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RESUMO
1. INTRODUÇÃO
O processo de projetos dos edifícios é marcado, via de regra, por uma série de indefinições,
quer das características do produto (projeto do produto “incompleto” ou com informações
conflitantes), quer das atividades produtivas (ausência de definições de procedimentos de
execução e de um projeto balizador para a produção); repercutindo em uma acentuada
improvisação em obra, para a qual são delegadas importantes decisões que poderiam ser
melhor estudadas e elaboradas durante a fase de projeto do empreendimento.
Esse caráter pouco formal do processo produtivo na construção de edifícios é reflexo do
precário domínio técnico e tecnológico que as empresas do subsetor detêm sobre a suas
atividades produtivas, bem como de serviços de projeto (em sua grande maioria
subcontratados) pouco orientados à construtibilidade das obras e deficientes enquanto
caracterização de produto.
Nesse contexto, o conceito de construtibilidade vai destacar a necessidade dos projetistas
considerarem as implicações das especificações em projetos (do produto) frente à sua
execução, reforçando a conveniência da adoção de soluções de projetos que simplifiquem e
melhorem o processo executivo. Assim, segundo SABBATINI (1989), a proposição
principal deste conceito é a de “integrar projeto e construção dentro de uma visão
holística, adotar prioritariamente, em todas as etapas, os dados provenientes das
operações construtivas e considerar que a solução ótima é a de maior construtibilidade.”
Seguindo a linha de se buscar maior integração do Projeto do Produto com as necessidades
de obra, tem-se destacado, entre pesquisadores e entre as empresas, a necessidade de se
projetar conjuntamente com os produtos os processos de produção dos mesmos.
Em uma perspectiva mais ampla - voltada para a indústria em geral -, JURAN (1992)
coloca o Projeto do Processo como “a atividade de definir os meios específicos a serem
usados pelas forças operacionais para alcançar as metas do produto”. Para tanto, esse
projeto deve especificar - segundo o autor:
• os equipamentos que serão utilizados;
• o “software” - procedimentos e técnicas que serão empregadas;
• as informações sobre como operar e manter os equipamentos.
O mesmo autor afirma ainda que para se chegar a tais definições são necessários:
• conhecer as metas de produtividade e qualidade que se deseja atingir frente às condições
financeiras e tecnológicas que a empresa apresenta;
• conhecimento das condições de operação de processos semelhantes;
• além do conhecimento da capacidade de processos alternativos ao que se deseja
“projetar”.
Para transpormos esse conceito (Projeto do Processo) para a construção, devemos observar
que, na indústria seriada, para cada projeto são produzidos uma infinidade de produtos,
fazendo com que o processo se repita inúmeras vezes e com isso os projetos do produto e
da produção permaneçam os mesmos (ou praticamente os mesmos), por vários ciclos de
produção. Na construção, ao contrário, a cada produto tem-se, quase sempre, um projeto de
produto diferente, embora freqüentemente, mantenha-se certas características tipológicas
que conformam o “padrão de obra” de cada construtora (AMORIM, 1996).
Assim, apesar da não repetitividade estrita do produto, muitos dos procedimentos de
produção (técnicas construtivas, ferramentas, outros) permanecem ou podem permanecer os
mesmos na execução de várias obras de uma mesma empresa e de uma mesma tipologia de
produto.
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Diante desse caráter singular da produção de edifícios, que a cada construção desenvolve
um processo produtivo único, ao mesmo tempo em que mantém práticas produtivas
tradicionais, o projeto do processo na construção pode considerar duas etapas distintas para
abarcar, por um lado, conteúdos e informações invariáveis (a menos de introduções
planejadas de inovações nestes procedimentos) e, por outro, as informações que são
próprias de cada obra.
Assim, surgem na literatura dois conceitos complementares e inter-relacionados referentes à
necessidade de antecipação dos processos, que vão, por um lado, apontar a necessidade das
construtoras apropriarem-se, efetivamente, do domínio técnico sobre seus processos
produtivos dando origem a um conceito mais amplo - que poderíamos tratar como Projeto
da Produção1 - que consistiria no estabelecimento, para cada tipo de processo construtivo
utilizado pela empresa, das estratégias gerais de produção, das normas de procedimentos de
execução, metas de produtividade em cada atividade padrão, e controles a serem
observados. Por outro lado, destaca-se o conceito de Projetos para Produção2 voltados
para a definição (em projeto) das seqüências e métodos de execução de determinadas etapas
criticas da obra, como forma de se ampliar o desempenho na produção dessas etapas.
2. PROJETO DA PRODUÇÃO
1
Com este entendimento de Projeto da Produção pode-se citar MARTUCCI (1990), FABRICIO (1996). De
forma similar, enfatizando os procedimentos de produção, SABBATINI (1989) define Projeto do Processo.
2
O conceito de “Projeto para Produção” e a sua aplicação frente à diferentes subsistemas de obra vêm sendo
abordado em diversos trabalhos recentes dentre eles: MELHADO & VIOLANI (1992), MELHADO (1994),
SOUZA (1996), MACIEL (1997).
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“A prática de se caracterizar e definir todos os processos de trabalho envolvidos na
execução de uma edificação, nos leva a adquirir uma ‘cultura técnica e tecnológica’, para
cada Processo Construtivo (...). É através desta prática que podemos dar à Produção o
caráter de Projeto, pois tem-se, ao longo do tempo e gradativamente, a possibilidade de se
introduzir inovações tecnológicas em determinados elementos do processo de trabalho
(...).” (MARTUCCI, 1990).
Dessa forma, ao contrário de significar uma limitação à inovação tecnológica, o
estabelecimento de procedimentos de produção, se acompanhado de um monitoramento
adequado (visando a retroalimentação dos procedimentos) sobre os resultados alcançados
em obra e de uma política de melhoria contínua, pode apontar para a introdução de novas
técnicas e tecnologias construtivas que melhorem a qualidade do processo e do produto.
Para a configuração de um Projeto da Produção, mais do que o estabelecimento de normas e
procedimentos, a questão central que se coloca é a necessidade de políticas e estratégias
empresariais que balizem a seleção das características e padrões que este projeto irá
impingir às obras e à execução das mesmas.
Assim, uma política de produção que defina como se dará a organização do trabalho, os
índices de produtividade, o padrão de qualidade, os critérios para subcontratação de
serviços, a quantidade de treinamento e a rotatividade de mão-de-obra própria, bem como
os investimentos que se deseja realizar; são requisitos para a realização de um Projeto da
Produção coerente com as aspirações e condições operacionais da empresa, representando
informações básicas para a criação de procedimentos adequados.
Diante desse caráter estratégico e próprio a cada organização que o Projeto da Produção
tem, a sua execução só pode ser capitaneada pela própria empresa que irá utilizá-lo (ainda
que conte com a colaboração de agentes externos, como especialistas em determinadas
áreas, consultores, pesquisadores etc.) e demande um autoconhecimento sobre as
características e potencialidades da empresa, além da definição de metas claras do que se
quer atingir.
Para concluir este item, deve-se enfatizar que, embora as normas de procedimentos sejam
os documentos que representam o Projeto da Produção na obra, o sucesso dele passa por
uma série de medidas de planejamento estratégico da produção, que envolvem a gestão da
mão-de-obra e das subcontratações, o investimento em equipamentos de produção, a
qualificação dos fornecedores de insumos em geral e o estabelecimento de um
relacionamento com os projetistas, de forma que esses últimos levem em conta as
características da produção (ver no item seguinte a discussão sobre Projetos para Produção
como ferramenta de integração entre projeto do produto e produção).
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desenvolver simultaneamente produtos e processos com o objetivo de integrar e otimizar
globalmente o ciclo de produção dos produtos (STOLL, 1991).
Na construção de edifícios, MELHADO (1994) definiu Projeto para Produção como o
“conjunto de elementos de projeto elaborados de forma simultânea ao detalhamento do
projeto executivo, para utilização no âmbito das atividades de produção em obra, contendo
as definições de: disposição e seqüência de atividades de obra e frentes de serviço; uso de
equipamentos; arranjo e evolução do canteiro; dentre outros itens vinculados às
características e recursos próprios da empresa construtora”.
Assim, o Projeto para Produção deve conter informações cuja finalidade é subsidiar a
execução do empreendimento. Para citar um exemplo, o Projeto para Produção de laje
racionalizada conteria as seguintes definições, de acordo com SOUZA (1996): ”(...)
seqüência de execução da laje (sentido geral de concretagem), delimitação dos panos de
concretagem, posicionamento das caixas de passagem, taliscas e gabaritos e a definição da
posição dos caminhos de concretagem, quando necessários.”
Para que tais projetos (para produção) definam adequadamente a realização da obra, eles
devem ser norteados por diretrizes que levem em conta as características do sistema de
produção da empresa, conectando os Projetos para Produção específicos com o Projeto da
Produção da empresa e com os Projetos do Produto.
Em relação ao sistema de produção, a definição clara de um Projeto da Produção (ver item
2) fornece as estratégias produtivas e os procedimentos básicos utilizados pela empresa, que
devem ser incorporados na realização dos Projetos para Produção de determinada obra.
Já os Projetos do Produto, contêm as informações geométricas, especificações e detalhes
que devem ser atendidas na produção do edifício e portanto devem ser considerados no
Projeto para Produção. Mais do que isso, o Projeto para Produção deve funcionar como
antecipação da produção de determinadas etapas críticas de obra e auxiliando na avaliação
da construtibilidade dos Projetos do Produto e na busca por soluções de produto
alternativas que a incrementem.
Embora o projeto para produção possa ser realizado posteriormente à definição do produto
(sendo esta a situação mais entrada no subsetor) é, como destacam MACIEL & MELHADO
(1996), mais adequado que a definição do projeto executivo e do Projeto para Produção se
dê simultaneamente - conforme colocado na própria definição de projeto para produção
adotada.
A caracterização da produção (Projetos para Produção) conjuntamente com o
desenvolvimento do produto (Projetos do Produto) tem como uma das funções permitir
uma melhor “tradução” das características e especificações do produto em procedimentos e
seqüências de produção, minimizando a possibilidade de execução inadequada ou
incompleta destas especificações.
Por outro lado, a projetação simultânea de produto e processo traz embutida a necessidade
de uma maior integração e consistência entre os projetos do produto, exigindo coordenação
de projetos, já que eliminar eventuais incoerências nas características e especificações
adotadas para o produto é condição básica para a realização de um projeto para produção
que cumpra sua missão de determinar um bom andamento da obra.
Mais do que identificar e corrigir incompatibilidades, a realização simultânea dos projetos
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deve estabelecer práticas de intercâmbio entre profissionais de áreas de conhecimentos
diferentes (arquitetura, estrutura, instalações, produção, etc.) de forma a facilitar a
ampliação da construtibilidade dos projetos através do rompimento da tradicional separação
de visões dentro de um empreendimento, voltadas para o produto (projetistas do produto);
ou voltadas paro o processo (projetistas do processo e pessoal de produção).
Além de propiciar um ambiente favorável à melhoria da construtibilidade nos processos
tradicionais, a realização simultânea de projetos pode facilitar a introdução de inovações
tecnológicas de produto e de processo, à medida que tais inovações podem ser discutidas,
analisadas e planejadas segundo seus impactos nas várias etapas do empreendimento.
Do ponto de vista dos profissionais envolvidos na definição do produto (em geral realizado
por escritórios contratados pelas construtoras) e dos Projetos para Produção (que vêm sendo
realizados por escritórios especializados, também contratados), busca-se uma convergência
de seus conhecimentos e experiências para a realização de projetos de caráter
multidisciplinar e que atendam as diversas necessidades do pessoal da produção, dos
próprios projetistas e dos usuários do empreendimento (clientes internos e externos).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BUCK, C.H. Problems of product design and development. Oxford, Pergamon Press,
1963.
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Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 1996. (Dissertação de
Mestrado em Arquitetura)
JURAN, J. M. A qualidade desde o projeto: novos passos para o planejamento da
qualidade de produtos e serviços. Traduzido por : Nivaldo Montigelli Jr. São Paulo:
Pioneira, 1992. Traduzido de: Juran on quality by design.
MACIEL, Luciana L. & MELHADO, Silvio B. O processo de projeto e a qualidade dos
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Desenvolvimento Tecnológico na construção civil. Núcleo de Pesquisa em Tecnologia
de Arquitetura e Urbanismo -NUTAU. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - FAU.
Universidade de São Paulo - USP, São Paulo, 1996.
MACIEL, Luciana L. O projeto e a tecnologia construtiva na produção dos
revestimentos de argamassa de fachada. Escola Politécnica da Universidade de São
Paulo, São Paulo, 1997. (Dissertação de Mestrado em Engenharia)
MARTUCCI, Ricardo. Projeto tecnológico para edificações habitacionais: utopia ou
desafio? Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo,
1990. (Tese de Doutorado em Arquitetura)
MELHADO, Silvio B. Qualidade do projeto na construção de edifícios: aplicação ao
caso das empresas de incorporação e construção. Escola Politécnica da Universidade de
São Paulo, São Paulo, 1994. (Tese de Doutorado em Engenharia)
SABBATINI, Fernando H. Desenvolvimento de métodos, processos e sistemas
construtivos: formulação e aplicação de uma metodologia. Escola Politécnica da
Universidade de São Paulo, São Paulo, 1989. (Tese de Doutorado em Engenharia)
SOUZA, Ana Lúcia R. O projeto para produção das lajes racionalizadas de concreto
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1996. (Dissertação de Mestrado em Engenharia)
STOLL, H. W. Design for manufacture: an overview. In: CORBERT, J. et. al. Design of
Manufacturing: strategies, principles and techniques. Wokingham, Addison-Wesley,
1991. p.107-29
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