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A Laringe x Anatomia x Processos Inflamatórios x

Tumores

Introdução
Podemos dizer com certeza que o laringe ocupa um dos principais papeis na complexa
dinânima da comunicação entre os seres humanos.
A fala é o produto de uma espetacular evolução que vem ocorrendo hà milhões de anos entre
os seres que habitam este planeta, evolução esta que, manifestando-se mais claramente na
raça humana, facilitou enormemente a troca de experiencias e sentimentos que foram
traduzidos em resultados fantásticos para a população de um modo geral.

O ato de falar, que nos parece simples superficialmente, envolve um grande número de
estruturas e não depende, como veremos adiante, apenas das cordas vocais.
O tom fundamental da voz (TF) é produzido através da vibração das cordas vocais (CV) que se
encontram no interior do laringe.
Esta vibração é desencadeada pela coluna aérea oriunda dos pulmões durante a fase
expiratória da respiração.
Ao atravessar a região glótica (entre as CV), o ar é entrecortado por aduções rítmicas de várias
frequências das cordas vocais nascendo então o TF.
Quanto maior for o numero de vibrações por segundo (frequência) mais agudo será o som
produzido. Inversamente, quanto menor for a frequência das vibrações, menor será a
frequência do som.
Os sons de baixa frequência são os sons graves e os sons de alta frequência são os sons
agudos.
Entre estes extremos, encontramos os sons intermediários ou sons médios.
Dito isto, podemos ver que a voz humana possue uma enorme veriedade de tons.
Não existe, a exemplo da impressão digital, uma voz exatamente igual a outra. Semelhantes ou
imitações sim, perfeitamente iguais não.

Logo após ser produzido o TF ascende em direção ao aparelho articulador da voz aonde
sofrerá uma série de modificações através do aparelho articulador buco-faringeo, nariz e
estruturas anexas como os seios da face.
Vejam bem, a voz quando ainda a nível das cordas vocais, não pode ser entendida como tal e
é totalmente imcompreensível.
Tente por exemplo abrir a bôca e emitir o som “A”. É fácil não?. Agora sem mexer um músculo
facial, isto é, com a bôca aberta tente dizer “PA” ou mesmo “LA”. Impossível não é?. Para emitir
o “PA” você teve obrigatoriamente que usar os lábios para acrescentar o P na sua tentativa de
dizer “PA”. Com o “LA” você usou a lingua.
E assim por diante. Cada sílaba, cada palavra, engloba uma enormidade de estruturas como
lábios, dentes, lingua, palato, bochechas, nariz, seios da face entre muitos outros que, no
conjunto, são conhecidos como sistema articulador buco-facial.
A voz portanto, resulta da integração da laringe com este sistema, ambos na dependência de
um perfeito comando central.

Os distúrbios que ocorrem na produção do TF da voz são conhecidos como disfonias e


obrigatoriamente dever ser diferenciados dos que ocorrem na articulação da voz como as
dislalias, disartrias entre outros que são da alçada da fonoaudiologia. Rouquidão sim, este é
uma sinal clínico que deve ser sempre abordado pelo otorrinolaringologista porque é indicativo
claro de patologia à nível da CV.

ANATOMIA BÁSICA
O laringe situa-se anteriormente no pescoço e em posição mediana, podendo ser facilmente
percebida como uma proeminência dura e móvel que desloca-se verticalmente para cima
durante a deglutição logo abaixo da região mentoniana.
Nos primeiros anos de vida, o laringe encontra-se situado mais superiormente do que no
adulto.
Este fato pode ser comprovado facilmente nas crianças através de um simples exame de
garganta quando deprimimos a lingua do paciente e percebemos uma estrutura em forma de
folha cartilaginosa revestida por mucosa.
Aí temos a nossa conhecida epiglote, tão falada nos livros de pediatria.

O laringe encontra-se montado sobre o primeiro anel traqueal, fato este que faz com que a
grande maioria dos autores o considerem como um anel traqueal mais diferenciado.
Relaciona-se posteriormente com o hipofaringe, superiormente com a base da lingua,
inferiormente com a traquéia e anteriormente com a glândula tireóide (Fig 1).

A armação do laringe é basicamente cartilaginosa.


Na sua base encontramos a cartilagem cricóide que, devido a sua semelhança com um anel,
recebeu este nome.
A cricóide apresenta na região posterior um espessamento também chamado de medalhão da
cricóide, o que confere ao laringe uma proteção extra nas regiões posteriores.
Montadas sobre este medalhão posterior, encontramos 2 cartilágens idênticas com a forma de
pirâmide de base triangular. São as cartilágens aritenóides.
Estas oferecem uma proteção adicional ao esqueleto cartilaginoso da laringe novamente em
sua porção posterior.
Fechando este conjunto anteriormente encontramos uma cartilágem grande, cuja forma se
assemelha a um livro aberto para trás, talvez a mais conhecida de todas.
É a cartilágem tireóide.
Esta protege anteriormente o restante das cartilágens e além disto, serve de suporte para a
fixação do laringe no emaranhado das estruturas do pescoço principalmente no osso hióide.
Agora, observando o esquema, perceberemos que o laringe possue uma forma de cone,
aonde o diâmetro de sua abertura superior é bem maior que o inferior. Fechando como uma
válvula todo este cone, temos a última cartilágem que é a epiglote.
Esta assemelha-se a uma folha cujo pedículo insere-se no ângulo interno da cartilágem
tireóide.
Todo este conjunto de cartilágens é unido através de ligamentos e músculos, possuindo uma
certa mobilidade para o perfeito funcionamento, como veremos adiante em detalhes.

As CV são estruturas ligamentares pares unidas anteriormente e inseridas exatamente no


ângulo interno da cartilagem tireóide um pouco abaixo (4 a 5 mm) da inserção da epiglote.
Caminhando no sentido posterior elas vão gradativamente se afastando da linha média, uma
para cada lado para terminarem inseridas cada uma na apófise vocal de cada aritenóide
formando um “V” aberto para trás .

As aritenóides possuem o poder de movimentarem-se sobre o próprio eixo.


Assim, cada vez que a aritenóide gira para fora ela leva consigo a respectiva CV afastando-a
da linha média. Logicamente, se este movimento for executado pelas duas aritenóides, as duas
CV afastar-se-ão da linha média para dar passágem ao ar que entra ou sai do trato respiratório
inferior através do laringe.
Resumindo.
As cordas afastam-se para que ocorra a respiração e aproximam-se durante a fonação.
A compreensão deste movimento de abertura a fechamento do espaço glótico (entre as CV) é
a base de toda a fisiologia da laringe.

Para que haja movimentação destas peças anatômicas existe um delicado conjunto de
músculos que, distribuidos na sua maioria dentro do laringe (endolaringeos), realizam
conjuntamente a função que a natureza destinou para este órgão.
Como basicamente os movimentos do laringe são de abertura e fechamento os principais
grupos musculares são os abdutores e os adutores.
Os primeiros são obviamente muito mais importantes na respiração e os segundos na fonação.
Temos ainda os tensores que participam ativamente na melhoria da qualidade vocal fornecendo
timbre a voz.

O músculo responsàvel pela abertura da glote é o cricoaritenoideo posterior. Como o nome


indica, insere-se na face posterior da cricóide e na apófise muscular da aritenóide.
A sua contração provoca a rotação da aritenóide para fora, abduzindo as CV. Existe um para
cada lado e este é o único músculo existente no laringe para tal função.
Existem dois músculos para realizar a adução das cordas vocais.
Um é o cricoaritenoideo lateral que insere-se na mesma apófise muscular da aritenóide e no
bordo lateral e superior de cartilágem cricóide.
A sua contração provoca a rotação da aritenóide para dentro do laringe, aproximando a corda
vocal da linha média.
O outro adutor é o ariaritenoideo, isto é, vai de uma aritenóide a outra.
A sua contração desloca as duas aritenóides no sentido horizontal em direção a linha média,
aproximando por conseguinte as cordas.
Os tensores são o tíreoaritenoideo e o cricotireoideo que ao se contraírem, provocam apenas
aumento de tensão na corda vocal. São, como dissemos, músculos responsáveis pela
qualidade ou brilho vocal.

Para que todo este conjunto músculo cartilaginoso possa mover-se, necessitamos de uma
inervação. Esta é fornecida através do nervo vago ou X par craniano.
Os nervo laringeos inferiores direito e esquerdo são essencialmente motores enquanto que, os
laringeos superiores são sensitivos.
A lesão, seja ela uni ou bilateral dos inferiores, também chamados de recurrentes, ocasiona
paralisias laringeas fechadas ou abertas de acordo com o grupo neuro-muscular atingido ou se
esta paralisia é central ou pariférica.
O nervo recurrente esquerdo, apesar da semelhança que o nome indica, é , no tocante ao seu
trajeto, bastante diferente do direito.
O esquerdo é bem mais longo que o direito.
Emerge do X par no mediastino, contorna a crossa da aorta, mergulha novamente no
mediastino subindo entre a traquéia e o esôfago, passando por cadeias ganglionares
mediastínicas, plexos nervosos, glândula tireóide, vasos cervicais dentre outras estruturas, num
longo trajeto para poder alcançar o laringe e desempenhar a sua função motora.
Já o recurrente direito contorna a subclávia direita logo que sai do vago, passa pela glândula
tireóide e em seguida entra no laringe.
Por ser bem mais longo que o direito o recurrente esquerdo é muito mais sujeito a lesões
sejam elas de traumáticas ou compressívas.
Por este mesmo motivo, as paralisias recurrenciais do laringe são muito mais frequentes no
lado esquerdo.

Classicamente, o interior do laringe é dividido em 3 regiões: supraglote, glote e infraglote .


Estas 3 regiões possuem sintomatologia e limites específicos.
A região supraglótica vai da entrada superior do laringe até um plano imaginário que passa
horizontalmente acima das cordas vocais.
Como esta região encontra-se muito próxima da base da lingua, chegando a tocá-la durante a
deglutição, seu sintoma mais característico é a disfagia, principalmente a odinofagia nos
processos inflamatórios agudos da laringe.
A região glótica nada mais é do que o próprio espaço delimitado pelas duas cordas vocais.
Um pouco mais estreita que a supraglote, a região glótica apresenta como principal sintoma a
disfonia popularizada com o nome de rouquidão.
Abaixo do plano das cordas vocais encontramos a região subglótica que estende-se até uma
linha que passa horizontalmente pelo bordo inferior da cartilágem cricóide.
É a mais estreita e indistensível das 3 regiões sendo por este motivo a responsável pelos
sintomas dispneicos da laringe.

Entender a drenagem linfática da laringe é muito importante para a avaliação sobre o


prognóstico dos tumores malignos deste orgão.
O desenho da distribuição destes vasos assemelha-se a uma ampulheta, isto é, bastante
abundante nas extremidades e escassa do centro.
Isto significa que os carcinomas localizados na supraglote ou na infraglote disseminam-se
muito mais facilmente que os carcinomas da região glótica. Inversamente, os tumores glóticos
possuem prognóstico bastante favorável devido a pouca drenagem linfática desta região.
A vascularização arterial é provida pelas artérias tireoideas.

PROCESSOS INFLAMATÓRIOS

Os processos inflamatórios do laringe como em qualquer outro órgão podem ser divididos
classicamente em agudos e crônicos.
Existem portanto as laringites agudas e as crônicas mas, obviamente, não falaremos de todas
elas e sim apenas das mais importantes, isto é, aquelas que encontramos na nossa prática
clínica diária.

Agudas
Os principais tipos de laringites agudas sã laringite aguda catarral, laringite estridulosa
(pseudo-diftérica) e laringite diftérica.
A laringite catarral é um processo inflamatório agudo que instala-se sobre a mucosa da laringe
com repercussões principalmente a nível das CV.
Ocasiona congestão difusa desta mucosa com edema liso desta e diminuição da mobilidade do
aparelho fonador.
Pode ser desencadeada por inúmeros fatores como choques térmicos, uso abusivo da voz,
fumo, álcool, exposição a agentes químicos, resfriados comuns etc.
Sua instalação é rápida, (em questão de horas) provocando intensa rouquidão, sensação de
aperto ao nível da laringe, tosse espasmódica e expectoração abundante tipo mucosa.
Quando sobrevem infecção por bactérias esta expectoração torna-se amarelada e associa-se
com sintomas gerais de febre e mal estar.
Se tratar-se de etiologia virótica estes sintomas gerais apresentam-se já no inicio da doença.
No adulto o quadro é bastante fácil de controlar e não temos grandes riscos.
A sintomatologia regride dentro de 5 dias com tratamento adequado.
Este deve obrigatoriamente incluir repouso absoluto da voz (aproximadamente 5 dias),
antiinflamatórios e ou antibióticos.
As inalações com mentol devem ser prescritas com cuidado pois se usadas em excesso
ocasionam quadros graves de tosse por irritação local da endolaringe.
A laringoscopia indireta revela edema e congestão difusos do laringe e dificuldade de
coaptação das cordas vocais durante a fonação.

A laringite estridulosa ocorre principalmente em crianças devido à maior presença de tecido


linfóide e conjuntivo frouxo submucoso no interior destes laringes.
Além disto, o laringe infantil tem um diâmetro muito menor que o do adulto, favorecendo assim
o surgimento de quadros obstrutivos por processos inflamatórios neste período da vida.
Ocorre mais frequentemente em meninos e surge sempre em crianças que se recolheram à
noite sem qualquer sintomatologia respiratória.
O quadro clínico é assustador.
A criança acorda subitamente apresentando tosse e ou choro roucos, agitação, sinais de
sufocação, palidez e sudoreses intensas.
O sinal que mais chama a nossa atenção e o estridor inspiratório ocasionado pela passágem
forçada do ar inspiratório através de uma subglote edemaciada.
Este edema forma-se facilmente também devido a facilidade com que ocorre acúmulo de
líquido extravascular nas submucosas quando a criança está deitada, aumentando assim a
pressão hidrostática do sangue nas regiões altas do corpo.
Além disto, encontramos obstrução nasal.
O tratamento de urgência deste tipo de laringite consiste basicamente em medidas simples.
O primeiro passo é colocar, se possível a criança em pé ou sentada para facilitar a drenagem
linfática da laringe e minimizar o edema da subglote.
Vasoconstrictores nasais, compressas mornas no pescoço, e corticosteroides injetáveis são
imprescindíveis.
Tomadas estas medidas, o quadro clínico cede em questão de minutos.
O seu tratamento profilático consiste em realizar adenoidectomia com ou sem amigdalectomia
(dependendo de cada caso), já que a maioria das crianças que apresentaram crises de laringite
estridulosa são portadoras de infecções de amígdalas e adenóides.
A avaliação de fatores alergênicos também é recomendada, ao nosso ver.

Na laringite diftérica o quadro clínico, apesar de semelhante, é muito mais assustador porque
sempre encontramos a criança já com diagnóstico firmado de angina diftérica. Isto quer dizer
que a laringite diftérica sempre é secundária a angina diftérica.
Atinge geralmente crianças na faixa etária de 1 a 6 anos de idade.
As pseudo-membranas ou placas diftéricas que inicialmente forma-se na faringe, descem e
invadem o laringe e, se nenhuma medida for tomada, terminam por ocluir a luz deste órgão
provocando a morte da criança por asfixia.

O quadro evolutivo desta laringite apresenta-se sempre com a seguinte cronologia


sintomatológica. Disfonia, dispnéia leve e asfixia.
Da fase inicial até a final o período médio é de 4 dias.
Na fase final a criança apresenta-se cianosada, respiração superficial, pulso acelerado,
extremidades frias e indiferente ao ambiente.
Diante de um quadro clinico confirmado de laringite diftérica em fase dispneica recomenda-se
traqueostomia o mais rápido possível além da soroterapia especifica e administração de
antibióticos (eritromicina), obviamente com o paciente internado e observado 24 horas por dia.
Deve-se, mesmo após a cura do processo, acompanhar de perto estas crianças para não
sermos surpreendidos pelos complicações pós-diftéricas como a síndrome de Marfan.

Existem muitos outros tipos de laringites agudas porém felizmente muitíssimo raras como a
herpética, da escarlatina, tífica, reumática, erisipelatosa e a flegmonosa.
Não discorreremos sobre elas pois como dissemos, são bastante raras e sempre associadas a
uma doença de etiologia conhecida como os seus próprios nomes indicam.

Crônicas

Podemos simplificar bastante dizendo apenas que as laringites crônicas são aquelas laringites
agudas que não foram adequadamente tratadas.
Em alguns casos isto não é verdade como veremos adiante.

A principal característica da laringite crônica é a rouquidão prolongada que pode ser


interrompida por breves períodos de melhoria da voz.
O paciente apresenta o hábito de pigarrear constantemente pela manhã com eliminação de
expectoração mucocatarral com ou sem tosse.
A rouquidão pode piorar do transcorrer do dia com o uso continuado da voz.
Suas principais causas sã Infeções respiratórias repetidas (amigdalites, sinusites, rinites), uso
excessivo de ácool, fumo, inalantes tóxicos (fotógrafos, químicos, tecelões, mecânicos,
bombeiros, carpinteros), uso abusivo da voz (professores, cantores, políticos), desordens
sistêmicas (diabetes, doenças hepáticas, enterites), exposição prolongada a choques térmicos
(pedeiros, foguistas, cozinheiros), entre muitas outras causas.
Os tipos mais comuns de laringites crônicas são a simples, a hipertrofica e a monocordite.

Na laringite crônica simples as cordas apresentam-se congestas, edemaciadas com dilatações


vasculares superficiais e cordas vocais sem o seu brilho característico.
Como há fadiga vocal, o paciente apresenta hipertrofia compensatória das falsas cordas.
Existe um exudato mucocatarral recobrindo as cordas vocais. Com a manutenção deste
quadro sem o devido tratamento, instala-se a laringite hipertrófica com hiperplasia da mucosa
das cordas vocais e piora acentudada da qualidade vocal do paciente podendo chegar ao
quadro de metaplasia das cordas vocais.
Nesta fase deve-se tomar muito cuidado pelo perigo de deixar passar um carcinoma
epidermóide em fase inicial.
A monocordite como o próprio nome indica, representa a inflamação de uma única corda vocal.
Na presença deste tipo de laringite, deveremos sempre suspeitar de tuberculose da laringe ou
de monocordite puramente vasomotora.
Hoje em dia, com os meios ópticos disponíveis descobrimos que muitas monocordites podem
ser na realidade o espelho de lesões tumorais unilaterais das cordas vocais.
O tratamento destas laringites é basicamente o mesmo das agudas.
Afastar o paciente dos agentes causadores e se for o caso recomendar-lhe exercícios de
impostação da voz.
Nas laringites hipertóficas avançadas, recomenda-se estudo criterioso e seguimento constante
do doente pelo risco do desenvolvimento do Ca.epidermóide.
Em caso de dúvidas deve-se recorrer a microlaringoscopia sob anestesia geral para uma
avaliação segura sobre o estado da mucosa da laringe em questão.

Devido a agravantes socio-econômicos crescentes em nosso país, um tipo especial de laringite


crônica vem lentamente ganhando espaço.
É a laringite tuberculosa.
Esta é geralmente secundária a tuberculose pulmonar e instala-se na laringe secundariamente
através de 3 vias: sanguínea (através dos vasos como nas tuberculoses miliares), linfática e
canalicular (através da ascenção de secreções contaminadas).
Este último tipo explica por que a localização do processo tuberculoso geralmente é na
comissura posterior (região interaritenoidea) devido ao decúbito do paciente durante a noite
(decúbito dorsal).
É a via mais comum de contaminação da laringe.
Os principais sintomas sã tosse constante espasmódica, rouquidão progressiva, disfagia
dolorosa (odinafagia pela localização das lesões na supraglote) e dispnéia nas fases finais da
doença.
A deglutição dolorosa caracteristicamente irradia-se para o ouvido homolateral fazendo com
que o paciente desenvolva verdadeiro pavor ao ato de deglutir.
Com isto, alimenta-se pouco e apresenta-se quase sempre com perda acentuada de pêso.
A laringoscopia indireta mostra lesões granulosas ulceradas ou não em várias áreas da
laringe, preferentemente nas regiões posteriores com exudato purulento abundante.
Diante destes doentes solicitaremos sempre os exames de rotina para tuberculose pulmonar
como RX de tórax em AP e L, pesquisa de BK no escarro com cultura do material, teste de
Mantoux.
Em caso de dúvida, recorremos a biópsia da laringe.
O tratamento é basicamente o mesmo da tuberculose pulmonar.
A tuberculose de laringe pode deixar como sequela uma estenose cicatricial de difícil
tratamento.

TUMORES BENÍGNOS DO LARINGE

Os tumores benígnos do laringe são bastante frequentes e falaremos apenas dos mais
encontrados na nossa prática clínica. São êles os pólipos, nódulos, papilomas, cistos e
granulomas.

Os pólipos nem sempre são considerados como verdadeiros tumores por alguns autores.
Alguns chegam a enquadrá-los como uma alteração de caráter inflamatório puro e enumeram
uma série de subtipos, que ao nosso ver, apenas aumentam a problemática em classificar as
doenças do laringe.
O pólipo geralmente apresenta-se como uma lesão pequena, de cor rósea e lisa no bordo de
uma das CV, podendo ser pediculado (a grande maioria) ou séssil .
Existem 2 tipos principais de pólipos. O angiomatoso e o fibroso.
O angiomatoso sempre é relacionado com inflamações agudas do laringe e pode regredir
espontaneamente sem cirurgia ao contrário do fibroso.
O principal sintoma é a rouquidão progressiva e ocasionalmente a voz bitonal quando o pólipo
tem tamanho suficiente para deslocar-se entre as CV.
Em pólipos muito grandes e pediculados há determinadas posições em que o paciente tem a
sua voz normal. Ao mudar de posição a voz torna-se rouca.
O tratamento consiste em microcirurgia da laringe sob anestesia geral e afastamento das
causas que originaram o pólipo como os processos inflamatórios crônicos, alérgicos e irritativos
das vias aéreas.
Os pólipos excepcionalmente tornam-se recidivantes após uma microcirurgia. Ocasionalmente
o pólipo apresenta-se nas duas CV.

Os nódulos do laringe são os tumores benígnos mais comuns deste órgão.


Sendo bilaterais e simétricos apresentam-se como duas pequenas saliências no bordo livre das
CV na junção do terço anterior com os 2/3 posteriores destas .
Atinge preferentemente o sexo feminino e especialmente naquelas que fazem uso abusivo da
voz como cantoras, telefonistas, professoras, babás, comerciárias entre outras.
O sintoma típico é a rouquidão progressiva que piora no fim do dia. O tratamento pode ser feito
através de orientação fonoaudiológica nos casos iniciais (nódulos pequenos) e microcirurgia da
laringe naquleles casos de nódulos volumosos seguida de fonoterapia.

Os papilomas do laringe merecem um pouco mais de atenção.


Por serem lesões altamente recidivantes e incidirem mais em crianças (entre o primeiro e o
sétimo ano de vida), podendo obliterar a luz do laringe, tornaram-se o “calo” do laringologista.
Caracteristicamente possuem potencial malígno no adulto, ao contrário das crianças.
Na criança geralmente tem aspecto multifocal localizando-se em várias áreas do laringe,
dificultando bastante a sua retirada cirúrgica.
No adulto geralmente são lesões únicas e podem ser queratinizados. Quando não
diagnosticados corretamente podem levar a quadros bastantes severos de asfixia necessitando
sempre de uma traqueostomia.
O aspecto é de uma lesão vegetante de cor rósea, formadas de pequenas vesículas com um
único pedículo semelhantes a uma cacho de uva.
A mãe nos conta que a criança começou a ficar rouca já nos primeiro anos de vida e que
posteriormente surgiu dificuldade respiratória progressiva resistente aos medicamentos mais
comuns (antibióticos e antiinflamatórios). Existe uma clara relação entre a papilomatose juvenil
recidivante (este é o nome mais adequado) e o estado nutricional das crianças afetadas.
As crianças bem nutridas e com boa higiêne não apresentam papilomatose ou esta é
muitíssimo rara estre estes.
Hoje em dia atribue-se orígem virótica ao papiloma do laringe embora os tratamentos com
imunoestimulação (interferon etc..) não interfiram no curso desta doença.
Quando a criança aproxima-se da puberdade a tendência à recidiva desaparece, fazendo-nos
pensar em dependência hormonal.
O tratamento sempre é realizado com microcirurgia da laringe em várias sessões nas crianças.
Chegamos mesmo acompanhar o caso de uma criança no Hosp. de Clínicas de Porto Alegre
que já havia se submetido a 28 microcirurgias, sempre com recidivas, isto no anos de 1981.
Aqui mesmo em nosso estado já temos alguns pacientes com mais de 10 sessões de
microcirurgias da laringe.

Ao meu ver hoje a única alternativa possível é mudar radicalmente o padrão nutricional e
higiênico destas crianças, coisa que as autoridades envolvidas com o poder não sabem, não
querem, não fazem e nem deixam ninguem fazer.

Os cistos são lesões unilaterais, lisas, translúcidas com conteúdo seroso ou mucoso que
ocorrem sempre que tivermos obstrução de uma glândula dentro do laringe.
Os sintomas são semelhantes aos dos pólipos e o tratamento sempre é cirurgico.

Os granulomas inespecíficos sempre ocorrem nas regiões posteriores do laringe entre as


cartilágens aritenóides.
Podem ser provocados por mau uso da voz (pacientes excessivamente tensos), reflúxo
gastroesofágico ou por entubação prolongada. Podem ser uni ou bilaterais.
O tratamento é sempre através de microcirurgia da laringe com infiltração local de
corticosteróide trancirurgico no local da retirada da lesão.
Em todas estas microcirurgias que falamos, sempre recomendamos repouso vocal por no
mínimo 10 dias no pós-operatório.
Este tipo de lesão também tem caráter recidivante porém menor que o papiloma.

TUMORES MALÍGNOS

O câncer do laringe, exatamente ao contrário do nódulos vocais, atinge quase que


exclusivamente o sexo masculino e nas faixas etárias acima do 40 anos.
Altamente relacionado com o hábito de fumar, é facilamente detectável em sua fase inicial
porque o seu principal e mais precoce sintoma é a rouquidão que é progressiva e resistente a
qualquer tipo de terapêutica ambulatorial.
Posso até mesmo atrever-me a dizer que, dentro de certos limites, o Ca. de laringe
diagnosticado precocemente comporta-se, em termos de prognóstico como um tumor benígno
qualquer, desde que se tenha com êle o devido cuidado na condução do diagnóstico e na
terapêutica adequada.
O principal e mais comum tipo de Ca de laringe é o carcinoma epidermóide .
Este representa mais de 95% de todos os tumores malígnos do laringe.
Existem ainda os sarcomas mas são muitíssimos raros.
O Ca. epidermóide pode localizar-se em vários pontos do laringe mas preferentemente inicía-
se no bordo livre da corda vocal em 80% dos casos e é exatamente por isto que o seu
diagnóstico precoce é bastante fácil.
Quando localiza-se nas regiões superiores do laringe (epiglote, prega ari-epiglótica) é
classificado como extrinseco.
Quando inicía-se dentro do espaço glótico ou na sub-glote é chamado de intracavitário ou
intrínseco.
Como descrevemos acima, quanto mais nos afastamos da região glótica, mais aumentam as
chances de disseminação destes tumores, ou seja, os extrinsecos têm om prognóstico sombrio
se comparados com os intrínsecos .

O aspecto laringoscópico desta lesões varia muito mas, de forma geral, apresentam-se como
uma lesão saliente no terço médio da CV, superfície queratinizada e halo de hiperemia
circundante assemelhando-se muito a uma placa de leucoplasia com a qual sempre devemos
fazer o diagnóstico diferencial.
Este é o Ca. epidermóide inicial.
Com o passar do tempo podem infiltrar as comissuras anterior e posterior, fixar ou limitar os
movimentos das cordas, passando a acometer a CV do lado oposto quando o prognóstico
muda completamente para pior. Pode também ascender em direção à supraglote ou descer em
direção a infraglote.
Quando infiltra as 3 regiões do laringe também é conhecido como Ca. epidermóide transglótico
e aí sim o doente encontra-se em maus lençóis pois terminará certamente submetendo-se a
uma laringectomia total com perda total da capacidade fonatória.
Nunca é demais lembrar que rouquidão com mais de 20 dias em paciente do sexo masculino e
fumante é motivo suficiente para indicarmos minuncioso estudo do laringe através de
laringoscopia. Isto sim é fazer medicina preventiva. Barata, rápida, simples e eficaz.

Uma vez confirmada a suspeita de Ca.epidermóide do laringe, solicitamos sempre estudo


tomográfico computadorizado do laringe e de todas as estruturas cirundantes na busca de
possíveis infiltrações ou metástases para orientar o tratamento definitivo que, na maioria das
vezes é cirurgico.
Naquelas lesões classificadas como Ca. in situ no 1/3 médio da corda vocal sem fixação da
mesma procedemos a retirada total através de microcirurgia da laringe e indicamos uma
cobaltoterapia preventiva (6000 rads) na região operada após 8 dias da microcirurgia.
Devemos acompanhar minunciosamente estes pacientes pelo menos mensalmente durante o
primeiro anos após a cirurgia, de 2 em 2 meses no segundo ano, de 3 em 3 meses no terceiro
ano e a cada 6 meses no restante da vida do paciente.
Os tumores invasivos ou mais volumosos são tratados com cirurgias maiores, mais
complicadas e mais mutilantes de acordo com o seu grau de invasão e a presença ou não de
mestástases.

Prof. Dr. José Cabral


Professor da Disciplina de Otorrinolaringologia da UFRN
Fonte:http://www.brasilclinicas.com/.

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