Você está na página 1de 1

A teoria encontrou a prática e o marketing político.

Os discursos do Podemos
são endereçados às maiorias sociais e evitam os jargões progressistas, visando, nas
palavras de seus articuladores, ocupar o centro do tabuleiro. Refutam a divisão política
no eixo esquerda-direita, argumentando que esse modo de narrar só interessa ao poder,
pois joga quem constrói alternativas diferentes para as bordas. Sua formulação é a dos
99%: os de baixo contra os de cima, la gente contra la casta.
Pela ênfase intelectual e no debate teórico, o Podemos acaba constituindo um
laboratório populista, em que as teorias desenvolvidas nas décadas passadas são testadas
de maneira consciente. As transposições e tensões entre teoria e prática aparecem no
encontro de gerações que foi a instigante conversa entre Iñigo Errejón e Chantal
Mouffe, publicada no livro Construir pueblo.11
10 IGLESIAS, Pablo. Trump y el momento populista. Disponível em:
http://blogs.publico.es/pabloiglesias/1091/trump-y-el-momento-populista/
11 ERREJÓN, Iñigo; MOUFFE, Chantal. Construir Pueblo: Hegemonia y Radicalización de la
Democracia. Barcelona. Icaria Editorial, 2015.
Ali, Mouffe repassa sua crítica à pós-política do neoliberalismo, em que restaria
à disputa política nada mais do que “administrar o consenso”. A partir do momento em
que os principais partidos oferecem soluções parecidas, e quando essas soluções não
melhoram a vida das pessoas (e, no caso da Espanha, não conseguem responder à crise),
podem aparecer frestas na hegemonia.
Os populistas do Podemos souberam perceber esse momento e entender a
essência da política, que para Mouffe consiste na criação de um “nós” – o que implica
necessariamente na distinção de um “eles”. Além disso, atentam para o “papel dos
afetos coletivos na construção desse ‘nós’, assim como para a importância dos símbolos
e de oferecer alternativas”.
O comentário de Errejón sobre o tema poderia ser uma provocação aos autores
citados no início deste artigo: “Há uma ideia entre as forças de esquerda, bastante
equivocada, que entende que se você faz um discurso similar aos populistas de direita –
no sentido de popular – você está ajudando, abrindo caminho. Quando na realidade eu
creio que o que os ajuda é deixar todo esse terreno dos afetos coletivos livre para eles;
assim como outro terreno-chave, que é o da identificação nacional.”12

(Chantal)

Você também pode gostar