contexto em esboço de uma
antropologia
paisagens naturais, ou da ecologia de pai- que o próprio pesquisador está inserido, o simétrica da
sagens fragmentadas) em geral reconhecem que traz problemas importantes a respeito paisagem

a importância da ação humana no proces- da objetividade possível neste tipo de análi-


Pedro Castelo
so. Não há, a princípio, antagonismo, o que se. Viveiros de Castro (2002) prefere usar o Branco Silveira
constitui uma grande virtude da disciplina em termo práticas de sentido para lidar analiti-
termos de uma potencial análise integrativa. camente com esta questão.
O que parece ocorrer é uma falta de ferra- Isto deve causar um certo incômodo epis-
mentas para lidar-se, simultaneamente, com temológico. Parece, entretanto, haver uma
ambas as questões. convergência possível entre a ecologia e a
Aparentemente, um desdobramento ur- antropologia, que dê margem a um campo
gente das pesquisas desenvolvidas no cam- discursivo comum: a ênfase nos processos.
po daecologiade paisagens é reconhecer que Tanto a ecologia que trata do não-equilíbrio
toda paisagem é um produto híbrido de natu- quanto a antropologia contemporânea falam
reza e cultura, ou seja, que metodologicamen- em processos. Processos sociais para os
te não é desejável a oposição entre paisagens antropólogos, processos ecológicos para os

126
ecólogos. Assim, o estudo de processos só- gem são decisões centralizadas baseadas
cio-ecológicos espacializados na paisagem apenas na produção científica sobre ela.
parece uma forma híbrida de abordar a ques- Como dissemos anteriormente, a ecolo-
tão. Dessa forma, a configuração da paisa- gia de paisagens é um campo híbrido e em
gem inclui processos de produção e construção. Se a questão da incorporação
reprodução físicos e simbólicos, que em úl- do social na análise não é bem resolvida, e
tima instância são relações. O estudo dos isto tem bases na própria dicotomia nature-
processos sócio-ecológicos na paisagem é, za x cultura que persiste na estrutura disci-
então, nada mais do que o estudo de rela- plinar, esta incorporacao aparece como
ções na paisagem. desejável e mesmo necessária por diversos
Enfim, o ponto é que dizer que algo na autores (Metzger, 2001 Pickett and Cadenas-
paisagem é relacionado ao fator antrópico SO 1995, Bastian, 2001). Este desejo muitas

não parece resolver a questão. Isto é funda- vezes aparece na forma de um desejo de
mental no estudo das paisagens porque reincorporar a 'perspectiva geográfica" dos
grande parte dos trabalhos publicados tem primórdios da ecologia de paisagem.
um objetivo (ou pelo menos uma pretensão) O que proponho aqui é algo um pouco di-
de aplicabilidade, seja ela em termo de pro- ferente. Proponho que a ecologia de paisa-
jetos de desenvolvimento, seja em embasa- gens dialogue com a antropologia, por dois
mento de políticas públicas. A preocupação motivos. O primeiro é um desdobramento do
é entender os impactos para poder planejar que Troll já apontava nos anos de 1930. O
futuras intervenções. autor entusiasmava-se com a possibilidade
Acontece que, quando se salta do plano da abordagem horizontal (relações espaciais
dos impactos para o plano das políticas, sem não-hierárquicas) da geografia poder dialogar
levar em conta os processos, muitas vezes com a abordagem vertical (de processos) da
incorre-se em soluções equivocadas, ampa- ecologia. Penso que a ecologia de paisagens,
radas no senso comum no pesquisador, recheada com outras informações ecológicas,
mascaradas com a autoridade do conheci- pode dialogar também com a etnografia, esta
mento científico. Sem um aprofundamento mistura de acompanhamento sistemático e
maior a respeito dos contextos, recorre-se a apreensão subjetiva do cotidiano que consti-
propostas simplistas, com altas doses de tui a principal forma de produção de conheci-
determinismo e pragmatismo. Este é um mento dos antropólogos.
Etnografia e antigo problema da chamada biologia da
questões sócio- Em segundo lugar, como discutido an-
ambientais: conservação que se replica na ecologia de teriormente, há na antropologia contempo-
esboço de uma paisagens. A análise dos processos sócio-
antropologia rânea uma longo debate, de nenhuma
simétrica da ecológicos abre a possibilidade de uma maneira resolvido, sobre formas de romper
paisagem
gama de soluções de (re)ordenação territo- com a dicotomia natureza x cultura, que
rial porque pode mostrar uma miríade de pode trazer um pouco de frescor à forma
Pedro Castelo
Branco Silveira soluções posiveis baseadas em diferentes como esta disciplina em formação tem vis-
projetos de paisagem. to a ecologia no espaço.
Ademais, se formos levar a sério a idéia Bastian (2001, p. 761-762) afirma que:
de que a produção do conhecimento acadê- 'uma concepção mais ampla de paisa-
mico é desejável, mas que em última instân- gem unifica uma variedade de aspectos
cia trata-se de verdades contextuais que ecológicos, estéticos, sociais e psicológi-
provavelmente serão reelaboradas por futu- cos, e supera filosoficamente a a contra-
ros pesquisadores, e que estas verdades in- dição entre as ciências naturais e as
teragem com uma gama de outros processos, humanidades. Duvido, no entanto, que o
conhecimentos, desejos e poderes no plano termo 'ecologia de paisagens' é o mais
da aplicação, não há porque imaginar que a favorável para esta 'meta-ciência'. ( ... )Em
melhor solução para o futuro de uma paisa- minha opinião a ecologia de paisagens

127
nao pode refletir todos os fatos e relações, fins interpretativistas, deu maiores repercus-
mas pode e deve adicionar questoes es- sões, desembocando nas posteriores abor-
senciais ao contexto geral das relações dagens ditas pós-modernas nos EUA (Clifford
natureza-ambiente-sociedade'.' e Marcus, 1986). Sua descrição densa, en-
Em concordância com Bastian, procura- tretanto, no nível dos procedimentos, é uma
mos então aqui esta "concepção mais am- variante da observação participante.
pla de paisagem", tora do campo da ecologia Goldman (2003) recupera a perspectiva
de paisagens, mas dialogando com ele. A malinowskiana em outra chave, advogando
abordagem de heterogeneidade espacial, a que se entenda a observação participante
idéia de mosaico, o foco em fluxos e redes proposta por Malinowski não como uma im-
na paisagem, a questão da escala, o aban- plausível metamorfose do antropólogo em
dono no foco no equilíbrio, são importantes nativo, mas como um devir-nativo, ou seja,
elementos trazidos pela ecologia de paisa- que o antropólogo seja afetado pelas mes-
gens para a compreensão da paisagem mas torças que afetam o nativo. "Não se tra-
como espaco sócio-ecológico. Da aborda- ta, portanto, da apreensão emocional ou
gem geográfica da ecologia de paisagens cognitiva dos afetos dos outros, mas de ser
(mas não só dela), podemos guardar a ne- afetado por algo que os afeta e assim poder
cessidade de um olhar histórico, e a idéia de estabelecer com eles urna certa modalida-
que não é possível entender a paisagem sem de de relação". (Goidman, 2003, p. 465).
entender a ação humana. Assim, uma teoria etnográfica teria "o objeti-
7. Etnografia do espaço sócio-ecológico vo de elaborar um modelo de compreensão
A etnografia, a escrita antropológica, tal- de um objeto social qualquer (linguagem,
vez seja um dos únicos pontos de convergên- magia, política) que, mesmo produzido em
cia entre as diversos ramos da antropologia. e para um contexto particular, seja capaz de
Certamente a etnografia feita por um antro- funcionar como matriz de inteligibilidade em
pólogo de tendências pós-modernas não é outros contextos." (Goldman, 2003, p. 460).
a mesma de um antropólogo com um olhar A idéia aqui não é falar "em nome da an-
mais positivista. Com mais ou menos certe- tropologia", aplicando o que seda um método
za sobre a realidade dos latos que estudam, estabelecido e coeso da disciplina em uma
dando mais ou menos voz aos seus "nati- área de fronteira. Estabelecido, sim, coeso
vos", os antropólogos sempre confiaram nos não. Nem estou seguro de que possa ser cha-
Etnografia e
cânones estabelecidos desde "Os Argonau- mada de método. Talvez a etnografia seja tão questões sócio-

tas do Pacífico Ocidental" (Malinowski, 1978). "resiliente" (para usar um termo da ecologia) ambientais:
esboço de uma
Assim, a etnografia hoje continua sendo ba- por causa de suas múltiplas facetas. Preten- antropologia
simétrica da
seada, no plano ideal, na imersão proporcio- do aqui defender a etnografia do espaço só- paisagem
nada pela pesquisa de campo intensiva, e cio-ecológico como uma forma de produzir um
pode abranger o acompanhamento sistemá- conhecimento híbrido em direção a uma an- Pedro Castelo

tico do cotidiano, a interpretação dos discur- tropologia simétrica da paisagem. Branco Silveira

sos dos sujeitos de pesquisa, a organização Mas como etnografar a paisagem num
de informações objetivamente ou subjetiva- viés sócio-ecológico? Por meio de relações,
mente obtidas, a interpretação de códigos me parece. A antropologia hoje parece po-
de conduta. der começar a se libertar da máxima durkhei-
O cientificismo de Malinowski e sua pre- miana de "o social se explica pelo social",
tensão de mimetizar o ponto de vista dos na- ainda confiando na afirmação, mas mudan-
tivos foi muito debatida ao longo de toda a do o sentido do que é o social.
história da antropologia. Geertz (1996) talvez Viveiros de Castro (2003) acredita que
tenha sido o antropólogo cuja crítica à obser- "a antropologia deve escapar de seu
vação participante, em prol da etnografia para destino auto-imposto e manter-se firme-

128
mente focada em seu objeto adequado: uma compreensão ampla de paisagem que
relações sociais em todas as suas vari- possa ser vista como um todo pelo leitor, mas
ações. Não relações sociais tomadas que ele possa perceber as diferentes matri-
como um domínio distinto (isto não exis- zes lógicas que as compõem, as unidades
te), mas todos os fenômenos como po- heterogêneas do mosaico.
tencialmente formados por e resultando
em relações sociais. Isto significa tomar O que chamo de "diferentes matrizes ló-
todas as relações como sociais."9 gicas são as diferentes práticas de senti-
do de diferentes sujeitos ou grupos sociais
Uma antropologia da paisagem, nesta
que agem na dinâmica da paisagem. Estes
chave explicativa, precisa recorrer às rela-
sujeitos podem ser tanto sujeitos tradicio-
ções existentes na paisagem, não só entre
nalmente considerados outros na antropolo-
seres humanos. A identificação de tais rela-
gia como sujeitos tradicionalmente
ções remete a como os sujeitos envolvidos considerados nós (antropólogos, cientistas).
nesta paisagem a concebem (no duplo sen- Não se trata mais, entretanto, de uma antro-
tido de conceber: o de ter idéias a respeito e pologia da ação (Gluckman 1958, Turner,
o de dar origem a), e também a como o an- 1957), mas de uma antropologia simétrica
tropólogo percebe tais relações. (Latour, 1994; 1999), em um tempo que a
Almeida (1999) afirma que a intersubje- disciplina parece ter resolvido a dicotomia
tividade é possível a partir de acordos prag- simbolismo X materialismo.
máticos, ainda que parciais, sobre as Enfim, a partir de diferentes concepções
conseqüências da ação sobre o mundo. a respeito do que ocorre no espaço com en-
Todos nós sabemos, intuitivamente, tes humanos e não humanos, o pesquisador
transformar um objeto visto de diferentes pode formular redes sócio-ecológicas simé-
ângulos e de diferentes perspectivas, uni- tricas de humanos e não-humanos, deixando
ficando essas aparências na idéia de um clara a procedência dos elementos dessa
objeto invariante, Deveríamos também
rede. A costura de quem etnografa precisa
ser capazes de nos transformarmos em
diferentes sujeitos, e assim olharmos para aparecer, não como um exercício de narcisis-
um mesmo objeto de diferentes ângulos. mo, mas para permitir ao leitor perceber o
Trata-se de reconhecera diversidade jun- processo de fabricação do mosaico. Afinal, o
tamente com a invariância. Quanto a isso, antropólogo é ele mesmo um ser situado so-
a lição do relativismo matemático e físico cialmente, e a etnografia é também uma prá-
Etnografia e seria muito útil e teria algo a ensinar aos tica de sentido.'° Temos aí o esboço de uma
questões sócio-
ambientais: antropólogos. Essa lição é a de que po- antropologia simétrica da paisagem.
esboço de uma demos formular leis objetivas, significan-
antropologia Conclusões: esboço de uma
do isso que observadores diferentes
simétrica da
podem pôr-se de acordo sobre suas dife- antropologia simétrica da paisagem
paisagem
rentes observações, desde que saibam Este artigo tem a dupla pretensão de di-
Pedro Castelo como convertê-las umas nas outras atra- alogar com antropólogos e ecólogos envol-
Branco Silveira vés do grupo de transformações adequa- vidos com questões sócio-ambientais. Para
do." (Almeida, 1999, p. 10). isso julguei necessária esta abordagem que
Uma etnografia do espaço sócio-ecológi- pode ser lida como excessivamente revisi-
co seria então como a fabricação artesanal onista. Tento, agora, atar os nós finais de
de um mosaico. A partir diferentes concep- minha argumentação.
ções sobre a paisagem, que mais do que dar Como afirmado anteriormente, a aborda-
diferentes respostas às mesmas perguntas, gem de paisagens me parece, na ecologia,
permitem a formulação de diferentes pergun- um dos campos mais promissores em for-
tas a se responder, pode-se justapor, sobre- mular diálogos férteis. Pelas dificuldades da
por e hibridizar diferentes matrizes inteligíveis história da disciplina em incorporar o fator
de compreensão de mundo, de modo a criar humano, no atual "estado da arte" da ecolo-

129
gia de paisagens, busca-se uma maior inte- não-humanos. As redes espaço-temporais
ração com as ciências sociais e a geografia. de entes humanos e não-humanos na pai-
A idéia de paisagem nunca foi explicitamen- sagem só podem ser formuladas a partir de
te um foco privilegiado da antropologia, mas um diálogo, que se dá em termos etnográfi-
sempre se fizeram recortes espaciais nas et- cos, entre o antropólogo, os ecólogos, os
nografias. Sempre se estudou "alguém em al- locais e outros. Quando Viveiros de Castro
gum lugar'. Aquestão mais específica que este (2003) propõe radicalmente que os antropó-
artigo coloca poderia vir de um ecólogo de pai- logos levem a sério seus nativos, isso signi-
sagem: como a antropologia pode colaborar fica levar a sério formulações a respeito de
com a ecologia em um enfoque de paisagem? equilíbrio e não equilíbrio, inclusive compre-
Em primeiro lugar, acho razoável partir- endendo como elas mudaram no tempo; e
mos do princípio de paisagem como uma significa levar tão a sério quanto teorias na-
porção arbitrária de espaço, à moda da eco- tivas sobre como formigas transformam-se
logia da paisagens. Assim, critérios de rele- em cipós e pajés em mapinguaris (Raimun-
vância caso a caso podem ser escolhidos do, em preparação).
para balizar o recorte da análise. Nisso a O não-humano, que não pode ser inter-
antropologia também converge com a eco- rogado pelo antropólogo, nesta chave é in-
logia de paisagens. Também à moda da eco- terrogado por ecólogos, benzedeiras,
logia de paisagens, o toco da explicação da caçadores, fazendeiros. A tarefa do antro-
heterogeneidade do espaço como objeto de pólogo, ao etnogratar estas redes, é a de
análise parece um tema amplo o bastante justapor, sobrepor, hibridizar estes proces-
para acomodar diferentes tipos de pergun- sos de interrogação para criar um mosaico
tas de diferentes sujeitos. etnográfico minimamente inteligível. Como
Se há pesquisadores da área biológica os matemáticos, saber fazer os procedime-
debruçados sobre a heterogeneidade espa- tos adequados de conversão (Almeida,
cial, e estes desejam colaborar com cientis- 1999). Assim somos capazes de produzir co-
tas sociais e com populações locais, o trabalho nhecimentos que, se quisermos, podemos
do antropólogo seda ode etnografar este tipo chamar de interdisciplinares.
de situação. Quais as perguntas que os ecó- Por fim, devo esclarecer que, se me ape-
logos fazem? Com base em que fazem estas go à paisagem como campo de convergên-
perguntas? Como os ecólogos produzem seu cia é por minha experiência de pesquisa e Etnografia e
conhecimento sobre o espaço? Qual o con- colaboração com ecólogos em um projetos questões sócio-
ambientais:
teúdo que acompanha estes como fazer? As desta natureza (Prado, 2006). Desse modo esboço de urna
mesmas perguntas valem para outros grupos posso dar uma contribuição em termos me- antropologia
simétrica da
sociais envolvidos com a produção daquela todológicos para pesquisas com enfoque só- paisagem
paisagem. Etnografar para tornar estas per- cio-ambiental. Acredito, porém, que minha
guntas e respostas inteligíveis entre os dite- argumentação geral vai além do uso de um Pedro Castelo
Branco Silveira
rentes grupos e ao leitor externo à questão é recorte espacial, ou da idéia de paisagem. Há
o ofício do antropólogo. diversas abordagem possíveis numa etnogra-
Não é uma idéia exatamente original, fia ligada às chamadas questões sócio-ambi-
após mais de quinze anos em que a inter- entais. Espero, por fim, ter convencido o leitor
displinaridade virou termo da moda (e pare- de que é possível recorrer à etnografia para
ce já ter saído de moda). A novidade, e a cruzar perspectivas científicas e não-científi-
especificidade da questão da paisagem, na cas numa base comum de entendimento, dei-
relação entre ecologia e antropologia, vem xando ruir as barreiras de purificação entre o
da possibilidade de se exercitar a tal antro- campo dos estudos do social e o campo dos
pologia simétrica de Latour, em que «social estudos do natural e deixando emergir os hi-
se amplie para relações entre humanos e bridismos dos imponderáveis da mundo real.

130
Notas

Este artigo é fruto da pesquisa de doutorado em Ciências nisms that govem the presence, distribution and abundan-
Sociais (IFCFI/ Unicanip) chamada 'Processos sócio-ecoló- co of species assemblages. There are many types ol cultu-
gicos: uma antropologia da paisagem em São Luiz do Parai- ral landscapes, but ali are historicalty dependent on initial
finge, SP', apoiada pelo CNPq e inserida no projeto conditions and on cultura ot a given time. Paradigms deve-
"Biodiversidade e Processos Sociais em São Luiz do Parai- loped by lhe tield of landscape ecology can be used to ex-
finge, 5V, apoiado pela FAPESP dentro do Programa Biota. piam lhe ecological retevance ot cultural landscapes and
2 As questões sócio-ambientais surgiram a partir do inicio their capacity to intorm and guide other human activities,
da década de 1990, quando valorizou-se academicamente especially in lhe economic sphere.'
e no seio dos movimentos sociais a idéia de que problemas a broad landscape conception unifies lhe variety ol
ambientais e problemas sociais podedam ter uma solução ecological, aesthetic, social anil psychological aspects, and
conjunta. No Brasil, um dos trabalhos mais representativos ii philosophically supersedes lhe contradiction between na-
nessa linha é da ONG Instituto Socioambiental (ISA). Para tural sciences and humanities. 1 doubt, however, that lhe
uma análise desta questão, ver Cunha e Almeida (2001) e temi landscape ecology is lhe most tavourable one for such
Escobar (1996). a broad 'meta-science'. ( ... ) In my opinion, landscape eco-
Ver Boaventura de Sousa Santos (1999) e Bruno Lalour logy cannot retleci ali facts and relations. But il can and
(1994), que discutem este esgotamento explicativo de for- should pul special issues imo lhe overail context of nature-
mas diferentes. environment-society.'

Temos atualmente uma visão mais sofisticada desta pro- '1 believe anthropology must escape setf-imposed doom
posição na antropologia ecológica de Emilio Morán (1998). and keep firmly focused on its propor object: social retati-
ons in ali their variations. Not social retations taken as a
Este debate se dá concomitante a outro, em que cultura
distinci domam (thre is no such thing), but ali phenomena
também pode causar natureza: aquele relacionado ao im-
as potentially comprising or imptying social retations. This
pacto das novas tecnologias no conceito de ser humano
means taking ali retations as social.
(Haraway, 1989; Strathern, 1992; Aabinow, 1999).
10 Afinal, como dizem Descola e Pátsson (1996:6), "mesmo
6 "lhe classification of plants and animais is only a limited
que a experiência de pesquisa de campo envolva momen-
aspect ol the social objectivation of nature, this process by
tos altamente 'pessoais', não é simplesmente um empre-
which cultura endows wilb a particular salience certain feia-
endimento solitário, uma reflexão monológica de um
fure ai its environment and certain fornis; of engagement
observador independente. A etnografia é um produto dialó-
with it. To understand such a process, one must siso take
gico envolvendo colegas, esposas, amigos e vizinhos- o
on account such dimensions as ontologies of non-human
resultado coletivo de uma 'longa conversa'.' (" white lhe
beings, spatial representations of social and num-social do-
experience ol lieldwoilç does involve highly 'personal' mo-
mains, ritual prescdptions ano proscsiptions of beings, etc.'
ments, ii is not simpty a solitary enterprise, lhe monoiogical
''geographic areas in which the relationsliips betwoen hu- reflection of an independent observer. Ethnography is a di-
man activity and the environment have created ecotogical, alogic product involving colleagues, spouses, friends and
socioeconomic, ano cultural patterns and feedback mocha- noighbours- lhe collective result ol a 'tong conversation').

Etnografia e
questões sócio-
amblentais:
esboço de uma
antropologia
simétilca da
paisagem

Pedro Castelo
Branco Silveira

131
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