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Sonhos Dourados - Revista de História
Sonhos Dourados - Revista de História
Sonhos dourados
Considerado o pai dos bandeirantes, D. Francisco de Souza usou métodos pouco
ortodoxos em sua obsessão pela descoberta de minérios
José Carlos Vilardaga
1/8/2015
Quando “Francisco das Manhas” faleceu, na vila de São Paulo, em 1611, estava “tão pobre (...) que
nem uma vela tinha para lhe meterem na mão”, segundo o cronista Frei Vicente do Salvador. Não foi
na hora da morte, portanto, que inscreveu seu nome na história, mas ao longo da vida: fidalgo
português, D. Francisco de Souza havia sido sétimo governador geral do Brasil e ocupava, desde 1608, o
posto de capitão geral das Minas e governador da “Repartição Sul”, que incluía as capitanias do Rio de
Janeiro, Espírito Santo e São Vicente.
Era uma espécie de “Quixote mineral”: despendeu toda a energia e os recursos que tinha – e que não
tinha – no mirabolante sonho de transformar o Brasil em um eldorado. Na historiografia paulista, foi
louvado como o pai dos bandeirantes, verdadeiro promotor do impulso expansionista regional,
patrocinando expedições que definiram a “vocação para o sertão” de São Paulo. Mas sua trajetória foi
polêmica, na linha tênue entre o lícito e o ilícito.
Ainda nos tempos de Portugal, D. Francisco de
Souza serviu em Tanger, comandando um galeão da
armada real de D. Sebastião na desastrosa
campanha marroquina de 1578. Durante a União
das Coroas Ibéricas, sob o reinado de Felipe II, pôs‐
se rapidamente a serviço do novo senhor, ao
participar, em 1589, da defesa de Lisboa contra as
investidas do pretendente português ao trono, D.
Antonio. Não só caiu nas graças do rei, como se
casou com a filha de um membro do Conselho Real.
Com boa inserção na rede de influências do sogro,
no final do ano seguinte era nomeado governador
geral do Brasil, em substituição a Francisco
Giraldes, que nem chegou a tomar posse. Mapa da Capitania de São Vicente em fins do XVI,
de Teixeira Albernaz. (Imagem: Fundação
A obsessão por minérios não era exclusividade de D. Biblioteca Nacional)
Francisco: aos impérios ibéricos interessava muito ir
em busca dessa riqueza. No amplo espectro territorial formado pelo império espanhol, multiplicavam‐se
as iniciativas de exploração mineral. No Brasil, o Regimento de 1588, herdado de Francisco Giraldes,
instruía sobre a fortificação da costa, o favorecimento à conversão dos índios pelos jesuítas e o
estímulo à descoberta de minas. Para tanto, o novo governador geral angariou uma comitiva bastante
representativa, com nítido sentido militar e técnico: soldados, arquitetos de fortalezas, peritos em
minérios, engenheiros, fundidores. A presença de portugueses, castelhanos, bascos, alemães,
flamengos e italianos refletia a amplitude do império espanhol.
Ainda em Madri, Souza conheceu Gabriel Soares de Souza, senhor de engenho na Bahia e autor do
Tratado descritivo do Brasil (1587). Este devia ser um homem bastante persuasivo: depois de sete anos
perambulando pela corte madrilena, estava prestes a voltar ao Brasil carregado de promessas de
mercês caso descobrisse as minas de metais que jurava existirem. Segundo algumas fontes, D.
Francisco tomou a mesma embarcação que o senhor de engenho, e prometeu empreender todos os
esforços para ajudá‐lo em suas empreitadas.
D. Francisco de Souza tomou posse em Salvador, no dia 9 de junho de 1591. Durante o período em que
permaneceu na Bahia, fez disparar entradas aos sertões em busca das riquezas minerais. Também
fortificou a costa, efetivou a conquista do Rio Grande e promoveu uma série de melhoramentos na
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qualquer forma, já no século XVIII, a palavra era associada em dicionário à “destreza no manejo dos
negócios”.
Ao final, pouco pôde fazer o manhoso Francisco: sem encontrar a riqueza que tanto buscou, faleceu
dois anos depois de sua volta, vítima provável de alguma das pestes que afligiam continuamente o
planalto de Piratininga. Até hoje não se sabe onde foi sepultado e durante muito tempo especulou‐se
sobre as razões de sua morte. Uma das versões sugeria assassinato. Outra, desgosto.
José Carlos Vilardaga é professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e autor de Lastros de
viagem: expectativas, projeções e descobertas portuguesas no Índico (1498‐1554), (Annablume, 2010)
e São Paulo no Império dos Felipes: conexões na América Meridional (1580‐1640), (Intermeios, 2014).
Saiba Mais
FRANCO, Francisco de Assis Carvalho. Dicionário de bandeirantes e sertanistas do Brasil – séculos XVI,
XVII, XVIII. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1989.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Caminhos e fronteiras. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
LEME, Pedro Taques de Almeida Paes. Notícias das Minas de São Paulo e dos sertões da mesma
capitania. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980.
MONTEIRO, John Manuel. Negros da terra. Índios e bandeirantes nas origens de São Paulo. São Paulo:
Companhia das Letras, 1998.
SALVADOR, Frei Vicente. História do Brazil (1500‐1627). Curitiba: Juruá Editora, 2007.
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