Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Ciência sistemática e
histórica da Religião
Resumo
Abstract
Introdução
Radicada no seio das ciências humanas, sejam estas vistas como “da
cultura” ou “do espírito”, a Ciência da Religião vive tão intensamente quanto
qualquer ciência da natureza as consequências do conflito cultural entre
ciência e religião. Diferenciando-se de todas as ciências por um acolhimento
da religiosidade em seus próprios termos, a Ciência da Religião tenta dar voz
ao discurso religioso em pleno campo acadêmico,1 sem o que não trataria
da religião, senão de outro fator explicativo que a reduzisse. Não obstante,
organizando-se como ciência, precisa “traduzir“ de algum modo o seu objeto
para uma forma crítica e sistemática; e, neste tocante, a relação temática
natural com a teologia torna-se problemática, pois acusações de carência de
cientificidade partem de adversários da Ciência da Religião, tanto quanto de
profissionais da área que intentam imunizar-se contra estes ataques.
Como se suas dificuldades próprias já não fossem imensas, a Ciência da
Religião sofre também com as indefinições correntes quanto à natureza da
ciência em geral e da objetividade possível dos discursos, um problema que
inclui radicalismos relativistas, que tentam exprimir todos os princípios do
conhecimento como questões de paradigma cultural, e certo isolamento da hard
Science, que para não ver seus programas afetados pelo relativismo acabam
dando as costas ao diálogo sobre a filosofia e a sociologia do conhecimento.
1
Com isto concordam praticamente todos os “partidos” da(s) Ciência(s) da Religião. Autores
ligados à Sociologia e à Antropologia como Greschat e Usarski, que querem uma identificação
com as ciências da cultura, reconhecem a necessidade de haver “algum” elemento transcendente,
espiritual ou místico irredutível a perpassar os fenômenos religiosos. GRESCHAT, Hans-Jürgen.
O que é Ciência da Religião? São Paulo: Paulinas, 2006; (USARSKI, Frank. Perfil paradigmático
da ciência da religião na Alemanha, In: TEIXEIRA, Faustino (Org.). A(s) Ciência(s) da Religião
no Brasil. São Paulo: Paulinas, 2001.
3
USARSKI, Frank. Constituintes da Ciência da Religião. Cinco ensaios em prol de uma disciplina
autônoma. São Paulo: Paulinas, 2006. p. 40-41.
4
USARSKI, 2006. pg. 69.
5
FILORAMO, Giovanni; PRANDI, Carlo. As Ciências das Religiões. São Paulo: Paulus, 1999.
6
HARRISON, Victoria S. The pragmatics of defining religion in a multi-cultural world. Interna-
tional Journal for Philosophy of Religion, vol. 58, (2006) p. 133-152.
11
GRESCHAT, 2006. p. 117.
Para Popper um enunciado terá valor científico quando sua forma lógica
for aberta à possibilidade de falseação, isto é, que ele possa ser “provado
falso”. Tal critério pesado faria inúmeras “baixas” no campo das ciências
humanas. Todavia, o importante antes de tudo é ter em mente que tal
contrato demarcatório popperiano busca garantir o máximo possível a
possibilidade de que aquilo que uma comunidade humana toma como
enunciados legítimos esteja aberto à crítica racional, sensível (órgãos dos
sentidos) e humana.13
12
COMSTOCK, Richard. Toward Open Definitions of Religion. Journal of the American
Academy of Religion, Oxford: vol. 52, n. 3, (Sep. 1984) p. 499-517.
13
PONDÉ, Luiz Felipe. Em busca de uma cultura epistemológica. In: TEIXEIRA, 2001. p. 36.
14
A hermenêutica enquanto ciência não permite um relativismo frouxo das visões interpreta-
tivas. Conquanto variadas, elas têm de conservar em comum a consistência metódica, o senso
histórico e a referência substancial à realidade. Paul RICOEUR. História e Verdade. Rio de
Janeiro: Forense, 1968. p. 36-38.
15
PADEN, William E. Interpreting the Sacred: Ways of Viewing Religion. Boston: Bacon Press,
2003. p. 45.
16
PADEN, 2003. p. 70.
17
LIBANIO, J. B. A religião no início do milênio. In: CRUZ, Eduardo R. da, DE MORI, Geraldo
(org.). Teologia e Ciências da Religião: O caminho da maioridade acadêmica no Brasil. São Paulo:
Paulinas; Belo Horizonte: Editora PUC Minas, 2011. p. 55-59.
18
GROSS, Eduardo. Considerações sobre a Teologia entre os Estudos da Religião. In: TEIXEIRA,
2001. p. 335-338.
Que unidade pode pretender uma disciplina dual por natureza e sem har-
monia entre as suas partes? Pesquisadores comprometidos com as ciências so-
ciais proíbem terminantemente qualquer definição geral de religião,23 enquan-
to pesquisadores comprometidos com a filosofia da religião, a teologia ou as
ciências hermenêuticas se perguntam: “como pode haver ciência sem objeto e
campo bem definidos?”. Donald Wiebe se sobressalta com a percepção de que
a Ciência da Religião tenha se perdido no descritivismo e já não sabe qual é
o critério de verdade dos fatos que estuda.24 Ao mesmo tempo, não quer ver a
Ciência da Religião entremeada de teologia:
21
PANNENBERG, Wolfhart. Teoria de la ciencia y Teologia. Madrid: Libros Europa, 1981. p. 322.
22
PANNENBERG, 1981. p. 370.: “La ciencia general de las religiones podría adquirir la relevancia
de una teología fundamental sólo con una condición, todavía no garantizada por el estado actual
de su desarrollo: la ciencia general de las religiones no debería limitarse a describir la experiencia
religiosa humana, sus conexiones con las restantes experiencias y su institucionalización en el
contexto de la vida social, sino que tendría que investigar también la realidad que se experimenta
en la vida religiosa y su historia.”
23
Camurça, Greschat e Usarski nas obras previamente citadas.
24
WIEBE, Donald. Religião e Verdade. São Leopoldo: Sinodal, 1998.
25
WIEBE, 1998. p. 67.
26
A maioria dos que foram citados neste trabalho.
27
HOLM, Søren. Religionsphilosophie. Stuttgart: Kohlhammer Verlag, 1960. p. 89-91.
28
NIEBUHR, H. Richard. The Responsible Self: An Essay in Christian Moral Philosophy. New
York: Harper & Row, 1978.
29
Para considerar a atualidade e vigor do pensamento de Cassirer, sugerimos o texto de Ralf
Goeres. GOERES, Ralf. Ernst Cassirers kritisch-idealistischer Symbolbegriff. Philosophische
Jahrbuch, vol. 114, n. 2, (2007), p. 346-375.
30
John TEMPLETON. Possibilities for Over One Hundredfold More Spiritual Information: The
Humble Approach in Theology and Science. Philadelphia: Templeton Foundation Press, 2000.:
“Developing a humble approach in theology, which encourages research and engages carefully with
science, may be even more fruitful than endeavors to reinvigorate inherited systems of thought,
whether they be polytheistic, deistic, theistic, monotheistic, pantheistic, panentheistic or even older
concepts”. p. 10.
31
Edênio Valle vai de encontro às ciências naturais em seu artigo: VALLE, Edênio. Ciências
Cognitivas, Filosofia da Mente e Fenomenologia: um debate contemporâneo. In: CRUZ & DE
MORI, 2011, além disso há nomes célebres dedicados ao intercâmbio entre religião e ciência,
como Arthur Peacocke, Philip Clayton.
32
Inúmeros artigos e outras referências podem ser encontrados no endereço do Núcleo de
Pesquisas em Espiritualidade e Saúde: http://www.ufjf.br/nupes/publicacoes/.
33
Faço aqui referência à forma brilhante com que James conecta os traços psicológicos da
religião a consequências positivas diretas sobre a saúde do indivíduo, como no caso de vícios,
patologias mentais e mesmo a aparente cura de doenças. JAMES, William. As Variedades da
Experiência Religiosa: Um estudo sobre a natureza humana. São Paulo: Cultrix, 1995.
Conclusão
Referências Bibliográficas