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Por que o Programa Minha Casa

Minha Vida só poderia acontecer


em um governo petista?
Why could the Minha Casa Minha Vida Program only have
happened in a government headed by the Labor Party?

Danielle Klintowitz

Resumo
No período de gestão do Partido dos Trabalhado- Abstract
res (PT) no governo federal, configurou-se uma Since the Labor Party has been governing Brazil,
dupla agenda para a política habitacional: a pri- there has been a double agenda for the housing
meira ligada à plataforma de reforma urbana, com policy: the first one is linked to the urban reform
previsão de descentralização e gestão participati- platform, with a forecast of decentralization
va, e a segunda consubstanciada na premissa de and participatory management, and the second
reestruturação do setor imobiliário, estruturada is embodied in the premise of restructuring of
em uma política exclusiva de provisão habita- the real estate sector, structured in an exclusive
cional com promoção privada e financiamento housing policy with private promotion and public
público. Esse modelo de governança garantiu a funding. This governance model has ensured
distribuição de benefícios a ambas coalizões que the distribution of benefits to both coalitions
representavam essas agendas, além de ter legiti- representing these agendas, and has legitimized
mado a política habitacional na agenda pública. the housing policy within the public agenda.
No presente trabalho, analisou-se a trajetória do In this paper, we analyze the trajectory of the
principal programa habitacional desenvolvido na main housing program developed in this period
época (MCMV), discutindo suas implicações para (MCMV), discussing its implications to the right
o direito à moradia e o papel dos atores do setor to housing and the role of actors in the housing
habitacional neste contexto. sector within this context.
Palavras-chave: política habitacional; reforma ur- Keywords: housing policy; urban reform; real
bana; mercado imobiliário; Programa Minha Casa estate market; Minha Casa Minha Vida Program;
Minha Vida; coordenação de interesses. coordination of interests.

Cad. Metrop., São Paulo, v. 18, n. 35, pp. 165-190, abr 2016
http://dx.doi.org/10.1590/2236-9996.2016-3508
Danielle Klintowitz

Introdução Ao tornar-se Presidente da República,


Luiz Inácio Lula da Silva reconhecendo, de
maneira­inovadora, os movimentos de moradia
Historicamente, a política habitacional brasi- como players do setor, conformou uma estra-
leira agregou em torno de si muitos interes- tégia de coordenação de interesses ousada,
ses públicos e privados. Durante o século XX, colocando na mesa de negociação movimentos
assistiu-se a uma forte articulação funcional de moradia e setor produtivo, coalizões com in-
no relacionamento entre Estado e setor produ- teresses historicamente opostos.
tivo, o que garantiu a priorização de políticas Estruturou-se, apoiado nesse contexto,
habitacionais mais voltadas ao crescimento um programa habitacional – o Minha Casa
econômico do que ao direito à moradia. Com Minha Vida (MCMV) – que ganhou status de
a redemocratização e a desestruturação da política por seu vigor de recursos e apoio mul-
política federal de habitação até então estru- tifacetado conquistado. O desenho desse pro-
turada no Banco Nacional de Habitação (BNH), grama atendeu à necessidade de sustentação
emergiram movimentos sociais urbanos, como da reestruturação do setor produtivo da cons-
o Movimento Nacional de Reforma Urbana trução civil e mercado imobiliário, que estava
(MNRU) – transformado posteriormente em em curso, com investimentos keynesianos que
Fórum Nacional da Reforma Urbana (FNRU) –, impactaram a sustentação macroeconômica
que conquistaram o estabelecimento de um do país, dialogando pouco com as necessida-
progressista arcabouço jurídico para o desen- des habitacionais das cidades brasileiras e com
volvimento urbano e praticaram de forma par- o Sistema Nacional de Habitação de Interesse
ticipativa, junto com governos locais de esquer- Social (SNHIS) que estava em construção desde
da, algumas experiências de implementação no 2005.
território, constituindo uma nova matriz rela- No entanto, apesar dos ganhos assimé-
cional com o Estado que ficou conhecida como tricos conquistados pelos movimentos de mo-
o “modo petista de governar”. radia em relação à coalizão do setor produtivo
Com a ascensão ao governo federal do e do enfraquecimento definitivo do SNHIS, a
Partido dos Trabalhadores (PT) que teve des- coor­denação de interesses que se estabeleceu
de sua fundação uma estreita relação com os no MCMV tornou-se extremamente eficiente
ideários da reforma urbana, criaram-se amplas e se expandiu para além dos interesses dessas
expectativas nos atores ligados a essa platafor- coalizões, sendo capaz de se ramificar em vá-
ma de que o novo momento representaria um rias escalas de coordenação: entre o setor pú-
marco de ruptura no legado histórico da polí- blico e privado; entre os diferentes ministérios;
tica habitacional voltada ao desenvolvimento entre União e municípios.
econômico e o início de um ciclo virtuoso de Esse arranjo que se estabeleceu então
implementação do “modo petista de governar” foi capaz de garantir que ambas as agendas
na escala federal. concorrentes – de reforma urbana e do setor

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produtivo­– convivessem de maneira articula- dificuldades financeiras às grandes empresas


da, mesmo que preservassem suas contradi- que naquele momento detinham grande soma
ções. Criou-se um imbricamento cooperativo de investimentos imobilizados em bancos de
que permitiu construir uma política habitacio- terra.
nal que se tornou uma das principais forças Nesse cenário, a conjuntura econômica
desse governo.1 foi o pretexto determinante para ampliação
Com o arranjo criado nesse ambiente, dos mecanismos e volume de recursos destina-
estabeleceu-se um “regime de política” (Couto dos ao setor habitacional. Através do MCMV,
e Abrucio, 2003) no qual se alcançou um enten- com o objetivo explícito de socorrer o setor
dimento quase hegemônico acerca da política produtivo da construção civil e mercado imo-
habitacional com seu lastreamento em inte- biliário e evitar o aprofundamento da crise do
resses objetivos dos atores envolvidos. Assim, mercado, o governo federal colocou o proble-
neutralizaram-se possíveis conflitos dos ato- ma da habitação definitivamente nos termos
res e suas coalizões com Estado, imbricando e propostos pelo setor imobiliário. Segundo
engendrando-os na defesa da própria política, dados do Ministério do Planejamento (Brasil,
mesmo que apenas parte dessa fosse conve- 2014), entre 2009 e 2014 foram investidos
niente para concretização de seus interesses e R$251,8 bilhões no MCMV, considerando os
que apenas parte de seus interesses fosse efeti- subsídios diretos e linhas de crédito disponibili-
vamente atendida. zadas. Esses recursos foram responsáveis pela
Neste artigo, busca-se discutir como se contratação de 3,75 milhões de unidades habi-
deu essa coordenação de interesses na cons- tacionais em todo o Brasil.
trução e implementação do Programa Minha O MCMV foi elaborado pela Casa Civil e
Casa Minha Vida e quais os rumos que a polí- pelo Ministério da Fazenda, em diálogo direto
tica habitacional nacional tomou a partir dessa com os setores imobiliários e da construção,
nova configuração. desconsiderando diversos avanços institucio-
nais na área de desenvolvimento urbano, bem
como a interlocução com o restante da socie-
dade civil. O Ministério das Cidades (MCida-
MCMV: entre o direito des) que tinha na sua origem um forte imbri-
à moradia e reestruturação camento com os atores ligados à plataforma da
do setor produtivo reforma urbana foi posto de lado na concepção
inicial, sendo chamado a contribuir apenas de-
No contexto de euforia do mercado imobiliário pois de elaborada a macroestrutura de funcio-
com o aumento dos recursos disponíveis e com namento do Programa.
a reforma institucional que garantia a seguran- Inicialmente pensava-se em uma estra-
ça dos negócios e lançamentos grandiosos, a tégia destinada apenas às famílias de estratos
crise internacional do subprime de 2008 amea­ médios – com renda acima de três salários
çou a possibilidade de venda dos empreendi- mínimos (SM) – com possibilidade de aces-
mentos em construção, impondo ainda sérias so a financiamentos e que necessitavam um

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percentual­menor de subsídio atrelado a eles. políticas habitacionais­, em que o atendimento


Como se tratava de um programa destinado não é distribuído de acordo com as necessida-
a reduzir as perdas financeiras do setor pro- des reais­, mas de acordo com os interesses dos
dutivo, os empresários do setor não queriam formuladores e implementadores.­
correr riscos. No entanto, o MCidades lutou As metas do programa por faixa de aten-
pela entrada das famílias de menor renda no dimento pouco dialogam com o déficit habita-
programa, o que implicava maiores subsídios cional acumulado por faixa de renda no país.
públicos. Os subsídios são fundamentais para Na primeira fase do Programa (MCMV1), en-
o acesso das famílias de baixa renda ao mer- quanto 91% do déficit estava concentrado na
cado habitacional e, ao mesmo tempo, trazem faixa 1 (renda até três SM), apenas 40% das
vantagens também ao setor produtivo que tem unidades produzidas destinaram-se a esse
o mercado habitacional ampliado com famílias público. Como consequência, apenas 6% do
que de outra maneira estariam fora. déficit­habitacional das famílias com menor
O Presidente Lula, orientado pela busca renda foi atingindo,3 enquanto 93% e 95% do
de soluções de arbitragem que caracterizou seu déficit das faixas de renda mais altas (2 e 3) fo-
governo (Singer, 2012), viu aí uma possibilida- ram atendidos, respectivamente. Na segunda
de também de ganho de capital político junto etapa (MCMV2), embora a meta para a faixa
à base de menor renda, além da ampliação do 1 tenha sido expressivamente ampliada em
mercado habitacional fundamental para as em- detrimento das demais faixas, o combate ao
presas do setor. Assim, criou-se um programa déficit­dessas famílias ainda é percentualmen-
com um patamar histórico de subsídios para as te muito inferior ao atendimento às famílias
famílias com renda de até três SM. com maior renda.
No entanto, o modelo do MCMV im- No modelo institucional desenhado para
plementado privilegiou a concessão maciça o MCMV, a análise de projetos, bem como a
de subsídios para faixas de renda mais altas contratação de obras e medição de etapas fina-
(Faixa 2) que poderiam adquirir financiamen- lizadas é parte dos procedimentos de respon-
tos maiores com menores percentuais de sub- sabilidade da Caixa Econômica Federal (CEF),
sídio. Ao mesmo tempo, também se elevou a não cabendo aos municípios responsabilidade
faixa de renda financiada pelo Fundo de Ga- formal pelos resultados alcançados. Nesse mo-
rantia sobre o Trabalho (FGTS), com melhores delo, o promotor do empreendimento passa a
condições de juros, e parte dessa demanda ser o setor privado, o poder público assume um
poderia ser atendida pelo Sistema Brasileiro papel apenas de financiador e organizador da
2
de Popança e Empréstimo (SBPE), liberando demanda. Cabe ao mercado privado a promo-
recursos do FGTS com financiamento mais ba- ção dos empreendimentos habitacionais ela-
rato para famílias de menor renda (Bonduki, borados de acordo com as exigências técnicas
2014). Assim, apesar dos expressivos subsí- mínimas do MCMV, principalmente no que se
dios concebidos de maneira inédita no país refere ao cálculo do valor da unidade habita-
para as faixas de renda mais baixas, o Pro- cional, de forma a se enquadrar no perfil finan-
grama ainda reproduz as antigas lógicas das ciado e, ao mesmo tempo, garantir maior taxa

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Tabela 1 – Metas do MCMV e déficit habitacional acumulado


por faixas de renda
MCMV 1
Déficit Metas Déficit Metas % Déficit
Faixas de renda* acumulado do MCMV 1 acumulado** do MCMV1 acumulado
(em %) (em %) (em mil) (em mil) atendido
Faixa 1 91 40 6.550 400 6
Faixa 2 6 40 430 400 93
Faixa 3 3 20 210 200 95
Total 100 100 7.190 1.000 14
MCMV 2
Déficit Metas Déficit Metas % Déficit
Faixas de renda acumulado do MCMV 2 acumulado*** do MCMV2 acumulado
(em %) (em %) (em mil) (em mil) atendido
Faixa 1 72 60 4.698,76 1.440 31
Faixa 2 15 30 941,05 720 77
Faixa 3 13 10 850,19 240 28
Total 100 100 6.490 2.400 37

* As faixas de renda do Programa MCMV não são as mesmas faixas estabelecidas pela metodologia da Fundação João Pinhei-
ro (FJP) para coleta dos dados. Enquanto o MCMV trabalha com a faixa 2 para famílias com rendimento entre 3 e 6 SM, a FJP
faz o cálculo do déficit para famílias com rendimento entre 3 e 5 SM. Optou-se por estabelecer esta relação como proxy, já
que estas são as únicas informações disponíveis. No entanto, as análises precisam considerar esta pequena distorção.
** com base no déficit habitacional 2000 (FJP, 2004).
***com base no déficit habitacional 2010 (FJP, 2013).
Fonte: Elaboração própria. FJP (2004 e 2013) e CEF (2013).

de lucro possível em seus projetos. Nesse con- voltado para as empresas que acessam direta-
texto, apesar do histórico patamar de recursos­ mente os recursos do FAR ou do FGTS,4 moda-
orçamentários destinados a subsídios para lidades com protagonismo do mercado privado
atender a população de mais baixa renda no (Brasil, 2014).
MCMV, os empreendimentos para essa faixa de Nestas modalidades do MCMV destina-
renda são fortemente marcados por uma lógica das a empresas (FAR – faixa 1, FGTS – faixa
de produção do mercado imobiliário privado, o 2 e FGTS – faixa 3), o fluxo de contratação e
que nem sempre dialoga com as necessidades produção desenhado garantem o protagonis-
relacionadas ao direto à moradia. mo direto das empreendedoras. A operaciona-
Apesar de existirem outras modalidades, lização se dá mediante o repasse de recursos
como o Programa Nacional de Habitação Ru- do governo federal para construtoras, que, por
ral (PNHR), Minha Casa Minha Vida Entidades sua vez, constroem os empreendimentos habi-
(MCMV-E), o Sub-50, destinado a municípios tacionais. Mesmo na modalidade faixa 1, que
com menos de 50 mil habitantes e uma mo- conta com expressivos subsídios, a produção se
dalidade para urbanização, analisando-se os dá por oferta privada ao poder público, isto é, a
montantes alocados nos diferentes fundos e as construtora define a cidade onde pretende fa-
unidades contratadas, observa-se que o núcleo zer o empreendimento, o terreno, o projeto e o
central do MCMV, desde o início, foi aquele número de unidades; aprova junto aos órgãos

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Gráfico 1 – Contratações Gráfico 2 – Contratações do MCMV


do MCMV 1 e 2 nas diferentes nas modalidades destinadas
modalidades (%) a empresas e outros (%)

modalidades
empresas
outras
modalidades

Fonte: Brasil, Balanço PAC 2 – 4 anos de execução. Fonte: Brasil, Balanço PAC 2 – 4 anos de execução.
Dez 2014. Dez 2014.

competentes e vende integralmente o que pro- Um dos impactos mais imediatos so-
duzir para a CEF, sem gastos de incorporação bre os programas desenvolvidos no âmbito
imobiliária e comercialização e sem riscos de do Fundo Nacional de Habitação de Interes-
inadimplência dos compradores. se Social­ (FNHIS) diz respeito à eliminação
dos repas­s es de recursos para as ações de
provisão­ha­bitacional para municípios e coo­
A implementação do MCMV, perativas habitacio­nais, o que implicou a re-
o enfraquecimento do SNHIS alização inte­g ral­ da provisão habitacional
nos termos das modalidades previstas pelo
e a desarticulação aos processos MCMV, e o FNHIS não pôde­mais ter progra-
de planejamento urbano mas alternativos para essa modalidade. Vale
e habitacional destacar ainda que, a partir de 2010, priori-
zou-se a alocação de recursos desse fundo
Com esse desenho adotado para o programa, em obras complementares a projetos em an-
fortemente ancorado na promoção das ha- damento financiados com recursos do PAC,
bitações pelo setor privado, o MCMV entrou que inclui o MCMV, o que mostra um caráter
em choque com os princípios do SNHIS que subsidiário do FNHIS nas decisões de política
era pautado pelo papel estratégico do setor habitacional (Cardoso, Aragão, Araújo, 2011;
público e pela descentralização federativa, ig- Relatório de Gestão do Conselho Gestor do
norando em larga medida premissas e deba- FNHIS, 2013).
tes acumu­lados em torno do Plano Nacional Outra importante implicação para o
de Habitação de Interesse Social (PlanHab) FNHIS foi o esvaziamento de recursos desse
(Krause,­Balbim e Lima Neto, 2013; Cardoso, fundo. Entre os anos de 2003 e 2010, rever-
Aragão e Araujo, 2011). tendo definitivamente a estagnação presente

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Tabela 2 – Recursos orçamentários executados do FNHIS,


PAC e PMCMV (2006-2014)
FNHIS PAC Favelas MCMV Total
Ano
Bilhões de R$ % Bilhões de R$ % Bilhões de R$ % Bilhões de R$
2006 1 40 1,52 60 - - 3,52

2007 0,3 13 1,97 87 - - 3,27

2008 0,8 23 2,7 77 - - 4,5

2009 1,01 10 3,88 38 5,25 52 10,62

2010 0,17 2 1,88 22 6,68 77 8,96

2011 0,51 4 2,15 16 10,98 80 13,84

2012 0,13 1 3,2 20 12,55 79 16,09

2013 0,21 1 3,65 19 15,63 80 19,68

2014 0,05 0,2 2,7 14 16,8 86 19,69

Fonte: Elaboração própria. SIGA Brasil - Acompanhamento da execução orçamentária da União, entre 2006 e 2014.

no setor habitacional desde a extinção do BNH que não integram o modelo desenhado para
em 1986, o investimento federal, incluindo os o funcionamento do SNHIS. É importante res-
investimentos com recursos onerosos do SBPE saltar, também, que os recursos­destinados ao
e do FGTS, saltou de R$7,9 bilhões, em 2003, FNHIS não só são menores em termos absolu-
para R$101,5 bilhões em 2010 (Brasil, 2014). tos em relação aos outros fundings­nesse pe-
No PPA de 2012 a 2015, dos 26% dos recursos ríodo, como percentualmente sua participação
do Orçamento Geral da União (OGU) alocados nos recursos destinados à habitação perde
para infraestrutura, 32,6% foram destinados importância, chegando a menos de 1% dos
à habitação, o que equivale ao montante de recursos totais orçamentários no final do pe-
R$389,7 bilhões dedicados ao setor em quatro ríodo estudado.
anos de planejamento orçamentário. Entretan- Com quase a integralidade dos recursos,
to, quando se observam os dados referentes à desenhou-se um programa – o MCMV – que
alocação de recursos, percebe-se claramente acabou se transformando de maneira hege-
que o FNHIS foi desprivilegiado, apresentando mônica no eixo central da política habitacional
um significativo declínio a partir 2010, quando no Brasil, fixando sua atuação apenas na pro-
se iniciam as contratações do MCMV. dução de novas moradias, atendendo plena-
Os recursos crescentes para o setor habi­ mente aos interesses do mercado imobiliário e
tacional são alocados em outros fundings­ a fim da construção civil, mas relegando ao esqueci-
de financiar programas habitacionais – PAC mento outras modalidades de enfrentamento
Favelas e Minha Casa Minha Vida (MCMV) – às diferentes necessidades habitacionais.

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O próprio PAC Favelas,5 que priorizava da disposição do mercado privado em apresen-


a modalidade de urbanização, acabou sendo tar projetos nas cidades onde o negócio é mais
prejudicado em detrimento do MCMV. O PAC atrativo; e como a meta estabelecida de con-
tem um arranjo institucional em que os gover- tratação de unidades era muito alta (3,75 mi-
nos locais são promotores das intervenções, lhões somando as fases 1 e 2 do MCMV), não
tornando o processo mais lento sem propiciar existiu até o fim da segunda fase do Programa
a celeridade no retorno do capital político e fi- espaço para priorizar os municípios que haviam
nanceiro empregado pelo mercado imobiliário. cumprido essas disposições legais. As contrata-
Como afirma Fix (2011), a temporalidade políti- ções obedeceram apenas a disposição de lucro
co-eleitoral do MCMV parece se ajustar melhor do mercado e as análises de viabilidade da CEF.
ao ritmo do capital financeiro – que promete
atropelar resistências de todos os tipos – do
que àquele das lutas urbanas e dos direitos so-
O impacto MCMV
ciais que a urbanização representa.
A desarticulação da estrutura do MCMV
sobre o direito à cidade
aos processos municipais de planejamento ur-
bano e habitacional suscitou o abandono des- No entanto, na literatura sobre o tema ainda
ses processos de planejamento e desenvolvi- resta a dúvida se os municípios que tinham pro-
mento institucional que estavam em curso nas cessos de planejamento estabelecidos tiveram
esferas subnacionais. O governo federal retirou vantagens em relação às contrações de uni-
a capacidade financeira, e consequentemente dades no MCMV. Para verificar a existência da
decisória e de atuação do SNHIS, em detrimen- correlação entre a existência dos instrumentos
to da alocação dos recursos em outro modelo, de planejamento que estavam sendo fomenta-
e, em consequência, os municípios também se dos pelo MCidades e a contratação do MCMV
desmobilizaram no atendimento às regras des- realizou-se uma regressão linear com os dados
se Sistema e direcionaram suas energias para a de contratação disponíveis (Klintowitz,­2015).6
obtenção do maior número possível de unida- Além de verificar a correlação entre instrumen-
des habitacionais por meio do MCMV (Rolnik, tos de planejamento e o número de unidades
Klintowitz e Iacovini, 2014). contratadas no âmbito do MCMV nos municí-
A Lei nº 11.977/2009 que dispõe sobre o pios brasileiros, nessa regressão buscava-se in-
MCMV, define como um dos critérios de prio- ferir o que explica o “sucesso” da contratação
rização dos municípios, além da desoneração do Programa nos diferentes municípios bra-
fiscal e doação de terrenos em áreas consolida- sileiros, já que os dados mostram que alguns
das, a implementação de instrumentos do Esta- municípios extrapolaram o atendimento de
tuto das Cidades. No entanto, essas regras de suas metas, enquanto outros não conseguiram
priorização nunca foram cumpridas. Segundo contratar nem a metade da meta estipulada.
os entrevistados da CEF (Klintowitz, 2015), as Para verificar o sucesso das contratações
contratações do Programa não adotam essas em alguns municípios, coletou-se variáveis que
normativas de priorização porque dependem poderiam explicar maiores contratações de

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unidades­habitacionais no MCMV em alguns (conselho, fundo e plano) com o número de


municípios em detrimento de outros. Para ava- contratações. Da mesma forma, a existência
liar a contração em cada município brasileiro de instrumentos urbanísticos de planejamento
foi utilizado um banco de dados fornecido pela e gestão do solo, não apresentam correlações
CEF. Esse banco de dados continha informações com o sucesso de contratações do MCMV.
sobre todas as unidades habitacionais contra- Apenas as variáveis do bloco de análise
tadas na primeira fase do MCMV que finalizou relacionado às dimensões territoriais demons-
com 1 milhão de unidades em maio de 2011. traram correlações. Essas variáveis apresenta-
Como variável dependente elaborou-se um ram uma correlação positiva entre as tipologias
“índice de sucesso de contratações” que foi de cidades identificadas como “periferia dos
calcula­d o a partir da divisão do número de polos regionais” e “grandes cidades isoladas”
unidades contratadas pela meta estabelecida e o sucesso de contratação de unidades do
pelo governo federal – em número de unida- MCMV1 na Faixa 1, demonstrando que nesses
des. Como as metas de contratação do MCMV tipos de cidades se realizam percentualmente
são estipuladas a partir do déficit habitacional, mais contratações do MCMV em relação a seu
essa variável relaciona as necessidades habita- déficit habitacional. Uma explicação para es-
cionais representadas pelos déficits dos muni- sa correlação está relacionada ao mercado de
cípios com o número de unidades contratadas. terras desses municípios. Essas tipologias de ci-
Inicialmente constatou-se que as contra- dades apresentam menor dinâmica imobiliária,
tações da modalidade faixa 1 do MCMV não com menor disputa pela terra, em relação a ou-
apresentavam relação direta com os números tras tipologias que não mostraram correlações
do déficit habitacional de cada município. Exis- com o sucesso de contratação das unidades do
te uma grande diversidade de situações nas MCMV. A baixa dinâmica de terras poderia en-
relações entre o número de unidades contrata- tão ser uma explicação para o maior número
das no âmbito do MCMV1 e o déficit de cada de contratações, pois, os promotores privados
município. Uma parte significativa de municí- do MCMV escolhem com total liberdade as
pios acima de 20 mil habitantes (29%) não tem cidades onde querem produzir empreendimen-
nenhuma unidade contratada apesar de terem tos e, segundo entrevistas (Klintowitz, 2015), o
metas estabelecidas pelo Governo Federal; preço dos terrenos tem se apresentado como
40% dos municípios tiveram um range de uni- uma das principais variáveis para esta escolha.
dades contratadas entre 10 e 50% em relação Em relação ao porte populacional, obser-
ao seu déficit, enquanto 6% dos municípios va-se também uma correlação positiva entre o
têm mais unidades contratadas do que o nú- sucesso de contratação e as faixas populacio-
mero do déficit habitacional calculado. nais entre 50 mil e 500 mil habitantes, demons-
Os resultados em relação ao “índice de trando que o programa tem dificuldades em
sucesso”, por sua vez, também indicaram que “rodar” nas cidades maiores, onde novamente
não existe nenhuma correlação entre a adesão o mercado de solo é mais dinâmico e a terra
dos municípios ao SNHIS, sua regularidade e para produção de habitação de interesse social
implementação dos itens exigidos pelo Sistema­ torna-se mais escassa e cara.

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Danielle Klintowitz

O resultado demonstrou, então, que exis- Como as gerências regionais da CEF


tem fortes indícios de que a variável explicativa (Gidur)­têm metas de contratação, tem-se as-
mais forte para o sucesso de contratação das sistido, ainda, distorções entre as necessida-
unidades do MCMV é realmente o preço da des habitacionais existentes nos municípios
terra. As variáveis relacionadas à instituciona- e a contratação de unidades residenciais no
lização do setor habitacional, que teve grande âmbito do MCVM orquestradas pela própria
fomento nos primeiros anos do MCidades, as- CEF e seus gerentes que têm usado diferen-
sim como o investimento na implementação de tes artifícios para alcançar as metas exigidas
instrumentos de planejamento e gestão do solo (Klintowitz,­2015). Com a anuência da CEF e
urbano do Estatuto da Cidade, não tiveram sig- do MCidades, os municípios menores, onde o
nificância na contratação desse programa. preço da terra urbanizada é menor, estão con-
Fica evidente que o modelo implementa- seguindo obter mais unidades do MCMV.
do pelo MCMV dialoga com as lógicas do mer- Em consequência desses fatores, apesar
cado imobiliário, mas não com as lógicas da de as capitais dos estados brasileiros concen-
política habitacional defendida pela plataforma trarem 37,5% do déficit habitacional, o de-
da reforma urbana e pelo próprio MCidades em sempenho proporcional apresentado nesses
seus primeiros anos, já que a definição de on- municípios para os imóveis da faixa 1 na fase
de haverá maior número de unidades são de- 1 do Programa é muito reduzido (24%) em
terminadas pelas facilidades e perspectivas de comparação com os outros recortes territo-
maiores ganhos dos produtores privados e não riais (76%).
pela existência de necessidades habitacionais, Confirmando os dados obtidos na re-
planejamento e priorizações da gestão pública. gressão linear apresentada, Lima Neto, Krause­

Tabela 3 – Contratações para municípios acima de 50 mil habitantes


(MCMV 1, faixa 1)

Unidades Unidades
contratadas contratadas Desempenho
Recorte Déficit urbano Total unidades
– famílias até – famílias até contratação
territorial – Faixa 1 contratadas
R$1.600 (OGU) R$1.600 (FGTS) sobre déficit
(área urbana) (área urbana)
> 100 mil 826.963 272.363 56.518 328.881 33 40
habitantes

50 a 100 mil 504.594 159.278 21.866 181.144 18 36


habitantes

Capitais estaduais 1.238.247 204.221 32.364 236.585 24 19

RM de capitais
estaduais (sem a 725.090 179.459 78.268 257.727 26 36
capital)

Fonte: Ministério das Cidades (2014).

174 Cad. Metrop., São Paulo, v. 18, n. 35, pp. 165-190, abr 2016
Por que o Programa Minha Casa Minha Vida só poderia acontecer...

e Furtado (2015), em estudo que busca­ e sua localização, os autores ainda afirmam
desvendar­ as correlações entre a produção que a ênfase do MCMV1 e 2 foi de produção
dos empreendimentos do MCMV na faixa 1 e de casas, e o quesito de localização e inserção
o déficit habitacional, na dimensão intrame- na cidade resultado das forças e interesses co-
tropolitana, revelaram que a maior produção nhecidos e presentes na ordenação típica do
habitacional em municípios nas metrópoles es- urbano e não fez parte da formulação progra-
tudadas se dá nos municípios mais periféricos mática do MCMV.
e com menor participação na atividade econô- A identificação das necessidades habi-
mica metropolitana. Os autores demonstram, tacionais representada exclusivamente pelo
ainda, que a média da distância dos empreen- déficit habitacional, incorporado ao modelo
dimentos ao centro de cada RM aumentou no de política habitacional produzido pelo MCMV,
MCMV2, o que nos permite supor que o efeito traz resultados muito diversos dos sentidos do
de valorização imobiliária, decorrida do próprio “direito à cidade” defendidos pela plataforma
MCMV1, já apresenta impactos para a própria da reforma urbana, como se observa na série
produção dos novos empreendimentos do Pro- de estudos de caso que tem sido realizados a
grama. A partir de seus estudos sobre as corre- respeito da implementação do MCMV nas cida-
lações entre a produção dos empreendimentos­ des brasileiras.

Tabela 4 – Avaliação dos Moradores do MCMV 1, faixa 1,


sobre o atendimento por serviços na moradia atual,
em comparação com à moradia anterior (em %)

Características avaliadas Melhorou Piorou Ficou igual Não respondeu

Rede de esgoto 49,7 8,4 41,5 0,4


Pavimentação 47,4 15,2 36,5 1,0
Coleta de lixo 40,2 11,3 47,8 0,6
Acesso Iluminação pública 38,0 19,1 42,2 0,8
à infraestrutura
básica Fornecimento de energia elétrica 35,4 7,2 57,0 0,4
Fornecimento de água encanada 32,8 20,0 46,9 0,3
Acesso aos veículos 34,8 23,2 39,5 2,5
Calçadas 36,7 28,5 34,0 0,9
Acesso a comércio 21,3 61,2 17,1 0,5
Acesso a equipamentos e serviços públicos 20,1 44,0 33,5 2,4
Policiamento 26,8 39,9 31,5 1,8
Acesso
Transporte público 30,2 38,7 30,0 1,1
à cidade
Acesso ao trabalho 20,5 44,7 29,4 5,4
Acesso à escola 26,9 35,9 27,7 9,5
Correios 22,3 33,7 42,9 1,2

Fonte: Elaboração própria. Pesquisa Rede Moradia Cidade (2014). Chamada MCTI/CNPq/MCIDADES n° 11/2012.

Cad. Metrop., São Paulo, v. 18, n. 35, pp. 165-190, abr 2016 175
Danielle Klintowitz

A pesquisa realizada pela Rede Moradia duas (Estado e setor empresarial) como nos go-
Cidade, 2014,7 por exemplo, revelou que a loca- vernos anteriores.
lização das novas moradias produzidas no âm- As três pontas, no entanto, não são con-
bito do MCMV tem importantes impactos nos duzidas na busca de uma agenda comum. Para
beneficiários em relação ao acesso a serviços e não contrariar nenhum dos interesses, o gover-
equipamentos públicos. Apesar de no Estado­de no opta por uma coordenação de interesses
São Paulo 43% das famílias pesquisadas terem com a constituição de duas agendas paralelas,
vindo de assentamentos precários e 56% de em que cada um dos interesses se vê contem-
áreas de risco, enquanto o acesso aos serviços plado (Klintowitz, 2015). A habitação passa a
básicos de infraestrutura melhorou em relação ter duas agendas paralelas para que convivam
à moradia anterior, as características classifi- no governo em uma estratégia de layering
cadas como de acesso à cidade (acesso ao co- (Mahoney, Thelen, 2010), que institui camadas
mércio, ao trabalho, a equipamentos e serviços incrementais, tanto sobre os aparatos institu-
públicos; policiamento, transporte público, à es- cionais herdados dos governos anteriores como
cola e aos correios) apresentaram significativa em um processo de combinação entre essas
piora em relação à moradia anterior. duas agendas em disputa.
A persistência do SNHIS ao longo do
tempo como o modelo de política habitacional
ideal­que se busca alcançar e a realpolitik im-
A tríplice aliança plementada pelo MCMV que utiliza regras que
na coordenação de interesses em nada convergem para o modelo idealizado
em torno do MCMV pelo SNHIS, sem contudo eliminá-lo definiti-
vamente, podem ser explicadas pela ideia de
No Governo Lula, a necessidade de ampliação decoupling, trazida por Meyer e Rowan (1977),
das bases e alianças inaugura uma nova es- na qual há um respeito “ritualístico” às regras
trutura de relacionamento do governo com a originárias, isto é, apesar de não serem as re-
sociedade. Enquanto em governos anteriores gras que comandam as instituições, esses “mi-
o relacionamento Estado-sociedade no setor tos geradores” permanecem como uma espécie
habitacional esteve estritamente vinculado às de direção moral da política. Assim, o modelo
articulações do Estado com as coalizões do se- proposto pela plataforma da reforma urbana
tor produtivo, no governo Lula, desde sua ori- permanece como o modelo utópico – SNHIS –
gem, os movimentos sociais ligados à moradia que parece dar a “direção moral” à política,
são trazidos à arena de negociação sem que, enquanto o modelo que favorece ao setor em-
ao mesmo tempo, o Estado se furte a estruturar presarial – MCMV – é aplicado na prática como
uma relação estreita com o setor empresarial. a “política real”, inviabilizando a possibilidade
Cria-se o que se pode chamar de uma triple do SNHIS concretizar-se. Oliveira (2010) identi-
aliança, ou uma matriz de relacionamento que fica esse modelo descrito para a política habi-
passa a ter três pontas (Estado, setor empresa- tacional, como a prática geral desenvolvida nos
rial e movimentos sociais), e não mais apenas governos petistas, denominando esse processo

176 Cad. Metrop., São Paulo, v. 18, n. 35, pp. 165-190, abr 2016
Por que o Programa Minha Casa Minha Vida só poderia acontecer...

de “Hegemonia às Avessas”. Segundo o autor, governar em que se buscou agradar todos os


nesse governo constrói-se uma áurea na qual setores e classes de forma a minimizar os con-
parece que os atores e suas coalizões histori- flitos, radicalizações e mobilizações contrárias
camente dominados passam a comandar a po- ao governo.
lítica, pois fornecem a “direção moral” e estão
No lulismo, pagam-se altos juros aos
à testa de organizações do Estado e dispõem, donos do dinheiro e ao mesmo tempo
ainda, de poderosas bancadas no Congresso aumenta-se a transferência de renda para
Nacional; no entanto, o conjunto de aparências os mais pobres. (...) Enquanto os meios de
esconde uma nova dominação na qual “não pagamento crescem, cada fração de clas-
se pode cultivar o seu lulismo de estima-
são mais os dominados que consentem em sua
ção. (...) Por isso o presidente pode pro-
própria exploração; são os dominantes – os ca- nunciar, para cada uma delas, um discurso
pitalistas e o capital, explicite-se – que se con- aceitável, usando conteúdos diferentes
sentem em ser politicamente conduzidos pelos em lugares distintos e, sobretudo, toman-
dominados, com a condição de que a ‘direção do cuidado para que os conflitos não im-
pliquem em radicalização e mobilização.
moral’ não questione a forma de exploração
(Singer, 2012, p. 202)
capitalista” (Oliveira, 2010, p. 27). A defesa do
setor produtivo da indispensável resolução do Assim, enquanto o setor produtivo tem
déficit habitacional explica-se muito bem sob importantes ganhos materiais com o MCMV
essa abordagem. em detrimento da redução do direito à cidade
Com a dupla agenda instalada, por um de milhões de famílias de baixa renda, a po-
lado cria-se uma ilusão para os atores ligados lítica habitacional preconizada pelos atores
à plataforma da reforma urbana de que um da plataforma da reforma urbana continua
dia se construirá um modelo de planejamento persistindo no imaginário e em poucos inves-
e gestão habitacional descentralizado com au- timentos institucionais da Secretaria Nacional
tonomia dos governos locais e de provisão por de Habitação, como parte dos ganhos dos ato-
meio de autogestão e, por outro, atende-se aos res ligados à plataforma da reforma urbana. As
interesses do segmento produtivo que deman- atas das reuniões do ConCidades mostram esse
da estabilidade de ganhos. As regras e progra- processo de layering (Mahoney e Thelen, 2010)
mas vão se somando e se sobrepondo de forma com clareza. Enquanto o MCMV vai tomando
a agradar todos, sem excluir nenhum interesse a primazia da política habitacional, na mesma
do processo. reunião do Conselho se debatem medidas para
As duas agendas – da reforma urbana e melhorar esse programa e discutem-se as preo­
do setor produtivo –, que caminham paralela- cupações sobre o conteúdo dos Planos Locais
mente como se ambas fossem prioritárias para de Habitação (PLHIS) como se esses ainda fos-
o governo, foram claramente uma das base de sem relevantes na condução da política habita-
sustentação do “lulismo”. Singer (2012) deno- cional no plano local (Klintowitz, 2015).
mina “lulismo” a estrutura de arbitragem para Observa-se, portanto, que o próprio
presidir um governo de coalizão desenvolvida layering ­ criado com essa dupla agenda é
no Governo Lula. Estruturou-se um modo de um importante artifício de manutenção da

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Danielle Klintowitz

arbitragem­ que busca contentar todos os planos sem mobilizações contrárias da socieda-
atores.­ O layering torna-se mais eficiente, pois de, como preconizava o lulismo (Singer, 2012).
as novas sistemáticas esvaziam as anteriores, Por sua vez, os movimentos de moradia,
trazendo amplos benefícios tanto ao Estado vislumbrando a possibilidade de vinculação de
como­ao mercado privado sem, contudo, tra- grande volume de recursos para a política ha-
zer o ônus político de desmontar o ideário – o bitacional, também quiseram estabelecer uma
SNHIS – construído a partir da luta de um im- aliança com os empresários do setor produtivo
portante movimento social aliado do gover- em torno da PEC da Moradia Digna que pre-
no – o FNRU. Assim, sem que se desmonte cedeu a instalação do MCMV. E demonstrando
os “mitos geradores” (Meyer e Rowan, 1977) que a política tem a capacidade de reconfi-
constituídos pelas institucionalidades conquis- gurar os atores e as coalizões, principalmente
tadas pelos ativistas da reforma urbana, volta- quando envolvem importantes recursos ca-
-se a praticar políticas urbanas e habitacionais pazes de reconfigurar o curso da política pú-
semelhantes às realizadas em momentos an- blica como um todo (Couto e Abrucio, 2003;
teriores da história brasileira, que favorecem Sabatier e Weible,­ 2007; March, 2010), os
outros interesses, sem ajudar, contudo, na im- movimentos convictos de sua posição no jogo
plementação da reforma urbana. político, compuseram essa aliança apesar dos
Além da manutenção simbólica do conflitos ocasionados com os aliados históri-
SNHIS, a medida mais importante medida cos, companheiros de FNRU.­
para a sustentação da hegemonia dessa polí- O governo, por sua vez, ao mesmo tempo
tica refere-se às alianças estabelecidas e ga- que reiterava os laços com os movimentos de
nhos obtidos pelos movimentos de moradia moradia nas interlocuções no ConCidades, mas
com o MCMV. principalmente no atendimento às demandas
Em um contexto de arbitragem, os em- nos processos de interlocução estabelecidos
presários do setor produtivo da construção­ nos gabinetes, estabelecia novos laços com o
civil e mercado imobiliário que já tinham empresariado do setor, tanto nas arenas públi-
interlocução­estabelecida com o governo, ao cas criadas, como principalmente nos espaços
entender que o governo petista era conforma- de gabinetes.
do por um ambiente de coordenação de inte- Assim, o ConCidades se constitui, então,
resses em que seriam necessárias a convivência como espaço de encontro e articulação entre
entre as diferentes coalizões, e, se possível, a os vários atores. Mas as negociações eram fei-
construção de alianças entre elas, usaram o tas em outras arenas que eram não públicas,
ConCidades, antes mesmo da ideia da formu- dando mais liberdade e autonomia nas nego-
lação do MCMV, para articular sua interlocução ciações aos atores envolvidos.
com os movimentos de moradia em busca da No entanto, mesmo com a ampla coa-
8
criação de laços e alianças, como parte da es- lizão formada em torno da PEC da Moradia
tratégia para construir uma ampla coalizão em Digna, sua negociação não foi bem-sucedida;
favor das demandas do setor produtivo, de mo- já o núcleo estratégico do governo (Casa Ci-
do que o governo pudesse implementar seus vil, Ministério do Planejamento e Ministério da

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Por que o Programa Minha Casa Minha Vida só poderia acontecer...

Fazenda) era contra sua aprovação pela cren- com o Governo­anteriormente­enxergavam no


ça de que a vinculação do orçamento engessa Programa a concretização de seus interesses
as possibilidades de ação política do governo. (Klintowitz, 2015).
Contudo, em 2008, com a crise internacional
adotou-se na prática, no MCMV, o cenário de
investimento proposto pela PEC da Moradia
Digna, alcançando um investimento aproxima-
O MCMV e os movimentos
do de 2% do Orçamento Geral da União (OGU)
de moradia
em subsídios habitacionais.
Com os objetivos alcançados, os laços Contudo, para os movimentos sociais de mora-
efêmeros entre os empresários da construção dia, mesmo defendendo o programa adiante da
civil e movimentos de moradia se afrouxaram plenária do ConCidades, o percurso do projeto
(Tarrow, 2009) e cada coalizão passa a cuidar da PEC da Moradia Digna ao Programa MCMV
de seu quinhão. Mesmo que de certa forma não foi tão direta quanto para o setor produ-
uma congregação de interesses em torno da tivo. Assim como o projeto da PEC, que não
manutenção do MCMV permaneça, a atua- havia incorporado a proposta da autogestão,
ção destas coalizões demonstra que a alian- ao ser anunciado o MCMV destinava-se ape-
ça entre elas se afroxou pela busca de seus nas para a promoção da moradia por empresas
próprios interesses. Como descrito por um privadas de construção civil. Um fato simbólico
empresário do setor da construção civil: “O que demonstra que inicialmente os movimen-
sucesso do programa Minha Casa Minha Vida tos de moradia não estavam contemplados
é o fracasso da articulação política do Mora- como atores que fariam parte dos beneficia-
dia Digna” (Klintowitz, 2015). No entanto, se dos com o MCMV foi a falta de representação
por um lado empresários e movimentos pas- desses movimentos na mesa de lançamento do
sam a não ter mais as mesmas sinergias do Programa em 25 de março de 2009. Os movi-
momento anterior, por outro, as alianças des- mentos precisaram reivindicar sua participação
sas coalizões com o governo se fortaleceram para serem chamados para o cerimonial.
enquanto o MCMV vigora com extraordinário Contudo, acreditando no apoio do Pre-
fonte de benefícios.­ sidente da República aos seus apelos, os mo-
Essa aliança se manifesta no ConCida- vimentos de moradia solicitaram audiências
des no qual apenas os conselheiros dos seg- especiais com o Presidente Lula e com a Mi-
mentos acadêmicos e profissionais, ONGs nistra Chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff,
e poder público municipal e estadual mani- para requerer sua parte no programa. Essas
festavam-se com críticas a respeito do des- reuniões privadas resultaram positivas e ape-
colamento do MCMV com o SNHIS e sobre a sar da estrutura do Programa já estar definida
necessidade de discussão mais profunda do nesse momento, foi criada uma nova modali-
MCMV nesse conselho, enquanto os repre- dade especial – o MCMV Entidades – voltada
sentantes de movimentos de moradia e do especificamente para promoção de moradia
setor empresarial que já haviam negociado por entidades sem fins lucrativos, incluindo as

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associações e cooperativas habitacionais au- próprios atores que passaram a atuar como
togestionárias. Kingdon (2011) argumenta que cooperantes do governo, ao invés de críticos
um bom empreendedor de política pública é e formuladores (Gohn, 2010). Contudo, se por
capaz de incorporar uma proposta para uma um lado os movimentos de moradia continua­
mudança no fluxo na política com a solução ram a não participar efetivamente dos pro-
de um problema existente que também precisa cessos decisórios da política habitacional e as
ser resolvido, articulando assim os problemas, arenas participativas foram desconsideradas,
a política pública e política. Assim, Lula, como por outro, fica claro que esse governo não
bom empreendedor de política, aproveitou a deixou mais de levá-los em consideração na
oportunidade trazida pelo MCMV para resolver lista de atores contemplados com a distribui-
também o problema dos movimentos de mo- ção dos benefícios dos investimentos na área,
radia, e ganhar a sua chancela para o MCMV. mesmo que de forma assimétrica se compara-
Utilizando-se da mesma lógica de arti- dos aos benefícios obtidos por outros atores.
culação do setor produtivo que conseguiu es- Garantiram-se, assim, recursos para financiar a
truturar o MCMV em audiências privadas nos produção social da moradia realizada de forma
ministérios, sem passar pelos foros públicos organizada, pelos futuros beneficiários e apoio
em que estavam inseridos, os movimentos de dos movimentos de moradia ao MCMV (Ferrei-
moradia também negociaram sua modalidade ra, 2014; Rodrigues, 2013).
com o governo em audiências privadas sem Embora o aporte de recursos na moda-
passar por arenas públicas. Apesar disso, parte lidade MCMV-E seja muito reduzido diante do
das lideranças, conforme comprovam as atas montante global do programa (apenas 2%)
das reuniões do ConCidades que discutiram o (Rodrigues, 2013), não se pode negar que sua
9
MCMV, parecia não se preocupar muito com existência foi uma vitória para essa coalizão e
as arenas em que se davam a decisão sobre a que está diretamente relacionada ao fato de
política, já que tal programa traria importante que tais movimentos passam a ter um novo
benefícios materiais para os movimentos de status de player no âmbito político (Rolnik,
moradia. Dessa forma, os próprios movimen- Klintowitz e Iacovini, 2014). Esse novo status
tos sociais de moradia, defensores históricos político trouxe o importante reconhecimento
dos espaços participativos de decisão sobre as aos movimentos sociais, e não apenas ao se-
políticas urbanas, retiram a negociação da are- tor privado da construção civil, como parceiros
na pública para a arena privada, conformando- do governo no processo de implementação da
-se em não fazer parte do processo decisório política de habitação de interesse social (Ta-
das macroestruturas da política habitacional, tagiba e Texeira, 2014), e, ao mesmo tempo,
desde que sejam atendidos por meio de nego- os reafirmou como apoiadores do governo, e
ciação nos gabinetes aos quais conquistaram principalmente, do MCMV. Um indicador fun-
o acesso. damental da importância dada pelo governo à
A estratégia de retirada da negociação concertação com os movimentos de moradia
das arenas públicas para pactuações indivi- foi a criação de uma assessoria da Presidência
duais com cada um dos atores enfraquece os da Caixa, especialmente para fazer o MCMV-E

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Por que o Programa Minha Casa Minha Vida só poderia acontecer...

“rodar”, e que buscava informar para a má- autogestionária,­foi significativa a participa-


quina, nas palavras do próprio presidente à ção dos movimentos na formação das listas
época da CEF – Jorge Hereda, que as Entida- de beneficiários das unidades produzidas pela
des e sua modalidade MCMV-E eram prioritá- promoção privada no âmbito do MCMV pa-
rias para o governo. ra a faixa 1 em diferentes municípios onde o
O MCMV-E passou a ser a principal for- poder público local, responsável pela indicação
ma pela qual os movimentos sociais de mora- da demanda, têm reservado um percentual
dia participam da implementação da política das unidades produzidas para o atendimento
pública (Ferreira, 2014). Em uma pesquisa (Ta- de famílias indicadas por movimentos sociais.
tagiba e Texeira, 2014), realizada no âmbito Em muitos municípios do Brasil, a indicação de
da avalição do MCMV-E, todas as lideranças um percentual de unidades pelos movimentos
entrevistadas afirmaram de forma categórica de moradia passou a se constituir como uma
o interesse em continuar atuando no MCMV-E, política municipal, ampliando muito os ganhos
apesar de demonstrarem muita clareza sobre dos movimentos de moradia com o MCMV. Na
os problemas e limites do programa. cidade de São Paulo, por exemplo, o Conselho
Conquistado em uma lógica estrutural de Habitação decidiu como critério para prio-
privatista que já estava assentada e que se des- rização da demanda que 25% das unidades
tinava ao protagonismo da promoção privada serão destinadas a benificiários indicados pelos
da moradia, o MCMV-E surgiu como uma espé- movimentos de moradia.10
cie de armadilha perversa. As entidades que de- É importante destacar que os ganhos de
sejam produzir com recursos do MCMV-E estão unidades com o MCMV, obtidos pelos movi-
aprisionadas às lógicas do mercado imobiliário mentos, são importantes para que as lideran-
privado e precisam disputar terrenos com as ças possam atender às suas bases, compostas
grandes construtoras do país. Apesar de parte principalmente por famílias em busca de uma
de os movimentos de moradia que defendem moradia, uma vez que nisso consistirá seu po-
historicamente a produção por autogestão, es- der de convocação junto a novos integrantes
pecialmente a UNMP, estarem tentando utilizar do movimento. Nessa conjuntura, a distribuição
os recursos do MCMV-E para concretizar pro- de serviços e benefícios sociais passa cada vez
jetos com esse viés, a inserção da modalidade mais a ocupar o lugar dos direitos e da cida-
para os movimentos de moradia em um arca- dania, constrangendo não somente a demanda
bouço institucional que já estava estruturado por direitos, como as próprias arenas públicas
para a lógica da produção privada, inviabiliza construídas para esse fim (Gohn, 2010), já que
de muitas maneiras a boa execução do MCMV- essa distribuição de benefícios depende apenas
-E (Rodrigues e Mineiro, 2012). da boa vontade e da competência de articula-
Nesse esquema que foi criado, mostrou- ção com os setores envolvidos. Nesse contexto,
-se mais lucrativo para muitas entidades indi- apesar de os ganhos serem reais, não potencia-
carem beneficiários do que produzir a mora- lizam mudanças estruturais.
dia. Assim, além do ganho de uma pequena Em governos de esquerda os movimen-
parte dos recursos do MCMV para a produção tos sociais tendem a valorizar a maior oferta

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Danielle Klintowitz

de participação estatal e a disputar nessas ins- conflito implícito dos cálculos de trade off en-
tâncias seus projetos e interesses. Contudo, ao tre as mudanças estruturais e o atendimento
mesmo tempo, tendem também a orientar sua imediato às bases.
ação por uma disposição menos conflituosa e
uma postura de maior conciliação, evitando a
pressão sobre os governos e diminuindo o uso
do protesto como forma de negociação, seja
A implicações do MCMV
para garantir suas demandas, seja para garan-
para o FNRU
tir a governabilidade a partir de uma agenda
de esquerda (Dagnino e Tatagiba, 2010). Nesse As diferentes naturezas dos segmentos que
cenário, a identidade desses movimentos passa compõem o FNRU sempre ocasionarma ten-
a se definir muito mais por sua relação com o sões internas a essa coalizão. No contexto do
Estado ou com os partidos do que a partir de MCMV, os movimentos de moradia defenderam
sua localização societária (Gohn, 2010) com a existência do MCMV, mesmo que com restri-
resultados perversos no que se refere à ques- ções a algumas de suas normativas, e não qui-
tão da autonomia. Ao mesmo tempo, ao serem seram cobrar do Governo mudanças internas
atendido dessa forma, de alguma maneira es- ao programa pelos canais institucionais ou em
tão dando uma chancela de qualidade da polí- mobilizações públicas muito conflituosas, ao
tica, como no caso do Programa MCMV. mesmo tempo, os outros segmentos constituin-
É importante considerar que os movi- tes do FNRU quiseram fazer críticas mais con-
mentos de moradia são um tipo peculiar de tundentes à estrutura do programa e promover
movimento social. Por um lado, lutam pela processos de pressão e enfrentamento público
mudança das estruturas da sociedade, sendo (Klintowitz, 2015).
justamente essa característica que os aliou ao A falta de consenso interno no FNRU fez
Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU) na com que essa articulação tivesse um posicio-
luta pelo direito à cidade. Por outro lado, têm namento mais discreto em relação ao MCMV.
uma base a ser atendida com bens materiais Essa contradição, ao mesmo tempo, favoreceu
concretos – casas –, sendo justamente o que o Governo que não teve que enfrentar essa
os levou a estabelecer alianças com os empre- oposição, no entanto, fragmentou e enfraque-
sários do setor produtivo. Essa dupla caracte- ceu a coalizão da reforma urbana que não
rística implica, muitas vezes, escolhas prag- conseguiu resolver suas discrepâncias internas.
máticas que favorecem alianças que geram Enquanto esse afastamento ideológico entre os
ganhos imediatos, mas que podem, ao mesmo segmentos não pareceu afetar os movimentos
tempo, implicar o desvio do caminho que leva- de moradia, essa circunstância teve signifi-
rá à estagnação das mudanças estruturais que cativa importância para os outros segmentos
defendem. Essas características também os que, por não terem numerosas bases como os
diferencia de outros segmentos que compõem movimentos, ficam enfraquecidos como atores
o FNRU – ONGS, setores profissionais e aca- com poder de pressão, mobilização e negocia-
dêmicos – que não estão submergidos pelo o ção junto ao Governo. Os movimentos, por sua

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vez, usaram­seus canais diretos de articulação também, uma parcela importante do eleitora-
para negociar suas demandas particulares, do que vive em assentamentos irregulares no
ligadas aos programas, mas não para bus- país. Assim, de forma surpreendente, por não
car articulações­mais estruturais em torno da dialogar em nada com o MCMV, a mesma lei
plataforma da reforma urbana, o que também que o instituiu foi também responsável por es-
fragilizou o FNRU como coalizão e em sua ca- tabelecer uma normatização para a regulariza-
pacidade de advocacy.­ ção fundiária de assentamentos localizados em
Apesar de diminuir os canais de articula- áreas urbanas de interesse social, que há muito
ção direta e o empenho em busca do apoio ao se tentava, sem sucesso, aprovar no âmbito do
governo dos segmentos de ONGs e acadêmi- Congresso Nacional.
cos ligados ao FNRU, o Governo não os alijou
totalmente do processo de construção da no-
va política habitacional. Ao elaborar a Medida
Provisória (MP 459) que instituiria o MCMV, o
A coordenação federativa
presidente Lula concedeu aos defensores da
do MCMV
plataforma da reforma urbana um capítulo
inteiro sobre a regularização fundiária, sendo Paralelamente, em um governo que tinha um
responsável por levar à concretização de uma projeto de manutenção de poder relacionado à
matéria de suma importância para a questão articulação federativa, não se poderia desenhar
fundiária no Brasil, e que estava em tramitação uma política de habitação que não garantisse
há muitos anos no Congresso Nacional sem si- ganhos para os municípios e para seus pre-
nais de que teria um desfecho rápido. feitos. Sob o pressuposto de que a promoção
O capítulo sobre regularização fundiária habitacional pelos entes locais impedia que
da MP 459/2009 teve sua redação totalmente os programas “rodassem” no ritmo desejado
baseada em um texto que já havia sido pro- (Loureiro, Macário e Guerra, 2013; Klintowitz,
duzido na Câmara dos Deputados, no âmbito 2015), mas com o intuito de que os governos
do processo que discute, desde o ano 2000, a locais aderissem à nova política, o modelo do
futura Lei de Responsabilidade Territorial Urba- MCMV foi construído delegando aos municí-
na (LRTU) (PL 3 057/2000). O texto da MP foi pios basicamente o papel de organização da
retirado do substitutivo produzido pelo último demanda (por meio de cadastros encaminha-
relator, o Deputado Renato Amary (PMDB-SP) e dos à CEF para a seleção dos beneficiários) e,
que estava pronto para a votação em plenário, de modo facultativo, à criação de condições
mas que enfrentava muita oposição. O proces- para facilitar a produção, mediante a flexibili-
so já havia passado por três relatores sem su- zação da legislação urbanística e edilícia dos
cesso (Silva e Araújo, 2013). municípios e/ou da doação de terrenos. Nesse
Com esse ato, Lula vislumbrou a pos- modelo a necessidade de institucionalidade da
sibilidade de contentar – com um programa gestão é muito pequena, demandando ape-
(MCMV) que a princípio os descontentaria –, nas a existência de um cadastro, sendo esse
os outros atores ligados à reforma urbana, e, justamente o instrumento mais presente nos

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Danielle Klintowitz

municípios brasileiros. Em 2009, ano de início tempo perceberam que os benefícios recebidos
do PMCMV, 81% dos municípios já o tinham seriam tantos ou maiores do que se fossem
(Arretche, 2012). os promotores dos empreendimentos, com a
Indicar a demanda significa, por um lado, vantagem de que não precisariam despender
um baixo investimento do ponto de vista finan- muitos esforços para isso. Diante desse quadro,
ceiro e institucional e, por outro, um grande é possível afirmar que políticos locais se bene-
recurso no sentido de angariar possíveis votos ficiam do programa, o que ajuda a entender
em pleitos municipais. A influência dos benefí- por que a maioria dos municípios concentrou
cios eleitorais proporcionados pela inaugura- seus esforços unicamente na viabilização de
ção de novos empreendimentos habitacionais, empreen­dimentos do MCMV em seu território,
produtos cujo significado vai além das conside- deixando de lado seus processos de planeja-
rações sobre o seu impacto econômico e social, mento ou criação de outras alternativas para
tem um importante potencial para gerar capital solução das necessidades habitacionais (Rol-
político. Os empreendimentos habitacionais nik, Klintowitz e Iacovini, 2014; Polis, 2014).
construídos no âmbito do MCMV são, assim, Trata-se de uma postura pragmática, que capta
“fatos políticos” de dimensão local, regional e o máximo de benefícios políticos com um míni-
nacional, conferindo legitimidade ao exercício mo de esforço institucional e financeiro. Nesse
do poder por sua elevada visibilidade no con- contexto, em muitos municípios, como é o caso
junto das realizações dos governos (Camargos, de São Paulo, foi retirado do orçamento munici-
1993). Cada unidade produzida vale para duas­ pal o recurso que antes se destinava à pasta da
contagens, ou seja, o capital político gerado habitação sob o argumento de que a política
serve tanto para o município quanto para o go- habitacional já tinha o recurso proveniente do
verno federal (Klintowitz e Iacovini, 2014; Rol- MCMV (Rolnik, Klintowitz e Iacovini, 2014).
nik, Klintowitz e Iacovini, 2014). Com a estrutura criada inicialmente
Vendo a possibilidade de ganhos de capi- para o MCMV, os únicos prejudicados seriam
tal político com o MCMV, muitos governos es- os municípios menores, que na MP 459 não
taduais também estão querendo “participar da estavam contemplados. Originalmente, não
festa”. Esses governos têm adicionado recursos parecia fazer sentido expandir a atuação para
aos disponibilizados pelo governo federal para esses municípios, já que não eram municípios
que se consiga implementar empreendimentos interessantes ao setor produtivo, principal-
nas capitais onde a terra é mais cara e, com is- mente na faixa 1, com empreendimentos de
so, têm aproveitado também do capital político grande escala para reduzir custos e ampliar os
gerado pelos empreendimentos produzidos. As- lucros (Shimbo, 2010). No entanto, ao serem
sim, um mesmo programa tem unido diferentes comunicados dos novos rumos da política ha-
esferas de governo, de diferentes partidos, em bitacional, esses municípios menores reivindi-
suas inaugurações. caram e negociaram no Congresso Nacional a
Se, inicialmente, os governos locais se in- inclusão­de uma modalidade para municípios
comodaram com o formato do Programa que com menos de 50 mil habitantes. Criou-se,
tirava deles o protagonismo, com o passar­do então, uma nova modalidade para o MCMV

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SUB 50 – a oferta pública – conhecida como geral de formulação do MCMV, foram sendo
“SUB-50”. Junto com o MCMV-E e o MCMV- criadas concertações no próprio programa para
-Rural, o SUB-50 representa as únicas exce- beneficiar o maior número de atores possíveis.
ções ao modelo de provisão habitacional com Esse modelo de concertação só pode-
promoção privada. ria ser estabelecido em um governo como o
Nessa modalidade, os munícipios têm de Lula, que já começou com o apoio de uma
um papel mais protagonista sendo responsá- grande base de movimentos sociais. A inova-
veis por acessar o recurso por meio de edital dora articulação da tríplice aliança que uniu
disponibilizado pelo MCidades. No entanto, empresários do setor produtivo e movimentos
essas três modalidades são marginais dentro de moradia, opositores históricos, em defesa
do Programa e representam apenas 11% do de uma política, e de seu governo de maneira
total de unidades previstas. Contudo, mesmo geral, não seria possível de ser construída em
não sendo pensado pelo executivo federal, a um governo que não chegasse ao poder com
inclusão desses municípios menores no bolo do a áurea da defesa dos direitos dos excluídos e
MCMV trouxe importantes apoios públicos da ao mesmo tempo com o pacto com o empresa-
CNM (Confederação Nacional dos Municípios) riado para a garantia do crescimento da econo-
e Frente Nacional do Prefeitos (FNP) para o go- mia do país e dos ganhos do capital nacional.
verno federal. As articulações para a coordenação de
interesses em torno da política habitacional
aqui demonstrada ocorreram no âmbito das
Considerações finais gestões do Presidente Lula. Embora o receituá­
rio tenha sido seguido na primeira gestão de
O que se percebe ao percorrer este caminho Dilma, percebe-se que falta a essa presidente
que desvela o arranjo institucional de coorde- o componente carismático de Lula e a vocação
nação de interesses em torno do MCMV criada para a coordenação de interesses intrínseca a
para sustentação desse programa que se trans- esse ex-presidente conforme constata Singer
formou na única política habitacional do Bra- (2012): “O sucesso de soluções intermediárias
sil por dois mandatos presidenciais é que esse arbitrais, depende em grande medida, da fi-
arranjo foi típico do lulismo, em que todos os gura providencial do líder que dá a cada um
atores têm seus interesses atendidos, mesmo o seu quinhão” (Singer, 2012, p. 201). O que
que de forma assimétrica, e de modo a garantir garantiu a estabilidade desta política foi jus-
a continuidade dos ganhos apoiam a política tamente a força da coordenação de interesses
estabelecida e o governo de forma mais ampla. que foi articulada de modo a criar um “regime
Enquanto se mantém viva a utopia do ca- de políticas públicas” (Couto e Abrucio, 2003)
minho preconizado pela plataforma da reforma quase hegemônico.
urbana que alimenta os atores ligados a essa No governo Dilma, no entanto, a política
plataforma; cada um dos atores envolvidos no e os arranjos institucionais e de atores per-
setor habitacional, inclusive esses próprios ato- maneceram praticamente os mesmos, porém
res, tem ganhos próprios já que, no contexto demonstraram esgarçamentos, mesmo antes

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da importante crise política que se deflagrou atores.­Os poucos espaços de decisão acerca
já no começo de seu segundo mandato. E do MCMV-E, em que se modificam normati-
como esses arranjos, no setor habitacional e vas e se disputam recursos, foram ocupados
também em outras políticas públicas, foram pelos movimentos de moradia ligados ao
essenciais para as estratégias para a própria FNRU,­ mas com a possibilidade do lança-
manutenção do poder do governo, seu esgar- mento da terceira fase do MCMV, assistiu-se
çamento pode inviabilizar o projeto de manu- a uma clara disputa das novas lideranças de
tenção mais à frente. moradia que buscavam brechas para que seus
Outro fato curioso que surge a partir interesses também fossem atendidos de mo-
da instalação do regime da política pública do que passassem a fazer parte da coordena-
do MCMV, é a disputa pelo espaço entre os ção de interesses estabelecida.­

Danielle Klintowitz
Instituto Pólis, Urbanismo. São Paulo/SP, Brasil.
daniklin@gmail.com

Notas
(1) Segundo dirigente da Secretaria Nacional de Habitação, na campanha eleitoral de 2014, as
pesquisas apontaram que o programa com maior recall, isto é, o que era mais lembrado pela
população quando pensavam nas políticas federais, era o MCMV (Klintowitz, 2015).

(2) O FGTS e o SBPE foram criados e regulamentos em 1966 como para promover o respaldo
financeiro necessário à estrutura organizacional do BNH. O FGTS, tendo como fonte de recurso
a poupança compulsória de parte dos salários formais captada pelo Governo Federal, é até hoje
a principal fonte de recursos de financiamento do desenvolvimento urbano do país com juros
mais baixos do que os praticados no mercado. Já no SBPE, cujo os recursos são provenientes
das cadernetas de poupança voluntárias é destinado para o financiamento habitacional dos
segmentos de mais alta renda com juros menos subsidiados.

(3) É importante notar que, para efeitos metodológicos, este cálculo da focalização do Programa
MCMV em relação ao déficit assume que todas as unidades produzidas no âmbito do programa
estão atingindo as famílias computadas como déficit e que não há nenhum vazamento. No
entanto, sabe-se que parte dos atendimentos não são destinados ao atendimento do déficit
calculado pela FJP. Além dos vazamentos pulverizados comuns em programas públicos, parte
do atendimento do MCMV está sendo utilizada para permitir o atendimento às famílias que
sofreram remoções forçadas para a implementação de novos empreendimentos, como no caso
das obras para a Copa do Mundo 2014 e as Olimpíadas 2016.

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(4) O PMCMV, em sua componente urbana, foi operacionalizado para a modalidade da faixa 1 a
partir da alocação de recursos orçamentários da União no Fundo de Arrendamento Residencial
(FAR) – inicialmente no montante de 14 bilhões de reais – e, em menor grau, ao Fundo de
Desenvolvimento Social (FDS) – inicialmente no montante de 500 milhões de reais –, ambos
gerenciados pela CEF. O FAR já vinha sendo utilizado na produção de unidades habitacionais para
famílias com renda entre três e seis SM, dentro do Programa de Arredamento Residencial (PAR),
recebendo recursos transferidos do Orçamento Geral da União (OGU) e do FGTS, e foi utilizado
no MCMV para viabilizar a modalidade que passa recursos orçamentários diretamente para
as empresas. Já o FDS é um fundo contábil de natureza financeira que funciona com recursos
provenientes do Orçamento Geral da União – OGU, com prazo indeterminado de existência,
sendo seus recursos destinados para o financiamento de projetos de investimento de interesse
social, nas áreas de habitação popular exclusivamente para famílias com renda de até R$ 1600,
por meio da concessão de financiamentos a beneficiários organizados de forma associativa por
uma Entidade Organizadora – EO (associações, cooperativas, sindicatos e outros), Organizadora
– EO.

(5) O PAC Favelas, voltado à urbanização de assentamentos precários, apesar de não dialogar
diretamente com o SNHIS e de passar por fora do FNHIS, é defendido por muitos atores ligados
à plataforma da reforma urbana à medida que promove uma atuação mais integrada entre as
políticas urbanas (habitação, saneamento, mobilidade) do que a provisão de novas moradias
que atua de maneira exclusiva na construção de casas.

(6) Optou-se por realizar este exercício estatístico apenas nos dados de contratação da primeira
fase do MCMV, pois os dados do MCMV2, disponibilizados pela CEF, apresentavam muitas
inconsistências e não foi possível conseguir uma base mais adequada junto ao gestor do
programa até o final desta pesquisa.

(7) A Rede Moradia Cidade foi uma rede nacional de pesquisadores que se reuniram para realizar
uma avaliação no âmbito da chamada MCTI/CNPq/MCidades n° 11/2012 sobre a inserção
urbana dos conjuntos produzidos no âmbito do MCMV em seis estados brasileiros. A rede
foi formada por pesquisadores de 11 instituições (universidades federais do Ceará, Pará, Rio
Grande do Norte, Minas Gerais, Rio de Janeiro (Ippur e Prourb), universidades estaduais,
USP (IAU e FAU), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Peabiru e Instituto Pólis) que
construíram uma metodologia em conjunto para identificação de similaridades e diferenças da
implantação desses conjuntos no território nacional. Essa avaliação realizou uma pesquisa com
3.900 famílias com moradias de unidades habitacionais produzidas no âmbito do MCMV, faixa 1,
nas diferentes cidades estudadas.

(8) Uma fala de um entrevistado de um conselheiro do ConCidades do setor da construção civil


explicita esta estratégia: “Como a distribuição de participação do Conselho [das Cidades],
de uma certa forma era um pouco desequilibrada e no fim o governo e os movimentos
sociais acabam tendo uma grande maioria, a gente percebeu que a participação nossa [dos
empresários] não deveria ser na votação. Não tinha como a gente ganhar a votação, a gente
sempre perdia. Mas tinha a discussão, a discussão não é voto, porque na verdade, eu acho que
uma coisa que era legal do Conselho é um trabalho de articulação para trabalhar um pouco o
consenso, eu acho que era uma cultura, uma coisa que foi bom, era trabalhoso, mas foi bom.
Então percebemos que a nossa participação deveria ser na articulação política, na proposta de
ideias, na elaboração de algumas propostas que pudéssemos de alguma forma vender as nossas
ideias (...) Dessa forma nós conseguimos construir uma parceria com os movimentos sociais,
que foi uma coisa muito legal, eu acho que a gente começou no embate com os movimentos

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sociais, a gente tinha visões muito diferentes em algumas coisas, mas conseguimos construir um
consenso” (Klintowitz, 2015).

(9) Ata da 20ª Reunião do Conselho Nacional das Cidades (MCidades, 2009, s/p).

(10) Valores de imóveis podem inviabilizar projetos habitacionais de São Paulo, Rede Brasil Atual.
Disponível em: <http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2014/02/prestes-maia-esta-
no-grupo-dos-que-201ctalvez201d-nao-valham-a-pena-destinar-para-habitacao-social-afirma-
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Texto recebido em 15/out/2015


Texto aprovado em 6/dez/2015

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