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C. W. LEADBEATER

ESBOÇO TEOSÓFICO

Tradução:
PAULINO DIAMICO

EDITORA TESÓFICA ADYAR S. A.


S. PAULO

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ÍNDICE
CAPÍTULO I Preliminar - O que é a Teosofia 04
Como o sabemos 05
Método de observação 06
CAPÍTULO II Princípios Gerais 08
As três grandes Verdades 08
Corolários 09
Vantagens que este conhecimento acarreta 10
CAPÍTULO III A Divindade 12
O Plano Divino 13
Lição da Vida 14
CAPÍTULO IV O composto humano 16
O verdadeiro Homem 18
CAPÍTULO V A Reencarnação 20
CAPÍTULO VI Novo conceito da natureza humana 24
CAPÍTULO VII A Morte 26
CAPÍTULO VIII O passado e o futuro do homem 31
CAPÍTULO IX Causa e Efeito 34
CAPÍTULO X Benefícios da Teosofia 37

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CAPÍTULO I
PRELIMINAR - O QUE É A TEOSOFIA

Durante séculos inteiros os homens têm discutido e argumentado, repetindo


suas pesquisas sobre certas verdades fundamentais, como a existência de Deus e a
Sua natureza, suas relações com o homem, e o passado e o futuro da humanidade.
Os homens formaram conceitos tão diametralmente opostos sobre estes pontos e a
este respeito se atacam e se ridicularizam uns aos outros, com tal mordacidade e
aspereza que, no espírito das massas, acabou por formar-se uma opinião
extremamente cômoda: a de que sobre tais questões não é possível a certeza, e que
tudo se resume em teorias vagas e especulações, nebulosa do seio das quais surge,
de quando em quando, alguma falsa dedução, fundada em premissas mal
assentadas. Contra esta opinião das multidões, não puderam prevalecer as
afirmações claras e precisas, embora frequentemente também incríveis, das
diversas religiões positivas.
Será preciso dizer que esta opinião popular, de resto muito explicável, sob
certo aspecto, é absolutamente errônea? Existem, no que respeita a esses
assuntos, fatos certos e precisos. Existem e em grande número.
A Teosofia, ao contrário das religiões, no-los apresenta como matéria de
estudo e não como artigos de fé. A Teosofia não é em si mesma uma religião, pois
em relação às religiões é o que foram as antigas filosofias. Não as contradiz;
explica-as. Repudia, por necessariamente indigno da Divindade ou incompatível
com Ela, tudo quanto nas religiões é irracional ou absurdo, mas aceita o que todas,
ou qualquer delas, têm de razoável, explicando, comentando e coordenando num
conjunto harmônico as verdades isoladas.
A Teosofia afirma que é possível conhecer a Verdade, e que de fato se a
conhece abertamente. Considera todas as religiões, por divergentes que pareçam,
como a expressão de verdades idênticas, se bem que observadas de pontos de
vista distintos e sob aspectos diversos, pois, não obstante as discrepâncias, por
demais evidentes, nas nomenclaturas e artigos de fé, todas estão concordes nos
pontos de capital importância: a conduta que um homem honrado deve observar
em sua vida, as qualidades que deve cultivar e os vícios a que deve fugir.
A respeito destes pontos de ordem prática, são idênticas as doutrinas do
Hinduismo, Budismo, Mazdeismo, Maometismo, Judaísmo e Cristianismo.
Quem não conhece a Teosofia poderá considerá-la como engenhosa hipótese
cosmogônica; mas para aqueles que a estudaram, não é mera teoria, e sim a
expressão de fatos positivos. É uma ciência exata, que pode ser aprofundada como
qualquer outra, e aquilo que nos ensina pode ser comprovado experimentalmente
por quantos se deem ao trabalho de submeter-se às condições necessárias. A
Teosofia, assim, é a afirmação dos grandes fatos da Natureza; a explicação de
quantos fenômenos a ciência conhece; e, finalmente, a descrição esquemática do
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trecho do Universo que habitamos.

COMO O SABEMOS?

Como se chegou, porém, ao conhecimento deste esquema? (1) Quem o


descobriu? - perguntará o leitor. Não dizemos que tenha sido descoberto, porque
em realidade o gênero humano sempre o conheceu, embora esse conhecimento
haja desaparecido, momentaneamente, de algumas partes do mundo. Houve
sempre uma coletividade de homens sumamente evoluídos, pertencentes não a
uma única nação, mas a todas as nações civilizadas - com pleno conhecimento deste
esquema. Tais homens sempre tiveram discípulos que, sob sua direção, estudaram a
fundo estas verdades, ao mesmo tempo que, externamente, divulgavam os seus
princípios gerais. Esta assembleia de homens sumamente evoluídos existe ainda,
como existiu noutros tempos, e, por instigação sua, alguns de seus discípulos dão ao
mundo ocidental os ensinamentos teosóficos.
(1). Empregaremos esta palavra como significando o plano de atividade de um
universo, desde seu ponto de origem como manifestação até a reabsorção; como o
desenho mental, puro, do que será a evolução em todo o período de atividade. (N.
do E.)
Os que tudo ignoram destes assuntos têm argumentado a tal respeito (por
vezes com insistência) que, a ser assim, as verdades teriam sido publicadas há já
muito tempo; e têm repreendido injustamente aos que possuem tais
conhecimentos o fato de colocarem, com um silêncio culpável, a luz debaixo do
alqueire. Entretanto, esquecem-se de que todos quantos em verdade procuram
estas verdades, sempre puderam achá-las, e que o mundo ocidental não fez mais do
que reiniciar indagações.
Durante séculos a maioria dos europeus satisfez-se com viver na mais grosseira
superstição, e, quando o impulso do progresso mostrou-lhes o absurdo de suas
ridículas e falsas crenças, adotaram o ateísmo, tão absurdo e cego como os
embustes aos quais substituía.
Assim é que, até hoje em dia, não haviam ainda alguns homens, dentre os mais
doutos e modestos, começado a compreender que nada sabiam e a perguntar a si
próprios se seria possível aprender alguma coisa.
Embora os razoáveis indagadores sejam ainda muito poucos, fundou-se a
Sociedade Teosófica, com o fim de congregá-los e publicar livros nos quais quem
deseje possa ler, observar, aprender e assimilar aquelas grandes verdades. O
objetivo da Sociedade Teosófica não é, de forma alguma, inculcar à força as suas
doutrinas a entendimentos rebeldes, mas expô-las singelamente, de modo que
quantos delas sintam necessidade possam compreendê-las. Não padecemos da
ilusão do missionário que, com triste arrogância, atreve-se a condenar ao tormento
eterno a todo homem que não confesse seu mesquinho símbolo peculiar. Sabemos
perfeitamente que, em último termo, hão de salvar-se até os próprios que agora
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recusam, por impossível, esta verdade, quanto mais aqueles que avidamente a
recebem. Mas, pelo que a nós cabe pessoalmente e a milhares de nossos
semelhantes, o conhecimento da verdade tornou a vida mais suportável e menos
temível a morte. Somente o puro desejo de que nossos irmãos participem de tais
vantagens nos move a tratar destes assuntos.
Há milhares de anos, e ainda hoje, são conhecidas em quase todo o mundo as
principais verdades da grande doutrina. Unicamente nós outros, ocidentais, nos
temos obstinado com presunçosa suficiência em ignorá-las, sorrindo com desprezo
cada vez que à nossa mente oferecia uma delas. Na ciência da alma, como em todas
as outras, só são conquistáveis as noções circunstanciadas pelos indagadores que
dedicam a sua vida a esse ramo especial. Os homens que neste mundo possuem
pleno conhecimento (os chamados Adeptos), desenvolveram pacientemente neles
mesmos as faculdades necessárias para o observação infalível. Portanto, sob este
ponto de vista, o método de investigação oculta difere dos processos empregados
na ciência moderna. Esta põe todo o seu empenho em aperfeiçoar os aparelhos de
observação, ao passo que o método oculto atende primeiro ao desenvolvimento do
próprio observador.

MÉTODO DE OBSERVAÇÃO

Para pormenorizar semelhante desenvolvimento precisaríamos maior espaço


do que o permitido por um manual. Noutras obras teosóficas o leitor encontrará o
esquema completo de dito desenvolvimento. Basta dizer, por agora, que tudo é
questão de vibrações. Nenhum conhecimento do mundo exterior adquirimos a não
ser por meio de vibrações, de uma ou outra espécie, que ferem nossa vista, ouvido
e tato. Assim, pois, si um homem conseguir tornar-se·receptivo de vibrações
suplementares, adquirirá um suplemento de percepções exteriores, chegando a ser,
por exemplo, o que é chamar-se um "clarividente". Esta palavra, em sua acepção
vulgar, só significa uma pequena ampliação da vista ordinária; mas o homem pode
tornar-se cada vez mais receptivo de vibrações também cada vez mais sutis, até
que, apoiando a consciência sobre alguma faculdade novamente desenvolvida,
acabe por trilhar novos e mais elevados caminhos. Então vê desenrolarem-se os
mundos que imagina serem de matéria mais sutil e que, em realidade, não são mais
do que novas regiões deste mesmo mundo, do qual já conhece algumas comarcas.
Assim aprende que, durante toda a sua vida, um vasto e despercebido mundo o
rodeia e que tal mundo influi constantemente, de mil modos, sobre ele, ainda
quando permaneça completamente cego e inconsciente da sua existência. Mas,
quando desenvolve as faculdades com o auxílio das quais pode pôr-se em contacto
com esses mundos novos, é-lhe possível observá-los científicamente, reiterar
amiúde as observações, compará-las com as de outros, ordená-las e coligir as
deduções que delas derivam.
Tudo isto tem-se feito, não uma, mas milhares de vezes. Os Adeptos, aos quais
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já me referi, consagraram todos os seus esforços a esta obra, e os investigadores da
Sociedade Teosófica têm dirigido ao mesmo fim os seus. Graças às nossas
investigações, não só temos comprovado grande número de dados que, no
princípio, os Mestres nos deram, como também temos podido explicar e ampliar
muitos deles.
A contemplação desta parte habitualmente invisível do nosso mundo nos
proporciona, desde o primeiro momento, o conhecimento de um vasto conjunto de
fatos inteiramente novos e extremamente interessantes. E nos dá, gradualmente, a
solução dos mais difíceis problemas da vida, revela muitos mistérios e nos faz
compreender porque nos pareciam tais até então. Era porque não víamos senão
uma pequena parte dos fatos e, em vez de abarcar o conjunto harmonioso, os
contemplávamos de baixo, e nos pareciam incoerentes e de certo modo
dissociados.
A Teosofia soluciona de momento grande número das mais debatidas
questões, como, por exemplo, a da continuidade da existência humana depois da
morte; e nos dá a verdadeira explicação de quanto impossível de per si afirmam as
diferentes igrejas a respeito do céu, inferno e purgatório. Enfim, a Teosofia ilumina
a nossa ignorância e dissipa o nosso temor ao desconhecido, dando-nos uma noção
racional e clara do universo interior, noção que tratarei de expor.

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CAPÍTULO II
PRINCÍPIOS GERAIS

Desejo ardentemente expor uma ideia tão clara e facilmente compreensível da


Teosofia quanto me seja possível.
Portanto, não enunciarei mais do que os princípios gerais de cada ponto
particular. Se o leitor desejar amplas informações, pode consultar obras mais
importantes, bem como as monografias que tratam de cada matéria especial. No fim
de cada capítulo citarei as obras mais a propósito a serem consultadas pelos que
desejarem aprofundar tão atraente sistema. Começarei, pois, pelo simples
enunciado do que de mais notável se encontra nos princípios gerais que o estudo da
Teosofia permite estabelecer. Alguns leitores encontrarão afirmativas que talvez lhes
pareçam incríveis e absolutamente opostas a suas ideias preconcebidas. Lembrem-
se, não obstante, de que nada exponho como simples teoria nem especulação
metafísica ou opinião religiosa a mim peculiares, mas sim como um conjunto de fatos
científicos, analisados e comprovados muitas vezes por mim mesmo e por outros.
Declaro, além disso, que este conjunto de fatos pode comprová-lo quem quer que seja
que empregue o tempo e o trabalho necessários para tal fim. Não ofereço ao leitor um
Credo que deva engolir como uma pílula. Trato de fazer a exposição de um sistema para
que o estude e de dizer-lhe como deve viver. Não lhe exijo fé cega. Unicamente lhe peço
que considere a Teosofia como uma de tantas hipóteses, se bem para mim seja a mais viva
realidade.
Se esta chamada hipótese satisfaz mais ao leitor do que as outras; se lhe parece que
resolve maior número de problemas da vida; que responde a maior número de perguntas,
então ele que aprofunde mais ainda o seu estudo, pois encontrará, segundo creio e espero,
a satisfação sempre crescente e o gozo íntimo que eu próprio encontrei. Se, pelo contrário,
julgar preferível qualquer outro sistema, nenhum mal lhe resultará daí, pois terá aprendido
uma parcela das crenças de uma sociedade de homens com os quais, de momento, não
chegou a concordar. Mas, pelo que a mim diz respeito, tenho suficiente fé nestas crenças
para garantir que tarde ou cedo chegará a hora em que o leitor as admita, quando souber o
que nós sabemos.

AS TRÊS GRANDES VERDADES

Uma das principais obras teosóficas estabelece três verdades absolutas que jamais
poderão desaparecer por completo; mesmo que, em certas épocas, sofram passageiros
eclipses, por ninguém se dar então ao trabalho de proclamá-las. Estas verdades
fundamentais são tão vastas e sublimes como a própria vida e, não obstante, tão simples
como o espírito do homem mais ingênuo. Não posso deixar de colocá-las como os mais

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importantes princípios gerais dos que vou expor.
Em seguida, formularei alguns colorários às três verdades fundamentais, e em terceiro
lugar, enumerarei algumas das vantagens que resultam necessariamente destes
conhecimentos primordiais. Enfim, depois de haver bosquejado esquematicamente as
linhas gerais do assunto, examiná-las-emos uma e a uma e me esforçarei em dar todas as
explicações complementares que caibam nesta pequena obra para aproveitamento dos
principiantes.
1ª - Deus existe. É bom. É o grande "outorgante de vida" que mora em nós e fora de
nós. É imortal e eternamente bernfazejo. Não se pode vê-lo, nem ouvi-lo, nem tocá-lo e,
não obstante, percebe-o quem o deseja perceber.
2ª - O homem é imortal. A glória e esplendor de seu futuro não têm limites.
3ª - O mundo é regido por uma lei divina de justiça absoluta; de modo que cada
homem é em realidade o seu próprio juiz, o árbitro de sua própria vida e a si mesmo
proporciona glória ou ignomínia, prêmio ou castigo.

COROLARIOS

De cada uma das precedentes verdades primordiais se deduzem várias outras


subalternas que as explicam e corroboram.
Da primeira se deduzem as seguintes:
1ª - -Apesar das aparências, tudo está combinado com inteligência e precisão
para produzir o bem. Todos os acontecimentos por deploráveis, que pareçam,
ocorrem, em realidade, tal e conforme devem ocorrer. Tudo quanto nos rodeia
propende para nos auxiliar e não para nos embaraçar; porém, é necessário
compreendê-lo.
2ª - Posto que o plano do universo converge para favorecer o progresso
humano, é notório dever do homem, conhecer este plano.
3ª - O homem que chegou a compreender o plano tem também o dever de
cooperar inteligentemente na sua realização.
Da segunda verdade fundamental, derivam-se as seguintes:
1ª - O homem real é uma alma com um corpo acessórios.
2ª - O homem deve adotar a alma como ponto de partida para encarar todas as
coisas e, cada vez que em seu interior surgir um conflito, identificar-se com a parte
mais elevada do seu ser e não com a inferior.
3ª - Aquilo a que geralmente chamam vida humana, não é mais do que um dia
da verdadeira e eterna vida.
4ª - A Morte não tem tanta importância como geralmente lhe é dada. Não é o
fim da vida, mas unicamente a passagem de um degrau a outro da sua escala.
5ª - O homem tem, no seu passado, uma evolução imensa, cujo estudo é
extremamente interessante e instrutivo.
6ª - Tem do mesmo modo em sua frente, no seu futuro, uma admirável
evolução, cujo estudo é ainda mais interessante e instrutivo.
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7ª - É absolutamente certo que a alma humana acabará por atingir a meta que
lhe está assinalada, por muito que pareça ter-se desviado da linha de evolução.
Da terceira verdade fundamental se deduzem as seguintes:
1ª - Cada pensamento, cada palavra e cada ação produz resultado definido que
não é prêmio nem castigo exterior e sim a consequência infalível do pensamento, da
palavra ou da ação com a qual se relaciona, como o efeito com a sua causa, ao
modo de duas partes inseparáveis de um todo único.
2ª - Tanto por dever como por interesse próprio, o homem deve estudar a
fundo a lei divina, com o fim de resignar-se a ela e aproveitá-la como aproveita as
outras leis da natureza.
3ª - É necessário que o homem possua o domínio completo de si mesmo, a fim
de regular judiciosamente a sua vida, de conformidade com a lei divina.

VANTAGENS QUE ESTE CONHECIMENTO ACARRETA

Quando este conhecimento é plenamente assimilado, muda tão


completamente o aspecto da vida, que seria impossível enumerar as vantagens
todas que daí provêm. Mencionarei apenas algumas das direções principais nas
quais se manifesta a mudança, e, por pouco que o leitor reflita, perceberá, sem
dúvida, alguma das inumeráveis ramificações que partem dos galhos mais próximos
ao tronco.
Entenda-se bem, não obstante, que o conhecimento vago e indeterminado não
produzirá tais mudanças, Aliás, qualquer crença análoga à que os homens
professam, seria em virtude dos dogmas das respectivas religiões, completamente
ineficaz. Semelhantes crenças em nada modificam o gênero de vida. Se
acreditarmos nas grandes verdades como noutras leis da natureza, como
acreditadas, por exemplo, que o fogo queima e a água molha, então será imenso o
efeito que produzirão em nossa vida. A fé que temos na imortalidade das leis
naturais nos obriga a harmonizar os nossos atos com essas leis, convencidos de que
o fogo queima, tomamos as precauções necessárias para evitar a queimadura,
sabendo que a água afoga, faremos empenho, em não pisar em falso, se não formos
bons nadadores. O caso é que estas crenças particulares são precisas e efetivas
porque se baseiam no conhecimento confirmado pela experiência cotidiana. Pela
mesma razão, as crenças do estudante de Teosofia são, para ele, reais e precisas.
Assim, de tais crenças teosóficas decorrem as seguintes vantagens:
1ª - Conseguimos compreender a razão de ser da vida. Aprendemos como e
porque devemos viver, e nos convencemos então de que vale a pena viver quando
se compreende bem a vida.
2ª - Aprendemos a nos governar e, consequentemente, a nos desenvolver.
3ª - Aprendemos o melhor modo de ajudar àqueles que amamos, de ser úteis ao
próximo em primeiro lugar e depois à espécie humana inteira.
4ª - Aprendemos a encarar sempre todas as coisas sob o ponto de vista
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filosófico mais elevado, e nunca do ínfimo ponto de vista da personalidade.
Consequentemente:
5ª - Já não nos parecem tão graves as penas da vida.
6ª - Já não nos parecem injustos os acontecimentos que se desenrolam em
redor de nós, nem o nosso próprio destino.
7ª - Dissipa-se o temor da morte.
8ª - A dor produzida pela morte das pessoas queridas é suavizada em grande
parte.
9ª - Adquirimos novas ideias a respeito da vida post-mortem, e compreendemos
o papel que esta desempenha em nossa evolução.
10ª - Ficamos livres de atormentadoras preocupações de ordem religiosa, tanto
no que diz respeito à nossa própria pessoa, como no que concerne; aos nossos
amigos. Por exemplo, os temores relativos à salvação da alma.
11ª - Cessa toda ansiedade em relação ao nosso destino futuro e vivemos numa
paz serena e perfeita.
Estudemos agora pormenorizadamente estes diversos pontos e procuremos
explicá-los sucintamente.

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CAPÍTULO III
A DIVINDADE

Uma vez que declaramos ser a existência de Deus o primeiro e o mais


importante princípio teosófico, convém definir o sentido que damos à sublime
palavra Deus, da qual tanto se tem abusado. Antes de tudo procuraremos tirá-la dos
limites estreitos, em que a encerra a ignorância dos homens pouco evoluídos, e
restituir-lhe a admirável significação (embora infinitamente inferior à realidade) que
lhe deram os fulgores das religiões. Assim, faremos distinção entre Deus, a
Existência Infinita, por um lado, e por outro a manifestação dessa Existência
Suprema como Deus revelado que desenvolve e guia o Universo. Somente a esta
manifestação limitada aplicaremos o nome de "Deus Pessoal". Deus em Si mesmo,
transcende os limites de toda personalidade e está em tudo e através de tudo. Em
realidade, Ele é tudo. Por tal motivo - do Infinito, do Absoluto, do Todo -
unicamente podemos dizer que É.
Na prática, porém, não há necessidade de nos remontarmos além da gloriosa e
admirável manifestação d'AQUÊLE que é a suprema forca diretora ou Deidade do
nosso sistema solar, chamado Logos pelos filósofos (1). Tudo quanto temos ouvido
dizer de Deus (2) é aplicável ao Logos, bem como tudo quanto foi dito relativamente
ao amor, sabedoria, onipotência, misericórdia e imensidade de Deus.
Verdadeiramente é n'Ele que vivemos, nos movemos e agimos; e, ainda que isso
pareça estranho, não é uma imagem poética, mas sim fato científico e exato. Ao
falar, pois, da Divindade, o nosso primeiro pensamento deve dirigir-se ao Logos.
(1). O conceito do Logos é mais acessível à mente humana que o do Absoluto.
(2) Subentende-se que só nos referimos aos louvores, pois de modo algum faríamos
eco das blasfemas ideias que atribuíram a Deus todos os vícios e paixões do
homem.
A existência de Deus não é para nós uma suposição vaga, nem a nossa crença
n'Ele tem os caracteres de artigo de fé. Sabemos que existe, como sabemos que o
sol brilha, pois todo investigador que tenha exercitado a clarividência adquire a
certeza absoluta da Existência Onipotente. Ainda que em nenhum grau de nossa
evolução humana possamos ver diretamente a evidencia inegável da sua vontade e
da sua ação nos cerca e avassala desde o momento em que nos aplicamos ao estudo
do mundo invisível. Este é, na realidade, a região mais elevada do mundo que
habitualmente conhecemos.
Vamos explicar agora um dogma comum a todas as religiões: a Trindade. Por
incompreensível que possa parecer ao leitor indouto a afirmação dos diversos
credos sobre este ponto, é preciso reconhecer que se torna significativa e luminosa
assim que se desentranha o seu verdadeiro sentido. Tal como na sua obra se nos
mostra o Logos Solar, Ele é indubitàvelmente trino e, não obstante, uno, conforme
as religiões ensinaram sempre. As obras, que adiante citarei, explicam este aparente
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mistério, tanto quanto a mente humana pode compreendê-lo no seu estado atual
de evolução.
Outra verdade é que Deus está tanto em nós como fora de nós; em outros
termos: que a essência do homem é divina. A maior parte dos homens poderá, na
sua cegueira para quanto não seja o que de mais grosseiro existe no mundo
exterior, recusar tal verdade; mas, para quem contempla o aspecto sublime da vida,
essa verdade é absolutamente certa.
No parágrafo consagrado à segunda verdade primordial, trataremos da
constituição do homem e de seus diversos veículos. Basta indicar, por agora, que,
reconhecendo a nossa essência divina, temos a segurança de que todo ser humano
há de retornar, mais tarde ou mais cedo, ao seio de Deus.

O PLANO DIVINO

Nenhuma proposição é tão difícil de ser aceita pelo vulgo, como o primeiro
corolário da primeira verdade fundamental. Ao observar os fatos da vida cotidiana,
vemos tantas tormentas e tempestades, tantas penas e sofrimentos, que nos
inclinamos, no primeiro momento, a acreditar na vitória do mal sobre o bem; pois
parece impossível que a aparente desordem faça parte de uma evolução sabiamente
dirigida. Entretanto, esta é a verdade de que facilmente nos podemos convencer!
Basta para isso apartarmo-nos da nuvem de pó que a nossa encarniçada luta contra
o mundo exterior levanta, e examinar tudo do ponto de vista que nos oferecem a
paz interior e um conhecimento mais completo. Então ficam a descoberto os
mecanismos desta complicada engrenagem. Pensávamos que as correntes do mal,
opostas à caudalosa corrente do progresso, prevaleceriam. E vemos que, ao fim e ao
termo, as correntes contrárias não são mais do que insignificantes agitações, leves e
superficiais redemoinhos, nos quais algumas gotas d’água parecem remontar à
majestosa corrente. Entretanto esta, apesar das aparências, e arrastando consigo
agitações e remoinhos, prossegue serenamente o seu curso para o escoadouro que
lhe está assinalado. A grande corrente da evolução persiste do mesmo modo no seu
caminho, e o que tomamos por terríveis tempestades não são mais do que
ondulações da superfície. Em apoio desta verdade, M. C. H. Hinton expõe outro
símile. (1)
(1). Scientific Romances, 1, 18, 24.
Segundo nos ensina a terceira verdade primordial, a justiça absoluta intervém
em tudo. Portanto, em quaisquer circunstância que o homem se ache, deve saber
que ele próprio as engendrou.
Porém, isto não é tudo. Havemos de estar também inquebrantavelmente
convencidos de que, por efeito das leis da evolução, tudo concorre para
proporcionar ao homem os meios mais eficazes de desenvolver em si mesmo as
qualidades que lhe sejam mais necessárias. Pode-se mesmo dar o caso de que não
tenha escolhido a situação em que se encontra; mas tal situação é sempre a que
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deve ser, porque a merece, e por isso é a mais conveniente ao seu progresso. A vida
pode opor ao homem obstáculos de toda espécie. Todavia, os obstáculos têm um
único fim: ensiná-lo a vencê-los e a desenvolver em si mesmo o valor, a resolução, a
paciência, a perseverança, em suma todas as qualidade de que carecer. Com
frequência o homem fala das forcas da natureza com se todas conspirassem contra
ele. Contudo, se refletisse melhor compreenderia que, ao contrário, tudo está
cuidadosamente previsto para ajudá-lo na sua ascensão progressiva.
Posto que o plano divino existe em realidade, o homem deve tratar de
compreendê-lo. Não há necessidade de demonstrar esta proposição. Se se tratasse
unicamente de assunto de interesse pessoal, nada melhor poderia fazer quem
vivesse em certas condições, do que acostumar-se a elas. Todavia, desde o
momento que o homem deixa de obedecer a considerações egoístas, tem mais
claramente assinalado o dever de estudar o plano divino, com o fim de cooperar
eficazmente para a sua realização.
Não há dúvida de que no plano divino deve-se contar com a cooperação
inteligente do homem, tão depressa tenha ele adquirido o desenvolvimento mental
suficiente para abarcar tal plano e a evolução moral precisa para que deseje auxiliar
o mundo. Na verdade, o plano divino é tão belo e admirável que, se o homem
chegar a contemplá-lo uma vez apenas, não terá outro remédio senão dedicar todos
os seus esforços a converter-se em operário de Deus, por ínfimo que seja o trabalho
que se lhe confie. (1)
(1) Para ampliar o conhecimento da matéria esboçada neste capítulo, o leitor
pode consultar as obras seguintes: "O Cristianismo Esotérico e a Sabedoria
Antiga", de A. Besant; "O Credo Cristão", de Leadbeater; "Fragmento de uma
crença esquecida" e "Orfeo", de Mead. (Livraria Orientalista, de R. Maynadé).

LIÇÃO DA VIDA

Conforme de minha vida avanço na senda


e os meus olhos vêm mais claro, aprendo
que, sob as a aparências da desordem,
medra o raizame da justiça.
Que a pena e a dor têm o seu objetivo
por mais que quem os sofra não o saiba,
é tão certo como com o sol a aurora
nasce, e que tudo quanto existe é bom.
Como sei que a noite engendra sombra,
sei que qualquer ação punível
nalgum dia e logar terá condenação
por longo que seja o prazo do castigo.
Sei que as torturas do coração
auxiliam algumas vezes nossas alma,

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e que para o seu desenvolvimento
lhe são necessárias amarguras
do cálice transbordante e sempre cheio;
mas sei que tudo quanto existe é bom
Sei que não existe nenhum erro
no divino e vasto plano eterno
e que entre humanos seres nenhum há
que não coopere ao bem de todos eles.
Sei que quando minha alma ao alto ascenda
perseguindo o seu inextinguível anseio
em direção à terra olhará, dizendo
que tudo é bom quanto nela existe.
(Poesia anônima publicada por um
jornal norte-americano).

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CAPÍTULO IV
O COMPOSTO HUMANO

Não se pode demonstrar de modo mais concludente o materialismo profundo


ao qual a Europa tem estado praticamente entregue, do que pelas próprias
locuções que empregamos na vida diária. Dizemos habitualmente e com inteira
naturalidade: "O homem "tem" alma; devemos "salvar" a nossa alma", etc., etc.,
como se o verdadeiro homem, o homem real, residisse essencialmente no corpo
físico e a alma fosse simples acessório, algo vago que pertencesse ao corpo e
dependesse dele.
Com semelhante ideia, cuja extremada inexatidão até a própria linguagem
revela, não nos deve maravilhar que algumas pessoas avancem um pouco além
pelo mesmo caminho e perguntem, por exemplo, se realmente existe esse "alguma
coisa" vaga que se chama alma. Daí resulta, frequentemente, não saberem os
homens, em geral, se têm ou não alma e se esta alma é imortal.
O surpreendente é que a humanidade possa permanecer em tão deplorável
ignorância, pois a multidão de provas, que o próprio mundo exterior oferece,
demonstra que o homem tem uma modalidade de existência absolutamente
independente da vida de seu corpo. Uma vida particular que antes da morte pode
manifestar-se a certa distância do corpo carnal e que depois se separa
completamente do cadáver. Enquanto não afastarmos de nós a inconcebível ilusão
de que somos o nosso corpo, ser-nos-á impossível ajuizar bem, a respeito deste
assunto. Um pouco de reflexão, porém, nos mostrará logo a existência de outros
tipos de matéria e a realidade não só da matéria sutil (que, sob o nome de "éter", a
ciência moderna admite, afirmando que penetra todos os corpos), como também
de matérias mais sutis do que o éter e que o penetram e o superam em tenuidade.
O leitor talvez pergunte se o homem chegará algum dia a conhecer essas
maravilhosas, sutis e incoercíveis variedades da matéria. Responderemos que há de
conhecê-las perfeitamente, como já conhece as formas grosseiras. Isto, quando
perceber as vibrações que emite. E ser-lhe-á possível perceber semelhantes
vibrações pela simples razão de que em si próprio tem matéria de tais variedades
sutis. Do mesmo modo que o seu corpo físico é o meio pelo qual se comunica, ativa
ou passivamente com o mundo físico, assim as partículas de matéria sutil que o
homem encerra lhe constituem um órgão capaz de pô-lo em comunicação com os
mundos de matéria sutil, mundos que a grosseria dos sentidos corporais ordinários
não pode perceber. E a ideia não é nova, pois já S. Paulo disse que "há corpos
terrenos e corpos celestiais". S. Paulo, além disso, fala claramente da "alma" e do
"espírito" do homem, não empregando estas palavras como sinônimas; se bem que,
em nossos dias, haja quem as tome por tal, revelando, assim, sua ignorância.
Torna-se evidente que a constituição do homem é muito mais complexa do que
geralmente se crê. Não só há um espírito e uma alma, como ainda a própria alma,
16
que "empresta forma ao espírito", dispõe de vários veículos de crescente
densidade, dos quais o inferior e mais material é o corpo físico. A todos estes
veículos se pode chamar corpos, se os considerarmos em relação aos planos de
matéria especial a que pertencem.
Com efeito, existe ao redor de nós uma série de mundos que se compenetram,
e o homem possui um corpo da mesma natureza de cada um desses mundos, com
os quais pode comunicar-se e até viver em qualquer deles, mediante o corpo
respectivo.
O homem aprende gradativamente a utilizar seus diferentes corpos. E isso lhe
permite adquirir, pouco a pouco, noção cada vez mais completa do vasto e
complicado universo em que vive, pois os mundos sutis também fazem parte
integrante do Cosmo. Assim, o homem chega a compreender muitas coisas que
antes lhe pareciam misteriosas; cessa de identificar-se com os seus corpos,
compreendendo que não são mais do que roupas que pode vestir, despir ou mudar,
sem alterar a essência de sua individualidade. Será preciso insistir ainda em que isto
não são especulações metafísicas nem crenças piedosas? São fatos cientificamente
certos, corroborados pela experiência e conhecidos com exatidão de quantos têm
estudado Teosofia. Muitos estranharão que nestes assuntos as afirmações precisas
substituam as hipóteses ordinárias. Todavia falamos aqui unicamente do que
grande número de investigadores conhecem graças a múltiplas e repetidas
experiências. É certo que sabemos o que dizemos e sabemos por experiências e não
por ouvir dizer. Por isso falamos confiadamente.
Os diferentes mundos que se interpenetram, os diferentes graus de
materialidade que a natureza nos oferece, designam-se em Teosofia com o nome de
"planos". Chamamos "plano físico" ao mundo visível, incluindo nele os gazes e os
diferentes estados do éter. Ao grau de materialidade que vem imediatamente
depois do plano físico, os alquimistas da idade média chamaram plano astral, cuja
existência conheciam muito bem. A Teosofia respeitou esta denominação.
Além do plano astral (1) existe um mundo de matéria ainda mais sutil, que
chamamos "plano mental", porque é a matéria constitutiva da "mente" do homem.

(1) A palavra "além" não significa aqui, distância, e sim maior sutileza da matéria. Já o dissemos, e o estudante deve
ter sempre presente que os planos ou mundos se compenetram.

Existem, por último, outros planos superiores ao mental. Não os


mencionaremos para evitar confusões, pois no momento só trataremos das
manifestações do composto humano nos mundos inferiores.
Tenhamos sempre presente que, "no espaço", estes mundos não estão um
mais longe do que outro. Realmente, todos ocupam o mesmo lugar e todos, na
mesma proporção e constantemente, nos penetram e rodeiam. No momento atual
a nossa consciência está equilibrada e como que localizada no cérebro físico, que é o
seu órgão atual. Daí resulta o termos consciência do mundo físico unicamente, e
isso mesmo, só de parte dele. Bastará aprendermos a focalizar e concentrar a nossa
consciência num dos veículos superiores para que os objetos físicos se dissipem à
17
nossa vista e possamos perceber, em vez deles, o mundo constituído da matéria
correspondente ao veículo empregado. Relembremos que a matéria é única
substancialmente falando. A diferença entre a matéria astral e a física não é maior,
em qualidade, do que a existente entre o gelo e o vapor da água. É a mesma
substância em diversos estados e condições. A matéria física pode converter-se em
astral, e esta em mental. É suficiente, para isso, subdividi-la convenientemente, e
comunicar-lhe o movimento vibratório que, em rapidez, corresponda a esses
diferentes estados.

O VERDADEIRO HOMEM

Que é, pois, o verdadeiro homem? O homem verdadeiro é, em realidade, uma


emanação do Logos, uma chispa do Fogo divino. O Espírito que existe no homem é
da essência da Divindade e tem como invólucro uma alma que o individualiza,
separando-o aparentemente, por certo tempo, da Vida Divina.
Admirável e interessante é a história da primeira formação da alma humana e
da investidura do Espírito nessa alma, porém, sua narração não cabe nas poucas
páginas de uma obra prolegomênica.
O leitor encontra-Ias-á por extenso em tratados especiais. Basta dizer aqui que
os três aspectos da Vida Divina funcionam nesta gênese, e que a formação da alma
humana constitui, de certo modo, o grande sacrifício do Logos no descenso à
matéria, ou seja, o ato chamado Encarnação.
Eis aí, pois, nascida a alma-infante. E, assim como foi formada "à imagem de
Deus", trina no seu aspecto como o próprio Deus e trina como Ele na sua
manifestação, assim também seu processo evolutivo será a contra-marcha do seu
descenso à matéria. A Chispa Divina possui todas as potencialidades, mas ser-lhe-á
necessário evoluir durante idades de idades antes de pô-las em ação. O processo
estabelecido, para a atualização das qualidades latentes no homem, parece ser o de
que este vá aprendendo a responder às vibrações exteriores, vibrando
harmonicamente com elas. Mas, no nível onde se acha o homem verdadeiro (isto é,
no plano mental superior), as vibrações são demasiado tênues para que o homem
carnal possa responder a elas. Porque, a princípio, o homem percebe apenas
movimentos de energia vibratória grosseira e violenta; e só quando, por meio delas,
a sua letárgica sensibilidade acorda, é que ele vai se tornando mais sensitivo, até
que, por fim, responde perfeitamente a toda classe de vibrações em todos os planos.
Tal é o aspecto material do progresso humano. Mas, partindo do ponto de vista
subjetivo, o homem capaz de responder a todas as vibrações, tem de entesourar em
toda a sua plenitude a faculdade de simpatizar e de compadecer. Esta é, com efeito,
a característica rigorosa do homem evoluído, do Adepto, do Instrutor espiritual, do
Cristo. Semelhante condição tem de ser precedida do desenvolvimento de todas as
18
qualidades que dão perfeição ao homem. Tal é o verdadeiro trabalho de sua longa
vida na matéria.
Neste capítulo deixamos esboçados pontos importantíssimos. Aqueles que
desejarem aprofundar o seu estudo podem consultar as obras teosóficas que
citamos na nota. abaixo. (1)
(1). "A Vereda do discipulado", "Nascimento e evolução da alma", "O Homem e
seus corpos", "O Eu e seus veículos" "Os sete princípios do homem" e "Em
Direção ao Templo'" de A. Besant. "O Homem visível e invisível" "Clarividência'"
"O Credo Cristão" e "Protetores invisíveis", de C. w. Leadbeabeater.
Desenvolvimento da alma", de Sinnett.

19
CAPÍTULO V
A REENCARNAÇÃO

Visto que, no princípio, as vibrações muito sutis não podem influir na alma, é
preciso que esta se revista de invólucros suficientemente grosseiros para que ao
menos as vibrações mais pesadas possam afetá-la. Assim, a alma se reveste
sucessivamente dos corpos mental, astral e físico. Isto constitui um nascimento ou
encarnação, o começo de uma vida física, durante a qual a alma adquire alguma
experiência sobre toda ordem de coisas; aprende, por assim dizer, certas lições e
desenvolve determinadas qualidades.
Ao termo de um tempo mais ou menos longo, a alma torna a concentrar-se em
si mesma e vai se despojando, um após outro, dos corpos de que se revestiu. O
primeiro a ser abandonado é o físico, e a este abandono chamamos morte, que não
representa, de modo algum, a cessação de nossas atividades, como ignorantemente
supomos. Nada mais contrário à verdade do que esta suposição. A morte é, em
verdade, o simples esforço que a alma realiza para recolher-se em si mesma,
levando como fruto de sua vida terrena os conhecimentos adquiridos. Após um
período de repouso mais ou menos longo, ser-lhe-á mister fazer outro esforço da
mesma natureza.
Assim, pois, conforme dissemos, o que geralmente chamamos vida, é apenas
um dia da mais durável e verdadeira vida, é um dia de escola no qual a nossa alma
aprende apenas algumas lições. Mas, o que é uma vida de 70 ou 80 anos, no
máximo, para aprender todas as lições que o mundo nos deve ensinar e que Deus
quer que nos ensine? A nossa alma há de, forçosamente, renascer várias vezes para
viver dias e anos na escola que chamamos existência, em classes diversas e em
diversos ambientes, até receber todas as lições que tenha necessidade de aprender.
Então e só então termina a nossa tarefa de escolares e passamos a cumprir um
dever mais elevado e glorioso: o da vida divina, para o qual não é mais do que uma
preparação a aprendizagem das vidas terrestres.
Eis, pois, em que consiste a doutrina da reencarnação e dos renascimentos,
doutrina quase universalmente admitida pelos povos civilizados da antiguidade e
que ainda é professada pela maior parte da espécie humana.
"O que é incorruptível - diz Hume - deve ser igualmente improcriável. Se a alma
é imortal, deve preexistir ao nascimento do corpo. Portanto, a metempsicose é o
único sistema espiritualista admissível pela filosofia" (1).
(1). Hume: "Essay on Immortality" - Londres, 1875.
A propósito das teorias reencarnacionistas da Índia e da Grécia, diz Max Muller:
"Baseiam-se numa ideia que, se estivesse expressa em termos menos
mitológicos, poderia. considerar-se como a melhor prova de cultura filosófica
superior" (2).
(2). Max Muller: "Teosofia ó Religión psicológica", 22 - Edição de 1895.
20
Em sua obra póstuma, o grande orientalista insiste na doutrina da
reencarnação, declarando que, pessoalmente, acredita nela.
Huxley, por sua parte, diz:
"A doutrina da transmigração tem, como a doutrina evolucionista, a sua raiz no
mundo dos fatos e funda-se em tudo quanto a analogia pode proporcionar de mais
demonstrativo relativamente a argumentos".
Vemos que tanto os escritores modernos como os antigos consideram digna de
sério exame a hipótese reencarnacionista. Todavia, nem por um momento devemos
confundi-la com aquela outra teoria, filha de profunda ignorância, segundo a qual a
alma, chegada por evolução ao período humano, podia regressar e converter-se em
alma de animal. De modo algum. Tal regressão é absolutamente impossível. Desde o
momento em que um homem existe (é uma alma humana com o corpo causal por
invólucro), não pode mais retroceder ao reino animal em razão de erros cometidos,
por muito grande que seja a sua teimosia em desperdiçar as ocasiões de progresso
que se lhe ofereçam. Se tal homem é preguiçoso e desaplicado na escola da vida, da
qual falamos acima, terá que repetir a mesma lição, até que, cedo ou tarde, chegue a
sabê-la, por lentos que sejam os seus adiantamentos.
Faz alguns anos, uma revista expôs, galantemente, a crença nesta doutrina,
dizendo:
Um pimpolho foi à escola sem saber mais do que o que tinha sugado com o leite
de sua mãe. O mestre, que era o próprio Deus, colocou-o na ínfima classe e marcou-
lhe estas lições, para que as aprendesse: - "Não matarás. Não farás mal a nenhum
ser vivo. Não furtarás". O discípulo não matou, mas foi cruel e furtou. Ao terminar o
dia, quando já trazia cans da barba, e veio a noite, o mestre, que era o próprio Deus,
lhe disse: - "Aprendeste a não matar, mas não aprendeste as outras lições. Volta
amanhã".
Feito menino, voltou na manhã seguinte, e o mestre, que era o próprio Deus,
colocou-o numa classe mais adiantada e lhe marcou estas lições:
"Não farás mal a nenhum ser vivente. Não furtarás. Não mentirás". E o discípulo
não fez mal a ser vivente algum, mas furtou e mentiu. E pelo fim do dia, quando veio
a noite e a sua barba encaneceu, o mestre, que era o próprio Deus, lhe disse:
"Aprendeste a ser compassivo, mas não aprendeste as outras lições. Volta amanhã".
E outra vez, no dia seguinte, voltou feito menino. E seu mestre, que era o
próprio Deus, colocou-o numa classe um tanto mais adiantada e lhe marcou estas
lições: "Não furtarás. Não mentirás. Não cobiçarás". E o discípulo não furtou, mas
mentiu e cobiçou. De modo que, ao termo do dia, quando veio a noite e a sua barba
estava branca, o mestre, que era o próprio Deus, lhe disse: "Aprendeste a não furtar,
mas não aprendeste as outras lições. Volta amanhã, meu filho".
Isto li no rosto de homens e mulheres e no livro do mundo e no pergaminho
que, escrito com estrelas, se desenrola nos céus". (1)
(1). Berry Benson, "The Century Magazine", Maio de 1894.
Não acumularemos nestas páginas os inúmeros argumentos irrefutáveis sobre
os quais se funda a doutrina da reencarnação, pois estão magistralmente expostos e
21
por pena mais douta noutras obras teosóficas. Observaremos que a vida nos põe
frente à frente inumeráveis problemas, cuja solução só se acha na hipótese
reencarnacionista. Esta grande verdade os explica e, consequentemente, somos
levados a tê-la por boa enquanto não se descubra outra hipótese mais satisfatória.
Acrescentarei que, para muitos de nós (e o mesmo podemos dizer dos outros
ensinos), esta chamada hipótese não o é de modo algum, mas sim conhecimento
sólido e diretamente obtido, ainda que isso não possa servir de prova para a massa
em geral.
Exporemos outra consideração: grande número de varões justos e virtuosos se
têm visto tristemente incapacitados de conciliar os acontecimentos de que
diariamente eram testemunhas, com a existência de um Deus ao mesmo tempo todo
poderoso e infinitamente bom.
O espetáculo das torturas morais e dos sofrimentos físicos sugeria-lhes o dilema
de que: ou Deus não era onipotente e não podia impedir o mal, ou não era
infinitamente bom e via com indiferença nossas misérias. Nós, os teósofos, temos a
inquebrantável convicção de que Deus- é todo Poder e ao mesmo tempo todo Amor,
pois graças à doutrina fundamental da reencarnação, podemos conciliar com esta
certeza a realidade das amarguras que nos rodeiam. Seguramente merece detido
exame a única hipótese que nos permite reconhecer racionalmente na Divindade a
perfeição da misericórdia e da onipotência, pois tal hipótese nos ensina que a nossa
vida atual não é um começo, mas sim que atrás de nós deixamos longa série de
existências, e mediante o que aprendemos no passado podemos nos elevar do nível
do homem primitivo à nossa condição presente. Não há dúvida que, no decorrer
dessas vidas passadas, haveríamos de ter agido bem e agido mal. De cada uma de
nossas ações resultou, de acordo com a lei de justiça infalível, uma proporção
definida de bem ou de mal. O bem produz sempre a felicidade e, além disso, as
condições favoráveis ao desenvolvimento ulterior.
Portanto, se de algum modo nos encontramos embaraçados em nossas
aspirações para o bem, havemos de compreender que esta inferioridade provém
unicamente de nós mesmos, ou é efeito da juventude de nossa alma; e se
estivermos pesarosos e em luta com a tristeza e o sofrimento, unicamente nós
mesmos somos os causadores disso. Os milhares e milhares de destinos dos homens,
tão variados e complexos, são outras tantas resultantes inevitáveis e exatas do bem
ou do mal inerentes aos seus atos anteriores, pois tudo progride regularmente de
conformidade com a lei divina e em previsão da final e gloriosa apoteose.
Nenhum ensinamento teosófico terá sido tão violentamente combatido como
esta grande verdade da reencarnação, e, não obstante, é uma doutrina
consoladora, pois nos concede o tempo necessário para realizarmos os progressos
que nos faltam e a possibilidade de chegarmos a ser "perfeitas" como o nosso Pai
"que está nos céus".
Alguns adversários apoiam o seu argumento principal na consideração de que
as penas e dores sofridas nesta vida forçam-nos a repelir a ideia de que seja
necessário repetir semelhantes provas. Fraco raciocínio! Dado que procuramos a
22
verdade e que vamos ao seu encontro, não havemos de retroceder perante ela,
ainda que o seu aspecto nos desagrade; mas, em realidade, a reencarnação bem
compreendida é, conforme já dissemos, uma doutrina profundamente consoladora.
Outros perguntam frequentemente por que se temos passado por tantas vidas
anteriores - não nos lembramos de nenhuma? Responderemos em duas palavras,
dizendo que algumas pessoas se recordam, se bem que sejam a minoria, pois a
grande maioria das pessoas de nossa época tem ainda a consciência focalizada num
dos seus veículos ou invólucros inferiores. Não é possível exigir deste veículo que
relembre encarnações anteriores, pois que jamais as teve; e a alma que as teve não
é ainda plenamente consciente no seu plano peculiar. Não obstante, todas as
recordações do passado ficam na alma, e as qualidade que a criança traz ao nascer
são, exatamente, a sua expressão. Mas quando um homem evoluiu o suficiente
para focalizar a sua consciência na alma e não já nos seus veículos inferiores, então
abre-se perante ele, como em livro aberto, a história completa de uma mais vasta e
verdadeira vida.

23
CAPÍTULO VI
NOVO CONCEITO DA NATUREZA HUMANA

Refletindo um pouco, veremos sem demora a mudança radical que se opera na


conduta de um homem convencido de que a vida física nada mais é do que um dia
de escola e de que o corpo físico nada mais é, tão pouco, do que um traje de
mecânico, que se abandona uma vez terminada a tarefa. Então o homem
compreende que o seu único trabalho importante é o de "aprender a lição
obrigada", e que seria néscia conduta distrair-se do cumprimento deste dever com
atrações frívolas.
Para quem conhece a verdade, é pueril e frívola a existência cotidiana do
comum dos homens que se afanam exclusivamente pelos bens materiais e correm
desazadamente empós da riqueza e da glória. Não é isso sacrificar o que é
verdadeiramente apetecível à momentânea satisfação do elemento inferior de nossa
natureza? O discípulo "afeiçoa-se às coisas do alto e não às terrenas"; primeiro,
porque tal é o seu dever, e depois, porque compreende perfeitamente a
insignificância de tudo quanto transitório. Procura colocar-se sempre no mais
elevado ponto de vista, pois que, se olhasse de baixo, não daria importância alguma
ao que pudesse ver, já que a vista estaria então obscurecida pela neblina espessa
em que as tentações e concupiscências nos envolvem.
Mas, - acaso não se verá em tentação o discípulo, por convencido que esteja,
de que há de caminhar pela vereda elevada? Sim, infelizmente. Ver-se-á
frequentemente solicitado e impelido para a vereda inferior.
No seu interior estalará formidável luta, experimentando o que, segundo a
frase enérgica de São Paulo: "A lei da carne entra em batalha com a lei do espírito";
e também descobrirá a verdade desta outra sentença: "Não faço o que quero e sim
o que não quero".
Observaremos, a propósito, que pessoas de profunda religiosidade se enganam
deploravelmente muitas vezes sobre a causa das lutas interiores que todos temos
sentido com alternativas de exacerbamento e moderação. Essas pessoas aceitam,
geralmente, uma destas duas explicações: ou supõem que a tentação provém do
demônio e é, em consequência, estranha à pessoa; ou, pela contrário, deploram a
negra malícia de sua alma e tremem em face do abismo de males que infestam seu
coração. É real que muitas pessoas boas e piedosas são atormentadas neste ponto
por angústias inúteis.
Se quisermos compreender bem este assunto, havemos de considerar primeiro
do que tudo, que os desejos concupiscentes não são, de forma alguma, nossos
desejos, nem tão pouco são efeito do demônio empenhado em apoderar-se de
nossa alma. É verdade, que, às vezes, atraímos entidades sinistras por meio dos
maus pensamentos que lhes dão vigor; mas estas entidades são de procriação
humana e, além disso, transitórias. Consistem simplesmente em formas artificiais,
24
engendradas pelos maus pensamentos dos homens e a vida fictícia que as anima
dura em proporção ao vigor do pensamento que as engendrou.
Porém, em regra geral, os impulsos nocivos que recebemos provêm de mui
diversa fonte. Dissemos que, durante a tarefa da encarnação o homem se reveste
sucessivamente de invólucros constituídos pela matéria dos diversos planos. Pois
bem, esta matéria não está morta (pois a ciência oculta nos ensina que não pode
haver matéria morta), mas sim, pelo contrário, é matéria viva e a vida que a anima é
instintiva. Mas a vida que anima esta matéria acha-se num grau de evolução muito
posterior ao do nosso Eu; e, portanto, tal matéria procura, esforça-se por descer mais,
dado que para elas o progresso consiste em densificar-se, ao passo que para o nosso Eu
consiste em sutilizar-se. É fácil, consequentemente, descobrir-se a causa do conflito se
considerarmos que o interesse do homem verdadeiro é oposto ao da matéria viva, que
constitui alguns dos seus veículos.
Eis aqui sucintamente esboçada a explicação do combate estranho que
experimentamos algumas vezes, interiormente, e que sugeriu a certos espíritos
poéticos a ideia dos anjos e demônios em luta pela posse das almas humanas.
O homem há de compreender, necessariamente, que ele próprio é a forca
superior que vai sempre na vanguarda e peleja pelo bem; ao passo que a forca inferior
não é "ele próprio", mas sim o fragmento rebelado de um de seus veículos inferiores. O
homem verdadeiro há de aprender a subjugar este fragmento rebelde, a dominá-lo por
completo e reduzi-lo à obediência; mas não há de cair no erro de considerá-lo
intrinsecamente perverso, pois também é uma emanação do poder divino, que se
esforça por prosseguir sua trajetória normal em descenso à matéria, em vez de
desprender-se dela como nós devemos fazer.

25
CAPÍTULO VII
A MORTE

É fecundo em resultados práticos o conhecimento da verdade teosófica, e um


dos mais importantes é o de mudar diametralmente o conceito vulgar que tínhamos
da morte. É impossível imaginar-se quantas torturas morais, terrores e aflições tem
sofrido a humanidade por sua ignorância supersticiosa acerca da morte. Um número
imenso de opiniões falsas e absurdas neste ponto tem produzido no passado e
produz ainda hoje sofrimentos incalculáveis. A extirpação de tais preconceitos é um
dos maiores benefícios que se podem outorgar à humanidade, e tal benefício
recebem da Teosofia aqueles que, graças aos estudos filosóficos que fizeram em
vidas anteriores, estão aptos para aceitar nesta, doutrinas que, desvanecendo o
temor à morte e muitas das tristezas que a acompanham, nos permitem contemplá-
la no seu verdadeiro aspecto e compreender qual é o seu objetivo no plano geral da
evolução.
Quando se considera a morte como o termo da vida ou como a chegada a um
país sombrio, perigoso e desconhecido, é natural considerá-la não só com funda
repugnância, como também com. grande terror. E, como, apesar de tudo quanto às
religiões têm feito para ensinar o contrário, o conceito vulgar da morte, no mundo
ocidental, se conserva o mesmo, não é de maravilhar que os mil horrores inerentes a
esta ideia de morte tenham-se enraizado nos costumes, ofuscando até aqueles que
conhecem a verdade.
Os símbolos constitutivos das pompas fúnebres são apenas provas da ignorância
das pessoas que as empregam. Assim que o homem começa a compreender o que é a
morte, abandona toda as fórmulas de luto como loucas infantilidades. Sabe que a
morte é um bem, e cai em si, percebendo que é egoísmo deplorar um acontecimento
felicíssimo para um amigo, tão só porque, em aparência vai afastar-se de seu lado.
Sem dúvida que não poderá subtrair-se ao choque da separação momentânea; mas
pode evitar que a sua própria dor sirva de estorvo e empecilho ao amigo que partiu.
O homem conhecedor da morte sabe que não deve temê-la nem deplorá-la,
tanto faz que seja ele o atingido ou que o sejam os seres amados. Todos morreram já
muitas vezes, pois a morte é uma velha amiga dos homens. Em vez de representá-la
como espantosa rainha do terror - não seria melhor dar-lhe por alegoria um anjo que,
com chave de ouro, nos abrisse as portas dos gloriosos reinos da luz perpétua?
O homem conhecedor da morte compreende claramente também que a vida é
contínua e que a perda do corpo físico significa unicamente mudança de vestuário,
sem a mínima mudança no verdadeiro homem que o envergava. Compreende que a
morte é simplesmente a promoção de uma vida, física em mais de metade, a uma
vida completamente astral e muito superior, portanto. Assim, pois, quando a morte
chega, recebe-a bem, e se atinge àqueles que ele ama, reconhece que para eles é um
grande benefício, ainda que não possa reprimir certo pesar egoísta, ante aquela
26
separação temporária a que é obrigado. Compreende igualmente que esta separação
é aparente e de modo algum real. Sabe que os chamados mortos estão sempre junto
a ele e que só precisa abandonar temporariamente o seu corpo físico durante o sono,
para reunir-se e comunicar-se com eles como dantes.
Vê claramente a unidade do vasto universo, cujas porções invisíveis aos olhos
físicos estão governadas pelas mesmas leis divinas. Assim não se surpreende nem
sente angústia ao passar de uma para outra destas partes e está seguríssimo do que
está oculto pelo véu.
A solicitude dos estudantes de Teosofia descreveu-lhe tão clara e
pormenorizadamente o conjunto do mundo invisível, que o conhece tão bem como
o físico, e sem vacilação pode passar do último ao primeiro, assim que se lhe ofereça
conjuntura favorável ao seu progresso.
Para pormenores completos acerca dos diversos graus desta vida superior, o
leitor que se reporte aos trabalhos especiais. Basta dizer aqui que as condições em
que o homem passa de uma a outra vida são precisamente as que o mesmo
engendrou. Os pensamentos e desejos alimentados durante a vida terrestre tomam
a forma de entidades vivas, perfeitamente definidas, que o rodeiam e sobre ele
influem até esgotar a energia que ele próprio lhes havia infundido. Se os
pensamentos e desejos foram perseverantemente enfocados no mal, serão
verdadeiramente aterradores esses companheiros do homem; mas, felizmente, tais
homens estão em pequena minoria entre os habitantes do mundo astral. A pior das
vidas que a generalidade das gentes se prepara para além-túmulo, é uma existência
indizivelmente enfadonha, desprovida de todo interesse racional, como
consequência dos anos desperdiçados em frivolidades, bagatelas, falatórios e
indulgências para consigo mesmo.
A este aborrecimento sombrio e passivo acrescentam-se, às vezes, verdadeiros
sofrimentos. Se, por exemplo, um homem se deixa dominar durante a sua vida
terrestre por apetites físicos violentos e se converte em escravo de vícios como a
avareza, a sensualidade ou a embriaguez, prepara então, por isso, para si mesmo,
muitos sofrimentos purgatoriais para depois da morte, pois ao perder o seu corpo de
carne não perde, de forma alguma, os maus desejos e inclinações que fomentará, os
quais persistem, ao contrário, mais despertos do que nunca e mais ativos, por não
embaraçá-los já a inércia das partículas de matéria grosseira. Mas, o que um tal
homem perde, é o meio de satisfazer aqueles apetites e inclinações que, insaciados e
insaciáveis, o atormentavam, reagindo sobre ele. Bem pode compreender-se que,
para este infeliz, isso constitui um verdadeiro inferno, embora temporário, pois os
seus desejos terminarão por consumir-se no seu próprio fogo, gastando a sua
energia exatamente no sofrimento que ocasionam.
Não resta dúvida que este destino é terrível.
Não devemos perder de vista, entretanto, em primeiro lugar, que o homem não
somente é o artífice de sua desgraça, porém que também determina sua intensidade
e duração. Consentiu, na terra, que este ou aquele desejo adquirisse tal ou qual
pujança, e na outra vida encontra-se em luta com este desejo e deve vencê-lo. Se
27
durante a vida física fez já alguns esforços para reprimi-lo e tê-lo refreado, estes
esforços anteriormente realizados minorarão os que ainda lhe restam a fazer. Ele
engendrou o monstro e ele deve vencê-lo, pois ele próprio deu toda a forca ao seu
inimigo. O seu destino é obra dele mesmo e ele próprio o deve enfrentar.
Em segundo lugar, devemos dizer que a penitência, o sofrimento, é então o
único meio da salvação. Que aconteceria se lhe fosse possível evitá-lo e passar
através da vida astral sem consumir seus apetites grosseiros? Simplesmente que na
próxima vida física dominá-lo-iam ainda completamente as mesmas paixões. Fosse
ébrio, avaro ou lascivo de nascimento e estas paixões chegariam a ser indomáveis,
antes que o homem tivesse podido aprender que é preciso esforçar-se por vencê-las.
Seria novamente seu escravo em corpo e alma, daí resultando inútil uma existência
terrena e para sempre perdida uma oportunidade de progresso. Seria isto um círculo
vicioso sem saída e retardar-se-ia indefinidamente a evolução de tal homem.
O plano divino está livre de tamanhos defeitos. A paixão é extinta durante a vida
astral e o homem reencarna sem as paixões consumidas, se bem que, em verdade,
subsiste ainda a fraqueza moral que precedentemente permitiu a prevalência das
paixões; é, por outro lado, não é menos certo que o corpo astral, formado para a
nova encarnação, está organizado de maneira que possa sofrer e expressar
exatamente as mesmas paixões que o seu predecessor, sendo fácil ao homem
reencarnado repetir a má vida passada. Mas o Eu, o homem verdadeiro, recebeu
uma lição terrível, e seguramente fará maiores esforços para impedir que a sua
natureza inferior renove a culpa tão acerbamente castigada, fazendo-o cair outra vez
sob o jugo das mesmas inclinações. Existem ainda nele, sem dúvida, os germes; mas,
se por outras causas, mereceu nascer de pais bondosos e prudentes, estes o
ajudarão a desenvolver o que de bom houver na sua natureza e a refrear o mal. Os
germes passionais, impossibilitados de frutificar, atrofiar-se-ão, e após outra
encarnação, não reapontarão, sequer. Assim, com lentos progressos, chega o
homem a desarraigar de si as más inclinações e a cultivar em troca todas as virtudes.
Por outro lado, o homem inteligente e generoso, o homem que compreende as
condições desta existência supra-física e se dá ao trabalho de adaptar a ela
cumprindo o maior número possível de condições, este homem vê estender-se
diante de si um campo admirável de ocasiões e possibilidades, tanto para instruir-se
como para trabalhar eficazmente. Descobre que a vida fora do corpo de carne possui
tal intensidade e refulgência que, comparadas com as mais vivas alegrias da vida
terrena, são estas como a lua cheia em relação ao sol meridiano. O seu
conhecimento claro e a sua confiança tranquila fazem resplandecer em si e em
quantos o rodeiam os poderes da vida duradoura. Converte-se em inefável centro de
paz e alegria para centenas de homens seus irmãos, e nalguns anos de existência
astral pode fazer muito maior bem do que o permitido por uma dilatada vida física.
Sabe perfeitamente, sobretudo, que tem perante si outro período de sua vida de
além-túmulo muito mais grandioso ainda.
Do mesmo modo que por seus pensamentos e desejos inferiores engendrou o
ambiente de sua vida astral, pelos pensamentos elevados e aspirações nobres
28
prepara a sua vida celeste. Porque o céu não é sonho, mas sim gloriosa e vívida
realidade. Não é longínqua cidade situada nas estrelas, com portas de pedras
preciosas e ruas pavimentadas de ouro, pátria de uma minoria de eleitos. Não. O céu
é simplesmente um estado de consciência pelo qual todo homem já passou, passa e
passará durante intervalo entre duas vidas ou encarnações. E este céu não é,
portanto, uma morada eterna, mas sim um estado de felicidade inefável, que se
prolonga por centenas de anos. E não é isto só, porque, embora o céu contenha, em
realidade, tudo quanto as diversas religiões prometeram de melhor e mais sublime
com esse nome, não deve ser considerado unicamente sob este ponto de vista.
É um reino da natureza, que tem suma importância para nós. É um imenso e
admirável mundo de intensa vida, onde podemos viver desde já, do mesmo modo
que nos períodos entre duas encarnações. Somente a nossa falta de
desenvolvimento e aquela espécie de diminuição do nosso - Eu, motivada pela
vestimenta carnal, nos impedem de compreendermos plenamente que a todo
momento e por todos os lados nos rodeia a glória do céu mais elevado, cujas
influências não cessam de nos afetar por toda parte. Por impossível que isto pareça
ao homem vulgar, para o ocultista é a mais positiva realidade, e para aqueles que
ainda não tenham compreendido esta verdade fundamental, repetiremos a
advertência do instrutor budista:
"Não vos abismeis na oração, nos lamentos e nas queixas, mas sim abri os olhos
e vede. A luz brilha ao redor de vós e não tendes mais nada a fazer do que tirar a
venda dos olhos e olhar. É tão maravilhoso, tão belo, que supera em muito a tudo
quanto o homem possa sonhar ou imaginar! E isto durará para todo o sempre!" (1)
(1). "The Soul of a People", pág. 163.
Quando o corpo astral, que é o veículo dos pensamentos e desejos de ordem
inferior, é gasto pouco a pouco e abandonado, o homem encontra-se externamente
revestido daquele outro veículo formado de matéria mais pura e sutil ao qual
chamamos corpo mental. Então a sua consciência se encontra neste veículo e por
meio dele pode perceber as vibrações provenientes das partículas do mundo
exterior, correspondentes à densidade do corpo mental. Terminou o tempo do
purgatório. Consumiu-se a parte inferior de sua natureza e permaneceram apenas os
pensamentos elevados e as aspirações nobres que teve durante a sua vida terrestre.
Concretizam-se ao redor dele e formam-lhe uma espécie de concha, por meio da
qual pode responder a certas modalidade vibratórias daquela sutilíssima matéria,
coletando com ela no tesouro comum do mundo celeste. Porque este plano mental
é, por assim dizer, o reflexo do próprio Espírito divino, inesgotável depósito do qual
os moradores do céu podem extrair exatamente o que se lhes permite e realizar as
aspirações e pensamentos que tenham tido em suas vidas física e astral.
Todas as religiões nos falam da felicidade celeste; porém, poucas lançam luz
sobre esta ideia capital, a única que, racionalmente, explica como todos os homens,
sem exceção, podem ser felizes no céu. Não obstante, a solução do problema se
estriba no fato de que cada qual cria o seu próprio céu, escolhendo entre inefáveis
esplendores do pensamento divino, os bens que mais ardentemente tenha desejado.
29
Assim cada um, mediante as causas engendradas na terra, regula por si mesmo a
duração e o caráter de sua vida superior. Cada homem tem, portanto, a quantidade
de felicidade que merece, e os seus gozos celestiais são da qualidade mais adequada
à sua idiossincrasia. O céu é um mundo no qual cada ser (pelo motivo mesmo de ser
consciente) goza da maior felicidade espiritual que seja capaz de desfrutar. É um
mundo em que pode satisfazer todas as aspirações, sem mais limites do que essas
próprias aspirações.

30
CAPÍTULO VIII
O PASSADO E O FUTURO DO HOMEM

Uma vez convencidos de que todos os homens chegaram ao seu atual estado
de evolução mediante a passagem sucessiva por uma longa série de várias vidas
anteriores, acode aos lábios esta pergunta: "Até que ponto nos é possível investigar
o nosso passado?" O problema é notoriamente interessante; e - felizmente - é
possível obter informação certa sobre este ponto, pela tradição, como também por
outra maneira mais segura.
Falta-nos espaço para nos estendermos aqui sobre as maravilhas da
psicometria, e assim diremos tão somente que existem numerosas provas e que não
há fato nem incidente, por mínimo que seja, que não se registre por si mesmo,
imediata e indelevelmente "na memória da Natureza", na qual se pode encontrar,
com exatidão absoluta, a representação verdadeira, completa, fiel, de qualquer
cena ou fato acontecidos desde o princípio do mundo. Todos os estudantes de ocultismo
sabem que é possível ler os anais do passado e muitos sabem, além disso, como os ler.
Esta memória da Natureza deve ser, em essência, a mesma Memória Divina que está
muito além do alcance da nossa mente, porém, que se reflete em planos inferiores, de
modo que, quando a mente humana se exercita nesse trabalho, pode achar nestes planos
os vestígios de todos os acontecimentos que a afetaram. Exemplifiquemos. Tudo quanto
acontece diante de um espelho se reflete na superfície do mesmo e os nossos olhos, cegos,
acreditam que nenhum vestígio deixam aquelas imagens na superfície refletora. Não
obstante, poderia acontecer o contrário, pois não é difícil conceber que as imagens "fiquem
impressas" no espelho, do mesmo modo que os sons impressionam o cilindro de um
fonógrafo, e nada se oporia a que se reproduzissem as imagens por meio de seus vestígios
no espelho, como se reproduzem os sons mediante o seus nos cilindro.
A psicometria superior demonstra, não só que "pode ser assim", mas também "que é
assim"; e que não somente um espelho, mas qualquer objeto físico, conserva os vestígios
exatos de tudo quanto diante dele acontece. Deste modo dispomos de um método rigoroso
e preciso, que nos permite ler a história do mundo e de nossa raça desde o seu começo,
desde os seus primeiros momentos, podendo observar infinidade de fatos,
interessantíssimos, como se os atores de outros tempos repetissem para nos obsequiar, as
cenas que realmente representaram no passado.
As investigações levadas a efeito por tais métodos na pre-história nos permitem
descortinar um dilatado processo evolutivo, lento e gradual, mas incessante. O
desenvolvimento da humanidade está sujeito a duas grandes leis: a de evolução, que
tranquilamente impele o homem para diante e para cima, e o da justiça divina, ou de causa
e efeito, que assegura ao homem, com absoluto rigor, a sanção dos seus menores atos e,
pouco a pouco, ensina-o a conformar-se inteligentemente com a primeira lei.
A terra não é o teatro único deste longo processo evolutivo. Começamo-lo noutros
globos da mesma ordem. Mas o assunto é demasiado vasto e complexo para ser tratado
31
numa obra rudimentar.
Em livros mais extensos acham-se informações certas e pormenorizadas acerca do
passado do homem e também a respeito do seu futuro, cuja glória idioma algum seria
capaz de expressar, embora seja possível dar ideia dos primeiros períodos que conduzem a
tão sublimes alturas. A muitas pessoas sérias parecer-lhes-á chocante ou mesmo blasfema
a ideia de que o homem seja divino e que possa atualizar em si mesmo as potências
da Divindade. Não obstante, em parte alguma se vê razão para tal estranheza, pois o
próprio Jesus relembra aos judeus que o rodeiam o texto das Escrituras e lhes diz:
"sois deuses". Além disso, os padres da Igreja sustentam a doutrina da deificação do
homem; em nossa época, porém, foram falseadas ou mal compreendidas doutrinas
que, em outro tempo, eram rigorosamente ortodoxas, e só os estudantes de
ocultismo conhecem a verdade integral.
Alguns perguntam porque, se ao princípio o homem era uma chispa da
Divindade, foi-lhe necessário passar por incalculáveis fases de evolução, que tantas
aflições e sofrimentos entranham, com o simples fim de tornar a Deus e a Ele se unir,
como o estava no princípio. Aqueles que apresentam esta objeção, não
compreenderam ainda, em seu conjunto, o plano evolutivo. O que em princípio
emanou da Divindade não era ainda um homem nem era tão pouco, em rigor, uma
chispa, pois na emanação carecia de individualidade. Era simplesmente como uma
nebulosa de essência divina, embora capaz de concretizar-se eventualmente em
infinidade de chispas.
A diferença entre a condição desta essência divina no instante de sua emanação
e no de sua reintegração é exatamente a mesma que se vê entre a matéria tênue e o
resplendor de uma nebulosa, e o sistema solar dela resultante. Esta é, em verdade,
bela, mas indefinida, e de nenhuma utilidade imediata; porém, os sóis que a sua
pausada evolução acende, difundirão vida, calor e luz sobre grande número de
mundos e seus moradores.
Estabeleceremos outra comparação. O corpo humano se compõe de milhões de
pequeníssimas partículas, das quais muitíssimas são expelidas do organismo a todo
instante. Suponhamos que, por qualquer processo evolutivo, cada uma das referidas
partículas pudesse, com o tempo, converter-se por sua vez num ser humano.
Diríamos, porventura, que essas partículas não haviam tirado proveito algum desta
evolução, se bem que, de certo modo, fossem humanas desde o princípio? Pois bem:
a essência divina emana pristinamente em estado de forca pura e é restituída à sua
origem em forma de milhares de poderosos Adeptos, capazes, cada um deles, de se
desenvolverem, ulteriormente, num Logos.
Assim temos direito de proclamar a ilimitada glória e esplendor do futuro do
homem, relembrando, como ponto importantíssimo, que a todos, sem exceção, nos
espera tão brilhante porvir. O homem a quem chamamos bom, aquele que se
conforma com a Vontade Divina e cujas ações cooperam para a marcha da evolução,
progride rapidamente na vereda que conduz ao feliz termo. O homem que, ao
contrário, retarda obcecadamente o majestoso curso da evolução, obstinando-se em
almejar e procurar satisfações egoístas, em vez de cooperar para o bem geral,
32
progredirá lenta e irregularmente. Porém, a Divina Vontade é infinitamente mais
poderosa do que os "quereres" humanos, e portanto, realiza perfeitamente o seu
vasto plano. Quem não aprender a lição no primeiro dia, terá de voltar e tornar a
voltar um e outro dia à escola, até que, por fim, aprenda e saiba. A paciência de Deus
é infinita, e tarde ou cedo cada ser humano atinge o fim assinalado. Para os que
conhecem a Lei e a Vontade, não há incerteza nem temor. A paz absoluta é o seu
tesouro.

33
CAPÍTULO IX
CAUSA E EFEITO

Nos capítulos precedentes mencionamos com frequência a poderosa lei de Causa


e Efeito, por meio da qual o homem recebe rigorosamente aquilo que merece. Sem
esta lei não poderíamos compreender o restante do Plano Divino. É necessário, pois,
que procuremos compreendê-la exatamente, e para isso convém, antes de tudo,
eliminar o supersticioso preconceito da "recompensa" e do "castigo" decorrentes de
toda ação humana. Esta ideia de prêmio e castigo é inseparável da de um juiz
distribuidor de ambos, e sugere que este possa ser mais benévolo num caso do que
noutro, influindo as circunstâncias no seu ânimo ou deferindo ele pedidos de graça,
ficando a lei, deste modo, completamente escarnecida. Assim, pois, todas estas
suposições são cada qual mais errônea e, portanto, quem deseje conhecer a verdade
dos fatos, deve repudiar em absoluto semelhante diretriz de raciocínio.
Tocai uma barra de ferro em brasa. Salvo em certas condições especiais, queimar-
vos-eis gravemente, e não obstante não direis que Deus vos castigou por haverdes
tocado na barra. Ao contrário, pois que compreendereis perfeitamente que aconteceu
o que, em harmonia com as leis da natureza, vos devia acontecer; e todos aqueles que
sabem o que é o calor e como age, vos poderiam explicar exatamente porque vos
queimastes. Observai, além disso, que o fim visado não influi no resultado físico da
ação, pois tanto faz que toqueis a barra com propósitos sinistros, como para evitar o
mal a outrem: queimar-vos-eis do mesmo modo.
Porém, dum ponto de vista mais elevado, os resultados serão muito diferentes.
No último caso teríeis realizado uma ação nobre, que vossa consciência aprovará, ao
passo que no primeiro caso sentireis remorso. A dor física seria, no entanto, a mesma.
Pois bem: para ter verdadeira ideia do modo pelo qual opera a lei de causa e
efeito, é preciso considerar que atua com um automatismo semelhante. Suponhamos
um peso pendente do teto por meio de uma corda e exerçamos certa pressão sobre
ele para desviá-lo da vertical. A mecânica nos ensina que a reação do peso sobre a
nossa mão será exatamente proporcional à forca que tenhamos empregado e esta
reação se produzirá independentemente dos motivos que nos tenham induzido a
alterar o equilíbrio do sistema. Assim também o homem perturba com uma ação má o
regime da grande corrente evolutiva e esta reage com a mesma forca que contra ela
se empregou.
Mas, nem por um momento devemos supor que seja indiferente a intenção que
determina nossas ações; pois, ao contrário, é o fator mais importante e característico,
ainda que em nada altere os seus resultados no plano físico.
Não esqueçamos, portanto, que a intenção em si mesma é uma forca que atua no
plano mental, isto é, em matéria tão sutil e de vibrações tão rápidas, que a mesma
quantidade de energia produz neste plano um efeito infinitamente maior que nos
planos inferiores. O ato físico produzirá, pois, o seu resultado no plano físico; mas ao
34
mesmo tempo, a energia mental da intenção produzirá o seu no plano mental, sendo
este último resultado completamente independente do primeiro e de muitíssimo
maior importância.
Vemos, assim, automaticamente distribuída perfeita distribuição. Por complexos
que sejam os motivos determinantes de nossas ações e por variada que seja a
proporção de bem e mal que os seus efeitos acarretem, restabelecer-se-á
espontaneamente e com absoluta exatidão o equilíbrio e prevalecerá a perfeita justiça
em todos os planos.
Não esqueçamos que o próprio homem, e só ele, é quem edifica o seu futuro
caráter e gera o seu futuro ambiente. Pode-se afirmar, em geral, que os atos de sua
vida determinam as condições circunstanciais de sua próxima encarnação, enquanto
que os seus pensamentos durante uma vida são os principais fatores do
desenvolvimento de seu caráter no decorrer da vida seguinte. É interessantíssimo o
estudo do processo por meio do qual atuam todas as diversas forcas; aqui, porém,
não podemos entrar em tais pormenores, que o leitor achará expostos em obras
fundamentais, como "Karma" e "Sabedoria Antiga", da Sra. Annie. Besant e
"Budismo Esotérico", do Sr. Sinnett.
É evidente que estes fatos corroboram admiravelmente grande número de
nossos princípios morais. Uma vez que o poder do pensamento é tão grande e no
seu plano peculiar produz efeitos muito mais importantes do que aqueles que se
originam no plano físico, conclui-se evidentemente que o homem deve dominar
semelhante forca, pois não só constrói com ela o seu caráter futuro, como também
influi constante e inevitavelmente sobre todos os seres que o rodeiam.
Os seus pensamentos, pois, conforme o uso que deles faça, acarretar-lhe-ão
uma grave responsabilidade. Quando um homem vulgar vê-se acometido por um
sentimento de ódio ou pelo desejo de prejudicar a seus semelhantes, propende
naturalmente a concretizar este sentimento ou este desejo em ato, ou pelo menos
em palavras.
Não obstante, as leis comuns às sociedades civilizadas lhe proíbem tal desabafo
e lhe ordenam que reprima quanto possível toda manifestação externa do que
sente, e se, destarte consegue acomodar-se às conveniências sociais, fica satisfeito e
até se acredita no caso de felicitar-se por ter cumprido com o seu dever. Mas, o
estudante de ocultismo sabe que, quanto ao que ele próprio concerne, deve levar
muito além o domínio de si mesmo e que deve reprimir o menor pensamento de
ódio, tanto como a sua manifestação externa. Porque sabe que os seus sentimentos
desencadeiam no plano astral forcas terríveis, que atuarão contra o objeto do seu
ódio com tanta segurança, como se fisicamente o vulnerassem, e que mui
frequentemente os efeitos das forcas astrais são incalculavelmente mais desastrosos
e duradouros.
É positivamente certo que os pensamentos são coisas reais. Mostram-se à visão
clarividente com forma definida e cor determinada, que depende da modalidade
vibratória do pensamento. O estudo destas formas e cores tem a sua importância,
podendo o leitor achar uma descrição ilustrada com imagens coloridas na obra do
35
autor, intitulada "Formas-Pensamentos".
Estas, considerações nos abrem novos horizontes em todas as direções. Desde
que os nossos pensamentos podem muito facilmente prejudicar, também podem
favorecer. Por meio deles podemos originar correntes mentais que levem a algum
amigo que sofra o auxílio de nossa simpatia, e por tal forma brindamos um novo
mundo ao nosso desejo de ser úteis. Muitos corações transbordando gratidão
deploram não possuir bens materiais com que pagar os favores recebidos. Pois bem:
eis aí o modo de solver a dívida numa ordem de pagamento em que não importa
possuir ou não bens materiais.
Todo aquele que pensa, sem exceção, pode ajudar a seus irmãos, e todo aquele
que possa, deve ajudá-los. Neste caso, como em todos, saber é poder, e quem
conhece a lei, pode utilizá-la. Sabemos que efeitos produzem alguns de nossos
pensamentos em nós mesmos e em nossos semelhantes. Devemos, portanto, nos
esforçar por obter os apetecidos efeitos do desejo formado. Cada qual poderá, deste
modo, não só modelar o seu caráter na vida presente, mas também determinar o
que virá a ser esse caráter no decorrer da próxima encarnação. Porque todo
pensamento vibra na matéria do corpo mental, e um mesmo pensamento
perseverantemente repetido desperta vibrações correspondentes, (uma oitava mais
grave) na matéria do corpo causal. Assim se intensificam e fortalecem
progressivamente, no mesmo Ego, certas qualidade que certamente reaparecerão e
serão congênitas no próximo renascimento. Assim também se desenvolvem pouco a
pouco, porém num crescer contínuo, as potências e virtudes da alma. Pouco a pouco
também o homem compreende a tarefa do seu progresso e começa a colaborar
inteligentemente no vasto plano da Divindade.

36
CAPÍTULO X
BENEFÍCIOS DA TEOSOFIA

O leitor atento já terá notado quão profundamente estes conceitos teosóficos


mudam o aspecto da vida em quem se convence da sua verdade, e terá notado
também o sentido em que se efetuam estas mudanças de aspecto e os motivos que
as determinam. A Teosofia explica logicamente a razão desta existência, que para
muitíssimos de nós era antes problema sem solução e indecifrável enigma. A
Teosofia ensina porque estamos neste mundo terreno, o que devemos fazer e os
processos pelos quais devemos fazê-lo. Por desprezível e infeliz que a vida nos
pareça, quando experimentamos pesar ou sofrimento e a leviandade dos prazeres
que nos proporciona o plano físico, a Teosofia demonstra o imenso benefício que a
vida nos traz se a consideramos como escola preparatória, precedendo às
indescritíveis glórias e às potencialidades infinitas dos planos superiores.
À luz dos ensinos teosóficos, não só descobrimos o modo de nos
desenvolvermos por nós mesmos, como também a maneira de auxiliar o
desenvolvimento do próximo e de nos tomarmos úteis em pensamento e em obra,
primeiramente ao pequeno círculo daqueles nossos irmãos, aos quais mais amamos ou que
estão mais intimamente unidos à nossa vida, e depois, gradualmente, de acordo com o
crescimento do nosso poder, à raça humana inteira.
Estes generosos pensamentos e desejos habituais nos colocam em nível muito
superior, de onde vemos claramente quão pequenas e desprezíveis eram as preocupações
pessoais, que sobrecarregavam a nossa vida passada. Inevitavelmente começamos a
observar as coisas do mais amplo ponto de vista da sua ação no conjunto da raça humana,
em vez de observá-las sob o aspecto de sua influência em nossa ínfima personalidade.
As penas e tribulações que havemos de sofrer, nos parecem exorbitantes, Unicamente
porque estão próximas e obscurecem os horizontes, como um prato posto diante dos olhos
eclipsa a luz do sol. Isto nos faz esquecer com frequência que "o objetivo da existência é um
repouso celeste".
Os ensinos teosóficos restituem cada conceito à sua verdade, e elevando-nos acima
das nuvens, nos permitem contemplar do alto o verdadeiro aspecto daquilo que víamos tão
mal ao observarmo-lo de baixo e de mui perto. Determinam-nos a eliminar a nossa
personalidade inferior, juntamente com o enxame de ilusões e prejuízos que a
acompanham e o falaz prisma através do qual víamos a vida. Eleva-nos a um nível onde não
há ambiente para o egoísmo; onde só admitimos como regra de conduta a realização da
justiça por amor à justiça; onde o nosso maior gozo consiste em auxiliar aos nossos irmãos.
Uma vida de gozos intensos nos espera. A proporção que o homem evolui, o seu poder
de compaixão e simpatia aumenta, torna-se cada vez mais sensível à tristeza, aos
sofrimentos e culpas que entenebrecem o Universo. E, não obstante, ao mesmo tempo vê,
cada vez mais claras, as causas destes sofrimentos e compreende melhor que, apesar deles,
toda a criação conspira para o seu ótimo fim. Assim se difunde em nós o gozo profundo, a
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segurança absoluta, filha da certeza em que estamos, de que tudo propende para o bem, e
daí a paz radiante que absorvemos na contemplação do Logos e no espetáculo do
admirável, progressivo e inevitável cumprimento do plano que traçou ao Universo.
Sabemos que Deus anela a nossa felicidade e sabemos também que o nosso mais estrito
dever é sermos felizes, espargirmos em redor de nós, sobre nossos irmãos, ondas de
felicidade, pois esse é um dos meios que nos foram concedidos para suavizar as penas do
mundo, Na vida vulgar se agravam os males, quando o homem crê que os padece
injustamente. Muitas vezes ouvimos exclamar: "Por que me hão de acontecer tantas
desgraças? o vizinho não é melhor que eu, e, não obstante, não está doente nem
perdeu amigos nem riquezas. Por que hei de ser, pois, tão desgraçado?"
A Teosofia livra de semelhante erro aos que a estudam, pois desde o começo lhes
ensina que o homem nunca padece o que não merece. Quaisquer que sejam as nossas
dores, havemos de considerá-las como pagamento de dívidas anteriormente
contraídas, que cedo ou tarde se hão de saldar e que vale mais saldá-las quanto antes.
Isto não é tudo. Cada dor nos oferece uma ocasião de progresso. Se suportarmos a
pena com paciência e valor, sem consentir que nos vença e esforçando-nos, ao
contrário, em tirar dela todo o benefício possível, vigorizaremos as preciosas
qualidades de intrepidez, perseverança e resolução. Por tal meio colhemos o bem no
próprio campo em que as nossas culpas passadas semearam o mal.
Dissemos já que os ensinos teosóficos dissipam todo temor à morte, dado que
explicam o que ela é. O teósofo não se lamenta mais pela sorte dos que partem
primeiro do que ele: pois - Ignora porventura que eles estão a seu lado continuamente
e que o dar rédea solta à dor egoísta seria para eles causa de mal estar e de tristeza?
Como não ser assim? Como uma aflição desordenada não haveria de reagir
dolorosamente sobre aqueles seres que estão agora mais próximos a ele do que antes,
e mais unidos a ele do que nunca por ardente simpatia?
Mas, - significa isto que a Teosofia pregue o esquecimento dos mortos? De modo
algum. Longe disso, nos aconselha, pelo contrário, que pensemos frequentemente
neles, porém, nunca com tristeza egoísta nem com o desejo de restituí-los à vida
terrestre, nem com o sentimento de sua perda aparente, mas sempre com a ideia do
grande benefício que lhes correspondeu. A Teosofia afirma que os vivos podem
favorecer poderosamente a evolução dos mortos por meio de vigorosos pensamentos
de amor, e que, se pensarmos neles como convém, os ajudaremos muito eficazmente
no desenvolvimento póstumo.
O estudo detido da existência humana entre duas encarnações, demonstra quão
breve é a vida física em comparação ao ciclo inteiro. Vejamos, por exemplo, o caso de
um homem de mediana cultura em qualquer das raças superiores. A duração de uma
só vida (isto é, de um dia de sua verdadeira vida) seria de uns quinhentos anos em
termo médio. Deste número, 70 ou 80 corresponderiam à vida astral, e os restantes, à
vida celeste que, consequentemente, é o período mais importante da vida do
homem. Convém advertir que estas proporções variam consideràvelmente conforme
os diferentes tipos humanos e muda por completo no caso das almas jovens,
encarnadas nas raças inferiores ou nas classes baixas da nossa, pois então a vida
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astral se prolonga tanto quanto a celeste diminui. No caso de um selvagem não há,
por assim dizer, vida celeste, porque um homem tal não desenvolveu ainda
nenhuma das qualidades que permitem chegar ao plano correspondente.
O conhecimento de todos estes fatos nos dá uma ideia clara e certa do futuro,
que deleitosamente nos alivia do vago e indeciso em que geralmente flutua o
pensamento humano acerca destes pontos. Um teósofo não terá jamais a menor
dúvida nem receio sobre a sua "salvação", porque sabe muito bem que o homem não
se "salvará" de nada, a não ser de sua própria ignorância; e, portanto, consideraria
horrível blasfemar, digo blasfêmia, o temor de que a vontade do Logos não se
cumpra algum dia em todos os seus filhos.
O teósofo não alimenta esperança vaga, porém, sim, certeza absoluta no
eterno, porque conhece a lei eterna e não pode temer o futuro pela mesma razão de
que o conhece. O seu único cuidado é, pois, tornar-se digno de colaborar na
grandiosa obra da evolução. Pode acontecer, não obstante, que de momento não se
lhe consinta nenhuma colaboração de importância; porém, não há ninguém que não
possa fazer algo mínimo muito próximo e ao redor dele, no seu campo de ação, por
muito baixo que esteja e muito pequeno que seja.
Todos temos ocasiões de trabalhar, e portanto de ir evoluindo, pois todo
contato e toda relação é uma de tais ocasiões. Se entrarmos em relação com
alguém, seja uma criança que nasce em nossa família, um amigo de nossa intimidade
ou um criado que se põe ao nosso serviço, havemos de ver neles outras tantas almas
às quais podemos ajudar, outras tantas ocasiões que de diversas maneiras se nos
deparam. Convém lembrar que não temos necessidade alguma de incutir nossas
ideias e convicções às pessoas com as quais nos relacionamos. Só dizemos que
devemos estar constantemente dispostos à ajudar a quantos pedirem o nosso
auxílio. Seremos zelosos em não perder ocasião alguma de servir ao próximo, seja
materialmente, até onde alcançarem as nossas forcas, seja comunicando-lhes os
nossos conhecimentos e conselhos, se mostra desejos de aproveitá-los. Em muitos
casos nos é impossível ajudar ao próximo com obras ou com palavras; mas em toda
ocasião podemos emitir algum pensamento amistoso e simpático, de cujo resultado
ninguém dentre os que conheçam o efeito das correntes espirituais, duvidará,
embora não apareça imediatamente no plano físico.
O teósofo deve distinguir-se do vulgar dos homens, pela sua alegria inalterável,
pelo seu valor invencível no meio das mais acerbas dificuldades e pela sua simpatia
sempre desperta e pronta a prestar serviços. A sua alegria não lhe impedirá,
seguramente, de tomar a vida a sério e de compreender que no mundo temos muito
que trabalhar e que ninguém deve perder o tempo. Convencer-se-á de que é preciso
obter completo domínio sobre si mesmo e sobre os seus diversos veículos, pois só
por este meio poderá dispor-se a socorrer os seus irmãos, quando se lhe ofereça
ocasião. Sempre preferirá o pensamento elevado ao baixo e o nobre ao rasteiro; e ao
ver o bem em todas as coisas, será abertamente tolerante. Preferirá, sem vacilar, as
explicações otimistas às pessimistas, e verá as coisas sob o seu aspecto consolador,
não sob o aflitivo, pois não esquecerá que o bem é germe, substância e fim da
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verdade, ao passo que o mal é apenas sombra transitória que forçosamente deve
dissipar-se, dado que Unicamente o bem pode subsistir.
O teósofo, pois, deve procurar o bem onde quer que esteja, com o fim de
prestar-lhe seu fraco auxilio. Procurará em todas as coisas desentranhar o sentido
em que age a grande lei evolutiva, com o fim de agir também no mesmo sentido,
contribuindo com toda a sua energia, por mínima que seja, em favorecer a poderosa
corrente de forcas cósmicas.
Assim, procurando sempre ajudá-las e nunca opondo-se a elas, chegará a ser, na
sua humilde esfera de ação, um dos benéficos poderes da Natureza. Por leve que
seja a sua cooperação, por sumamente longínquo que esteja o débil concurso que
produza, não deixará por isso de ser um colaborador de Deus, como o mais sublime
privilégio que se possa outorgar a um homem.

FIM

40

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